Desde que Kardec inaugurou a sistematização
do conhecimento espiritual, disciplinando a mecânica das comunicações
e estruturando sistemas de aferição da veracidade das
comunicações e da ética no processo de intermediação
mediúnica, o mundo passou a entender melhor a Mediunidade,
posto que já a conhecia desde tempos imemoriais.
Sim, meus amigos, já dissemos em outros momentos: a Mediunidade
não é "patrimônio" do Espiritismo –
mesmo aquela que obedece à rigidez estabelecida por Kardec
para a seleção das mensagens e a demonstração
de sua validade para o conhecimento universal, incluindo-se aí
a questão da permanência das "revelações"
espirituais, no curso do tempo, tendo em vista que o contexto, o cenário
e as próprias inteligências desencarnadas consultadas,
bem como o nível de entendimento dos encarnados, passaria pela
fieira evolutiva. Assim, temos determinados contextos escritos na
segunda metade do século XIX que estão defasados, desatualizados
e cientifica ou filosoficamente incorretos, uma vez que pertencem
àquele quadrante temporal e as percepções, tanto
dos homens quanto dos Espíritos que vêm dar informes,
são distintas. Tudo evolui!
Este "caminho" pavimentado com dificuldade e praticamente
sozinho por Kardec deveria ter sofrido melhorias e complementações.
Há quem diga que, posteriormente ao desencarne do professor
francês, outros pesquisadores enveredaram a escrever suas percepções
(anímicas ou por intuição de mentes invisíveis)
e outros médiuns deram azo à comunicação
de outras ideias, ditas complementares ao contexto preliminar cognominado
por Codificação Espírita. Aqui, abro um parênteses
para considerar, diversamente, da maioria, um contexto maior que inclui
tudo aquilo que Kardec sistematizou ou produziu, afora os "decantados"
cinco livros "básicos" (que, alguns cunharam e a
maioria gostou de repetir, "Pentateuco Espírita",
para coincidir a obra lionesa com os cinco pesados e antigos volumes
atribuídos a Moisés. Equivocada e desnecessária
"comparação". A obra de Kardec é monumental
não só no conteúdo, mas na essência e na
extensão, posto que, por exemplo, só os doze volumes
(esquecidos) da Revue, já dariam muito mais amplitude àquilo
que está nas obras "fundamentais". Por falar em fundamental,
é bom resgatar o que o próprio Kardec teria dito da
sua "produção literária", considerando
que, para qualquer neófito, importaria conhecer três
das "principais" obras: O Que é o Espiritismo,
O Livro dos Espíritos e O
Livro dos Médiuns, sendo as outras, variações,
diversificações, complementações do contido
nesta trinca fabulosa.
Mas, vamos voltar ao tema essencial deste ensaio: "Devemos esperar
pelos Espíritos?" Como assim? Esperar o quê? Esperar
p´ra quê? Qual o contexto?
Vamos dividir as respostas em dois blocos. Peço paciência
para que o entendimento possa ser completo, ao final.
Numa primeira vertente, vou enquadrar o continuum espírita
que, para mim, continua "deixando a desejar". Se, por um
lado, temos uma profusão – nunca antes vista na história
desse país (ou do mundo) – de obras ditas "espíritas"
(e me perdoem os puristas, vou enquadrar aqui tudo o que tenha alegadamente
origem medianímica e tudo o que trate de questões transcendentais,
a partir das premissas estabelecidas no conteúdo kardeciano).
Não vou ficar, aqui, fazendo seleções ou amostras.
Para mim, tudo é ESPIRITISMO, desde que, é claro (pode
não parecer para muitos) não se "avacalhe"
a contextura principiológica da Doutrina dos Espíritos
e não se avilte aqueles que são, reconhecidamente, pela
própria cátedra de Rivail, os PRINCÍPIOS BÁSICOS
DO ESPIRITISMO. Como este, também, é um ensaio didático,
vamos a eles: DIVINDADE, ESPIRITUALIDADE (EXISTÊNCIA DOS ESPÍRITOS),
IMORTALIDADE, EVOLUTIVIDADE (EVOLUÇÃO), COMUNICABILIDADE,
PLURALIDADE (DOS MUNDOS HABITADOS E DAS EXISTÊNCIAS –
REENCARNAÇÃO). Sete princípios, pois. Fugiu de
um deles, não é ESPIRITISMO.
