Introdução
Sem nos deixar levar pelo fanatismo
cego, que infelizmente atinge a muitos, entendemos que na Bíblia
ao lado das ordenações divinas, Moisés ditou
várias outras leis, umas de cunho estritamente social,
enquanto outras estavam relacionadas aos rituais religiosos, mas
que, para ficarem investidas de uma maior autoridade, ele deixava-as
passar como tendo sido provindas do próprio Deus.
Neste estudo que ora estamos fazendo,
iremos analisar todos os Dez Mandamentos e demonstraremos que
até neles existe algo que não podemos em sã
consciência atribuir como promanando da divindade.
Um problema que deparamos é
realmente saber qual dos Dez Mandamentos estão
de acordo com a Bíblia, visto a divergência que existe
sobre eles entre as correntes religiosas. Por isso, iremos
recorrer aos textos que constam da Bíblia para saber exatamente
como eles se encontram narrados no capítulo 20
de Êxodo, versículos 2 a 13 (são repetidos
em Deuteronômio 5, 6-21).
Entretanto, e para nossa maior
surpresa, não é da forma que se encontram nas passagens
bíblicas que as correntes religiosas no-los passam. Nota-se
claramente que, em alguns casos, não são nem os
mesmos termos que constam da Bíblia, apesar de sempre afirmarem
que não devemos mudar em nada os Textos Sagrados. Podem
alegar em sua própria defesa que o sentido é o que
dizem, entretanto, podemos também argumentar que quando
citamos os Dez Mandamentos devemos enumerá-los tais e quais
os textos da Bíblia, já que não se trata
de interpretação, mas apenas de uma citação
literal.
Devemos ter em mente que um
mandamento, para ser divino, deverá atender a
pelo menos três requisitos básicos, quais sejam:
Atemporal; que pode ser aplicado
em todos os tempos, visto ser imutável;
Universal; aplicação
indistinta a todos os povos;
Imparcial; atingir a todos da
mesma maneira.
Assim, uma determinada lei que
possa ir contra qualquer um desses requisitos, não será
nunca uma lei proveniente de Deus, mas apenas leis feitas pelas
"mãos" dos homens.
1º - Amar a Deus
sobre todas as coisas.
Em Êxodo
20, 2-3: Eu sou o Senhor teu Deus, que te libertou
do Egito, do antro de escravidão. Não terás
outros deuses além de mim.
É, sem dúvida alguma,
uma Lei Divina, pois nós, seres humanos, sendo criados
por Deus, devemo-Lhe por gratidão todo o nosso amor. Essa
Lei foi confirmada por Jesus, como o primeiro mandamento a ser
cumprido.
Só existimos por ato de
sua vontade e amor.
E, pela ordem do Universo, não
podemos admitir vários deuses, devemos somente a Ele adorar.
2º - Não fazer imagens para adoração
Em Êxodo
20, 4-5: Não farás para ti ídolos,
nem figura alguma do que existe em cima, nos céus, nem
embaixo, na terra, nem do que existe nas águas, debaixo
da terra. Não te prostrarás diante deles, nem lhes
prestarás culto, pois eu sou o Senhor teu Deus, um Deus
ciumento. Castigo a culpa dos pais nos filhos até à
terceira e quarta geração dos que me odeiam, mas
uso de misericórdia por mil gerações para
com os que me amam e guardam meus mandamentos.
Percebe-se, claramente, que nem
todas as correntes religiosas têm isso como integrante dos
Mandamentos, já que necessitam justificar os "ídolos"
(imagens) a que prestam culto, embora queiram dar outro nome para
esse tipo de "adoração".
E, assim, a questão das
imagens, colocada no versículo 4, acabou tornando-se um
motivo de controvérsia religiosa, entre aqueles que veneram
imagens e os que, apoiados nesse versículo, não
admitem de forma alguma tal veneração. Inclusive,
há pouco tempo atrás, num canal de TV, assistimos,
constrangidos, a um determinado líder religioso, numa atitude
que demonstra uma completa falta de respeito e caridade cristã,
chutando uma imagem religiosa. Perguntamos se Jesus, a quem dizem
seguir, fez algo semelhante?
