Formação do novo homem
- A tarefa da Educação Espírita é a
formação de um homem novo. A Educação
Clássica greco-romana formou o cidadão, o
homem vinculado à cidade e suas leis, servidor do Império;
a Educação Medieval formou o cristão,
o homem submisso a Cristo e sujeito à Igreja, à autoridade
desta e aos regulamentos eclesiásticos; a Educação
Renascentista formou o gentil-homem, sujeito às
etiquetas e normas sociais, apegado à cultura mundana; a
Educação Moderna formou o homem esclarecido,
amante das Ciências e das Artes, cético em matéria
religiosa, vagamente deísta em fase de transição
para o materialismo; a Educação Nova formou o homem
psicológico do nosso tempo, ansioso por se libertar
das angústias e traumas psíquicos do passado, substituindo
o confessionário pelo consultório psiquiátrico
e psicanalítico, reduzindo a religião a mera convenção
pragmática.
Nesse rápido esquema temos uma visão do desenvolvimento
do processo educacional e de suas conseqüências. Não
pretendemos que seja uma visão perfeita e completa. É
apenas um esboço destinado a nos orientar na compreensão
do assunto. E vemos que ele pode nos dar uma idéia negativa
da Educação, mas se refletirmos a respeito veremos
o contrário. Do homem submisso ao Estado ou a Deus,
preso a leis, regras e convenções que o amoldam e
desfiguram, avançamos para o homem livre do futuro, responsável
por si mesmo, que chega a se revoltar contra o próprio Deus
no seu profundo anseio de liberdade, mas sempre em busca da sua
afirmação como Ser.
Essa afirmação é
a que nos traz o Espiritismo com as provas científicas da
sobrevivência e a perspectiva da imortalidade, com a desmitização
da morte, com a racionalização do nebuloso conceito
de Deus e de suas relações com o homem, com o esclarecimento
decisivo do destino do homem e da razão de ser da vida e
suas peripécias. Cabe, portanto, à Educação
Espírita formar o homem consciente do futuro, que já
começa a aparecer na Terra, senhor de si, responsável
direto e único pelos seus atos, mas ao mesmo tempo reverente
a Deus, no qual reconhece a Inteligência Suprema do Universo,
causa primária de todas as coisas.
Não é mais possível
educar as gerações novas segundo nenhum dos tipos
anteriores de Educação. Daí a rebeldia
que vemos nas escolas, a inquietação da juventude,
insatisfeita com a ordem social e cultural, ambas obsoletas, em
que se encontram. A Educação Espírita
se impõe como exigência dos tempos. Só
ela poderá orientar os espíritos para a formação
do homem novo, consciente de sua natureza e de seu destino, bem
como de pertencer à Humanidade cósmica e não
aos exíguos limites da humanidade terrena. Só ela
pode nos dar, nesse homem novo, a síntese de todas as fases
da evolução anterior, numa formulação
superior. Porque o homem espírita – ou o homem
consciente – que essa nova Educação nos dará,
será ao mesmo tempo o cidadão, o cristão, o
gentil-homem, o homem esclarecido e o homem psicológico,
mas na conjugação de todos esses elementos numa dimensão
espiritual e cósmica.
Com isso não queremos dizer
que toda a Humanidade se converta ao Espiritismo, mas tão
somente que os princípios fundamentais do Espiritismo serão
as coordenadas do futuro, marcando o âmbito conceptual e ético
da nova formação educacional. Não foi
necessário que toda a Humanidade se convertesse ao Cristianismo
para que os princípios deste remodelassem o mundo. O
mesmo acontecerá com o Espiritismo. A função
da Educação Espírita é portanto a de
abrir perspectivas novas ao processo educacional, adaptando-o às
necessidades novas que surgiram com o desenvolvimento cultural e
espiritual do homem. As escolas espíritas – como
as escolas cristãs o fizeram – serão os centros
dinamizadores da renovação. E a Pedagogia Espírita
– como o fez a Pedagogia Cristã – orientará
a nova concepção educacional que está nascendo
em nossos dias.
Por outro lado, correntes avançadas da Pedagogia Contemporânea,
como especialmente a do neokantismo, representada por Kerchensteiner
na Alemanha e René Hubert na França, darão
sua contribuição para o desenvolvimento dessa profunda
revolução educacional em marcha. Seria bom, por
sinal, que os educadores espíritas procurassem aprofundar-se
no estudo do Traité de Pédagogie Générale,
de Hubert, que nos parece um verdadeiro monumento de renovação
educacional dentro das coordenadas espíritas.
Como vemos, o nascimento da Educação Espírita
ainda não se completou. Começando com Kardec,
há mais de um século, ainda está se processando
em nossos dias. Por isso mesmo, somos todos convocados a participar
desse acontecimento espiritual, contribuindo cada qual da maneira
que puder para que ele se complete o quanto antes.