
Dois autores clássicos estudaram
a distinção entre um fenômeno mediúnico
e um fenômeno anímico: Alexander Aksakof
(1832-1903), em Animismo e Espiritismo e Ernesto
Bozzano (1862-1943), em Animismo ou Espiritismo.
Ambos pretendiam demonstrar através de sólida pesquisa
com diversos médiuns, que a tese animista – de que
qualquer fenômeno é sempre manifestação
do próprio médium – é insuficiente para
explicar todas as manifestações, pois há muitas
em que a identidade de uma outra inteligência comunicante
se faz evidente. Isso não invalida que haja de fato fenômenos
anímicos, onde é o Espírito do médium
que está em ação, como nos casos de telepatia,
clarividência, sonambulismo ou desdobramento ou o que hoje
chamamos “estados alterados de consciência”. Por
exemplo, se o indivíduo se desdobra e vai visitar um local
distante, volta e conta o que viu, este é um fenômeno
anímico. Diferente do que Aksakof e Bozzano chamam de um
fenômeno espírita, onde uma individualidade se manifesta
através do médium e traz informações,
evidências de identidade, como grafia, estilo de pintura,
escrita ou outras, que são diferentes do que o médium
sabe, pensa ou costuma demonstrar por si mesmo. O conjunto de evidências
da entidade manifestante indica uma personalidade distinta do médium.
Anos antes de Aksakof e Bozzano, Kardec já havia se debruçado
sobre essas questões, em sua pesquisa pioneira sobre a mediunidade.
Ao contrário do que muitos espíritas pensam atualmente
(e pensam porque não conhecem e nnão estudam suficientemente
os fenômenos mediúnicos), o animismo não é
algo necessariamente pernicioso, não é mistificação.
Há dois aspectos que devem se considerados:
1) animismo (um termo que não
foi empregado por Kardec, mas o fato está presente em suas
obras) é também evidência da independência
do Espírito em relação à matéria.
Se alguém se desdobra e atua em Espírito e aparece
em outro local, como fazia Eurípedes Barsanulfo (que realizava
partos a quilômetros de distância, enquanto estava
em sala de aula em estado de transe), trata-se de uma faculdade
natural, que aponta que somos espíritos encarnados e podemos
exercitar nossos dons espirituais.
2) as linhas que delimitam o fenômeno mediúnico do
anímico são muito tênues (e isso tanto Aksakof
quanto Bozzano também reconhecem). Porque, bem ensina Kardec
em O Livro dos Médiuns que quando o Espírito
do médium age pode estar em contato com outros Espíritos
e, portanto, o fenômeno anímico pode ter algo de
mediúnico. Por outro lado, toda manifestação
mediúnica tem algo de anímico, porque se trata sempre
de uma comunicação entre duas inteligências,
duas individualidades e é impossível que o médium
anule sua própria bagagem cultural, suas emoções,
sua forma de ser, para que o Espírito se manifeste plenamente.
Por isso, um mesmo Espírito se comunicando por médiuns
diferentes (por melhores que sejam esses), podem apresentar alguns
traços distintos.
A mediunidade é um fenômeno
bastante delicado, com muitas sutilezas, e requer um estudo acurado,
sempre baseado em observação. É o que perdemos
em nosso movimento espírita atual. O melhor médium,
como dizia Kardec, é o que menos se engana, não porque
queira intencionalmente mistificar, mas porque no diálogo
entre os dois mundos, há sempre uma dose de subjetividade
que deve ser considerada. Esse olhar prudente (como queria Kardec,
racional e científico) não invalida as comunicações,
mas nos assegura uma precisão maior na apreciação
do conteúdo que nos chega do além.