Respeitamos todos os pensamentos,
mas a nosso ver, o Deus do Universo nunca se preocuparia com uma
coisa insignificante dessa. Achamos que o homem tem para si que
Deus é apenas o Deus da Terra e não de um Universo
infinito. Se, por um momento pararmos para analisar a nossa ignorância
a respeito do Criador do Universo, talvez não iríamos
pensar que Ele iria ter uma atitude tão nesquinha dessa.
Ao contemplar o céu numa noite bem estrelada, diante dos
bilhões de astros, fora os que não se encontram
no nosso campo de percepção, ficaremos deslumbrados
diante da extrema grandeza do Universo, e só após
isso, é que podemos mensurar sobre quem é o autor
disso tudo. Aí, sim, é que teremos uma tênue
idéia da grandeza do autor. E, depois disso, pensarmos
que Ele estaria preocupado com imagens seria pura infantilidade.
Entretanto, cremos que, tudo isso
tenha um motivo determinado. Ora, Moisés querendo impor
ao povo hebreu a idéia de um Deus único, necessitava
afastar daquele povo tudo o que poderia causar algum tipo de embaraço
a tal idéia, e assim, não teve outra alternativa,
a não ser proibir a adoração das imagens,
já que isso era coisa muito comum naquela época,
pois quase todos os deuses eram representados por ídolos,
para que o povo pudesse adorá-los. Devemos entender que
não tinham evolução espiritual suficiente
para adorarem um Deus invisível.
Se admitirmos que isso seja realmente
uma ordem divina, estaremos admitindo que Deus é incoerente
já que em outras oportunidades manda exatamente que se
façam imagens, senão vejamos:
1 - Êxodo
25, 18-19: "Farás dois querubins de ouro
polido, nas duas extremidades do propiciatório; um de um
lado e outro do outro lado, de modo que os querubins estejam nos
dois extremos do propiciatório".
Se formos consultar o "Aurélio"
encontraremos que querubim é um ser da classe dos anjos,
entretanto, à época da narrativa bíblica,
o seu significado consistia de nada mais, nada menos, que um ser
da mitologia babilônica, metade homem e metade animal. Era,
portanto, um ser misto, representado com rosto humano e corpo
de leão ou touro ou outros quadrúpedes com asas,
vindo a ser, portanto, uma espécie de esfinge.
Assim, fica também configurado
um absurdo: que Deus contrariando sua determinação
anterior, tenha mandado fazer dois querubins, seres da mitologia
babilônica, e, não bastasse isso, tinha que ser de
ouro puro.
2 - Números
21, 8-9: "O Senhor lhe respondeu: ‘Faze
uma serpente venenosa e coloca-a sobre um poste. Quem for mordido
e olhar para ela, ficará curado’. Moisés
fez uma serpente de bronze e a colocou sobre um poste. Quando
alguém era mordido por uma serpente, olhava para a serpente
de bronze e ficava curado". Sabemos que a serpente na Antigüidade,
era o símbolo da divindade de cura. Assim, mais uma vez,
Deus, o contrário ao que havia dito antes, manda fazer
uma imagem. E, para piorar ainda mais as coisas, essa imagem era
o símbolo de uma divindade de cura. Talvez seja por isso
que a medicina tenha tomado para seu símbolo duas serpentes
envoltas num poste. E, a respeito dessa serpente de bronze que
Moisés colocou num poste, o povo acabou por fazer dela
um ídolo e por a adorar por 700 anos.
E quanto ao versículo
5º, onde se diz que Deus castiga a culpa dos pais nos
filhos até à terceira ou quarta geração,
é mais um outro absurdo. Uma vez que disso somos forçados
a supor que Deus não seja tão justo quanto o ser
humano, já que nossa justiça jamais admite que a
culpa passe além de quem cometeu o delito. Mas por outro
lado, também, se torna incoerente com essa outra determinação
divina contida em Deuteronômio 24,
16: "Os pais não serão mortos pela
culpa dos filhos, nem os filhos pela culpa dos pais: cada um será
morto por seu próprio pecado".
Somente por estas duas passagens
já podemos questionar a tal de "inerrância"
da Bíblia, como querem alguns fanáticos cegos, que
se apegam só aos textos que lhes convêm, e passando
a passos largos sobre os que não lhes interessam.
Mas, talvez digam que são
apenas duas passagens. Como, pois, ser tão radical neste
ponto? Entretanto, no conceito que temos de Deus, não podemos
supô-Lo mutável ou contraditório em qualquer
uma das suas determinações, uma mínima que
seja, já que isso não se coaduna com a perfeição
absoluta. E, além do mais, essas duas estão entre
várias outras que numa análise desapaixonada podemos
encontrar na Bíblia.
