A desencarnação de Divaldo
Pereira Franco, ocorrida neste 13 de maio de 2025, representa um marco
histórico ao movimento espírita brasileiro e mundial.
Mais do que o encerramento de uma trajetória pessoal notável,
testemunhamos o fim de uma era caracterizada por médiuns cuja
projeção pública e longevidade conferiram ao Espiritismo
uma visibilidade e uma respeitabilidade únicas, embora não
isentas de tensões doutrinárias e desafios interpretativos.
Divaldo foi, sem dúvida, um dos
grandes nomes do Espiritismo do século XX e início do
XXI. Sua obra social à frente da Mansão do Caminho, sua
incansável atividade como orador e divulgador do pensamento espírita,
e a vasta produção mediúnica atribuída a
diversos Espíritos, notadamente a figura de Joanna de Ângelis,
colocaram-no numa posição de liderança moral e
intelectual junto a multidões. Por mais de sete décadas,
ele foi presença constante em tribunas, congressos, emissoras
de rádio, televisão e, mais recentemente, nas plataformas
digitais, difundindo mensagens de espiritualidade, ética e consolo.
No entanto, a relevância de sua
desencarnação transcende sua figura. Ela encerra simbolicamente
um ciclo do movimento espírita marcado por personalidades carismáticas,
por médiuns de projeção quase institucional, que
acabaram, de fato, se tornando referências interpretativas da
Doutrina, muitas vezes ocupando no imaginário coletivo um lugar
que, conforme advertia Allan Kardec, jamais deveria substituir o da
razão e da universalidade dos ensinos dos Espíritos. É
o ciclo de pessoas como Chico Xavier, de Yvonne do Amaral Pereira, Suely
Caldas Schubert, e agora, de Divaldo Franco, representantes de uma geração
que formou o imaginário espiritual de milhões, com todas
as virtudes e ambivalências que essa influência implica.
Todos, ainda que falíveis como qualquer ser humano, contribuíram
decisivamente para a divulgação do Espiritismo conforme
suas capacidades e limitações.
A morte de Divaldo convida ao exercício
da gratidão e reconhecimento sincero por sua dedicação
constante à causa do bem, por sua postura pública digna,
por sua ação filantrópica concreta e transformadora.
Diante do fim de uma era de grandes
médiuns, o Espiritismo tem a responsabilidade de buscar sua vocação
original: a de ser uma filosofia espiritualista baseada na razão,
na observação e no exame coletivo e metódico das
comunicações mediúnicas obtidas em toda parte e
por figuras anônimas. É hora do movimento espírita
revalorizar a obra de Kardec não como objeto de adoração,
mas como projeto filosófico em desenvolvimento, que exige estudo
sério, debate aberto e compromisso com a coerência entre
forma e conteúdo. Talvez a era das grandes figuras carismáticas
ceda lugar à era da coletividade lúcida, da pesquisa espírita
comprometida com a universalidade e da educação moral
baseada no esclarecimento, não na autoridade de figuras isoladas.
O retorno de Divaldo ao mundo espiritual,
com toda a serenidade que certamente acompanhará um Espírito
de tamanha entrega ao bem, deixa um legado que precisa ser respeitado,
mas não petrificado. O verdadeiro tributo que se pode prestar
a ele não está em santificá-lo, mas em compreender
que sua trajetória, com méritos e limites, pertence a
uma etapa do Espiritismo que cumpriu seu papel e agora cede lugar a
novos desafios. A maturidade do movimento se mede pela capacidade de
honrar seus nomes sem os canonizar, de acolher a emoção
da partida sem se afastar da razão crítica.
Que o próximo período
seja marcado, como propôs Kardec, pela razão aliada à
moral, centrado na educação do Espírito como processo
contínuo de emancipação interior. Enquanto isso,
despedimo-nos do caro Divaldo desejando um excelente retorno à
Pátria Espiritual.
Fonte:
https://educadorespirita1.blogspot.com/2025/05/alem-do-carisma-reflexoes-sobre-o-fim.html
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de Marco Milani
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