Aula 12 : Física
e Espiritismo : considerações finais
1. FÍSICA E ESPIRITISMO
VI: CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo das últimas aulas,
buscamos esclarecer o leitor sobre possíveis relações
entre alguns conceitos da Física e do Espiritismo. Verificamos
que alguns conceitos exprimidos pelos espíritos podem ser
explicados e entendidos graças ao desenvolvimento da Física
Moderna, mas também analisamos algumas características
dos fenômenos espíritas concluindo que eles não
podem ser explicados pela teoria quântica.
Nesta aula, pretendemos comentar
sobre um outro exemplo de fenômeno da Física que está
sendo confundido com um fenômeno espírita, o teletransporte,
e vamos tecer comentários sobre a obra Mecanismos
da Mediunidade [1] de André
Luiz, através da psicografia de Francisco C. Xavier e Waldo
Vieira. Vamos, também, analisar, brevemente, a idéia
de universos paralelos e o que isso representaria
em termos espíritas.
Comentaremos, também, a respeito
de alguns trabalhos de nossa autoria em que aplicamos alguns conceitos
da Física na análise de algumas afirmativas dos Espíritos
superiores com relação a fenômenos da natureza
e sobre o Fluido Universal. Esses trabalhos não constituem
prova ou demonstração de alguns conceitos espíritas
com base na Física, mas sim são exemplos de análises
em que alguns conceitos da Física são utilizados para
melhor compreender a possibilidade de determinados fenômenos
espíritas. Isso é algo bem análogo ao que Kardec
fez quando usou conhecimentos da ciência para, por exemplo,
explicar a formação do nosso planeta.
Sobre o teletransporte,
a figura mais comum que nos vem à mente é o filme
Jornada nas Estrelas, em que os tripulantes da nave eram “teletransportados”
ou “teleportados” instantaneamente da nave para a superfície
do planeta e vice-versa. Recentemente, diversas revistas de divulgação
científica tem estampado em suas capas o assunto “teletransporte”
o que tem sugerido a alguns leitores espiritualistas a ilação
de que é exatamente esse fenômeno o que ocorre em determinados
fenômenos espíritas.
Esse tema tem sido estudado a mais
de 10 anos [2] mas continua sendo pesquisado
[3] por causa do enorme potencial em
aplicações naquilo que chamamos computação
quântica. O fenômeno, nada mais é, do
que a reconstrução de um determinado sistema quântico
a uma distância afastada do mesmo. Nenhum objeto é
trasnsportado! Os cientistas aproveitam a ligação
do tipo não-local entre duas partes de um sistema quântico
inicial para transformar um outro sistema quântico, em local
distante do primeiro, em um sistema idêntico ao inicial. Essa
descrição é bem diferente do fenômeno
espírita de transporte de algum objeto onde o próprio
objeto é deslocado de um lugar para outro.
O físico Stephen
Hawking é um dos fundadores da disciplina conhecida
como Cosmologia Quântica. Isso parece contraditório,
pois a Mecânica Quântica foi criada para estudar o comportamento
do mundo microscópico e a Cosmologia para estudar o comportamento
do mundo em escala astronômica. A idéia de Hawking
é considerar todo o universo como se fosse uma partícula
quântica. Assim, ao universo se associa uma função
de onda. Esta seria formada por uma “soma”
de infinitos universos paralelos. Como a função
de onda representa probabilidades, presume-se que o quadrado de
seu módulo seja bem próximo de 1 nas proximidades
de nosso universo, isto é, para os “termos” da
infinita soma cujo universo seja mais parecido com o nosso. Atualmente,
os cientistas ainda não provaram essa hipótese [4].