E, como não sou "purista" nem "puro" (de
pureza doutrinária), entendo que há na produção
anímica ou mediúnica (desde a intuição
até a psicografia) muita coisa relevante e oportuna, ainda
dentro da esfera da OPINIÃO DOS ESPÍRITOS sobre situações
do mundo físico e do mundo extrafísico. Minha homenagem,
aqui, a duas referências neste processo: a Chico Xavier que
foi e é, ainda, a maior fonte de produção textual
mediúnica pós-Kardec e a Herculano Pires, "o metro
que melhor mediu Kardec", segundo Emmanuel, que teria alcunhado
o primeiro como "o ser interexistente", isto é, aquele
que vive (e como vive!) ao mesmo tempo em dois mundos, tal a plenitude
e a desenvoltura como transitou no plano da matéria e no Mundo
dos Espíritos.
Sim, dirão alguns, há muita "porcaria" por
aí, num estilo de "arrebanhar" a atenção
e o interesse dos incautos e dos invigilantes (sic.). Ou, como já
ouvi, em corredores federativos, que há editoras apenas interessadas
em lucrar, em arrecadar, mais e mais, e por isso, "dane-se o
conteúdo; basta uma capa multicolorida, um acabamento especial,
uma foto de capa chamativa, alguns dizeres promocionais e vende feito
uva". Palavras da salvação! Ora, Senhores... Desde
os bancos escolares, na faculdade de Jornalismo e depois na de Direito,
sempre ouvi os mestres dizerem: "vende porque existe público".
Nada diferente disso. As pessoas se movimentam em face de interesses
e ninguém muda isso senão o próprio ser, quando
amadurece, quando modifica seu teor vibratório, quando seleciona
(melhor) suas companhias físicas ou espirituais. As tentativas
seculares de "tolher" as liberdades, de "enquadrar"
o pensamento, de "selecionar" ou "padronizar"
conceitos ou comportamentos foram todas um fracasso, dignas de figurarem
no panteão da escuridão ou, como alguns amigos espiritistas
(que respeito mas não concordo) alcunham de "trevas",
"trevosos" ou coisa que o valha.
A seleção, caríssimos, deve ser particular, própria,
individual e INTRANSFERÍVEL. Ela se assemelha às outras
escolhas que fazemos: um programa para fazer nas horas vagas, um filme
para assistir no cinema ou em casa, uma modalidade esportiva (até
mesmo aquelas cujo objetivo seja "surrar" até quase
à morte determinado "opositor"), os prazeres, os
alimentos, a bebida e, até, outras "atrações"
desta vida cada vez mais diversificada. É como se disséssemos
a cada ser: - Viva! E faça escolhas, mas não esqueça
de que todas as escolhas terão repercussões. E estejas
preparado para assumir as responsabilidades e as consequências
de cada uma das escolhas. Simples assim!
Então, para fechar este primeiro bloco, vou dizer que não
me incomodo nem um pouco de chegar em uma livraria, banca, feira do
livro ou folhear catálogos impressos ou "navegar"
pelas páginas das distribuidoras e editoras, assim como receber,
diariamente, "anúncios" de livros, novas obras, reedições
ou "promoções", em que, a princípio,
pela minha experiência de leitura e seleção, por
honra à formação doutrinária (difícil
e penosa, pela constância aos grupos de estudo e debate e pelas
horas de leitura, feitas até mesmo no trajeto do coletivo de
casa para a escola, ou trabalho, e vice-versa – experiências
que fornecem conhecimento e visão de conjunto e que nada consegue
superar), eu possa (reservadamente, cá com meus botões)
colocar senões (pessoais) a este ou aquele título, a
este ou aquele médium (em virtude da produção
mediúnica que eu conheça, por ter lido e avaliado) ou
aos espíritos (?) comunicantes que assinam este ou aquele título.
Eu tenho os MEUS CRIVOS, que são resultado do dito acima. Mas
não vou, nunca, impô-los a outrem, nem publicar releases
ou fichas de leitura (coisa antiga, isso, não?), desqualificando
ou desaconselhando a obra, o médium ou a autoria espiritual
alegada. Não mesmo! Cada um que faça o mesmo percurso
(ou similar), que estude, que pondere, que compare. Aliás,
não foi isso que o Mestre Kardec fez e ensinou a fazer, sob
a batuta do atento Erasto ("preferível rejeitar nove verdades
do que aceitar uma só mentira")?
Aos companheiros que já me perguntaram – até oficialmente
– sobre a produção de um "roteiro",
de uma "orientação geral" às livrarias,
instituições espíritas e distribuidoras de livros
ou, até, ao próprio público leitor interessado
espírita, eu sempre respondi e respondo negativamente. Tarefa
impossível e inaceitável, do ponto de vista da própria
diretriz de Kardec. É preciso tudo sopesar, avaliar, analisar,
sem que outrem o faça por vocês.
