Aula 4 :
Tópicos de pesquisa multidisciplinar entre algumas Ciências
e o Espiritismo - O método de análise por pares
1. TÓPICOS PERTENCENTES À ALGUMAS CIÊNCIAS E
O ESPIRITISMO
Nas aulas anteriores, falamos sobre
o caráter científico do Espiritismo e do campo de
trabalho puramente espírita. Aqui, vamos iniciar uma série
de aulas onde discutiremos o outro campo de trabalho que tem atraído
e recebido muita atenção do Movimento Espírita.
Trata-se do estudo de tópicos de pesquisas multidisciplinares:
assuntos que pertencem ao escopo de alguma ciência ordinária
e ao Espiritismo. Não pretendemos apresentar em detalhes
cada pesquisa, mas sim divulgar sua existência e a referência
para que o leitor interessado busque maiores informações.
Nesta aula, apresentaremos exemplos gerais de pesquisas científicas
na área de Medicina que estão contribuindo com o Espiritismo.
MEDICINA: Hoje
em dia, a disciplina científica que nos parece ser a mais
promissora para a introdução de assuntos espíritas
e espiritualistas em seus projetos de pesquisa acadêmicos
é a Medicina. E, na verdade, isso já vem acontecendo
conforme os exemplos que veremos a seguir.
Nosso primeiro exemplo de pesquisa
na área médica de interesse espírita é
o resultado de um trabalho de revisão sobre diversas experiências
sobre os efeitos da prece nos tratamentos de diversos tipos de pacientes
[1]. Os autores analisaram estatisticamente
os diversos casos publicados na literatura científica e concluíram
que se por um lado não se pode confirmar, dentro dos critérios
científicos, os efeitos da prece sobre a recuperação
de doentes, eles reconhecem que um número significativo de
casos positivos incentiva a realização de mais pesquisas
nessa área.
Em Psiquiatria temos alguns trabalhos
interessantes. Um dos maiores nomes na área de pesquisa relacionada
com conceitos espiritualistas é o Prof. Ian Stevenson.
Aqui no Brasil, o trabalho mais conhecido de Stevenson é
o livro 20 casos sugestivos de reencarnação
[2]. É digno de nota dizer que
Stevenson não se limitou a escrever, somente, livros divulgando
o seu trabalho de pesquisa. Ele publicou vários artigos científicos
em revistas internacionais levantando dúvidas sobre casos
“estranhos” que não podem ser explicados nem
pela genética nem pelas influências do ambiente [3].
Dentre esses fatos “estranhos” estão as fobias
observadas em crianças, marcas de nascimento incomuns, diferenças
entre gêmeos monozigóticos, brincadeiras e comportamento
incomuns na infância, etc. No Brasil, o Dr. Hernani
G. Andrade repetiu algumas das experiências de Stevenson
sobre casos sugestivos de reencarnação [4].
O médico psiquiatra Dr. Alexander de Almeida
está trabalhando em um projeto de tese de doutoramento, na
Universidade de São Paulo, intitulado “Mediunidade:
uma experiência dissociativa num contexto religioso”,
tendo já publicado alguns artigos sobre o assunto [5-7].
Esses são alguns exemplos
que tem tido repercussão científica. O campo de pesquisa
é imenso dentro da medicina e aos poucos novos pesquisadores
vão se interessando por esses tópicos de estudo.
Na próxima aula comentaremos
a respeito de uma interessante pesquisa em matemática cujos
resultados levam a interpretações morais. Abaixo falaremos
sobre o chamado método de análise por pares.
2. O MÉTODO DE ANÁLISE
POR PARES
Na aula anterior, expomos o formato
geral de um artigo científico. Aqui falaremos do coração
da atividade de divulgação científica: o método
de análise por pares. A palavra “pares”
significa “semelhantes”. Cada área do conhecimento
é formada por conteúdo e terminologia próprias.
O enorme progresso em todas as áreas tornou muito difícil,
para não dizer impossível, a uma única pessoa,
conhecer profudamente mais de um assunto. Mesmo dentro de uma área
do conhecimento, as especializações se desenvolveram
a tal ponto que as pessoas levam anos para dominarem um único
tópico. Assim, apenas uma pessoa formada em uma área
específica pode analisar com segurança as atividades
de outras pessoas na mesma área. Somente um “semelhante”
ou “par” pode verificar se outros trabalhos, sobre determinado
assunto, foram realizados com todo o rigor que se espera nesse campo
de estudo.
A comunidade científica adotou,
então, um método de análise de artigos
onde os “pares”, isto é, outros cientistas especialistas
na mema área de que trata o artigo, fazem a análise
do mesmo. Isto ocorre, em geral, da seguinte maneira.
