Alexandre Fontes da Fonseca

>    A Ciência em busca da verdadeira felicidade

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Alexandre Fontes da Fonseca
>    A Ciência em busca da verdadeira felicidade

 

 

Dados de pesquisas na área social mostram que as teorias atuais sobre o bem-estar em Psicologia e Economia falham na descrição dos resultados.

Uma nova proposta teórica busca interpretar a felicidade em termos de valores mais duradouros. Tais dados comprovam a assertiva dos espíritos e do Evangelho de que os bens materiais não trazem felicidade.

 



1. INTRODUÇÃO

Recentemente, numa das revistas científicas mais importantes do mundo, a Proceedings of The National Academy of Sciences of The USA, um artigo interessantíssimo foi publicado sobre a felicidade [1]. O autor, com base em dados de levantamentos sociais sobre os aspectos determinantes do bem-estar e felicidade de vários grupos de cidadãos dos Estados Unidos, questiona duas correntes teóricas atuais sobre essa questão. O chamado modelo do ponto fixo, pertencente à Psicologia, diz que as circunstâncias da vida alteram o nível de felicidade de um indivíduo apenas temporariamente. Isso significa que em pouco tempo ele retorna ao seu ponto fixo normal de felicidade. A outra teoria, conhecida pela idéia do mais é melhor, é chamada de preferência revelada, ou algo que diz respeito as opções e desejos de adquirir bens de cada pessoa.

Neste artigo pretendemos comentar o assunto verificando que um passo significativo foi dado pela ciência em direção daquilo que o Espiritismo ensina sobre a felicidade.

Os dados foram obtidos de levantamentos realizados nos Estados Unidos com questões do tipo “como você diria que a sua vida está hoje – você diria que você está ‘muito feliz’, ‘razoavelmente feliz’ ou ‘não muito feliz’?” A cada uma dessas respostas é atribuído um número (3 para muito feliz, 2 para razoavelmente feliz e 1 para não muito feliz). Após analisar todas as respostas, uma média era calculada em função de grupos ou tipos de pessoas, como diferentes faixas etárias, sexo, estado de saúde, estado civil, etc. Apesar das respostas a esse tipo de questão, de forma isolada, serem incompletas ou carregarem erros, quando realizadas com um grande número de pessoas e periodicamente, revelam informações bastante confiáveis, conforme dizem os especialistas [1]. Primeiramente, apresentaremos os pontos básicos das duas teorias atuais, mencionadas acima. Lembramos que não existe unanimidade dentre os cientistas de ambas as áreas e que elas refletem as tendências em cada disciplina.

Em Psicologia, a tendência atual é a chamada “teoria do ponto fixo” que diz que cada indivíduo possui um ponto fixo de felicidade ou bem-estar devido tanto às características genéticas quanto à personalidade. Eventos e circunstâncias da vida como casamento, perda de emprego ou lesões sérias e doenças podem defletir uma pessoa acima ou abaixo do seu ponto fixo mas após um período de tempo conhecido como adaptação hedônica ele(a) retornará ao ponto fixo inicial. Adaptação hedônica significa a perda de entusiasmo quando algo excita o indivíduo ou o ganho de ânimo quando algo o entristece. Segundo essa teoria, nada pode contribuir para uma melhora ou piora na satisfação de vida de cada indivíduo.

Em Economia, acredita-se que as circunstâncias da vida e, especialmente, o aumento da renda financeira possuem efeitos duradouros na felicidade de um indivíduo. Eles preferem não entrar no mérito sobre os estados subjetivos da mente e discutem essa teoria apenas em termos de comportamentos observados. Segundo a teoria da preferência revelada uma pessoa pode melhorar o seu bem-estar aumentando sua renda financeira. Os economistas reconhecem que a felicidade depende de uma série de fatores mas eles acreditam que o aumento da renda financeira leva a um aumento na felicidade.