Dou-me ao direito de, apenas, uma única exceção
à regra acima: o fato de alguém, com o livro na mão,
ou já tendo demonstrado interesse no mesmo, vier me perguntar:
- Marcelo, você já leu este livro? O que me diz dele?
O que sabe do médium ou do autor, assim como do eventual espírito
(ou espíritos) que assinam a autoria intelectual da obra? Neste
caso, se eu tiver lido (não sou, é claro, um devorador
contumaz de obras nem uma enciclopédia ambulante), eu poderei
dar a MINHA OPINIÃO, com as ressalvas de que será a
MINHA VISÃO, conforme os meus conhecimentos. Nada definitivo,
prescritivo ou sancionador ou desabonador de qualquer obra, portanto.
No segundo quadrante do texto, vou me dedicar à ESPIRITODEPENDÊNCIA
dos espíritas. Como? Sim, é isso mesmo. Dependência
dos Espíritos para a realização das modificações,
das mudanças, das transformações ou, pasmem,
das simples tarefas do dia-a-dia. No fim da década de 80 eu
participava de uma instituição. Numa reunião
mediúnica, a dirigente assim se expressou: - Meus irmãos,
nós estamos pensando em pintar a nossa casa espírita.
Vamos consultar os mentores para ver se eles desejam (!) que seja
pintado de branco ou se podemos utilizar outra cor, como alguns irmãos
estão sugerindo. E ela se "concentrou" e recebeu
dada entidade que disse: - Branco! E, após o assim seja, foi
assim feito... Não é chacota, não é invenção,
muito menos desrespeito com as personalidades (físicas e espirituais)
que participaram desse episódio histórico... É
a realidade...
E assim eu continuo vendo, aqui ou ali, a IMPERIOSA NECESSIDADE que
têm os encarnados de "ouvirem" os Espíritas,
de receberem deles, quase sempre, o "puxão de orelhas"
no sentido de corretivo, de censura, de admoestação,
porque NUNCA nós estamos (ou estaremos) prontos... Nós
estaremos constantemente evoluindo e é natural que alguém
que esteja bem mais à frente, venha corrigir e orientar certos
procedimentos. Quanto a isso, nenhuma dúvida. Isso ocorre em
todos os cenários da nossa vida (e nem sempre por parte daqueles
que estão, de fato, intelectual ou moralmente na vanguarda,
mas ocupam posição superior nos contextos existenciais:
família, escola, trabalho, etc.).
O problema desta ESPIRITODEPENDÊNCIA não se limita às
quatro paredes de uma instituição espírita (lembrando
o episódio acima enquadrado, qual o reflexo direto e imediato
da cor colocada nas paredes para a Humanidade?). O que assusta é
o fato de que a grande maioria dos espiritistas fica esperando a manifestação,
ainda que mediunizada ou declaradamente inspirada (tomo a liberdade
de "duvidar" ou de "desejar aferir" se se trata
mesmo de uma comunicação SÉRIA, como apresentou-nos
Kardec em relação ao exame e à seleção
da produção mediúnica, quando, por exemplo, trata
do Controle Universal dos Ensinos dos Espíritos ou quando estabelece
prodigiosos comentários em relação à antiga
prescrição bíblica "provai e vede se todos
os espíritos são de Deus" ou quando exemplifica,
por meio das mensagens apócrifas, que a assinatura ou o estilo
"rococó", rebuscado e mui belo, no conteúdo
de uma página dita medianímica, pode ser um embuste,
uma farsa, um gracejo ou resultar, unicamente, da pouca instrução
de um Espírito que, POR AFINIDADE VIBRATÓRIA, se aproximou
de dado ambiente e entrou em sintonia com o "aparelho",
médium. Novidade nisso? Não creio... Isto acontece TODOS
OS DIAS, e eu posso me recordar das "n" vezes em que ouvi
ou li sobre situações em que o dirigente ou o mentor
do trabalho exortava: - Vigilância! Equilíbrio! Elevação
de vibrações! Melhorar (equalizar) a sintonia! E por
aí afora...
Agora mesmo, em que o nosso país, tão pacato, tão
pacífico, tão "coração do mundo",
tão "pátria do Evangelho", é palco
de inúmeras e sequenciais (talvez, intermináveis, dentro
de um dado contexto temporal, pois é claro que não durarão,
como não duraram em outros tempos, aqui, ou em outros locais,
no contexto de outras sociedades) e de alguns abusos, com violências,
agressões, depredação e vilipêndio de patrimônios
públicos e privados, vez por outra leio (nas redes sociais
ou listas de emails) ou escuto dos próprios espíritas:
- O que os Espíritos nos dizem sobre isso? O que devemos fazer?
