Pela primeira vez um ensinamento espírita interfere na interpretação
de um estudo científico.
Quem não assistiu e se divertiu com a trilogia “De Volta
Para o Futuro” [1]
que encantou o mundo com a romântica estória de um rapaz
que realiza uma série de viagens no tempo encontrando seus
pais, no passado antes de se casarem, a si mesmo e aos seus filhos,
no futuro.
Divertimentos a parte, a verdade é que uma variação
no fluxo do tempo não só é teoricamente possível,
segundo a Teoria Geral da Relatividade de Einstein, como foi comprovada
experimentalmente. Apesar do assunto ser considerado, pelas
pessoas em geral, uma especulação sem fins práticos,
alguns cientistas tem levado esse tema a sério principalmente
porque ele está diretamente ligado à questão
sobre as relações entre causa e efeito, o que é
extremamente relevante na pesquisa de uma teoria unificada da Física.
Tanto isso é verdade que uma das mais conceituadas revistas
de divulgação científica, a Scientific American,
dedicou um número inteiro a questões sobre o tempo.
Desejo destacar o artigo intitulado “Como Construir uma Máquina
do Tempo” (original em inglês: “How to Build a Time
Machine”) [2].
Nesse artigo, o físico teórico Paul Davies apresenta
aos leitores os mecanismos de uma viagem no tempo. Em suas próprias
palavras Davies afirma: “It wouldn’t be easy, but it might
be possible” [2,3].
Cabe citar que três físicos norte americanos publicaram
na também conceituada Physical Review Letters [4]
uma proposta séria a respeito do assunto. Motivado pelo interesse
científico, mesmo que teórico, sobre o assunto, pretendo,
nesta matéria, comentar sobre uma restrição do
Espiritismo à questão da viagem no tempo. Mesmo que
do ponto de vista prático isso esteja muito longe de acontecer,
a discussão apresentada aqui tem um caráter didático
em ambos os pontos de vista espírita e científico.
Não há espaço suficiente para discutirmos os
detalhes sobre os mecanismos teóricos da viagem no tempo. As
referências citadas servem como guia ao leitor mais interessado
em pesquisar o assunto. Primeiramente, vamos expor em linhas gerais
as condições em que o tempo fluiria de forma diferente
possibilitando uma viagem no tempo, mencionando as evidências
experimentais que suportam as pesquisas. Em seguida exporemos uma
restrição espírita à viagem no tempo.
Basicamente, existem duas maneiras de se alterar o fluxo do tempo,
isto é, fazer com que ele passe mais devagar ou mais rápido,
quando comparado ao fluxo de tempo de um dado observador, por exemplo,
um homem parado numa estação de trem. Uma delas é
mudar a velocidade de um determinado objeto ou pessoa. Segundo a Teoria
da Relatividade, observadores que estejam em repouso (parados na estação
de trem) perceberão que o tempo fluirá mais devagar
para aqueles que estiverem se movimentando com relação
a eles. A outra forma de alterar o fluxo do tempo é aproximando-se,
ou afastando-se, de objetos com massa elavada. Segundo a Teoria Geral
da Relatividade, o tempo flui mais lentamente na proximidade de tais
objetos massivos. Não percebemos isso no nosso cotidiano porque
as diferenças no fluxo do tempo apenas se tornam significativas
quando as velocidades de movimento são próximas da velocidade
da luz e porque estamos todos à mesma distância média
do nosso planeta.
A variação no fluxo de tempo foi testada experimentalmente
sincronizando-se dois relógios de altíssima precisão
e colocado-os, em seguida, em aviões que voaram por muitas
horas em sentidos contrários [5].
O resultado foi uma significativa diferença entre os relógios.
Uma outra verificação experimental foi um pequeno desvio
na luz emitida por átomos de hidrogênio que, segundo
Hawking [5],
é explicado através de trajetórias de elétrons
no que ele chamou de anéis fechados, isto é, trajetórias
no espaço-tempo que iniciam numa dada posição
e instante de tempo e terminam na mesma posição e instante
de tempo.
Antes de discutir a restrição espírita, vejamos
o que o professor Paul Davies comentou em seu artigo
sobre certos paradoxos de causa e efeito que a viagem no tempo proporciona.
Considere a situação em que uma pessoa viaja ao passado
e tira a vida de sua mãe. Isso cria um paradoxo pois se a mãe
morre, ela não terá aquele filho(a). Se o filho(a) não
nasce, ele(a) não poderá, após crescer, viajar
ao passado para tirar a vida dela e fica, então, claro o paradoxo.