2. DISCUTINDO OS DADOS DA PESQUISA

Não é difícil perceber o caráter completamente materialista dessas duas correntes de pensamento. Elas refletem dois limites. Um é o limite materialista genético. O outro é o limite materialista do consumismo. Sabemos, como espíritas, que ambas as direções são equivocadas. Porém, no trabalho da referência [1] o autor apresenta e demonstra que os dados sociais experimentais revelam que nenhuma das duas teorias se verifica de uma forma geral. É importante lembrar que essas análises dizem respeito à médias estatísticas sobre todas as pessoas entrevistadas. Existem os desvios da média que representam as diversidades na personalidade humana. No entanto, a média reflete o comportamento da maioria e por isso ela é considerada um importante fator. Vamos apresentar um resumo desses resultados que contradizem as duas teorias acima.

A primeira questão respondida pelos dados experimentais é se existe, de fato, um ponto fixo de felicidade para o qual retornamos independente das circunstâncias da vida. A resposta é não. Os primeiros dados apresentados em [1] comparam as respostas sobre a felicidade de pessoas com algum tipo de deficiência com o de pessoas saudáveis. Segundo Easterlin [1], autor do artigo, a satisfação de vida é, em média, significativamente mais baixa naqueles que possuem deficiências do que naqueles que são normais. Além disso, a pesquisa foi feita levando-se em conta o grau de severidade da deficiência e, em todos os casos, a felicidade era menor para aqueles com mais sérios problemas. Apesar de podermos dizer que tanto uma vida com satisfação promove boa saúde (a antiga filosofia do mente sã corpo são) e vice-versa, os estudos mostram que a falta de saúde leva à infelicidade. Logicamente, como mencionado em [1], existem adaptações às deficiências que, com o tempo, amenizam o sofrimento. Mas segundo os dados, prevalece um efeito negativo duradouro na felicidade quando a saúde é afetada.

De outro lado, dados sobre a felicidade daqueles que são casados e daqueles que são solteiros, separados e viúvos, foram analisados na pesquisa. Apesar do casamento ser usado como um exemplo de circunstância da vida que demonstra a teoria do ponto fixo, os dados revelam outras conclusões. Quando os dados são analisados de acordo com a idade, a média do nível de felicidade das pessoas com idade de 18 e 19 anos (cuja maioria ainda não se casou) é menor do que a das pessoas com idade de 28-29 anos. Um dado interessante é que a diferença entre os níveis de felicidade permanece os mesmos quando as idades são ainda maiores. As comparações entre os diferentes grupos revelam que o nível de felicidade, em média, não diminui com a duração do casamento. Esse dado é muito interessante e mostra justamente o contrário do que muitas pessoas dizem sobre a as dificuldades da vida de casado. Esses dados mostram que o nível de felicidade não foi revertido ao nível inicial como sugere a teoria do ponto fixo.

Da mesma forma como o casamento afeta a felicidade, a dissolução do casamento também traz um impacto negativo duradouro. É interessante observar que o nível de felicidade do grupo cujo casamento terminou por qualquer razão, é menor do que o daqueles que não se casaram. Mais uma vez isso mostra a falha da teoria do ponto fixo. Em resumo, o volume de dados sugere que a formação de uniões matrimoniais promove um aumento positivo e duradouro no nível de satisfação ou felicidade enquanto que a dissolução da união resulta em um efeito negativo permanente.

“Mais é melhor?” Voltando à teoria da área econômica, o problema básico com a teoria da preferência revelada é que o julgamento do nível de felicidade de uma pessoa só pode ser feito por ela mesma e não pode ser inferida a partir do que ela consome [1]. A questão, então, é se os dados suportam a idéia de que a renda financeira e a felicidade crescem juntas. Num ponto de vista imediato, existe uma associação entre renda financeira e felicidade. Mas analisando ao longo de ciclos de vida, os dados mostram que o aumento da renda financeira não altera o nível de felicidade contradizendo a teoria econômica. O problema ocorre porque com relação aos bens de consumo a adaptação hedônica funciona perfeitamente como, por exemplo, o entusiasmo que se reduz com um objeto novo após um certo período de tempo. Isso, inclusive, é usado para defender a teoria do ponto fixo que, como vimos, falha quando outros aspectos, como a saúde, são analisados. Uma outra razão para esse problema é a questão da comparação social. As pessoas são levadas a pensar que a utilidade de certos bens depende dos bens de outras pessoas.

