Em relação à
geração de jovens atual, a chamada por alguns estudiosos
de geração “Y”, os ditos adultos guardam
uma relação um tanto contraditória. Por um
lado, endeusamos os jovens pelos seus prodígios na informática
e pela sua habilidade de transitar no mundo da informação,
trazendo em si a geração nova, que pelo mito da tecnologia
transformará o mundo em um lugar próspero e justo.
Da mesma forma, no mundo louco e
perigoso que nos encontramos, onde por força dessa mesma
tecnologia não conseguimos nos esconder dos males ocorridos
aqui ou na China, tutelamos essa mesma juventude, trocando sua autonomia
por conforto, excluindo-os de processos decisórios, das tentativas
de fazer e de ser sujeito, restringindo-os ao seu mundo virtual
que não conseguimos entender, como uma esfinge a nos desafiar.
Assim, seguimos com jovens estimulados
a não quererem crescer, ampliando os limites superiores e
inferiores do que entendemos por juventude, ao mesmo tempo lastreados
por adultos de um mundo que, pela sua estabilidade social e pela
valorização do consumo, não permitiu rupturas,
mantendo suas referências culturais e sociais nas décadas
de 70 a 90, afastando novas referências criadas pelos jovens,
em uma época de releituras e novas roupagens.
Esse curioso cenário, do
endeusado e tutelado, tem seus reflexos em diversos campos da vivência
da juventude, inclusive no ambiente religioso. A postura de enxergar
o superjovem, mas ao mesmo tempo o jovem bibelô, que não
pode fazer nada, mas que sabe tudo (ainda que superficialmente),
nos leva a inibir o que de mais tenro tem a juventude, que é
a sua capacidade de promover mudanças pelas suas próprias
mãos.
A juventude na casa espírita
é aquele grupo sonhador, que luta pela sua autonomia, no
exercício da construção de espaços,
no microcosmo que é uma mocidade espírita, que canta,
estuda, trabalha dentro de seu mundo, para se preparar para ser
no futuro o agente daquele mesmo mundo. Não é só
fazer, a juventude espírita é um reinventar e experimentar
fazer as mesmas coisas de novas maneiras, se afirmando e se construindo,
como ator principal.
Essa vivência protagonista
da juventude de querer fazer e nesse processo errar e acertar é
o que forja o espírita que aquele adulto será. As
práticas na juventude espírita burilam valores, apontam
ideais e constroem referências. E para isso, é preciso
ousar, é preciso mudar e também aprender, equilibrando
a sabedoria da tradição e os benefícios da
inovação, em uma arte conhecida por poucos.
Entretanto, vivemos uma época
de inovação da tecnologia, de vivência em mundos
virtuais, e ainda de uma geração madura, hoje no papel
de adultos, que construiu parte do mundo como é hoje e que
se vê como protetora incondicional da nova geração,
impedindo esta de fazer, errar, decidir e sofrer.
Do lado jovem, o consumo e o prazer
suplantaram o ideal, substituído pelo desejo de criar uma
empresa no fundo de quintal para vender programas inovadores e faturar
um milhão. O chamamento do individualismo, a competitividade
e o apego aos bens materiais apresenta-se ao jovem de forma ostensiva,
abalando valores e crenças. Os rankings virtuais, os realities
shows e o jogo de máscaras fazem da juventude um duelo de
subterfúgios, no qual se cria uma fobia indescritível
do processo de crescimento e de abominação do futuro.
Essa combinação explosiva,
obviamente uma generalização que ignora experiências
salutares encontradas no mundo concreto, nos alerta como membros
da geração madura sobre se estamos realmente incentivando
a geração mais nova a crescer. E crescer implica em
limites, em desafios e até em lidar com as frustrações.
Estaremos realmente preparando esses jovens para serem os trabalhadores
de amanhã da casa espírita ou queremos que eles sejam
o trabalhador que nós somos, herdeiros de nosso trabalho?
Essa reflexão é oportuna
no nosso movimento. Já não lutamos mais contra o preconceito
e para sermos aceitos na sociedade. Já não precisamos
de livros impressos para obter o conhecimento espírita. A
luta da implantação, da difusão, da relação
com as questões sociais se faz apagada diante do livro novidade
do mês, da palestra show e do show de música espírita.
Ficamos padronizados em um mundo pasteurizado. E para o jovem, restou
reproduzir aquele espaço, sob a tutela vigilante dos mais
velhos, em um burocrático arranjo de tarefas no contexto
da casa.
Criar, inovar, esse privilégio
restou ao jovem apenas no ambiente virtual. Coube a ele esse santuário,
onde ele muda de identidade, lança protestos e vive, fugindo
das agruras de crescer e enfrentar esse desafio, vivendo à
margem do mundo que o admira, mas o tolhe em suas potencialidades.
A verdade é que os jovens
de hoje são tão jovens como nós fomos. Sem
tirar nem pôr. Tem os mesmos sonhos, as mesmas necessidades,
a mesma demanda por cavar seu lugar no mundo social, inclusive na
casa espírita. Não façamos do jovem a mitificação
que fazemos da tecnologia. Entretanto, esses mesmos jovens se veem
segregados no gueto virtual, vendo seus sonhos deslocados para desejos
individualistas, sem encontrar lugar para a vivência no coletivo.
Termino essa reflexão
pensando o que queremos do movimento espírita daqui a 20
anos. Ficar se lamentando que o jovem não tem interesse ou
formatá-lo pelo medo de errar são posturas que somente
reforçam essa situação. É preciso enxergar
o jovem como jovem, e ajudá-lo a encontrar o verdadeiro sentido
da juventude, e de como o Espiritismo pode ser uma oficina-escola
de crescimento, de inovação e de renovação.