
"Declaração" de membro
titular da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas em Paris,
na época de Allan Kardec
A divulgação do espiritismo,
bem como o atendimento fraterno em associação à
atividade de passes são duas frentes de atividade das sociedades
espíritas em geral, associados às reuniões públicas.
Era muito comum no Brasil, os centros
manterem reuniões públicas com estudo de “O Livro
dos Espíritos” na primeira parte, seguido de “O
Evangelho segundo o espiritismo” na segunda. Na metade do século
passado já era comum a realização de reuniões
mediúnicas de caráter privativo, evitando-se a realização
de reuniões mediúnicas públicas, por diversas
justificativas, incluindo aí uma forma de proteção
institucional contra a criminalização do espiritismo,
mas também preocupados com a integridade do médium e
a união de pensamentos dos participantes da reunião.
Os membros de reuniões públicas
eram aos poucos integrados às demais atividades da sociedade
espírita, na medida em que demonstrassem interesse, frequência
e aprendizagem, nos pequenos grupos, nos quais os dirigentes participam
também das demais "frentes de trabalho" da casa espírita.
Há quarenta anos, em nossa
casa, quando se desejava fundar uma nova reunião mediúnica
ou preparar alguém para participar de uma reunião mediúnica,
fazia-se um estudo continuado de “O Livro dos Médiuns”.
Com o tempo e a preocupação
com a preparação das pessoas para as atividades próprias
da casa espírita, bem como a ampliação de alguns
centros espíritas na capital mineira, surgiram novas iniciativas
de formação dos trabalhadores espíritas.
Em Minas Gerais houve uma iniciativa
do Grupo Emmanuel, dirigido por diversos estudiosos, que consideravam
importante o estudo do Novo Testamento (e do Antigo Testamento, eventualmente)
que acabou substituindo nas reuniões o estudo de “O evangelho
segundo o espiritismo” (que ficou como uma das fontes utilizadas
nesse estudo), o que disseminou o pensamento de Emmanuel sobre a mensagem
cristã e fez surgir novas iniciativas de exegese espírita
dos evangelhos.
Para a formação dos
trabalhadores da casa espírita, foram surgindo ciclos de estudos
de doutrina e de mediunidade, especificamente, em diversos lugares
no Brasil. Já tínhamos um ciclo de estudos de mediunidade
na União Espírita Mineira, quando surgiu o COEM (Curso
de Orientação Espírita e Mediúnica), uma
proposta de estudos impressa no Paraná, salvo engano. Já
existiam iniciativas em São Paulo, como os diversos cursos
de formação propostos por Armond, como o de “Aprendizes
do Evangelho”, por exemplo. As propostas incorporavam a nova
literatura mediúnica produzida no Brasil, o que envolvia a
obra psicografada por Francisco Cândido Xavier, ditadas por
Emmanuel e André Luiz, os livros de Cairbar Schutel e Vinícius
e muitos outros autores que são vistos como obras subsidiárias.
A FEESP chegou a publicar inúmeros livros de apoio aos seus
cursos, que talvez hoje se encontrem nas bibliotecas dos núcleos
espíritas mais bem estruturados.
Sociedades Espíritas como o
Grupo Scheilla, em Belo Horizonte, articularam as iniciativas de formação
ao acesso às atividades nos grupos. Nela funcionam paralelamente
as reuniões públicas, muito concorridas e os cursos
de formação, que ficaram conhecidos pelo grupo pelo
nome de módulos, porque há uma introdução
à doutrina espírita, uma preparação para
a mediunidade, um módulo dedicado ao estudo dos evangelhos
e um quarto módulo de apresentação sistemática
das diversas atividades da casa, como reuniões de passe, etc.
As reuniões públicas tratam de doutrina e temas espíritas
de interesse do público que procura a casa espírita
em busca de informação, consolo, apoio e orientação.
A Federação Espírita
Brasileira, por fim, considerando todas essas iniciativas em curso,
em âmbito nacional, diferentes entre si, propôs os cursos
de Estudo Sistematizado da Doutrina Espírita – ESDE,
que tiveram a sua versão de preparação para a
mediunidade em dois volumes e posteriormente o Estudo aprofundado
da Doutrina Espírita – EADE. Inicialmente apostilas,
agora vendidas em forma de livros, trazem roteiros de estudo com referências
a diversos autores espíritas. Propõe que os responsáveis
por essa formação sejam mais facilitadores que palestrantes
e incentivam os participantes ao estudo e à leitura orientada.
Foram criados cursos de formação e trocas de experiência
entre as pessoas que trabalham com o ESDE e houve adesão das
federativas, especialmente a União Espírita Mineira.
Nesse momento temos, então,
as reuniões públicas que se mantiveram como algo voltado
aos que procuram o espiritismo em busca de auxílio e orientação
e os grupos de estudo que visavam a formar o espírita e a preparar
o trabalhador. Três iniciativas diferentes, que ao contrário
do que se pensa, atraíram públicos diferentes. As reuniões
públicas deveriam ser uma “porta de entrada” ao
espiritismo e à casa espírita, mas muitas pessoas a
transformaram em uma espécie de lugar de frequência semanal,
assistindo a palestra, tomando o passe, sem conhecer as outras iniciativas
que existem no núcleo que frequentam. Surgiram também,
aqui e acolá, dirigentes cuja única ligação
com a casa é a direção da reunião pública,
o que fazem como um “mestre de cerimônias”, sem
criar um vínculo entre os membros.
Estas transformações
trouxeram algumas polêmicas ao meio espírita, que não
cabem nesse artigo, por não dar para desenvolver os temas a
contento: a questão da centralidade ou não de Kardec
nas reuniões públicas e atividades de formação
dos trabalhadores espíritas, a questão dos novos autores
e das novas editoras espíritas, alguns desses com perfil místico,
de sincretismo oriental ou com as matrizes africanas, outros com afirmações
sobre o mundo espiritual, isoladas e aparentemente contraditórias
com a literatura geralmente aceita pelo movimento espírita.
Junto a elas corre a questão da incorporação
dos novos autores, coerentes com a doutrina espírita, com livros
bem escritos, no que tange à racionalidade e fundamentação
espírita.
Espero que o final de ano, sempre
marcado pela ideia de “fim de ciclo” e de parada para
avaliação, nos permita refletir em nossas casas espíritas
como estamos recebendo e preparando as pessoas que nos procuram com
diversos objetivos, como os que buscam auxílio, os que buscam
a introdução ao conhecimento espírita, os que
buscam aprofundamento e estudo aprofundados e os interessados em integrar-se
nas múltiplas atividades da comunidade espírita.