3º – Não tomar seu santo nome em vão.
Em Êxodo
20, 6: Não pronunciarás o nome do
Senhor teu Deus em vão, porque o Senhor não deixará
impune quem pronunciar seu nome em vão.
Embora devemos ter todo o respeito
ao nome de Deus, ficamos a pensar se realmente isso poderia ser
uma ordem divina ou se seria fruto do pensamento cultural da época.
Lemos em Êxodo
3, 15: "Deus disse ainda a Moisés: ‘Assim
falarás aos israelitas: é Javé, o Deus de
vossos pais, o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus
de Jacó, que me envia junto de vós. – Este
é o meu nome para sempre, e é assim que me chamarão
de geração em geração’".
Diante disso, perguntamos: Se Deus diz que seu nome é Javé,
e que seria assim que deveríamos chamá-Lo, por que
motivo nós não o chamamos pelo seu nome? Ou as determinações
divinas fora dos Dez Mandamentos não devem ser cumpridas?
4º – Guardar
o dia de sábado
Em Êxodo
20, 7: Lembra-te de santificar o dia do sábado.
Trabalharás durante seis dias e farás todos os trabalhos,
mas o sétimo dia é sábado dedicado ao Senhor
teu Deus. Não farás trabalho algum, nem tu, nem
teu filho, nem tua filha, nem teu escravo, nem tua escrava, nem
teu gado, nem o estrangeiro que vive em tuas cidades. Pois em
seis dias o Senhor fez o céu e a terra, o mar e tudo que
neles há, mas no sétimo dia descansou. Por isso
o Senhor abençoou o dia do sábado e o santificou.
Ora, é comum vermos este
Mandamento da seguinte forma: Guardar os domingos e festas. Vejam
que além de mudarem as determinações divinas
(sábado para domingo), acrescentam coisas que nem estavam
lá, como é o caso das festas.
Aqui é necessário
buscarmos o sentido da letra, para podermos entender
esse Mandamento. Existe uma necessidade fisiológica, tanto
no homem quanto nos animais, que é o descanso, de vital
importância para se recomporem suas energias, caso contrário,
poderão morrer de esgotamento.
A inspiração divina
foi captada com certeza. Entretanto, as palavras utilizadas para
registrarem-na podem não trazer o sentido exato dela, pois
correspondem à evolução cultural e espiritual
de quem a recebeu.
Para o homem além da necessidade
física, podemos também perceber uma outra de natureza
religiosa, ou seja, a importância de se reservar um dia
para que as pessoas pudessem se dedicar às suas atividades
religiosas. Sem esse Mandamento, fatalmente iria ocorrer que,
além da exploração do trabalhador, haveria
grande dificuldade para que uma pessoa viesse a se aprimorar espiritualmente,
já que lhe faltaria tempo para se dedicar a isso.
5º – Honrar
pai e mãe
Êxodo
20, 8: Honra a teu pai e a tua mãe, para que
vivas longos anos na terra que o Senhor teu Deus te dá.
Podemos notar a importância
desse Mandamento na recompensa prometida para quem o cumprir.
Os judeus imaginavam que uma vida longa aqui na Terra era sinônimo
de estar nas graças de Deus, pois nada sabiam ou compreendiam
da realidade espiritual. Como só aceitavam a vida física,
nada mais lógico para eles que viver muito tempo, o que
lhes significava um prêmio. Podemos perceber isso, claramente,
na Bíblia, quando em suas narrativas encontramos pessoas
tendo um longo período de vida. Temos, por exemplo, os
que viveram: 840 anos, 810 anos, 895 anos, 962 anos e 979 anos,
o que, se entendermos na literalidade, iria contrariar o que consta
de Gêneses 6, 3: "E o Senhor disse: Meu Espírito
não ficará para sempre no homem, porque ele é
apenas carne. Não viverá mais do que 120 anos".
Sabemos também, que mesmo
se não fosse uma Lei Divina, é nosso dever honrar
aos nossos pais, já que são eles que nos proporcionam
essa nova reencarnação, ao procriarem o nosso corpo
físico. Vemos, neles, co-criadores, que "entregam"
a Deus um novo corpo físico para que um espírito
venha a ter uma nova oportunidade de crescimento e aprendizado,
pela porta da reencarnação.