Cada revista científica possui
um conjunto de editores, geralmente cientistas experientes, que
são responsáveis por garantir que os artigos passem
pelo método de análise por pares de forma correta
e idônea. Os editores, em geral, fazem uma primeira leitura
no artigo para verificar se o mesmo pertence ao escopo da revista,
isto é, à(s) área(s) de pesquisa para a(s)
qual(is) a revista foi criada. Se o artigo estiver dentro do escopo
da revista os editores escolhem um ou mais cientistas especialistas
no tema do artigo e enviam-lhes uma cópia para que façam
uma análise crítica de acordo com o conjunto de critérios
da revista. Os autores nunca sabem quem faz a análise de
seus artigos. Mas, em alguns casos, aqueles que vão analisar
o artigo sabem quem são os autores do mesmo.
Os cientistas convidados a analisarem
um artigo, em geral, não possuem vínculo formal com
a revista. Isso ajuda a assegurar a imparcialidade no processo de
análise do artigo. Essas pessoas são chamadas de “árbitros”
(“referees” em inglês) e esse processo é
também conhecido como processo de arbitragem.
Algumas revistas possuem, também, uma espécie de conselho
editorial que colabora na análise dos artigos e na escolha
dos “árbitros”. Encontramos, ainda, a denominação
de “pareceristas” para os árbitros.
A grande vantagem deste método
é a maximazação da imparcialidade na
análise dos artigos já que aqueles que a
farão não pertencem formalmente à revista ou
a sua editora. Revistas científicas de grande impacto costumam
enviar os artigos para duas ou mais pessoas de modo a evitar que
pareceres desonestos baseados em motivos pessoais (como, por exemplo,
a concorrência em pesquisa) possam ocorrer. Desta forma, os
leitores terão mais garantia de que os artigos publicados
correspondem a resultados de pesquisa realizados de forma séria
e criteriosa.
Para ilustrar o processo, considere
o seguinte exemplo. Vamos supor que o cientista X escreveu um artigo
sobre suas pesquisas com um novo remédio para o combate ao
cancer. O cientista X submete o seu artigo para publicação
na revista A. O editor da revista A, chamemo-lo EA, recebe o artigo
e faz uma leitura do mesmo. EA percebe que o artigo é muito
interessante e seus resultados são muito importantes. Mas
o editor EA não entende nada de cancer e não pode
avaliar se o artigo está correto ou não. O editor
EA, ao invés de publicar um artigo somente por ser interessante,
decide enviar o artigo do cientista X para um outro cientista, chamemo-lo
Y, fazer uma análise. O cientista Y é escolhido por
ser especialista em drogas contra o cancer. O cientista Y inicia,
então, a leitura e análise dos métodos empregados
pelo cientista X para obtenção dos resultados de sua
pesquisa. Y verificará, por exemplo, se nenhum experimento
ou método de análise foi esquecido ou mal realizado
por X. Y verificará se não existem pesquisas já
publicadas sobre o assunto que não foram citadas por X no
artigo. Y verificará se X fez todos os testes cabíveis
para assegurar que os efeitos e consequências da nova droga
não se devem a outros fatores possíveis. Enfim, o
cientista Y verificará se o artigo satisfaz todos os critérios
científicos de pesquisa dentro de sua área.
Se o cientista Y verificar que
os resultados das pesquisas do cientista X seguiram todos ou quase
todos os requisitos necessários, o cientista Y emitirá
um parecer positivo quanto à publicação do
artigo. Certamente, o cientista Y recomendará pequenas modificações
no artigo mas ele será aceito. Nesse caso, o editor EA agradecerá
a ambos (cientistas X e Y) e emitirá o parecer final de aceitação
do artigo para publicação.
Se o cientista Y verificar que
alguns requisitos importantes não foram abordados ou realizados
pelo cientista X, ele emitirá parecer negativo decisivo ou
parecer negativo condicional. O parecer negativo decisivo significa
que Y não recomenda a publicação do artigo,
nem se forem feitas correções no mesmo, porque ele
não contém resultados confiáveis sobre o assunto.
O parecer negativo condicional significa que Y não recomenda
a publicação do artigo como ele está agora,
mas sugere várias alterações e recomendações
sobre vários passos que precisam ser realizados pelo cientista
X de modo a assegurar os resultados apresentados. Em ambos os casos,
o editor EA também agradece e expõe o parecer final
de recusa do artigo para publicação, apresentando
todas as explicações emitidas pelo parecerista (cientista
Y) que foram usadas como base para a decisão editorial. O
processo de análise por pares não é perfeito
já que envolve a atuação de seres humanos que,
como sabemos, somos falíveis. Porém, não conhecemos
nenhuma outra forma mais imparcial e produtiva de analisar os artigos
científicos submetidos para publicação. Na
prática, esse método tem se mostrado muito eficiente
e a enorme quantidade e variedade de periódicos científicos
permitem que autores que se sintam injustiçados, tentem publicar
seus trabalhos em outras revistas já que elas enviarão
os artigos para análise de outros árbitros. Na próxima
aula comentaremos sobre os periódicos espíritas e
a análise que seus editores podem realizar dos artigos e
matérias submetidos para a publicação.