Wilson
Garcia
> Hermínio C. Miranda – Opções
Temáticas em sua Obra
Um dos escritores espíritas mais lidos da atualidade, também
tradutor, Hermínio Correa de Miranda, nascido em 1920, tem
um fôlego para pesquisas e leituras tão amplo que não
seria de todo equivocado afirmar que é o escritor dos escritores.
Equipara-se, talvez, neste aspecto e em certa medida a Ernesto Bozzano.Em
sua obra, extensa e também densa, sobressaltam as referências
bibliográficas, ao lado de suas preferências temáticas
e de uma preocupação constante com as conceituações,
que deseja colocar claras para melhor expressão do seu pensamento.
Contribui para isso a competente capacidade de ler em diversas línguas
e uma memória privilegiada que Miranda demonstra possuir,
valorizando sobremaneira o seu autodidatismo.
Tendo residido por algum tempo nos Estados Unidos, a serviço
profissional, aprimorou ali não só os seus conhecimentos
do inglês como também o gosto pela literatura profusa
do país de Tio Sam, em especial as obras relacionadas aos
temas de sua preferência.
Sem qualquer pretensão de analisar a obra completa
de Miranda, podemos destacar quatro de suas opções
temáticas: cristianismo (leia-se teologia), mediunidade,
regressão de memória e reencarnação.
Esta última, porém, parece estar muito à frente
das outras, como atesta o prefaciador de um dos seus livros: "Em
Doutrina Espírita, o ponto que mais o atrai é a reencarnação".
(1) Mais do que isso, é também assunto freqüente
em praticamente toda a sua obra, pois, sempre que pode ele o introduz
em reforço de seu pensamento.
Miranda não é um pesquisador do tipo Ian Stevensson
ou Hernani Guimarães Andrade. Enquanto estes se preocupam
com a análise dos fatos em seus detalhes comprováveis,
quando trata da reencarnação Miranda se vale habitualmente
de pesquisa biográfica com apoio em bibliografia consistente,
em que estão presentes, inclusive, obras de história.
É bem verdade que o seu livro mais denso sobre o tema - "Eu
sou Camille Desmoulins" - escrito em parceria com o sujet da
pesquisa, Luciano dos Anjos, conta com um outro tipo de apoio: a
regressão de memória. É também verdadeiro
o fato de utilizar as experiências com regressão de
memória em outras obras sobre a reencarnação.
Sua argumentação, entretanto, privilegia a comparação
de dados biográficos, no que é rigoroso se assim podemos
nos expressar.
O livro referido merece uma certa atenção, haja vista
para as discussões que despertou quando de sua aparição
no mercado, em especial por alguns detalhes curiosos: Luciano dos
Anjos, sujet e personagem principal, é figura polêmica
por suas preferências político-doutrinárias,
em que se arrolam o discutível gosto pelo francês Roustaing
(aquele do corpo fluídico de Jesus) e uma atuação
extravagante no período em que esteve na Federação
Espírita Brasileira. Estes fatos levantaram suspeitas sobre
o livro, mas é preciso reconhecer a seriedade de Hermínio
Miranda tanto na condução das pesquisas quanto na
comprovação das informações obtidas
durante os transes. Aliás, a polêmica surgiu antes
mesmo da publicação do livro quando Luciano teria
vetado a informação constante dos originais de que,
em transe, se opunha à teoria roustainguista.
A seriedade de Miranda, nesta como em outras obras, é incontestável.
Correndo o risco de ser contestado, avança ele na defesa
de idéias próprias em alguns casos, inovando senão
na originalidade do assunto pelo menos na utilização
de novas designações para fatos conhecidos, como é
o caso de seu "replay", nome que atribui ao fenômeno
observado por Ernesto Bozzano em "A Crise da Morte", a
respeito das lembranças que o indivíduo repassa no
instante da desencarnação.