Meu Deus, será que os Espíritos nos abandonaram? E por
aí afora...
Meu Deus! – digo eu... Será que vamos continuar "terceirizando"
a solução para os nossos próprios problemas?
Será que vamos continuar atribuindo aos OUTROS (desencarnados,
obreiros, que nos assistem, ou encarnados, em virtude de seus cargos
ou posições mundanas, capazes de provocar as mudanças,
por tentar colocar "tudo nos eixos" novamente) a responsabilidade
pelo FAZER? Será que vamos "crer" (fé raciocinada?)
que os Espíritos que estão por toda a parte e que, no
dizer da obra primeira, influem nos acontecimentos da vida ao posto
de que "não raro nos dirigem" é algo titerítico,
como se fôssemos marionetes a serviço ou sob a dependência
deles? Não!
Evidente que eles (principalmente os mais evoluídos, despertos,
preocupados e envolvidos nas situações da vida física,
pelos encargos que assumiram em relação a nós,
encarnados, individual e coletivamente) estão acompanhando
as diversas situações – não só no
nosso Brasil-varonil, mas em diversas outras localidades deste e dos
outros mundos habitados, com preocupação e denodo. Os
Espíritos que assistiram Rivail foram categóricos em
afirmar que, pela categoria dos interesses se mensuraria a atração
e a proximidade dos Espíritos, de modo que assuntos fugazes
e triviais, situações de mera materialidade não
iriam despertar a atenção dos Espíritos evoluídos,
mas apenas daqueles que ainda se comprazem com situações
de baixa ou mediana claridade.
Eles, os Espíritos estão, com certeza tudo observando.
E se aproximando das pessoas (encarnados) de acordo com a Lei das
Afinidades. Assim, com muita franqueza, posso dizer que numa pequena
concentração de homens e mulheres "baderneiros"
que deseja atear fogo em um veículo, haverá uma multidão
igual (ou até maior) de desencarnados, "atiçando"
e se locupletando (espiritualmente, pelos prazeres psíquicos)
por aquele fato ou ato. Assim como dentre aqueles que estejam defendendo
"melhores dias", com equilíbrio e discernimento,
aqueles que não sejam movidos pela motivação
do "quanto pior melhor" ou do "atiremos todas as pedras"
ou do "nada presta, nada deve subexistir", os que desejam
um país melhor, com EFETIVA JUSTIÇA SOCIAL, com respeito
às instituições e aos valores e princípios
públicos, a correção e a aferição
em relação aos desmandos e a punição exemplar
dos responsáveis (veja-se, a respeito, a parábola do
Escândalo Necessário, em O Evangelho) uma multidão
de Bons Espíritos estará lhes acompanhando. Novamente,
aqui, como na situação bem acima, dos livros espíritas,
é a AFINIDADE e a SIMILITUDE DE GOSTOS, PENDÊNCIAS E
PENDORES estará a determinar a união ENTRE os Espíritos.
Ao invés de ficarmos, como em tempos outros, em que estagiamos
em seitas e cultos de fé baseados na contemplação,
na oração e nos petitórios, aguardando "soluções
mágicas e mirabolantes" por força da intervenção
dos ESPÍRITOS SUPERIORES nos acontecimentos da vida, sejamos
nós os AGENTES TRANSFORMADORES, cada qual em seu "quintal".
Sejamos nós os fomentadores das boas ideias, das críticas
verdadeiras e pontuais, da disseminação de valores,
seja em teoria (inicialmente a parte que desperta nos outros o desejo
de prosseguir junto) como na prática, na ação
que arrasta os corações e as mentes no sentido da mudança
qualitativa.
Evidente que como Espírita, não vou olvidar o poder
das vibrações, das sintonias coletivas, a ação
eficaz da prece enquanto elemento motivador de condutas, a partir
da associação produtiva, ética e construtiva
entre as INTELIGÊNCIAS (encarnadas e/ou desencarnadas). A manipulação
das energias, de efeitos vários e poderosos é estudada
pelos Espíritas de todos os tempos e tem capítulo especial
dentro da obra kardeciana. Mas ela, a prece, ou a exortação
ou cátedra dos Espíritos desencarnados, em instrução
a nós outros, de maneira geral ou "provocada", quando
o médium ou um interlocutor deseja saber o que os Espíritos
têm a nos dizer, não pode substituir a AÇÃO
CONSCIENTE, PRÓATIVA, PERSEVERANTE E CONTÍNUA na direção
do BEM.
Não, não devemos esperar pelos Espíritos! Devemos
fazer a parte que nos cabe. Agora!