A eles devemos a nossa educação,
principalmente a moral, e, se não puderam dar mais deles
para nós, é porque, muitas vezes, nós espíritos
rebeldes, não lhes damos ouvidos. Tudo que fazem a nosso
favor, o fazem por amor. Quantas vezes, nos revoltamos contra
eles, quando éramos adolescentes, mas, ao nos tornarmos
maduros, não somente sermos adultos, compreendemos que
tudo o que nos fizeram não faltou o ingrediente do amor.
Se voltarmos no tempo para lembrarmos as vezes que passaram noites
inteiras sem dormir, preocupados com nosso estado de saúde,
quando até mesmo uma simples gripe, para eles, era motivo
de preocupações, dar-lhes-íamos mais respeito
e mais valor. Quanto é significativo o carinho com que
nossa mãe nos carregou no colo, oferecendo seu peito para
que sugássemos o leite materno de importância vital
para o nosso desenvolvimento físico e até mesmo
emocional. São tantas coisas que devemos aos nossos pais,
que seremos totalmente ingratos, se não tivermos para com
eles todo o respeito que merecem.
6º – Não matar.
Em Êxodo
20, 9: Não matarás.
É exatamente neste mandamento
que podemos confirmar que Moisés, ao lado das Leis Divinas,
colocou várias outras. Mas, para dar maior valor a elas
de maneira que o povo as seguissem cegamente utilizou, para isso,
da estratégia de dizer que eram provenientes de Deus. Não
podemos condená-lo por isso, pois não havia outro
meio de moralizar um povo bruto e ignorante, como o de sua época.
Vejamos então, algumas
citações bíblicas para confirmar isso. Recorremos
ao capítulo 21 de Êxodo:
12. Quem ferir mortalmente um
homem, será punido de morte.
15. Quem ferir o pai ou mãe,
será punido de morte.
16. Quem seqüestrar uma pessoa,
quer a tenha vendido, ou ainda se encontre em seu poder, será
punido de morte.
17. Quem amaldiçoar o pai
ou a mãe, será punido de morte.
E em Êxodo
22, encontramos mais ainda:
17. Não deixarás
com vida uma feiticeira.
18. Quem tiver relações
com um animal, será punido de morte.
19. Quem oferecer sacrifícios
aos deuses, e não unicamente ao Senhor, será condenado
ao extermínio.
Bom, só por aí já
podemos verificar que, se tudo isso for realmente Mandamento Divino,
onde fica o "Não matarás"? Seria, podemos
admitir, Deus agindo com incoerência, o que a nosso ver,
repetimos, é inegavelmente um absurdo.
Quem sabe se a vergonhosa Santa
Inquisição, que de Santa não tinha nada,
não tenha se baseado nisso para levar à fogueira
os hereges e as feiticeiras?
Mas, para uma compreensão
mais racional da Bíblia, devemos levar em conta os fatores
culturais relativos ao povo e a época do acontecimento.
Assim, considerando que a legislação de Moisés
foi ditada, quando o povo hebreu se encontrava no deserto, e não
os esqueçamos que nele permaneceram por 40 anos, fica fácil
entendermos que, como não havia construções
em alvenaria, para se colocar nelas, em reclusão, os criminosos
e, nessa circunstância, não havia como ficarem pessoas
apenas vigiarem-nos, era mais cômodo, quem sabe até
mesmo recomendável, que a morte fosse a pena para todos
os crimes, não é mesmo?
Entretanto, admitir que tais leis
venham de Deus é que não seria racional e lógico.
7º – Não adulterarás.
Em Êxodo
20, 10: Não cometerás adultério.
Esse Mandamento, algumas vezes,
o encontramo-lo da seguinte forma: "Não pecar contra
a castidade". Ora, castidade não tem o mesmo significado
que adultério. Sendo a castidade definida como abstinência
total dos prazeres sexuais. E pergunto se as pessoas casadas estariam
infringindo tal lei? Ou não seria uma lei para, de certa
forma, justificar o celibato?
O significado de adulterar: 1.
Falsificar, contrafazer: 2. Corromper, viciar, deturpar, deformar.
3. Mudar, alterar, modificar, podendo ainda corresponder a cometer
adultério, ou seja, infidelidade conjugal.
