Como tudo mais no Universo, a fé
é sujeita à Lei da Evolução. No entanto,
sua evolução, mais que a de outras características
do espírito humano, apresenta duas componentes que se devem
somar. Em sua capacidade de remover montanhas, a fé pura
e inocente de um aborígine australiano pode ser mais forte
que a fé racionalizada de um erudito estudioso Espírita.
Dizer que a deste último é superior à do primeiro
apenas por ser fruto do entendimento é simplificar demais
uma questão complexa e, possivelmente, afirmar uma inverdade.
Existem diversas estórias nas tradições religiosas
das diversas religiões, até mesmo parábolas
do Senhor Jesus, para nos esclarecer sobre esta realidade.
Uma que gostamos muito diz respeito a uns sacerdotes
que tinham ouvido falar que, em uma determinada ilha, havia um homem
que queria aprender a orar. Tocados pela necessidade do pobre homem,
os sacerdotes demandaram à tal ilha e, em lá encontrando
o homem, este lhes disse que era muito ignorante e que tudo o que
sabia dizer como oração era ficar repetindo "Deus,
Deus, Deus" monotonamente.
Os sacerdotes, habituados às longas orações
proferidas do púlpito para os fiéis, tentaram ensiná-las
ao homem. Após certo tempo ensinando as orações,
tomaram novamente o barco para retornarem ao continente, acreditando
terem cumprido sua missão. Quando já tinham-se afastado
bastante da ilha, no entanto, eis que vêem o homem correndo,
aflito, sobre as águas, suplicando-lhes que voltassem, pois
tinha esquecido as orações que os sacerdotes lhe haviam
ensinado.
Mesmo entendendo o relato acima como uma alegoria
e não um fato real, ele é correto quando mostra que
a fé simples, pura e inocente, é de um poder imenso,
pois de nada duvida, permitindo ao Espírito encarnado o exercício
de potencialidades que um outro, dotado de grande conhecimento,
nem pensaria em exercer por ignorar seu funcionamento. No relato
evangélico vemos que Pedro, ao tentar seguir o Mestre, que
caminhava sobre as águas, começou conseguindo e, depois,
afundou. Quando isso ocorreu, o Mestre repreendeu-o por sua pouca
fé. Sim, ao raciocinar sobre o que Jesus tinha feito, ele
não encontrou explicação e, com isso, perdeu
a sustentação que a fé simples lhe havia dado
para os primeiros passos.
Os relatos evangélicos
nos trazem, ainda, dois exemplos magníficos do poder da fé.
A cura da mulher que tinha uma hemorragia havia doze anos pelo simples
contato com o manto de Jesus (Lc 8:43-48)
demonstra a força da fé simples e não raciocinada.
Para ela o Mestre disse: "A tua fé te salvou."
Como exemplo da fé raciocinada e de sua força, lemos
sobre a cura do servo do Centurião (Lc
8:3-10), que, compreendendo a condição
de Jesus como um líder de falanges espirituais assim como
era ele líder de falanges encarnadas, disse saber que o Mestre
não precisava ir à casa dele para curar seu servo,
fazendo com que Jesus, após ter confirmado o entendimento
dele, promovendo à distância a cura solicitada, afirmasse:
"... nem mesmo em Israel encontrei tamanha fé".
Não devemos prescindir da fé simples como se ela fosse
um resquício de atraso em nosso caminho evolutivo que para
nada servisse. Não, diante de algo que não compreendemos
plenamente, mas que nossa intuição nos afirma ser
possível e é voltado para o bem, saibamos seguir em
frente e agir com determinação e fé, certos
de que os bons Espíritos estarão conosco na empreitada.
Foi com essa fé, ao mesmo
tempo simples e raciocinada, que Espíritos, praticamente
saídos do anonimato da sociedade, fizeram obras magníficas
registrando-se para sempre na história humana como ícones
de ação colocada a serviço do bem. Se Madre
Teresa, Ghandi, Irmã Dulce, algum deles tivesse submetido
cada ação do bem que fizeram a um raciocínio
prévio quanto à sua factibilidade, pouco ou nada teriam
feito.
Concluindo, oferecemos um tema para
reflexão: Em O Evangelho Segundo o Espiritismo,
Capítulo XIX, 2, Kardec analisa a expressão com que
Jesus se referiu à força da fé, dizendo-a capaz
de mover montanhas, como tendo significado alegórico. Diz
o Codificador que Jesus se referia às montanhas de incompreensão,
de ignorância, de dificuldades as mais diversas. Mas, será
que o Mestre estava mesmo usando alegorias? Afinal, não foi
Jesus o Espírito responsável pela criação
de nosso planeta inteiro, tendo movimentado com a força de
sua vontade as forças da natureza? Então por que tomar
como certo que Jesus estava sendo alegórico quando falou
que a fé seria capaz de mover montanhas?
Bem sabemos que ainda somos
Espíritos ignorantes esforçando-nos para melhorar
e que milhares, talvez milhões, de vidas nos separam da perfeição
dos Espíritos puros. Ao falar da fé que remove montanhas
não poderia Jesus estar falando de um estágio evolutivo
da fé que aqui na Terra ainda não nos é possível
conceber?