A pena de morte ou pena
capital, uma das facetas da mobilização espírita
em defesa da vida, é entendida como uma modalidade de pena,
no campo jurídico, que se caracteriza pela desencarnação
compulsória do condenado, apresentando-se como penalidade
irreversível.
Presente em vários momentos da história
da humanidade e no momento atual em vários países,
tem a pena de morte a sua aplicação por métodos
modernos, como a injeção letal, e por meio de mecanismos
bizarros, como o pisoteamento por elefantes, em casuísticas
que variam não só pelo grau de espetáculo,
mas também pelo requinte de crueldade e pela dor causada
na execução, suscitando discussões adicionais
no campo dos direitos humanos.
Os crimes que motivam a condenação
a pena de morte no mundo e na história também variam
em grande espectro. De crimes hediondos, como homicídio
e estupro, até questões ideológicas e comportamentais,
como adultério, homossexualismo, corrupção,
negação da religião oficial e ainda, insubordinação;
estas tipologias penais compõe os motivos que levam a sociedade
a decretar a morte de um dos seus, sugerindo pela natureza dos
crimes que a pena de morte serve também de instrumento
de dominação e atemorização da população,
diante do poder autoritário.
Praticamente abolida na Europa e na Oceania, tem
seus maiores índices de execução na China,
Irã e Arábia saudita, resistindo com pujança
em governos de matriz democrática, como os Estados Unidos
e o Japão. Apesar desse quadro, percebe-se no mundo um
claro declínio dessa modalidade de pena, no campo legal
e prático, seja pela pressão de grupos de direitos
humanos, seja pela sua baixa efetividade na inibição
de delitos e ainda, pela possibilidade de condenação
irreversível de um inocente, o que na prática já
ocorreu mais de uma vez.
No Brasil, a última execução
por pena de morte ocorreu em 1876. No período republicano,
a exceção da Constituição Federal
de 1937, a pena de morte somente se apresenta para aplicação
em tempos de guerra, para crimes militares, previsto ainda a possibilidade
de indulto. Na prática, nossos tribunais não condenam
ninguém a morte desde 1876.
Apesar de arroubos midiáticos, a vedação
da pena de morte figura como cláusula pétrea na
Constituição Federal de 1988, o que impossibilitaria
a sua implantação em nosso ordenamento por alterações
legais ou constitucionais, federais ou regionais, o que tranquiliza
todos aqueles que marcham contra essa prática abjeta, sintonizados
com os movimentos mundiais, que encaminham esta para uma futura
extinção.
O espiritismo condena a pena de morte, de forma
veemente, em especial pelo contido nas perguntas 760 a 765, do
qual destacamos o trecho: “Sem dúvida, o progresso
social ainda muito deixa a desejar. Mas, seria injusto para com
a sociedade moderna quem não visse um progresso nas restrições
postas à pena de morte, no seio dos povos mais adiantados,
e à natureza dos crimes a que a sua aplicação
se acha limitada. Se compararmos as garantias de que, entre esses
mesmos povos, a justiça procura cercar o acusado, a humanidade
de que usa para com ele, mesmo quando o reconhece culpado, com
o que se praticava em tempos que ainda não vão muito
longe, não poderemos negar o avanço do gênero
humano na senda do progresso.”
Entretanto, apesar de distantes da pena de morte
no plano jurídico-político, não temos muito
o que nos gabar no Brasil… A pena de morte formal, por mais
contraditório que isso possa parecer, tem um aspecto positivo,
de prever um processo legal, métodos sem crueldade, a possibilidade
de indulto, o contraditório e a ampla defesa, no escopo
de direitos e garantias que consagram o direito penal, via de
regra.
Infelizmente, em nosso país, a pena de
morte se apresenta com outras faces, distante do modelo formal,
em práticas que guardam o mesmo espírito de vingança,
de exclusão do plano terreno, de espetacularização
da dor, com um barbarismo mais acentuado e com um caráter
clandestino.
Figuram em nossas páginas de jornal a casuística
de grupos de extermínio, execuções de população
de rua, homicídios por forças policiais, penas capitais
por determinação de traficantes de drogas, matadores
de aluguel, e por fim, com mais destaque recentemente, o linchamento
de criminosos de pequeno potencial ofensivo por populares. Um
ról de práticas mais abjetas que a pena de morte
formal, beirando a barbárie, e que são objeto de
adesão popular, na exaltação pelas redes
sociais.
A pena de morte, seu espírito, se apresenta
em múltiplas faces na nossa sociedade, radicada em uma
cultura de violência e de desrespeito aos direitos humanos.
Cabe a nós, espíritas, que seguimos os exemplos
morais do Cristo, um condenado à pena capital no madeiro,
e refletir sobre isso tudo e de como devemos nos posicionar.
Refletir nos cabe, em especial no que dizem as
obras espíritas respeitáveis, que indicam que a
morte não resolve o problema da alma comprometida com a
sombra, que a Lei é de amor e que a raiz das questões
criminológicas repousa no aspecto social, psicológico
e educativo. Esse desespero descompensado está longe de
ser justiça ou solução na doutrina da vida
eterna e de penas transitórias.
Pesquisa da Revista Isto É de 2008 com
os jovens aponta que 47% dos espíritas nessa faixa etária
é favorável a pena de morte. Mais do que espanto,
devemos refletir sobre essa nossa busca por soluções
imediatistas para os nossos problemas crônicos e verificar
que a pena de morte não jaz sepultada como ideia ou prática,
merecendo espaço amplo de debate e discussão em
nossas casas espíritas, na palestra, no livro e no grupo
de estudo.
Uma defesa da vida ampla, que se posicione de
forma integral, enxergando o homem em suas múltiplas dimensões,
para além de discussões legislativas, atuando sobre
o mundo concreto, é o que carecemos. O amanhã regenerativo
que desejamos começa nessas singelas lutas, ainda distantes
de serem vencidas, não pela falta de leis, mas pela nossa
imperfeição latente.