Você, caro leitor, crê
na vida depois da morte? Não! Então talvez você
corra realmente um risco de extinção. Nas pesquisas
do dr. Ian Stevenson, alguns padrões do processo reencarnatório
- admitindo a reencarnação como a verdadeira interpretação
para os casos sugestivos de lembranças de vidas passadas -
parecem responder ao perfil psicológico dos membros de uma
comunidade; como local, taxa de intermissão, sexo e contexto
familiar, mas possivelmente não são os únicos.
Renascimento e sobrevivência podem ser opções
para a personalidade humana que deixam de estar - ou talvez ainda
não sejam - disponíveis para aqueles que não
acreditam ou, quando menos, tal descrença inibe a possibilidade
de experiências conscientes durante o intervalo de
uma vida a outra. Isso, prima facie, pode parecer terrorismo
- concordo -, mas explico abaixo as proposições filosóficas
que podem ser articuladas de acordo com algumas evidências provenientes
das pesquisas psíquicas.
Nos casos pesquisados por Stevenson as distâncias médias
entre residência prévia e local de renascimento giravam
em torno de 45 km. Nos dados da pesquisadora de vidas passadas, Satwant
Pasricha, a mediana cai para 8 a 10 km (European Journal of Parapsychology,
3, 51-65). Taxa de intermissão ou, se prefirir, intervalo,
é o tempo que o sujeito demorou a reencarnar. É o que
os espíritas chamam de erraticidade. Stevenson
verificou que a média de intermissão na Tailândia
era de apenas 6 meses; no Sri Lanka obteve-se 1
ano e meio; na Birmânia, 1 ano e 9 meses.
Quanto à mudança de sexo, países em que a cultura
diz não ocorrer, não se encontraram resultados. No entanto,
países como Birmânia, Tailândia,
Sri Lanka e Índia, há
registros de 29%, 13%, 9%
e 3%, respectivamente. Quanto ao contexto
familiar, quase todos os casos dos índios tlinguite,
no Alasca, as crianças reencarnam na mesma família,
ao passo que quase todos os índios asiáticos reencarnam
fora dela. Mas o que tem a ver todos esses dados?
Bem, o que se sugere é que o perfil cultural, a crença
em determinados fatores, influencia de modo direto
as características do processo de reencarnação.
Países onde se acredita numa reencarnação rápida,
os casos do tipo reencarnação, em média, trazem
períodos de intervalo menor. A própria
distância entre o local de vida da personalidade prévia
do de seu renascimento parece encontrar uma identidade cultural.
O que acontece então com sujeitos pertencentes a cultura não-reencarnacionistas?
Sugiro que essa questão seja desdobrada em duas partes: a)
indivíduos que acreditam no além-túmulo,
mas não crêem na reencarnação;
b) pessoas que não acreditam na reencarnação
e nem na sobrevivência de sua personalidade após o aniquilamento
corporal. Lembro a você neste momento a advertência que
fiz no início, ou seja, que consideremos que a reencarnação
seja realmente um fato.
Indivíduos que acreditam no além-túmulo, mas
não crêem na reencarnação
Indivíduos que aceitam a continuidade
da vida, mas negam a reencarnação, podem apenas demorar
um tempo maior para reencarnar. Se na Tailândia, onde há
a crença no renascimento de modo quase imediato, o intervalo
de tempo médio é de 6 meses, talvez pessoas que repelem
a reencarnação demorem algumas décadas, ou até
séculos, para renascer. Se existe alguma vantagem em estar
do lado daqui, em termos de progressão do espírito,
a descrença pode acarretar um atraso à evolução
pessoal. De qualquer maneira, como nestes casos, do outro lado, a
consciência está desperta, pode o sujeito mudar de postura.