Antigamente, poderiam vê-lo
somente quanto à questão da infidelidade conjugal,
visto o machismo do povo hebreu. Mas, modernamente, poderemos
compreendê-lo também com um significado mais amplo,
e o próprio Jesus o utilizou dessa maneira (Marcos
16, 4: Uma geração má e adúltera
pede um sinal, e nenhum sinal lhe será dado, senão
o sinal do profeta Jonas.). Quando apresentaram a Ele a adúltera,
pedindo-Lhe a opinião sobre o que deveriam fazer a ela,
sabiam que pela Lei Mosaica ela deveria ser apedrejada. Entretanto,
por que nada disseram sobre o adúltero, quando se sabe
que não poderia uma mulher cometer adultério sozinha?
Isso, sem dúvida, reflete também a cultura da sociedade
machista da época.
8º – Não furtar.
Êxodo
20, 11: Não furtarás.
A questão de se apropriar
indevidamente do que não nos pertence faz parte do respeito
que devemos ter para com nosso próximo. Por outro lado,
isso sanciona o direito que cada um tem de possuir alguma coisa,
desde que a obtenha por vias legais e éticas.
Entretanto, cabe à sociedade
como um todo a incumbência de levar a todos os seus membros
o ensino público, onde também os valores da ética
e da moral deverão fazer parte do programa de aprendizado
do aluno. Falindo nesse aspecto, a conseqüência é
inevitável, já que indivíduos sem esses valores
acabam por se tornarem em delinqüentes de todas as espécies.
9º – Não
levantar falso testemunho.
Em Êxodo
20, 12: Não levantarás falso testemunho
contra o próximo.
Fundado principalmente numa questão
de justiça, é inegável que se trata de um
preceito natural, portanto, divino.
Um pouco atrás, falamos
do período da Inquisição, e sabemos que durante
ela esse Mandamento não era tido como divino, já
que não faziam a menor questão de aplicá-lo.
10º - Não
desejar a mulher do próximo nem cobiçar nenhum de
seus bens.
Em Êxodo
20, 13: Não cobiçarás a casa do próximo,
nem a mulher do próximo, nem o escravo, nem a escrava,
nem o boi, nem o jumento, nem coisa alguma do que lhe pertence.
É comum vermos esse Mandamento
desmembrado em dois: Um como o nono mandamento: Não desejar
a mulher do próximo e o outro, como décimo: Não
cobiçar as coisas alheias.
Falamos um pouco atrás
que as determinações de Deus devem ser atemporais,
universais e imparciais. Se formos fazer uma análise do
texto bíblico, utilizando desses critérios, chegaremos
à conclusão que este não passa por esse crivo.
A sociedade machista em que se
constituía o povo hebreu é a única coisa
que encontramos para justificar a questão de "não
cobiçar a mulher do próximo". Veja que
seria um absurdo admitir que a mulher do próximo poderia
desejar o marido da outra, já que isso não está
explicitamente proibido. E o que não é proibido
é permitido. Mas, se bem analisarmos a questão,
o desejar a mulher do próximo ou o marido da próxima,
ela já estaria no contexto do "não adulterarás",
assim ficaríamos com duas ordens divinas para a mesma situação.
Voltando ao que já dissemos anteriormente, devemos entender
os fatores culturais da época. Assim, podemos perceber
que o que se encontra listado nessa passagem reflete apenas o
que, para época, era de suma importância para aquele
povo. Veja, por exemplo, a questão do escravo. Qual o sentido
de sua aplicação nos dias de hoje? Poderemos cobiçar
a "Mercedes" do próximo? O jumento era um meio
de transporte muito utilizado na época, entretanto, hoje
utilizamos o carro, como ficaria, pois, a aplicação
literal desse Mandamento?
Quanto à questão
da mulher, ela era tida como propriedade do homem, talvez, assim
considerada, por causa da narrativa bíblica de sua criação.
Já que, pela Bíblia, Deus criou o homem primeiro,
para só depois resolver dar-lhe uma companheira. Mas, ao
invés de criá-la também do barro, donde veio
o homem, como consta da Bíblia, toma-a da costela do homem.
O significado disso tudo realça que a mulher não
tinha valor algum, e até para ser criada, foi dependente
do homem. E será que isso foi orientado por Deus, ou Ele,
também, era ainda muito atrasado, como o era a Humanidade
daquele época? É óbvio que tudo isso tem
muito a ver com o homem, e não com a Inspiração
Divina, pois Deus é imutável, sendo sempre o mesmo,
ontem, hoje e sempre.
