Depois de 15
bilhões de anos e alguns milhares de civilização,
aqui estamos nós. Desde o Big Bang, a evolução
continua, criando sempre estruturas mais complexas, das quais somos
o mais belo expoente, rumo a uma consciência universal.
As partículas, os átomos, as moléculas,
as macromoléculas, as células, os primeiros organismos,
as populações, os ecossistemas, e por fim o homem...
A evolução continua, mas desta vez é sobretudo
técnica e social. A cultura tomou o testemunho. Estamos num
ponto de viragem da história análogo ao do surgimento
da vida.
Após as fases cósmica, química e biológica
inauguramos o quarto capítulo do grande livro da vida, em que
a humanidade será protagonista no terceiro milénio.
Acedemos a uma consciência de nós próprios, que
se tornará colectiva.
Dizemos, com toda a modéstia, que estaremos a criar uma nova
fórmula de vida: um macrorganismo planetário, englobante
do mundo vivo e produções humanas. Seremos as células,
e ele também evolui. Tem o seu sistema nervoso próprio,
no qual a Internet é um embrião, e um metabolismo que
recicla os materiais. Este cérebro global, criado de sistemas
interdependentes, une os homens à velocidade do electrão,
revolucionando, assim, as imensas trocas culturais, intelectuais e
morais.
Não sendo uma selecção natural, mas sim cultural,
as nossas invenções e a nossa nova consciência
são as mutações darwinistas. No entanto, esta
evolução técnica e cultural progride muito mais
rapidamente do que a evolução biológica de Darwin.
O homem cria novas "espécies"; o computador cria
os satélites, a televisão, a rádio, o telefone,
o avião...
Agora, é o homem que faz a selecção darwinista;
não observamos o mercado, que selecciona, elimina e faz a escolha
dos mais aptos e capazes, das novas "espécies"? A
grande diferença é que o homem pode criar, no abstracto,
tantas "espécies" quantas desejar. Esta nova evolução
desmaterializa o homem. Entre o mundo real e o imaginário,
o homem inclui um novo mundo - o virtual -, que lhe permite elaborar
e testar objectos e máquinas que ainda não existem,
bem como explorar universos artificiais. Para espanto de todos nós,
ou não, esta evolução cultural segue a mesma
lógica da evolução natural das espécies.
A complexidade segue a sua obra, mas libertando-se,
a pouco e pouco, do pesado fardo da matéria. De certo modo,
reencontramos o Big Bang, a explosão de energia, muito semelhante
ao inverso do «ponto ómega», sendo uma implosão
do espírito liberto da matéria. E se abstraíssemos
o tempo poderíamos confundir os dois.
O homem deve ainda aperfeiçoar-se muito mais. Quando as células
se associam, alcançam uma individualidade muito maior do que
se estivessem isoladas. A fase da macrorganização comporta
um risco de homogeneização planetária, mas também
germes de diversificação. Quanto mais o planeta se globaliza
mais se diferencia.
As metáforas mecânicas, as engrenagens, os relógios,
dominaram o início do século. São agora as metáforas
dos organismos as mais pedagógicas, na condição
de não as tomarmos à letra. O organismo planetário
que criamos exterioriza as nossas funções e os nossos
sentidos: a nossa visão pela televisão, a nossa memória
pelos computadores, as nossas pernas pelos transportes... Mas mantém-se
de pé a grande questão: iremos viver em simbiose com
esse organismo planetário ou tornar-nos-emos parasitas destruidores
do hospedeiro, o que nos atiraria para graves crises económicas,
ecológicas e sociais?
Actualmente, drenamos, em proveito próprio,
recursos energéticos, informações, materiais;
e segregamos dejectos no meio ambiente, empobrecendo constantemente
o sistema que nos sustenta. Somos parasitas de nós próprios,
dado que algumas sociedades industrializadas travam o desenvolvimento
das outras.
Se continuarmos na via actual, acabaremos parasitas da Terra.
Num organismo existe um sistema de alarme e de cura. Se o organismo
se ferir, o corpo inteiro é mobilizado. É imperioso
criar um sistema análogo para o planeta. A ONU, e as inúmeras
associações humanitárias, já são
esboços desse sistema, mas precisamos de ir muito mais longe.
Aí está o papel catalítico do Espiritismo. Se
soubermos que existe um ente superior, que nos rege e orienta, que
a vida continua (a morte não existe), que a reencarnação
é um facto irrefutável, que a lei de causa e efeito
é uma realidade, e se conhecermos donde vimos, para onde vamos
e o que fazemos aqui, muitos de nós teremos comportamentos
diferentes perante a sociedade e o planeta.
Ora, a importância do Espiritismo está aí...