Segundo o professor Davies, esse é um evento que não
ocorreria por não ser consistente. Seria como se tentássemos
encontrar uma solução para um anel circular de raio
R que possuísse comprimento diferente de 2?R, em nossa geometria
usual. Por outro lado, ele afirma que se uma pessoa viaja ao passado
e salva a sua mãe, ainda jovem, da morte, esse evento é
perfeitamente viável e consistente. Entre esses dois exemplos,
existe um ponto importante que é o livre-arbítrio.
Ou a viagem no tempo interfere no livre-arbítrio, pois
escolher entre salvar e matar é puramente uma decisão
nossa; ou, simplesmente, esta viagem não é possível
para os seres vivos. Não temos esse problema com os
objetos inanimados. A questão sobre o livre-arbítrio
é complexa nesses casos e mereceria uma análise futura.
A restrição espírita que desejamos ressaltar,
porém, é outra. Considere a possibilidade de viagem
no tempo para uma época não distante seja no passado
ou no futuro, de modo a podermos nos encontrar mais jovem ou mais
velho, respectivamente. A situação pode ser caracterizada
como havendo dois de nós num dado momento. Do ponto de vista
material, do corpo físico, não há nenhum problema.
No entanto, se lembrarmos que somos espíritos encarnados estaremos
numa situação de conflito com um ensinamento dos espíritos.
Segundo a questão número 137 do Livro dos Espíritos
[6], o espírito
não pode animar dois corpos diferentes simultaneamente. No
nosso exemplo, teríamos dois corpos diferentes animados pelo
mesmo espírito. Isso está em contradição
com a referida resposta dos espíritos.
De fato, a viagem no tempo ao passado, mesmo distante, também
gera o conflito acima. Imagine que a nossa viagem nos levou a muitos
séculos atrás. Suponha que nesta época estávamos
encarnados vivendo uma de nossas vidas passadas. O nosso espírito
estaria ligado a este corpo e ao corpo que veio do presente. Novamente
temos a contradição. Mesmo que não estivéssemos
encarnados em tal época, nosso espírito estaria no plano
espiritual e não poderíamos estar lá e encarnados
no corpo que veio do presente ao mesmo tempo.
Já a viagem ao futuro nos parece possível,
pelo menos no ponto de vista da restrição anterior.
Suponha que nós entramos numa nave para viajarmos a uma estrela
próxima, digamos, 10 anos-luz de distância, a uma velocidade
próxima da luz. Após retornarmos ao nosso planeta, terá
se passado muito mais tempo na Terra do que conosco dentro da nave
(o artigo [2]
explica os detalhes). Encontraremos, portanto, a Terra 20 anos no
futuro. Nesse caso, nosso espírito não esteve presente
na evolução espaço-temporal da Terra e em tal
futuro, não encontraremos um outro “eu” mais velho
ou reencarnado pois estivemos na nave realizando a viagem.
Do ponto de vista prático, a viagem no tempo ao passado é
algo impossível para objetos e seres de tamanho macroscópico.
Isso já não é verdade com relação
aos objetos de tamanho microscópico, como o elétron
numa trajetória tipo anel fechado acima mencionado. Nesse caso
a restrição espírita não apresenta nenhum
problema pois tais objetos são apenas materiais. De qualquer
forma devemos ter em mente que há muito o que aprender sobre
as leis do nosso Universo.
Finalizando, eu gostaria de ressaltar a idéia
de que ao invés de ser confirmada pela ciência, pela
primeira vez, uma afirmativa espírita interfere numa análise
científica impondo restrições a um fenômeno
considerado possível e estudado seriamente pelos cientistas.
Segundo Hawking [7],
talvez o fato de nunca termos recebido a visita de um ser do futuro
seja uma prova de que a viagem no tempo é impossível.
Entretanto, eu arrisco a dizer que a razão pela qual isso não
tenha ocorrido não seja somente devido às dificuldades
científicas e técnicas associadas à viagem no
tempo, mas também porque a restrição espírita
apresentada nesta matéria seja, de fato, um empecilho real
ao fenômeno. É importante frisar que isso é apenas
uma opinião e não uma verdade comprovada cientificamente.
Mesmo assim, sinto uma admiração cada vez maior pela
Doutrina Espírita que demonstra possuir um potencial enorme
de informação e conhecimento que, verdadeiramente, nos
ajuda a progredir.