Seu pensamento é de que "o historiador ou historiógrafo
não deve imaginar fatos inexistentes para preencher lacunas
ou justificar a "sua" filosofia da História. Deve
limitar-se a narrar os fatos, tal como se apresentam na documentação
existente ou na melhor e mais verossímil tradição".(2)
Ao lado de sua farta produção na linha da reencarnação,
Miranda revela-se igualmente interessado nos fatos mediúnicos,
privilegiado que foi pela convivência com alguns médiuns
férteis em material de análise. Sua capacidade de
registrar as informações obtidas por esta via, bem
como de ampliá-las com pesquisas bibliográficas, permitiu-lhe
escrever inúmeros livros, numa relação de que
desponta a série Histórias que os Espíritos
Contaram - nada menos de cinco volumes, três dos quais publiquei
pela Correio Fraterno: A Dama da Noite, A Irmã do Vizir e
O Exilado. Nestas obras surpreende o fato do autor trabalhar com
a regressão de memória nos espíritos manifestantes.
Esta relação íntima com o plano invisível,
que o autor diz ter durado algumas décadas em ambiente apartado
do centro espírita, principiou por uma constatação:
"Ao iniciar-se a tarefa, o conceito que eu formulava acerca
dos espíritos era o dos livros que estudara durante o período
de instrução e formação. Para mim, seriam
entidades que, de certa forma, transcendiam a condição
humana, quase como abstrações vivas, situadas numa
dimensão que meus sentidos não alcançavam.
Mas não era nada disso, os espíritos são gente
como a gente! Sofrem, amam, riem e choram. Experimentam aflições,
desalentos, alegrias, esperanças, tudo igual".(3)
Também aqui, o material colhido por Miranda vai servir para
as diversas outras obras que escreve, como é o caso, por
exemplo, do livro Condomínio Espiritual, em que penetra com
certa ousadia no terreno das ciências psicológicas,
analisa a Síndrome da Personalidade Múltipla (SPM)
e apresenta conclusões do tipo: "Se o leitor estiver
a perguntar-se por que razão entra em cena a mediunidade
nesta discussão, devo dizer-lhe que, a ser legítima
a proposta de que são autônomas as personalidades que
integram o quadro da chamada grande histeria (SPM), é de
pressupor-se no paciente faculdades mediúnicas mais ou menos
indisciplinadas, mas atuantes, que permitem não apenas o
acoplamento de outras individualidades ao seu psiquismo, como manifestações
de tais entidades através de seu sistema psicossomático"
(pág. 26). Para deixar ainda mais claro o seu pensamento,
Miranda afirma: "Pela minha ótica pessoal, a SPM não
seria psicose nem neurose, mas faculdade mediúnica em exercício
descontrolado" (pág. 252).
Ainda no plano das vidas sucessivas, Miranda acredita ser a reencarnação
de um dos fiéis colaboradores de Martinho Lutero ao tempo
da Reforma, tendo por esta personalidade uma inusitada admiração.
Seus estudos sobre vidas anteriores incluem Lutero (este seria a
reencarnação de Paulo). Isto talvez explique, entre
outras coisas, o também grande interesse de Miranda pela
teologia e, em especial, o Cristianismo, valendo destacar aí
os dois volumes de As Marcas do Cristo e ainda Cristianismo: A Mensagem
Esquecida.
Não se pode, portanto, deixar de mencionar neste ponto duas
coisas: sendo afeito ao estudo da teologia, Miranda não se
mostra um místico do tipo comum; apesar disso, é francamente
partidário do aspecto religioso do Espiritismo, revelando-se
aqui um dos poucos momentos de sua obra em que é contundente:
"O Espiritismo está coerente com essa mensagem imortal,
e, por isso, implantou-se tão solidamente sobre alicerce
de três "pilotis": ciência, filosofia e religião.