Outra conclusão interessante
desse machismo hebreu daquela época vamos encontrar em
dois castigos para a mulher (Eva), registrados em Gêneses
3, 16: "...e o teu desejo será
para o teu marido", e "...e ele te dominará".
É desnecessário qualquer outro comentário.
Os Dez Mandamentos na codificação
Kardec, pergunta aos Espíritos
superiores, conforme consta do Livro dos
Espíritos (LE):
Perg. 614 – Que
se deve entender por Lei Natural?
R – A Lei Natural é
a Lei de Deus é a única verdadeira para a felicidade
do homem. Ela lhe indica o que deve fazer e o que não deve
fazer, e ele não é infeliz senão quando se
afasta dela.
Perg. 615 – A Lei
de Deus é eterna?
R – Ela é eterna
e imutável quanto o próprio Deus.
Perg. 621 – Onde
está escrita a Lei de Deus?
R – Na consciência.
No desenvolvimento das Leis
Naturais (Leis Divinas), vemos uma certa correspondência
com os Dez Mandamentos. São também em número
de dez, quais sejam:
I – De Adoração
É a elevação
do pensamento a Deus. Pela oração, a alma se aproxima
dele (perg. 649 LE).
II – Do Trabalho
O trabalho é uma Lei Natural,
por isso mesmo é uma necessidade e a civilização
obriga o homem a trabalhar mais porque aumenta suas necessidades
e seus prazeres (Perg. 674 LE).
III – Da Reprodução
Sem ela o mundo corporal pereceria
(Perg. 686 LE).
IV – De Conservação
O instinto de conservação
é dado a todos os seres vivos, qualquer que seja o grau
de sua inteligência. Em uns, ele é puramente maquinal,
em outros ele é racional (Perg. 702
LE).
V – De Destruição
É preciso que tudo se destrua
para renascer e se regenerar, porque o que chamais destruição
não é senão uma transformação
que tem por objetivo a renovação e melhoramento
dos seres vivos (Perg. 728 LE).
VI – De Sociedade
Deus fez o homem para viver em
sociedade. Deus não deu inutilmente ao homem a palavra
e todas as outras faculdades necessárias à vida
de relação (perg. 766 LE).
VII – Do Progresso
O progresso é lei natural,
cuja ação se faz sentir em tudo no Universo, não
sendo admissível, por conseguinte, possa o homem frustrá-la
ou contrapor-se-lhe.
VIII – De Igualdade
Todos os homens são iguais
diante de Deus, todos tendem ao mesmo fim e Deus fez suas Leis
para todos (perg. 803).
IX – De Liberdade
O homem é, por natureza,
dono de si mesmo, isto é, tem o direito de fazer tudo quanto
achar conveniente ou necessário à conservação
e ao desenvolvimento de sua vida. Essa liberdade, porém,
não é absoluta, e nem poderia sê-lo, pela
simples razão de que, convivendo em sociedade, o homem
tem o dever de respeitar esse mesmo direito em cada um de seus
semelhantes.
X – De Justiça,
de Amor e de Caridade
A justiça consiste no respeito
aos direitos de cada um. Amai-vos uns aos outros disse Jesus.
Caridade é benevolência para com todos, indulgência
para com as imperfeições alheias e perdão
das ofensas.
Conclusão
Pode alguém ficar escandalizado
com algumas coisas que estamos dizendo, entretanto, é bom
que se diga que Jesus, de certa forma, modificou os Dez Mandamentos.
Fez uma síntese deles, que não há como contestá-los
mais. Encontramo-la em Mateus 22,
36-40: "Mestre, qual é o maior mandamento
da Lei? Respondeu Jesus: ‘Amarás o Senhor
teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma
e de todo teu espírito. Este é o maior e o primeiro
mandamento. E o segundo, semelhante a este, é: Amarás
teu próximo como a ti mesmo. Nesse dois mandamentos se
resumem toda a Lei e os Profetas’".
Quem ama verdadeiramente seu próximo,
não mata, não rouba, não cobiça, enfim,
nada faz que seja contra este outro ensinamento de Jesus: Tudo
o que quereis que os homens vos façam, fazei-o vós
a eles. Acrescentando: Esta é a Lei e os Profetas (Mateus
7, 12).
Jan/2002