A
profetização, assim, como referência da
atuação de espíritos sobre os humanos,
é exceção, condicionada a circunstâncias
especialíssimas
A música cativa. No contexto espiritual, a arte, em sua vertente
musical desempenha um papel importante na formação e
na composição da individualidade do ser. Neste sentido,
não há quem não se emocione ou se interesse por
determinados ritmos, melodias e sons.
Os estudiosos e especialistas em harmonia
musical, costumam dividir a história do rock em antes e depois
dos Beatles, o grupo que revolucionou completamente a forma de compor,
produzir e representar a música, no cenário internacional.
O quarteto de Liverpool concebeu variações e composições
até hoje imitadas pelos intérpretes e não há
um único compositor ou intérprete de nossos tempos que
não busque na sistemática e interpretação
beatleniana a inspiração para compor e apresentar canções
nos dias de hoje.
Paul, John, Ringo e George, assim,
são criaturas ímpares, em termos de desenvolvimento
musical, isto não significando que tenham sido, a seu turno,
Espíritos de escol ou missionários. Apenas - e tão-somente
- fizeram o melhor com os recursos que dispunham e colocaram em prática
o exercício dos talentos que "receberam do Alto"
ou que desenvolveram, em termos de habilidades e capacidades, face
o livre-arbítrio que possuem, enquanto seres espirituais.
Em outros ensaios, temos dito que
há uma evidente sintonia entre os planos invisível e
material na execução de diversificadas ações,
em múltiplos setores da existência. No âmbito das
ciências, da literatura e, é claro, da arte, as inteligências
invisíveis - por sintonia - aproximam-se dos entes encarnados,
orientando-os, sugerindo, influenciando e cooperando em produções
conjuntas, mesmo que, amiúde, seja o crédito pelas produções
e realizações assumido, quase que totalmente, pelos
homens, sem referência aos desencarnados.
A exceção, é
claro, enquadra aquelas situações onde os indivíduos
com alguma noção espiritual reconhecem a existência
do intercâmbio entre Mundos, diagnosticando, através
da Mediunidade, a sintonia entre estes e aqueles, registrando a origem
espiritual das atividades lítero-artísticas que compõem
ou materializam.
Recentemente, o beatle Paul McCartney
(dizemos assim porque, apesar do "fim" do grupo ter sido
anunciado há mais de três décadas, o compositor
britânico, por estar vivo, continua sendo identificado como
tal) declarou à imprensa que George Harrison, um dos componentes
do fantástico quarteto de rock, falecido há cerca de
três anos, teria influenciado uma de suas mais recentes composições,
intitulada "Waiting for your friends to go", o que, em português,
tem o sugestivo nome de "Esperando seus amigos partirem".
A "ajuda" do além, na composição da
melodia (e/ou da letra) implica, necessariamente, numa análise
"transcedental". Primeiro, porque os artistas, muitas vezes
em "êxtase", utilizam-se de alucinógenos, e
a produção (resultado) de sua atividade acaba sendo
uma decorrência da equação que conjuga a natural
inspiração pessoal do artista e o efeito das drogas
ou o incentivo de substâncias farmacológicas. Segundo,
pois não é tônica a formação ou
a aceitação de teorias espiritualistas, que implicam
na aceitação da simbiose entre vivos e mortos, a qual,
em regra, só acontece em função de revelações
ou milagres, conforme a teoria religiosa dominante. A profetização,
assim, como referência da atuação de espíritos
sobre os humanos, é exceção, condicionada a circunstâncias
especialíssimas.
Então, quando uma personalidade
de renome e inconteste em termos de importância e reconhecimento
público vem declarar a "influência" espiritual
recebida, dizendo, inclusive, que o "morto" ditou ou escreveu
por seu intermédio, isto, por si só, deve ser considerado
de grandiosa relevância para a disseminação das
idéias espíritas.
McCartney, ainda, declara que a "facilidade"
para compor a canção decorreu justamente da presença
e da quase exigência do falecido amigo em direcionar a atividade
de sua criação musical, chegando a declarar: - Era ele
que estava escrevendo. Tive um "feeling" (sentimento, em
inglês). Era ele mesmo... A canção "escreveu-se"
sozinha.
