Vivemos uma época de paradoxos:
nunca se falou tanto em paz, mas nunca se ensinou tanto a guerra,
a grosseria, a brutalidade, a violência. Como é possível
criar uma sociedade pacífica, serena, nos modelos ensinados
por Jesus, por Buda, por Francisco de Assis, por Gandhi, se desde
a infância a criatura humana é submetida a um aprendizado
de violência por meio audiovisual em cores no cinema e no
lar? Observem-se os desenhos animados, plenos de exemplos de brutalidade,
de destruição, de desrespeito às coisas e à
vida, que são apresentados às crianças na televisão
e na internet. As cenas se sucedem, mostrando seres disformes, monstruosos,
criaturas que se combatem e se destroem de modo espetacular, arruinando
tudo o que está ao seu redor, através de socos, pancadas,
raios, explosões.
Pergunta-se como ensinar à
criança a paz, a tranquilidade, o respeito às coisas
e às criaturas, se lhe são apresentados exemplos que
a induzem exatamente ao contrário? O resultado dessa sementeira
de brutalidade e desumanização é visto todos
os dias nas estatísticas, que apresentam o crescente número
de desavenças, de agressões e de mortes.
Como será possível
a uma criança chegar à condição de adulto
sem tornar-se consumidora de alcoólicos, se a televisão
faz uma pregação insistente sobre o prazer de consumi-los,
em todos os horários, dentro dos lares, usando como pano
de fundo a euforia do futebol, a alegria do convívio humano?
Nesse particular, evidencia-se o imenso poder dos produtores de
bebidas alcoólicas, que não só conseguiram
manter sua propaganda na mídia, como ganharam o espaço
anteriormente usado pelos produtores de cigarros.
A batalha contra o fumo foi vitoriosa,
colocando o Brasil bem à frente de países mais desenvolvidos.
Entretanto, o fumo é bem menos lesivo à sociedade
do que o álcool. O dano produzido pelo fumo se restringe
quase que só ao seu usuário, enquanto que o do álcool
é capaz de destruir uma família inteira. Por que não
regulamentar a propaganda, a venda e o uso de alcoólicos
como se fez com o fumo? Mas apesar de o uso do álcool ser
muito mais danoso que o do fumo, não há legislação
que obrigue os fabricantes de bebidas alcoólicas colocarem,
nos seus produtos, avisos quanto aos malefícios do seu uso,
conforme é exigido nas embalagens de cigarros.
E, por falarmos em propaganda danosa,
o que dizer quanto à licenciosidade sexual, o que dizer sobre
as aulas de prostituição que entram nos lares, em
todos os horários? As cenas de intimidade vividas por casais
são apresentadas em novelas exibidas à tarde e à
noite. Alguns programas são apresentados em horário
mais avançado, dado o nível de sensualidade que apresentam,
mas as suas chamadas, os seus anúncios são feitos
em todos os momentos. Há programas que não apenas
são atentatórios aos bons costumes, à moral,
à ética, mas à própria dignidade humana,
onde se evidencia não só a licenciosidade, mas também
a ausência de pudor, de senso de privacidade, este, um dos
atributos que distingue o ser humano do restante da criação.
Há programas humorísticos que pregam abertamente a
promiscuidade, o desrespeito, o deboche, o uso do palavrão.
O aviltamento da mulher se tornou tão comum que é
olhado pelo viés humorístico. Há flagrante
apoio à mulher leviana, despudorada, em detrimento da nobre
figura da mulher-esposa, da mulher-mãe.
Mas, afinal, vivemos num país
que se diz cristão. Será que o Cristianismo é
para ser vivenciado apenas no interior das comunidades religiosas?
Será que se deveriam isolar do mundo aqueles que não
desejam compactuar com esse estado de coisas, ou lutar para que
o mundo se torne compatível com os ensinamentos do Cristo?
Se aqueles que desejam manter uma vida equilibrada, respeitosa,
pretenderem afastar-se do convívio com a sociedade, como
interpretariam a recomendação de Jesus, registrada
por dois evangelistas: "Eis que vos envio como ovelhas no meio
de lobos (...)" (Mt., 10: 16) e "Ide; eis que vos mando
como cordeiros ao meio de lobos." (Lc., 10: 3)?
Diante da recomendação
de Jesus, não devemos criar ilhas onde se viva cristãmente,
mas devemos trabalhar no sentido de cristianizar todos os lugares.
Como nos sentiríamos se, subitamente, aparecesse Jesus ao
nosso lado, quando nossas crianças estão vendo certos
desenhos, ou estamos assistindo a algumas dessas novelas, desses
filmes ou algum desses programas?
E o que estão fazendo as
religiões no sentido de despertar as criaturas para uma mudança
de atitude, a fim de que assumam sua real posição
diante do Cristo? Será que o papel das religiões é
levar seus fiéis a pensarem em Deus, ouvindo enternecidamente
comentários sobre os ensinamentos de Jesus, somente no interior
dos templos, em momentos sagrados? Mas Jesus nunca separou a vida
em momentos sagrados e momentos profanos. De acordo com os Seus
ensinos, os princípios éticos e morais devem permear
todos os atos da vida, em todos os ambientes. Portanto, é
premente a necessidade de se despertar o homem para o esforço
de proceder de conformidade com esses ensinamentos, em todas as
circunstâncias da vida, conforme Ele ensinou e exemplificou.
Logo, as religiões devem esclarecer o homem no sentido de
não esperar o Céu depois da morte, mas de construí-lo
aqui, em todos os ambientes, principalmente dentro de si mesmo,
desde agora.
E como estamos procedendo nós,
espíritas, nesse cenário caótico em que vivemos?
As casas espíritas estão promovendo reflexões
sérias que nos levem a nos situarmos na vida como Espíritos
imortais temporariamente encarnados? Estamos tendo oportunidade
de avaliação das propostas da televisão, do
cinema, do teatro, da literatura ante nosso futuro no Mundo Espiritual?
Lembremo-nos de que, se o Espiritismo
não nos atemoriza com o Inferno, também não
nos oferece um Céu conquistado sem esforço no Bem.
A verdade é que também nós estamos um tanto
acomodados diante do panorama atual, pois raras vozes se erguem
para denunciar esse tremendo antagonismo entre o que nos oferece
a mídia, e as diretrizes de conduta ensinadas no Evangelho.
Portanto, diante dessa ruína moral que se vê na atualidade,
é de se perguntar onde estão as vozes dos condutores
de almas, onde estão as vozes das religiões que silenciam
diante de tanta ignomínia? Será que aguardam a volta
de João Batista?