Convenciona-se entender a alteridade como a relação
que se trava com o outro de modo isonômico, com absoluto respeito
pela identidade do outro, sua bagagem individual, sua intelectualidade
e personalidade, bem como suas idéias e percepções.
Em essência, não existem duas individualidades iguais
no universo, de modo que os pontos de vista sempre serão distintos
na totalidade, embora possa haver aproximações e concordâncias
em alguns elementos. Diz-se, até, que no relacionamento interpessoal,
à luz da alteridade, havendo consenso nos aspectos de mérito,
nós nos esforçamos por entender as pequenas diferenças
acessórias, compondo ajustes e realizações conjuntas.
O ser humano é comunicativo
por excelência. Desde o momento em que precisou externar suas
idéias, convencionou um conjunto de símbolos, aos quais
chamou de linguagem, para diminuir a distância que o separava
do outro, fazendo-se entender. A comunicação, assim,
instaurou-se entre dois ou mais seres, fundada na possibilidade de
emissão e recepção de mensagens e, deste modo,
a partir da sintonia, construiu-se a relação.
O enfoque comunicativo, entretanto,
alterou-se substancialmente. Da intenção de "convencer"
o outro acerca de nossas idéias, ou cooptá-lo, atinge-se
o estágio da comunicação alteritária,
em que o que importa é a possibilidade da
construção do diálogo e o investimento nas diferenças
entre os seres comunicantes, que agregam valor a partir do
contato com o universo do outro. Nesse patamar, é preciso valorizar
as quatro premissas básicas da ética na comunicação:
1) o outro é uma individualidade; 2) como individualidade,
o outro tem direito a expressar suas idéias; 3) na relação
com o outro, comunicar-se entendendo as diferenças que existem
entre ele e você; e, 4) a partir das diferenças, amar
o outro como ele realmente é, em sua diferença, sem
exigências de mudança ou adequação a seus
conceitos particulares.
Na construção desse
processo comunicativo, o cotidiano tem demonstrado o enriquecimento
da bagagem espiritual dos seres que, em distintos ambientes e construindo
diferentes relações, esforçam-se por adotar a
mencionada ética, entendendo, ainda, que cada novo contato
revela-se como um desafio ao exercício da alteridade. Em essência,
cada nova oportunidade de ação alteritária agrega
valor no sentido da descoberta de si mesmo, do intercâmbio com
o outro e do crescimento a partir da diferença.
Referidos conceitos, todavia, provocam verdadeira revolução
no contexto social, acostumado com a visão tradicional do processo
comunicativo, que se baseia, apenas, na difusão de conceitos,
no sentido de convencimento ou adesão. Em verdade, as mídias
com vinculação filosófica ou religiosa (ou, mesmo,
quando leigas, sendo utilizadas por adeptos) acabam girando em torno
de si mesmas, destinando-se, em sua imensa maioria, para os prosélitos,
adeptos ou simpatizantes, tão-somente. Com isso, perde-se excelente
oportunidade de diálogo e interação, na essência
da tese de "aprender com o outro", sem deixar-se, puramente,
convencer.
Comunicação,
em resumo, é uma via de mão dupla, em que ambos
têm isonomia de tratamento, direitos e obrigações.
A essência da comunicação, assim, é a própria
interação "descompromissada", isto é,
aquela que se funda na possibilidade da construção do
diálogo interpessoal, e não se preocupa em fazer com
que crenças ou ideologias particulares sejam absorvidas pelo
interlocutor, como premissa. Se isso acontecer, fluirá naturalmente,
até porque também absorveremos do contato com outrem
aquilo que entendermos oportuno para nosso próprio crescimento
pessoal.