Há poucos dias, tivemos a Páscoa
e em seguida o “dia do índio” e nas semanas das
duas datas, vimos pelas ruas, crianças de escolas públicas
e particulares, vestidas e pintadas de coelhinho e de índio.
Uma visão incômoda, pois tudo muito superficial, sem
nenhum significado de aprendizado. Papais e mamães claro, acham
os meninos e as meninas lindinhos, com suas orelhas de coelho ou seus
cocares de papel! As crianças, sem dúvida, ficam bonitas
com qualquer coisa.
Mas isso, na minha opinião,
não tira a pobreza e na maior parte das vezes a breguice dos
enfeites (que me desculpem os que gostam!). E, sobretudo, o vazio
pedagógico que muitas vezes se instala em tais comemorações.
E aqui se dá também o vazio estético.
Esse é um retrato do que é
a educação na maioria das escolas.
A Páscoa é uma festa
cristã, que, se é feriado, deveria ser contextualizada
na cultura ocidental, com seu significado. Na ocasião, poderia
se fazer um projeto interdisciplinar sobre a Páscoa judaica,
a Páscoa cristã, e um estudo comparativo entre os significados
para cada religião. Colocar, por exemplo, para as crianças,
a obra genial de Rimski-Korsakof sobre a Páscoa russa, assistir
vídeos ou pesquisar fotos de como é comemorada a Páscoa
em diferentes países. E contar a história de Jesus,
comentando as diferentes interpretações que existem
a respeito desse personagem, a de que ele é Deus (maioria dos
cristãos), a de que ele é um profeta (para os muçulmanos),
de que ele é um Espírito evoluído (para os espíritas),
de que ele é um mártir político, que pregou uma
ética revolucionária (para alguns agnósticos
e ateus…).
Os indígenas são a raiz
de nossa nação, os donos originais das terras brasileiras,
que foram massacrados, e continuam sendo excluídos de nossa
cultura. Sua presença na escola não deveria se reduzir
a um dia de comemoração simplória, em que as
crianças colocam cocares na cabeça. Projetos de pesquisa
histórica, convites para trazer realmente indígenas
para contarem suas tradições orais, leitura de livros
agora escritos a partir dessas tradições e, sobretudo,
conscientização do quanto o Brasil, como coletividade,
deve a eles. Tudo isso é tratar o tema com seriedade.
Mas na escola, o que predomina é
o mecânico, com uma legislação vinda de cima para
baixo, de uma programação engradada, não sentida,
não vivida, não significativa.
Outro caso é o da inserção
da cultura afro-brasileira na escola. Agora também é
lei, é diretriz nacional. Mas a inclusão não
ocorre de fato, porque é feita da mesma maneira que os casos
citados acima e porque, por exemplo, em escolas de elite, há
raros ou nenhum negro, porque o distanciamento dessa matriz poderosa,
belíssima, de nossa história, é um distanciamento
antigo, enraizado, em forma de racismo disfarçado e de intolerância
arraigada. Muita gente ainda hoje tem preconceito contra o Candomblé.
Agora, tudo isso se agrava pelo crescimento
da intolerância evangélica. Já há casos
narrados no Brasil afora, de alunos evangélicos que se recusam
a fazer trabalhos encomendados pelos professores, que tratem de temas
afros. Os evangélicos (nem todos claro) demonizam as manifestações
afro, como demonizam homossexuais, como demonizam espíritas
e umbandistas. Onde há demonização do outro,
não há possibilidade de diálogo, de convivência
e de respeito.
Isso tudo é muito grave. Nosso
empenho em livros, cursos e propostas didáticas, e agora na
Universidade Livre Pampédia, é, de fato, fazer uma educação
plural, onde todos tenham voz, onde todos sejam ouvidos com respeito,
mas que falem também com respeito pelo outro.
A riqueza do mundo está na
sua diversidade. A riqueza do Brasil está no seu mosaico de
tradições étnicas, culturais e religiosas. Se
não aprendermos a inserir isso de modo legítimo, profundo
e verdadeiro na educação das novas gerações,
caminharemos para um país mais intolerante do que tem sido
até hoje.