Alguns companheiros imaginaram que os universos paralelos poderiam
representar o plano espiritual. Porém, os universos paralelos
propostos por Hawking são materiais no sentido de que em
alguns deles existem cópias de nós mesmos com alguma
diferença pequena ou grande. Por exemplo, existiria um universo
paralelo em que eu estou escrevendo sobre história da música
ou, ainda, um outro universo em que eu sou cego e analfabeto. Que
relação existiria entre os diversos “eu”s
de cada universo? Ao nosso ver, nenhuma relação existe
e se o meu espírito está neste universo, o espírito
que animaria o corpo de um Alexandre cego e analfabeto de outro
universo, certamente, seria outro pois o mesmo espírito não
pode animar mais de um corpo. Outra questão é o seguinte:
em cada instante, o universo que conhecemos é o resultado
de um colapso da função de onda do universo. Sempre
poderemos questionar o aspecto probabilístico do universo
em cada instante. Uma outra característica da teoria de Hawking
é a ligação microscópica entre os diversos
universos paralelos. Essa ligação ocorreria através
do chamado buraco de minhoca. Segundo Kaku
[4], como o tamanho do buraco de minhoca
é muito pequeno, nenhum de nós corre o risco de ser
levado a um universo paralelo ao nosso e nenhum ser de outro universo
nos visitaria. Segundo os Espíritos (questão 459 do
Livro dos Espíritos [5]), eles
influenciam nossos pensamento muito mais que imaginamos ao ponto
de quase nos dirigir. Isso significa que o contato do mundo espiritual
com o nosso é muito mais próximo do que a teoria de
Hawking prediz para os universos paralelos. Daí,
nossa conclusão é que o modelo dos universos paralelos
ainda não serve para explicar o mundo espiritual.
No livro Mecanismos da Mediunidade
[1], André Luiz
se baseia nos avanços da Física Moderna para expor
uma explicação para os mecanismos do fenômeno
mediúnico. O leitor leigo em Física perceberá
que André Luiz se utiliza de conceitos diversos de diversas
teorias como a teoria quântica e clássica para partículas
e campos. Ele se utiliza, também, de conceitos desenvolvidos
nas áreas de Engenharia Elétrica para propor idéias
como a de corrente mental, circuitos mediúnicos, gerador
do cérebro, etc. André Luiz faz uma interessante recapitulação
das teorias desenvolvidas no começo do século XX para
a estrutura da matéria, mencionando algumas características
quânticas das partículas, e propõe que a matéria
mental seja constituida, também de partículas que
“ (...) embora em aspectos fundamentalmente diversos,
obedece a princípios idênticos àqueles que regem
as associações atômicas, na esfera física,
(...)” (Cap. IV da Ref. [1]).
A proposta de André Luiz
está de acordo com o que expomos no final da aula 9 (Boletim
491) onde comentamos que nada impede que a estrutura dos fluidos
espirituais não seja algo análogo ao que foi descoberto
para a matéria densa. Porém, segundo a nossa leitura
desta obra, André Luiz apenas usou a analogia entre a estrutura
da matéria comum com a matéria mental para explicar
os fenômenos mediúnicos em termos de correntes e fluxos
mentais em total analogia com circuitos de correntes elétricas
cujo comportamento é explicado de modo clássico em
termos de diferença de potencial e força eletromotriz.
Existe um capítulo inteiro chamado “Analogias de
circuitos” (Cap. VII) em que André Luiz escreve
cada fenômeno mental e seu correspondente material. Ainda
no Cap. IV, sob o subtítulo “Indução
Mental” André Luiz recorre à idéia
de “campo” de Einstein para analisar as influências
entre os Espíritos. As teorias que envolvem a idéia
de campo desenvolvidas por Einstein não são quânticas.
Em minha análise particular, André Luiz usou apenas
a parte bem compreendida da teoria quântica e não
citou em nenhum lugar a idéia de não-localidade para
explicar alguma característica do fenômeno mediúnico.
Mesmo quando ele explica as propriedades magnéticas da matéria
em termos da propriedade quântica conhecida como “spin”
associada a cada partícula, André Luiz se expressa
da seguinte maneira ao fazer a analogia com o fenômeno mediúnico:
“Perceberemos nas mentes ajustadas aos imperativos da
experiência humana, mesmo naquelas de sensibilidade mediúnica
normal, criaturas em os <<spins>> ou efeitos
magnéticos da atividade espiritual se evidenciam
necessariamente harmonizados, (...)” (Cap.