Hoje, examinando os fatos do ponto de vista privilegiado da perspectiva,
sabemos que o suporte religioso é o mais importante dos três".(4)
Segue, portanto, a linha emanuelina, em que não se contenta
apenas em apontar sua visão, mas destaca o que entende ser
o aspecto primordial: o religioso. Eis que o confirma: "O Espiritismo
(...) se resume, em última instância, em uma proposta
clara e objetiva de esforço pessoal evolutivo para substituir
religiões salvacionistas, dogmáticas e irracionais.
Fé racionalizada, purificada e sustentada pela experimentação,
continua sendo fé, mais do que nunca. Se isto não
é religião, que seria, afinal?".(5)
Para finalizar, alguns aspectos curiosos
em Hermínio Miranda:
1. Ele não é um escritor que se poderia
dizer popular. Conquanto em alguns instantes demonstre intenções
nessa direção, sua linguagem o trai, seu estilo é
denso e portador de uma seriedade do tipo que não se permite,
leves que sejam, algumas pitadas de jocosidade. Às vezes
tenta, mas não logra sucesso. Por isso, seria interessante
analisar a razão da excelente vendagem de seus livros;
2. Miranda abusa das conceituações
e dos esclarecimentos tendo por base os dicionários e enciclopédias.
Tem-se a impressão de que escreve com o "Aurélio"
e a "Britânica" ao lado, a eles recorrendo constantemente.
Isso pode significar, por exemplo, uma tendência ao didatismo,
ao mesmo tempo em que preocupação com o produto final
da recepção do leitor;
3. Verifica-se, também nele, uma quase excessiva
preocupação de convencer o leitor de que não
deseja modificar sua opinião acerca de determinados aspectos
especialmente ligados à crença. Ao analisar o conjunto
de sua obra, este fato se destaca com certa nitidez, contrastando
com a firmeza com que defende suas opiniões.
Notas
1. Abelardo Idalgo Magalhães em De Kennedy ao
Homem Artificial.
2. Reencarnação e Imortalidade, pág.
17.
3. As Mil Faces da Realidade Espiritual, pág.
10.
4. As Marcas do Cristo, vol I, Apresentação.
5. As Mil Faces da Realidade Espiritual, pág.
271.
Bibliografia
Alquimia da Mente, 2ª ed., Lachâtre, 1994.
A Dama da Noite, Correio Fraterno, 1985.
A Irmã do Vizir, Correio Fraterno, 1985. A Memória e o
Tempo, 5ª ed., Lachâtre, 1996.
A Reencarnação na Bíblia, Pensamento, 1999.
As Marcas do Cristo, vol. I e II, 3ª ed., Feb, 1994.
As Mil Faces da Realidade Espiritual, 2ª ed., Edicel, 1994.
As Sete Vidas de Fénelon, Lachâtre, 1998. Autismo, Lachâtre,
1998.
Candeias na Noite Escura, 3ª ed., Feb, 1994. Condomínio
Espiritual, 3ª ed. Fé, 1995.
Cristianismo: A Mensagem Esquecida, 2ª ed. Clarim, 1998.
Eu Sou Camille Desmoulins, 3ª ed., Lachâtre, 1993.
De Kennedy ao Homem Artificial, 2ª ed., Feb, 1992.
Guerrilheiros da Intolerância, Lachâtre, 1997.
Histórias que os Espíritos Contaram, 4ª ed., Alvorada.
Lembranças do Futuro, Lachâtre, 1995.
Nas Fronteiras do Além, Feb, 1994. O Exilado, Correio Fraterno,
1985.
O Que é Fenômeno Mediúnico, Correio Fraterno, 1986.
Reencarnação e Imortalidade, 4ª ed., Feb, 1991.
Sobrevivência e Comunicabilidade dos Espíritos, 3ª
ed., Feb, 1990.
Swedenborg, uma Análise Crítica, Celd, 1991.
Fonte: http://www.espiritnet.com.br/Biografias/biohermi.htm
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