O próprio título da
faixa que integra o mais recente álbum de Paul ("Chaos
and Creation in the Back Yard - considerado um dos três melhores
do compositor, desde que o grupo foi desfeito, no início da
década de 70) é intrigante e com uma "dúbia"
interpretação. Deixando o significado "padrão"
(material) de lado, o título significa que os que já
estão no plano espiritual, em razão do vínculo
que não se acaba com a morte, aguardam o momento de reverem
aqueles que deixaram aqui (plano material), podendo-se inferir que,
cada ser que desencarna, embora continue o seu plano de evolução,
sente saudades e aguarda, com certa expectativa, a oportunidade de
rever - em Espírito - aqueles que ficaram, sendo, pois, decorrente,
a idéia de aguardar que os que se acham encarnados, morram,
para um encontro "do outro lado".
A letra, assim, suscita à interpretação
de que George esteja - ao lado de John, falecido em 1980 - aguardando
a chegada de Paul e Ringo, para que, na vida espiritual, possam, quem
sabe, reeditar os ensaios inesquecíveis da década de
60, no plano sutil.
Estou exagerando? Penso que não!
Afinal, se nos debruçarmos sobre os conceitos básicos
de mediunidade e comunicação entre os planos espiritual
e material, encontraremos diversos elementos para fundamentar este
parecer.
De início, o próprio
O Livro dos Espíritos consigna as
célebres conceituações acerca da (poderosa) influência
do plano invisível sobre o terreno, conforme a questão
459. Em paralelo, O Livro dos Médiuns apresenta elementos que
devem ser conjugados para a identificação da real influência
do Espírito George sobre o compositor McCartney. Vamos a elas:
1) Identidade
espiritual - elementos psíquicos podem ser relevantes
na identificação do espírito comunicante, seja
pela vidência, audiência ou sensibilidade. Assim sendo,
quem conviveu muito tempo com determinada pessoa, após a sua
passagem para a vida espiritual e, ocorrendo o fenômeno mediúnico
(aqui representado pela influência de um sobre o outro e pela
"comunicação"), reconhece traços e/ou
características deste último.
2) A Prova da Identidade
- resulta, diretamente, considerando-se, é claro, as situações
de embuste que determinados Espíritos possam suscitar para
iludir os encarnados, como assaz acontece com os zombeteiros. Assumem,
assim, identidade falsa, pelo que podem ser desmascarados mediante
o estudo sério e a observação detida. Identidade
é individualidade, isto é, o traço que diferencia
os Espíritos entre si, seja na vida material seja no plano
invisível, pela qual são reconhecidos em todas as situações
e circunstâncias. É pelo caráter que se identifica
o comunicante, nas expressões daquilo que infunde ou dita ao
médium. Outros elementos como expressões, linguajar
e caligrafia e assinatura podem ser igualmente relevantes para a comprovação
de "quem" se comunica, mas, pelos elementos contidos nas
reportagens que inspiram este ensaio, não é possível
tratar do assunto.
3) A Afinidade -
a relação direta que se trava entre os Espíritos
decorre da afinidade de propósitos e interesses.
Neste sentido, quanto mais contemporâneos
sejam o comunicante e o instrumento, melhores serão os resultados
da atividade e, por conseqüência, mais fácil será
a prova de sua identificação ..
4) Psicografia -
a escrita "direta", isto é, aquela em que o Espírito
desencarnado dita ao homem uma mensagem, dá-se de modo consciente,
parcialmente consciente ou inconsciente, isto é, em diversas
situações pode-se perceber a maior ou menor influência
do primeiro sobre o segundo.
Ainda assim, há casos de mediunidade
de intuição, onde não há, propriamente,
a comunicação psicográfica, mas o desencarnado
influencia na atividade de criação intelectual do encarnado.
Os elementos das reportagens que trataram o tema dão-nos indícios
de que Paul, realmente, psicografou a canção. Ainda
assim, no caso em tela, não podemos dizer se sir McCartney
será um médium psicógrafo daqui para frente,
mas, de qualquer modo, o "canal" de comunicação
está, doravante, aberto e ativo.