VIII, grifos nossos). Vê-se, claramente, que essa analogia
entre “spin” e “efeitos magnéticos da atividade
espiritual” não é a mesma coisa que o conceito
empregado na Física onde cada partícula individual
possui um magnetismo intrínseco chamado “spin”.
André Luiz, aqui, percebeu que em nada contribuiria associar
o “spin” de cada partícula mental à idéia
de “spin” da Física pois ele tinha como objetivo
comparar as características macroscópicas dos objetos
classificados como ferromagnéticos com a mediunidade ostensiva
de algumas pessoas.
O leitor deve estar se perguntando,
a Física, então não pode provar a existência
do Espírito ou dos conceitos espíritas? e será
que é impossível, então, usar conceitos da
Física para desenvolver ou entender melhor alguns conceitos
espíritas?
A resposta à primeira pergunta
é afirmativa, isto é, a Física pode vir a provar
a existência e sobrevivência da alma já que,
afinal, ela é alguma coisa que atua sobre o Universo. A Humanidade,
ao meu ver, se beneficiaria muito com tal feito. Porém, existem
dificuldades muito maiores do que nós espíritas podemos
imaginar. A primeira delas é o preconceito pessoal de cada
cientista, como pessoa. A ciência, por mais que tenha desenvolvido
métodos de estudo e pesquisa, é uma atividade humana
e como tal está sujeita às virtudes e defeitos que
o ser humano possui. No entanto, o preconceito não é
o único obstáculo às pesquisas espiritualistas.
Carecemos de um projeto de pesquisa muito sólido que fosse
bem embasado não somente nos conhecimentos espíritas
mas também nos conhecimentos científicos naquilo que
de mais atual existe. Infelizmente, as analogias de André
Luiz não são suficientes para que o assunto possa
ser reconhecido como demonstração científica.
É preciso lembrar que as idéias espíritas não
são as únicas que pretendem usar conceitos da teoria
quântica para dar suporte a elas. Se o Espiritismo usar a
teoria quântica para explicar seus conceitos e outras doutrinas
também a usarem para defender seus princípios, quais
deles estarão corretos e quais estarão errados? Se
um desses princípios espiritualistas for diferente do que
a Doutrina Espírita diz, mas que se baseia em algum “conceito
quântico”, qual estará com a razão? Não
é seguro saber que a ciência se, por um lado, rejeita
analogias simples e diretas entre conceitos espíritas e científicos,
por outro, evita de aceitar conceitos espiritualistas em desacordo
com o Espiritismo? Por essa razão, consideramos que o preconceito
dos cientistas é um obstáculo menor do que imaginamos.
O desafio é estudar a fundo tanto o Espiritismo quanto a
Física (ou outra ciência) e encontrar a “brecha”
inquestionável pela qual conceitos espíritas poderiam
ser introduzidos na pesquisa científica. Já mencionamos
em aula anterior (aula 4, Boletim 486) que consideramos a área
médica como promissora nesse aspecto pois lida diretamente
com o ser humano e pode encontrar “brechas” que as teorias
puramente materiais não encontram. Apesar das estranhas interpretações
das teorias modernas em Física, é muito mais difícil
encontrar uma brecha na Física do que pode parecer.
A segunda questão acima é
algo mais realizável por nós. Tanto é verdade
que temos alguns trabalhos de nossa autoria em que utilizamos alguns
conceitos de diversas teorias da Física para explicar e entender
melhor alguns fenômenos espíritas. Em um desses trabalhos,
analisamos [6] a questão da
influência dos espíritos sobre os fenômenos da
natureza (questões de 536 a 540 do Livro dos Espíritos
[5]), do ponto de vista de um fenômeno
físico como uma tempestade. Nossa motivação
para esse estudo decorreu dos comentários de Kardec no ítem
46 do capítulo XV de A Gênese [7],
sobre a passagem evangélica intitulada “Tempestade
Acalmada”, em que propõe que Jesus estava calmo diante
da tempestade que se aproximava por saber, de antemão que
ela iria amainar e que não havia perigo algum. Analisamos
o fenômeno do ponto de vista físico e usamos os conceitos
da Teoria do Caos para mostrar que não é necessário
uma enorme quantidade de fluidos animalizados para realizar uma
influência sobre um fenômeno de tão larga escala
como uma tempestade.
