A clareza de Kardec é notável. Seus argumentos, a fundamentação
moral que utiliza em seus comentários e a fidelidade aos princípios
norteadores do Espiritismo são, sem dúvida, sua grande
marca pessoal, acrescidas de sua grande inteligência e dedicação
a causa que sinalizam a grandeza de sua missão.
Em discurso na renovação do ano social,
proferido a 1º de abril de 1862, na sede da
Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, e publicado na Revista
Espírita, edição de junho de 1862 (1), entre
valiosas e oportunas considerações, detemo-nos na apreciação
da Autoridade da Experiência.
Antes de quaisquer comentários, transcrevemos
trecho parcial do discurso:
“(...) coloca-se naturalmente uma observação importante
sobre a natureza das relações que existem entre a Sociedade
de Paris e as reuniões, ou sociedades, que se fundam sob os
seus auspícios, e que erradamente se consideraria
como sucursais. A Sociedade de Paris não tem sobre
elas outra autoridade senão a da experiência;
mas, como disse em outra ocasião, ela não se imiscui
em nada nos seus negócios; seu papel se limita a conselhos
oficiosos, quando lhe são solicitados. O laço que as
une é, pois, um laço puramente moral, fundado sobre
a simpatia e a semelhança
das idéias; não há, entre elas, nenhuma
filiação, nenhuma solidariedade material; uma só
palavra de ordem é a que deve unir todos os homens: caridade
e amor ao próximo, palavra de ordem e que não poderia
levar desconfiança. (...)”
Que exemplo! Que coerência! Que fidelidade
à própria Doutrina Espírita!
Notemos o detalhe de determinado trecho: conselhos
oficiosos, quando lhe são solicitados. Eis o princípio
da democracia, do respeito à liberdade alheia e mesmo o espírito
da unificação, tão defendido e necessário
em nosso movimento.
O exemplo partiu do próprio Codificador, ao
referir-se à Sociedade por ele mesmo fundada. Autoridade apenas
da experiência de instituição mais antiga, digamos.
Laços fundados na simpatia de vistas, puramente morais. Sem
quaisquer outras filiações oficiais. Apenas o princípio
basilar norteando os relacionamentos e intercâmbios: caridade
e amor ao próximo.
Vejamos que as dificuldades do movimento originam-se
da tentativa de imposição de idéias, prática
totalmente incoerente com a índole do Espiritismo, por si só
respeitador da individualidade e da liberdade de quem quer que seja,
inclusive de instituições fundadas e mantidas sobre
sua própria inspiração.
Eis o fundamento de união dos espíritas
e das sociedades inspiradas pelo Espiritismo.
(1) Edição IDE-Araras-SP, tradução
de Salvador Gentile, março de 1993, páginas 161 a 170.