Hoje, não faz qualquer sentido, embora seja de louvar algumas
atitudes, por parte dos ecologistas e de todos aqueles que procuram
defender o planeta do homem, encerrar a variedade dos seres em guetos,
para criar reservas. Quando vemos os bosquímanos, ou ameríndios,
relegados para o que chamamos, muito cruelmente, «reservas»,
perguntamos quem somos nós para termos tal atitude, indigna
de um ser humano. Não serão essas prisões ou
reservas pequenas ilhas que nos oferecemos para nosso belo prazer,
até fazendo excursões turísticas para vermos
nossos semelhantes? Pensamos que estas populações não
têm outra solução, como vemos ao longo da história,
que não seja misturarem-se, genética e culturalmente,
connosco, ou então desaparecerão.
Hoje, observando os ainda masai - tribo africana, das margens da caldeira
de N'Gorongoro -, que passam a vida no meio dos leões, rinocerontes,
búfalos, etc., todos eles bichinhos não especialmente
ternos, compreendemos que se pode viver em paz com todos, e com o
meio.
Não deixemos que a nostalgia e a petulância nos invadam
a mente. Pensemos, isso sim, na importância de encontrarmos,
em conjunto, a harmonia e o equilíbrio entre a Terra e a tecnologia,
e entre a ecologia e a economia, para assim evitarmos crises. Deveremos
observar e estudar as lições que nos dá o conhecimento
sobre a evolução da complexidade. Compreender a nossa
história pode dar o recuo necessário, um sentido ao
que fazemos, e maior sageza. É inegável o crescimento
de uma inteligência colectiva, num humanismo tecnológico.
Aí está o Espiritismo para corroborar, ensinando, esclarecendo
e amando.
Cada vez mais estamos prestes a perder a diversidade: a cultura humana
torna-se cada vez mais homogénea, o mundo torna-se global,
o planeta mais pequeno. As pessoas viajam muito, quer física
quer virtualmente. Misturando-se, desta forma, as culturas, dá-se
o fenómeno da aculturação. O homem acumula um
conhecimento crescente, progride para um maior saber, uma maior liberdade,
para uma cultura mais complexa. Seguimos a mesma lógica da
matéria e da vida. A nossa história tem um sentido,
uma lógica; não acreditamos nem na contingência
nem no acaso, que aos olhos de alguns cientistas só parecem
intervir quando estudam períodos muito curtos.
As sociedades humanas organizam-se cada vez melhor. A pouco e pouco
temos a consciência do meio ambiente que nos rodeia e de nós
próprios. Vejamos a ONU. Estes organismos têm conhecido
inúmeras dificuldades. Considerando-se, porém, as coisas
com o devido distanciamento, descobre-se que o homem tomou consciência
da sua condição mundial em apenas 70 anos; o que é
isso, comparado com a nossa história?
A humanidade actual já chegou a um certo nível de reflexão,
embora nos pareça muito jovem. Numerosas dificuldades do nosso
tempo provêm do facto de muitas populações terem
apenas uma informação muito reduzida do mundo; mas a
providência divina não deixa as coisas entregues ao acaso,
já que o acaso não existe.
No limiar deste século o homem inventou duas maneiras de se
autodestruir: o excesso de armamento nuclear, atómico e biológico,
e a deterioração do ambiente.
Actualmente, coloca-se uma questão: estaremos capacitados para
coexistir com o nosso próprio poder? Se a resposta for não,
a evolução continuará sem nós. Como Sísifo,
teremos levado o rochedo até ao alto da montanha, para logo
de seguida o deixarmos escapar. É um pouco ridículo,
não é? Temos de ter plena consciência da gravidade
da situação presente, mantendo, contudo, o optimismo.
Temos de deitar mão a todos os nossos recursos, intelectuais,
culturais, tecnológicos e sobretudo morais, para salvar o planeta,
antes que seja tarde. Somos os responsáveis pelos danos causados,
quer activos quer passivos, e também seus herdeiros. É
a nós que compete fazer com que este delicioso planeta continue
vivendo, mas com saúde.
Estão reunidos todos os meios para que possamos (praticando
primeiro) transmitir que a fraternidade é, e será, a
pedra angular da felicidade humana e planetária.
Então regeneremo-nos, senão seremos como Sísifo.
Sejamos espíritas, no verdadeiro sentido da palavra.
A hora é de unidade fraternal - o saber amar.
Terminamos com uma mensagem psicografada por Divaldo Pereira Franco,
na Associação Cultural Espiritualista de Viseu, em Maio
de 1993, pelo espírito do dr. Adolfo Bezerra de Menezes: «(...)
Aqui estamos, em nome dos espíritas do Brasil e de Portugal,
pelo laço da fraternidade, para dizer-vos que antes de encarnardes
vos comprometestes com a construção da era nova e de
um mundo melhor. Obreiros da fé renovada, ide adiante, confiantes
e felizes, e o Senhor irá convosco.»