Em outros dois trabalhos, analisamos
uma afirmativa dos Espíritos superiores sobre o Fluido Universal,
presente na resposta que deram à questão número
27 do Livro dos Espíritos [5].
Em um deles [8] comparamos a afirmativa
dos Espíritos nessa questão com um resultado ainda
não compreendido pelos cientistas a respeito dos efeitos
do vácuo quântico no Universo. Propomos (não
provamos nada) que o Fluido Universal seja o elemento que anularia
os efeitos do vácuo quântico caso essa previsão
seja verdadeira. Porém, apenas os cientistas especialistas
em Cosmologia poderão avaliar a possibilidade dessa hipótese.
Em outro artigo [9], analisamos as
propriedades das chamadas matéria escura e energia escura,
presentes em larga escala no Universo, e mostramos que nenhuma delas
poderia ser o Fluido Universal já que elas possuem propriedades
diferentes daquelas que os Espíritos ensinaram sobre o Fluido
Universal.
Por fim, vale a pena aqui comentar
o trabalho do filósofo Ken Wilber que reuniu
na obra Quantum Questions [10],
a opinião de alguns dos maiores físicos sobre questões
espiritualistas. Os físicos cujo pensamento religioso foi
estudado por Wilber foram Heisenberg, Schrödinger, Einstein,
de Broglie, Jeans, Planck, Pauli e Eddintong. Wilber afirma que
todos eles possuiam um sentimento religioso bem
claro mas que, ao mesmo tempo, todos eles eram
contrários à utilização de conceitos
e teorias da Física para explicar-se os fenômenos místicos.
O principal argumento desses grandes cientistas é “se
a Física de hoje dá base ao misticismo, o que acontecerá
se a Física do amanhã substituir a física de
hoje?” [11]. De modo a vermos
que isso é, de fato, muito sério, vamos reproduzir
os comentários de André Luiz em seu prefácio
do livro Mecanismos da Mediunidade [1]:
“Aliás, quanto
aos apontamentos científicos humanos, é preciso reconhecer-lhes
o caráter passageiro, no que se refere à
definição e nomenclatura, atentos à circunstância
de que a experimentação constante induz os
cientistas de um século a considerar, muitas vezes,
como superado o trabalho dos cientistas que os precederam.
Assim, as notas dessa natureza,
neste volume, tomadas naturalmente ao acervo de informações
e deduções dos estudiosos da atualidade terrestre,
valem aqui por vestimenta necessária mas transitória,
da explicação espírita da mediunidade (...)”
(Grifos nossos).
André Luiz tinha plena consciência
de que a Física se renova constantemente e não se
arriscou a propor uma teoria absoluta para os mecanismos da mediunidade,
dizendo que as analogias presentes no livro servem de “vestimenta
necessária, mas transitória” para a explicação
dos fenômenos mediúnicos.
Em nossa opinião, a recomendação
dos grandes físicos reflete o cuidado que devemos ter em
propor explicações para os conceitos espíritas
em termos de conceitos de outras teorias científicas. Porém,
se desejarmos pesquisar a realidade espiritual por intermédio
de paradigmas científicos outros, como a Física, não
podemos nos furtar ao estudo profundo das ferramentas teóricas
da ciência que pretendemos usar e devemos nos informar sobre
a forma pela qual a ciência, como um todo, se desenvolve,
seus critérios, seus meios de divulgação e
reconhecimento. Essas aulas sobre Ciência e Espiritismo, se
destinam a introduzir o leitor a essas questões.