5) Médiuns Sensitivos
ou Impressionáveis - em maior ou menos proporção,
todos sentimos a presença das inteligências invisíveis
e, de certo modo, com o estudo e a prática mediúnica
(hábito), aprendemos a conviver melhor com as "influências"
espirituais, delas tirando o melhor proveito (não em termos
pessoais, materiais), mas em função da própria
utilidade do fenômeno, para fins de crescimento espiritual e
auxílio (bem-estar, saúde e informação)
de outrem. Neste sentido, um Bom Espírito, na dicção
do Espírito Verdade, nos provoca, sempre, uma impressão
suave e agradável.
6) A condição
de artista - o fato de trabalhar com arte - e arte verdadeira,
de qualidade, diferentemente de arte "vulgar", de conteúdo
sofrível, que grassa pelo mundo em que vivemos - dá
ao encarnado uma condição "diferente", uma
especialidade que o credencia para o intercâmbio espiritual
"de qualidade", levando-se em conta, ainda, a questão
da afinidade (de gostos e tendências) entre os habitantes de
distintos mundos. A orientação espírita indica
que tais seres "[...] são sem dúvida Espíritos
adiantados, capazes de compreender por si mesmos e de conceber grandes
coisas" e "[...] são médiuns sem o saberem."
No caso específico da relação Paul-George, a
facilidade da comunicação se dá em virtude de
que ambos trabalharam juntos com a arte e, neste sentido, a convivência
levou à familiaridade de intenções e propósitos,
resultando, no caso em comento, na produção de uma canção
"a quatro mãos", ou, a "dois Espíritos".
7) Animismo - considerado
como a expressão espiritual de si mesmo, num fenômeno
de caráter espiritual, quando o encarnado recorda-se de fatos
passados ou resgata impressões da vida espiritual, canalizando-as
para a condição de vida atual. De certo modo, existe
um relativo preconceito do meio espírita para com as ocorrências
anímicas, como a simbolizar certa diferença conceitual
e categórica entre o fenômeno mediúnico propriamente
dito e o espiritual. Não há, em nosso posicionamento,
nenhuma gradação - em termos de importância filosófico-científica
entre a mediunidade e o animismo, desde que o comunicante caracterize-se
pelo grau de desenvolvimento espiritual, refletido no tipo de mensagem
transmitida. Assim é que a distinção entre uma
e outra se dá em função das circunstâncias
fáticas e da linguagem utilizada, de vez que uma comunicação
anímica - embora relevante e útil - terá proximidade
com o formato usual da expressão utilizada pelo encarnado.
8) Influência
do encarnado sobre o desencarnado - outro elemento relevante
é a questão do grau de influenciação do
homem sobre o Espírito comunicante. Kardec questionou isto
da Falange da Verdade, recebendo a seguinte resposta: "Exerce,
porquanto, se estes não lhe são simpáticos, pode
ele alterar-lhes as respostas e assimilá-las às suas
próprias idéias e a seus pendores; não influencia,
porém, os próprios Espíritos, autores das respostas;
constitui-se apenas em mau intérprete".
Por fim, analisando-se com detidão
o resultado (a composição, assinada por Paul e creditada
ao Espírito Harrison), há elementos suficientes para
considerar que se trata de uma comunicação mediúnica
fidedigna, mantendo-se os traços que tão bem caracterizaram
a profícua e qualificada produção musical dos
Beatles e, neste sentido, demonstrando que a criatividade e produtividade
artísticas transcendem os portais da natureza material. Mais
que isto, os interesses dos Espíritos se conjugam com os dos
seres encarnados, importando dizer-se que, ao ingressarmos no plano
sutil, continuaremos vinculados aos "assuntos" com que nos
envolvemos na vida encarnada. Assim é que a amizade entre os
"meninos de Liverpool" resiste ao tempo e à morte,
enquadrada esta apenas como uma passagem. Que George e - quem sabe
- John Lennon, possam continuar "compondo" do outro lado,
para nosso deleite... Os amantes da boa música agradecem!
Fonte: Revista
Espírita HARMONIA
http://aeradoespirito.sites.uol.com.br/A_ERA_DO_ESPIRITO_-_Portal/ARTIGOS/ArtigosGRs/A_MUSICA_ESPIR_DOS_BEAT_MH.html
(*)
Marcelo Henrique Pereira, Mestre em Ciência Jurídica,
Presidente da Associação de Divulgadores do Espiritismo
de Santa Catarina e Delegado da Confederação Espírita
Pan-Americana para a Grande Florianópolis (SC)
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