Segundo Easterlin [1], toda essa questão envolve os conceitos de aspiração e adaptação. Em tese, uma adaptação completa implica em que as aspirações se alteram com a mesma velocidade com que as circunstâncias atuais de cada indivíduo alteram. Isto apenas parece ser o que acontece devido às alterações na renda financeira. Porém, as aspirações materiais aumentam muito mais do que o aumento da renda financeira e, como resultado, o indivíduo se torna cada vez mais longe dos seus objetivos materiais (porque vive criando novos objetivos), fazendo com que o bem-estar desejado nunca seja atingido. Num outro tipo de experiência com questões sobre o tipo de coisas que as pessoas pensam proporcionar uma vida boa e quais delas elas possuem, foi possível perceber e demonstrar que as aspirações crescem proporcionalmente ao número de itens que elas já possuem. Como a renda financeira não aumenta na mesma proporção dos bens já adquiridos, ocorre o desbalanço entre aspiração e adaptação culminando com a falta de bem-estar.


3. OS PRIMEIROS PASSOS DA CIÊNCIA

Acreditamos ter ficado claro, após a apresentação dos resultados da pesquisa do Prof. Easterlin, que a felicidade não depende dos fatores genético e de personalidade nem, muito menos, ela pode ser adquirida com a obtenção de um bem de consumo. Portanto, a felicidade não está nas coisas materiais. Mas, isso, nós espíritas já sabíamos a muito tempo. Vejamos, como exemplo, o primeiro parágrafo da mensagem de François-Nicolas-Madeleine em Instruções dos Espíritos, ítem 20, capítulo V de O Evangelho Segundo o Espiritismo [2]:

“Não sou feliz! A felicidade não foi feita para mim! exclama geralmente o homem em todas as posições sociais. Isso, meus caros filhos, prova, melhor do que todos os raciocínios possíveis, a verdade desta máxima do Eclesiastes: "A felicidade não é deste mundo."Com efeito, nem a riqueza, nem o poder, nem mesmo a florida juventude são condições essenciais à felicidade. Digo mais: nem mesmo reunidas essas três condições tão desejadas, porquanto incessantemente se ouvem, no seio das classes mais privilegiadas, pessoas de todas as idades se queixarem amargamente da situação em que se encontram.”

Antes de apresentarmos nossas conclusões finais, vamos analisar a proposta científica de Easterlin [1]. O ponto central de sua teoria é que tanto a adaptação hedônica quanto a comparação social operam de forma idêntica em todos os domínios de circunstâncias da vida. A adaptação hedônica é menos completa com relação a circunstâncias familiares e à saúde do que com bens de consumo. O autor sugere que a comparação social é também menos completa com relação à vida familiar e saúde do que com relação aos bens de consumo já que os primeiros são menos acessíveis ao olhar público do que bens materiais. Ainda com relação a bens materiais, um trabalho é citado (ver citações em [1]) que diz que bens culturais como músicas, literatura, arte, são menos sujeitos à adaptação hedônica do que bens de “conforto” como casas e carros.

