
Conforme referência que nos
foi enviada por Chrystian Lavarini (1),
o artigo de M. Sudduth "Super-Psi and the Survivalist Interpretation
of Mediumship" (2) merece
alguns comentários na esteira do que publicamos aqui recentemente
(3) sobre a teoria super-psi. À
princípio, esse artigo de Sudduth se apresenta como uma defesa
bem elaborada da teoria de super-psi, que se coloca como uma alternativa
não materialista à teoria espírita.
Para facilitar a discussão que segue, traduzimos o resumo
do artigo de Sudduth:
De acordo com a interpretação
da sobrevivência da mediunidade, a existência de individualidades
desencarnadas é a melhor explicação para
os dados associados a mediunidade física e intelectual.
Outros - defensores do que é frequentemente chamado de
'hipótese super-psi' - garantem que os dados da mediunidade
podem ser explicados, ao menos igualmente bem, em termos de uma
agente vivo (ESP ou psicocinese). Muitos defensores da interpretação
da sobrevivência tentam esvaziar as virtudes explicativas
da hipótese super-psi argumentando que ela é infalsificável
e não tem apoio independente nas evidências. Minha
linha argumentativa central neste artigo é que as críticas
dos adeptos da sobrevivência à hipótese super-psi
são auto-destrutivas à defesa da sobrevivência
a partir da mediunidade. Para mostrar isso, primeiro argumento
em detalhes que a interpretação da sobrevivência
da mediunidade está comprometida de tal forma com psi que
ela é indistinguível da hipótese super-psi.
A partir dessa perspectiva, pode-se mostrar que qualquer tentativa
de se negar virtudes explicativas à hipótese super-psi
com base em certo grau de psi que isso exige também acaba
por enfraquecer o próprio argumento da sobrevivência.
O conceito de psi
Para compreender a linha argumentativa
de Sudduth é importante também conhecer o significado
de 'psi' como conceito frequentemente usado na parapsicologia. 'Psi'
seria um tipo de habilidade da mente humana que daria a ela capacidade
para produzir diversos fenômenos que, na linguagem típica
da parapsicológica, se confundem com os fenômenos mediúnicos
- tanto de natura 'física' como 'intelectual' (ou mental).
Psi seria, de fato, a fonte desses fenômenos (agentes vivos),
enquanto que a informação deles produzida teria como
origem a mente de outras pessoas.
Esvaziada de uma teoria (4), a parapsicologia
tenta construir uma linha de explicação para os fenômenos
psíquicos que, em sua maior parte, tem horror à qualquer
'hipótese' externa considerada 'anti-científica' (5).
Por causa disso, a parapsicologia se esforçou em construir
uma linha meramente empírica de argumentação,
onde alguns fenômenos são elevados à categoria
de princípios fundamentais. Haveria assim 'fenômenos
básicos' (6) como blocos unitários
em termos dos quais a explicação de outros fenômenos
anômalos seria feita. A consequência disso é
que as explicações parapsicológicas soam como
tautologias para muitos fenômenos (ver
tautologia).
É preciso compreender que as coisas ficaram assim por causa
da própria dificuldade em se justificar psi (7)
com base na física conhecida de um lado, o horror a hipóteses
adicionais e, de outro, ao ambiente francamente hostil aos fenômenos
psíquicos do mainstream acadêmico.
Diferenças entre a interpretação da sobrevivência
e a teoria espírita para a mediunidade.
De fato, a interpretação da sobrevivência
a que se refere Sudduth apenas diz que a fonte da informação
oriunda dos fenômenos psíquicos está na existência
dos Espíritos. Não se detalha o mecanismo através
do qual isso seria possível. Por isso, a linha argumentativa
do autor de (2) é válida:
1. A hipótese super-psi faz
uso de psi em certo grau;
2. A interpretação da sobrevivência usa psi
em um grau indistinguível de super-psi;
_____________________________________________
C: Portanto, todas as críticas dirigidas a super-psi também
valem para a sobrevivência.
Porém, é importante enfatizar que existem grandes
diferenças entre a 'interpretação da sobrevivência'
a que se refere Sudduth em seu artigo e a teoria espírita
elaborada por A. Kardec (8) para a
mediunidade. No caso de Kardec, diversos elementos explicativos
(existência de fluidos imponderáveis, perispírito,
diferenças de densidade entre corpos etc) existem e interagem
para explicar uma variedade de fenômenos psíquicos
de uma forma bem mais complexa do que a simples assunção
da existência dos Espíritos na interpretação
da sobrevivência em questão. Por causa disso, a crítica
que Sudduth tece à falta de imunidade da tese da sobrevivência
em relação à hipótese de 'super-psi'
não se aplica à teoria de Kardec como é fácil
perceber.
Obviamente, o debate entre a 'sobrevivência' e 'super-psi'
passa longe de Kardec, já que grande parte dos pesquisadores
modernos dos fenômenos psíquicos (e que são
favoráveis à sobrevivência) desconhecem a teoria
de Kardec em detalhes.
Fenômenos de experiências de quase
morte e visão de leito de morte não são fenômenos
mediúnicos. Aplicar super-psi em tais casos é claramente
problemático. De fato, tais fenômenos indicam, de forma
independente da mediunidade, a existência do Espírito
e sua sobrevivência.
Um problema ainda maior para super-psi
Os leitores não terão dificuldade em perceber a limitação
do argumento de Sudduth a partir do próprio título
de seu artigo: 'Super-psi e a interpretação da sobrevivência
para a mediunidade' (grifo nosso).
Em suma, seu argumento só se aplica à mediunidade.
Entretanto, existem inúmeras ocorrências que são
fenomenologicamente diferentes da mediunidade:
- Lembranças e fenômenos
associados a vidas anteriores em crianças (9);
- Lembranças de vidas anteriores em adultos submetidos
à regressão de memória;
- Experiências de quase morte, EQM (10);
- Visões no leito de morte (11);
Aplicar a ideia de super-psi nesses casos seria
proibitivamente desonesto como é fácil perceber. Seria
esticar em demasiado uma explicação customizada para
um tipo de fenômeno. Inúmeros detalhes concorrem para
demonstrar que a ideia da sobrevivência se sustenta de forma
independente:
- Por exemplo, no caso das lembranças
de vidas anteriores em crianças, o que 'sobreviveu'
de uma existência para outra? Como explicar marcas de nascença
associada a vidas anteriores usando super-psi?
- No caso de experiências de quase
morte, o que continua a existir enquanto o cérebro
está sem oxigênio?
- Porque a imensa maioria das lembranças
em EQM diz respeito ao encontro com pessoas já falecidas?
Nas visões de leito de morte, porque são reportadas
imagens de pessoas falecidas?
O leitor interessado identificará
facilmente outros detalhes na fenomenologia psíquica 'não
mediúnica', que permite facilmente perceber a simplicidade
e amplitude explicativa da tese da sobrevivência. Dessa forma,
invocando-se a 'Navalha
de Occam' (simplicidade), a tese da sobrevivência
apresenta-se como a teoria que deve ser escolhida.
Esse é um assunto interessante que merece ser melhor explorado
futuramente, principalmente no que diz respeito às consequências
da tese da sobrevivência com base em evidências não
mediúnicas.