A sociedade espírita em que
trabalho tem reuniões diárias, de segunda à
sábado, que começam em torno das 20 horas. Em uma
delas fui convidado a apresentar um estudo no qual abordei o trabalho
de Deolindo Amorim, "O espiritismo e as doutrinas espiritualilstas".
Deolindo viveu em uma época
de intensos debates no movimento em torno da identidade do espiritismo,
e como tivesse conhecimento filosófico e coerência
doutrinária, assumia posições contrárias
aos sincretismos que os mais entusiasmados propugnavam, e que já
haviam gerado diversas cisões no movimento espírita.
Seu livro foi publicado originalmente
pela Federação Espírita do Paraná, e
objetiva distinguir o espiritismo das diferentes doutrinas espiritualistas
em voga no Brasil. Deolindo era membro da Liga Espírita do
Brasil, cuja sede era estabelecida em Niterói-RJ, e que se
transformaria da FEERJ, após o Pacto Áureo. Ele somava
forças com Herculano Pires e Carlos Imbassahy, dois grandes
pensadores daquela época, nos congressos e encontros que
organizaram.
Como pensador, sensato que era,
em vez de escrever em tom panfletário, o que não lhe
era característico, Deolindo analisava, calmamente, mas de
forma clara e incisiva, as semelhanças e diferenças
entre o espiritismo e: a rosacruz, a cabala, a teosofia, as doutrinas
evangélicas, a umbanda, e o movimento espiritualista anglo-saxão.
Posteriormente ele publicaria africanismo e espiritismo.
Este tema parece nunca ter
fim. É muito comum os neófitos (e mesmo espíritas
com muitos e muitos anos de casa) desejarem trazer algo de sua experiência
pessoal para as sociedades espíritas. Recentemente ouvi pessoas
quererem trazer o reiki para as casas espíritas (talvez pela
similitude com os passes), as práticas de medicina chinesa,
a cromoterapia, a acupuntura (que hoje é uma especialidade
médica em nosso país, portanto, regulamentada), os
florais de Bach e outras práticas/filosofias, nas quais parecem
perceber alguma identidade de conceitos, mas que tem suas diferenças.
Parece haver uma nova onda
africanista no movimento, e como se vende de tudo nas livrarias,
a leitura de um livro opinativo, ainda que considerado mediúnico,
parece ser suficiente para sacramentar sincretismos. Felizmente,
há pessoas lúcidas no movimento, como o Pedro Camilo,
que muito recentemente publicou um artigo (Umbandização
da prática mediúnica espírita?)
no qual se dirige respeitosamente à
umbanda e aos umbandistas, mas reafirma a identidade destas duas
práticas, posicionando-se contra as misturas.
link original parao artigo de Pedro
Camilo ->
http://www.redeamigoespirita.com.br/group/artigosespiritas/forum/topics/umbandizacao-da-pratica-mediunica-espirita-por-pedro-camilo
Voltando às palestras na
Associação Espírita Célia Xavier, em
uma delas, uma frequentadora perguntou se eu não considerava
os cultos afrobrasileiros e o espiritismo como sendo a mesma coisa.
Em outra, um frequentador ficou incomodado com o trabalho do Deolindo
e veio me questionar após a palestra. Quando reafirmei o
que disse ele desabafou: eu não vou deixar de tomar os meus
banhos de flores brancas...
Creio que na esfera particular,
devemos respeitar o livre-arbítrio das pessoas. A questão
maior é quando, querendo reconhecimento social para escolhas
individuais, elas resolvem querer implantar suas combinações
pessoais nas casas espíritas, como forma de buscar reconhecimento.
Se em nome da tolerância os trabalhadores da casa aceitam,
em breve não se conseguirá mais identificar o que
é espiritismo e o que não é.