Pessoas que não acreditam na reencarnação
e nem na sobrevivência de sua personalidade após o aniquilamento
corporal
Colocando a sobrevivência
dentro de um contexto evolucionista, a par da ainda raridade de casos
que sugerem a permanência individual após à morte,
como relatos mediúnicos, casos de reencarnação,
experiências fora do corpo, aparições, parece
ainda a faculdade humana de transcendência estar dando os seus
primeiros passos ao invés de ser uma característica
já estabilizada. Talvez sobreviver à morte seja algo
emergente e que ainda não se sedimentou em nenhuma espécie
de vida terrena. O que os metapsiquistas chamavam de evolução
anímica e os parapsicólogos de hoje chamam PSI, a fim
de explicar psicocinesia e modalidades de percepção
extra-sensorial, quem sabe não seja um sistema sensório
transcendente em vias de complementação. Assim nem todos
os seres devem sobreviver. Certo? Talvez, mas não é
o que se sugere. O que pretendo dizer – e acho mais coerente
- é que a sensação de sobrevivência do
ego é emergente, mas que alguma forma de permanência
e renascimento sempre estiveram presentes. Assim, rudimentarmente,
a crença budista na doutrina Anatta (não-eu), na qual
a alma é substituída por uma espécie de eterna
energia psicobiofísica, destituída de personalidade,
que migra para um novo corpo, pôde ter sido verdadeira nos primórdios
da evolução, como pode ainda ser uma realidade para
uma vastidão de seres, inclusive ainda no homem.
Os estados religiosos que algumas pessoas experimentam
espontaneamente, assim como experiências místicas, situações
eventuais de experiências transcendentes, como EQM e, acima
de tudo, uma forte crença na existência do além,
podem favorecer, através de uma indução psicológica,
a exteriorização do ego dentro daquela energia que transmigra
de um corpo a outro. Indivíduos que acreditam no post-mortem
permanecem com sua personalidade ativa; os que não crêem,
ficam com ela em estado de latência, até uma nova oportunidade
em sua próxima existência. Há algumas pesquisas
que concluem que a crença em Deus e na espiritualidade é
um aspecto evolutivo de cunho social que favorece a comunhão
dos seres, facilitando a convivência harmônica. Talvez
não seja essa a única vantagem adaptativa, mas que haja
realmente um lucro de cunho naturalístico: a sensação
de continuidade após à morte.
Últimas Considerações
A grande utilidade de sobreviver é sentir que se continua a
viver após a morte. Morrer e renascer imediatamente, de maneira
infindável, não traz recompensa psicológica nenhuma.
E, num sentido prático, quase não difere do materialismo
puro. Embora nossa personalidade, numa mesma vida, mude com o tempo,
nós sabemos que continuamos a ser quem somos graças
a sensação de continuidade. A natureza do ego é
transitória, mas o precedente sempre influencia no consequente,
sendo o atual, aquele que nos define neste exato momento, influenciado
por todos os egos que já possuímos, inclusive os que
experimentamos em vidas passadas, e sentimos apenas reflexamente nesta
vida, através de nossas inclinações, que não
se circunscrevem apenas por critérios culturais, como a educação
que recebemos. A negação da vida após a morte
não impede que lembremos de vidas passadas, mas obstaculiza
termos experiências durante o período de intervalo. Você
pode me perguntar qual a diferença daquele que tem crença
numa reencarnação imediata para o que não acredita
no post-mortem? Eu diria que seria a possibilidade, quanto ao primeiro,
de chegar a ter experiência consciente durante a intermissão,
embora possivelmente curto, de meses, dias, ou até horas, dependendo
do grau de influência psicológica que sua crença
impregna sua psiquê. Acredito que seja possível, a par
das supras evidências em pesquisa psíquica, inferir que
a sensação de sobrevivência e a possibilidade
de ter experiências conscientes após a morte corporal
possam talvez ser situações emergentes e universais
na natureza, mas ainda não plenamente estabilizadas. Pode acontecer
também que o sujeito alterne ciclos de atividade/inatividade
de sua personalidade após a morte, dependendo do rumo que deu
a si quanto à questão da sobrevivência, durante
suas últimas jornadas reencarnatórias. Mas pode ser
também que algumas pessoas ainda não tenham vivenciado
uma experiência consciente, com a permanência de sua personalidade,
após o desencarne, migrando ainda na concepção
pura da Anatta budista. Mais que apenas uma questão cultural
ou de evolução, descrer numa vida após a morte
pode responder àqueles que objetam que Deus não nos
deu livro arbítrio de não querer existir. Se nossas
convicções podem influenciar o nosso destino espiritual,
como os dados em pesquisas de reencarnação sugerem,
crer pode ser um “sim” a pergunta se desejamos viver ou,
pelo menos, termos consciência disto.
Referências