Segundo Easterlin, a felicidade de um indivíduo poderia ser maximizada se ele direcionar seu tempo aos domínios de circunstâncias da vida em que a adaptação hedônica e a comparação social são menos completas. O que tem acontecido, no entanto, é que as pessoas têm alocado grande parte de seu tempo em obter rendas financeiras que permitem adquirir bens materiais e se preocupam pouco com as coisas que realmente possuem um efeito mais duradouro no bem-estar. Este engano ocorre, segundo o autor, pelo fato de que as pessoas, ao decidirem o que fazer com o seu tempo, levam em conta as aspirações que elas pensam serem fixas no tempo e falham em perceber que as aspirações mudam por causa dos efeitos da adaptação hedônica e da comparação social, que no caso de bens materiais, agem de forma mais completa. Como resultado, as pessoas gastam um enorme tempo e esforço em “ganhar dinheiro” e sacrificam a vida familiar e a saúde que são os domínios em que as aspirações permanecem mais constantes e onde a obtenção dessas aspirações gera impactos mais duradouros na felicidade. A proposta de Easterlin é que as pessoas destinem mais tempo em favor da vida familiar e da saúde aumentando, assim, a média no nível de felicidade.

Outras circunstâncias da vida como, amizade e trabalho também afetam a felicidade e não foram analisadas aqui porque as pessoas que realizaram o experimento de pesquisa citaram mais as questões materiais como fonte de felicidade. Isso reflete, de certa forma, o nível de engano e o apego ainda existente às coisas materiais. Isso revela, também, o enorme campo de trabalho na educação moral das pessoas rumo a verdadeira felicidade.


4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Essas pesquisas não têm intenção de revelar aspectos religiosos. Mas é surpreendente vermos que, mesmo aos poucos, a ciência caminha em direção à verdades comumente ensinadas pela maioria das religiões. Já tivemos a oportunidade de comentar dois trabalhos sobre pesquisas na área de Matemática que levam à interessantes conclusões morais [3,4].

Apesar de não entrar no mérito religioso, um ponto muito importante merece destaque no estudo do Prof. Easterlin. Em sua proposta teórica, ele situa a felicidade como ligada àquilo que tem valor mais duradouro. Tanto a saúde quanto as questões familiares são, do ponto de vista material, circunstâncias da vida que mais tem valor em termos de um período mais longo de tempo. Ficamos imaginando o que o Homem não ganhará em qualidade de vida quando perceber que a vida continua e que ela é um dos bens mais preciosos e duradouros que dispomos. Que paraíso a Terra vai se tornar um dia quando os Homens perceberem que o Amor verdadeiro é o bem mais precioso e duradouro que podemos oferecer e receber. Sugerimos o estudo da questão número 918 de O Livro dos Espíritos [5] e os itens 3 e 4 de O Evangelho Segundo o Espiritismo [2] sobre o “homem de bem”. Relacionado ao tema deste artigo, encontramos o capítulo XVI de O Evangelho Segundo o Espiritismo [2], “Não se pode servir a Deus e a Mamon”, que apresenta uma importante discussão sobre os bens que verdadeiramente terão valor na vida espiritual. Sugerimos também a leitura do artigo da referência [6] sobre a felicidade segundo o Espiritismo.

Se, aparentemente, as religiões têm tido dificuldades em esclarecer a humanidade quanto a essas verdades duradouras, ficamos particularmente felizes em saber que, aos poucos, elas estão ganhando um novo aliado: a Ciência.



Fonte: Artigo publicado na revista FidelidadESPÍRITA 18, pp. 16-19 (2004).

REFERÊNCIAS

[1] R. A. Easterlin, Explaining happiness, Proceedings of The National Academy of Sciences of The USA 100, pp. 11176-11183, (2003).

[2] A. Kardec, O Evangelho Segundo o Espiritismo, Editora FEB, 112a Edição, Rio de Janeiro, 1996.

[3] A. F. da Fonseca, Aliança entre a Ciência e a Religião: uma contribuição da Matemática, FidelidadESPÍRITA 13, pp. 26-29, (2003).

[4] A. F. da Fonseca, Jogo do ultimato e o progresso da humanidade, FidelidadESPÍRITA, submetido para publicação.

[5] A. Kardec, O Livro dos Espíritos, Editora FEB, 76a. Edição, Rio de Janeiro, 1995.

[6] N. Landini, Felicidade, FidelidadESPÍRITA, 16, pp. 12-13, (2003).

http://www.terraespiritual.locaweb.com.br/espiritismo/artigo218.html




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