por Rodrigo Queiroz
– Revista Umbanda Sagrada
Na prática da Umbanda, a oferenda é um
dos atos mais sagrados de conexão entre fiel e Divindade.
Toda religião tem sua prática ofertatória,
quer seja uma fruta no Congá ou até uma nota de R$ 10,00
no envelope. Não importa, este é um ato de oferta, um
ato de fé e cada religião tem a sua leitura própria
de como deve ser esta prática.
Nas religiões naturais, de culto a Deus e Divindades
na natureza, no geral estas religiões tem como pratica ofertatória
a oferenda daquilo que vem da natureza, ou seja, flores, frutos, grãos
etc.
A Umbanda é uma religião natural, ela
entende a natureza física como pontos de força, santuário
natural, sítio sagrado ou mesmo casa dos Orixás. E encontramos
variadas formas de oferendas, tem oferenda para tudo, para energização,
para descarrego, para abertura de caminhos, para prosperidade, para
amor e por aí vai. O fato é que oferenda está presente
no dia a dia do Umbandista.
Já que é tão comum o ato ofertatório
e prioncipalmente depositado na natureza ou nos pontos de força,
como: cachoeira, mata, bosque, mar, encruzilhada... Fica a pergunta:
o Umbandista foi sendo preparado para ter consciência
ambiental ?
Nunca se falou tanto em meio ambiente, efeito estufa,
caos planetário como nestes últimos anos. Todavia se não
fosse algo tão sério não se falaria tanto. Claro
que podemos ajudar muito fazendo cada um a sua parte, como diminuir
o tempo do banho, selecionar o lixo, diminuir o uso do carro, etc.
Mas é realmente preocupante o que fazem por aí
os Umbandista e demais religiões quando entram na natureza para
uma prática sagrada e acabam profanando o espaço sagrado.
É isso mesmo, profanando !
Você já observou a quantidade de lixo que
fica no pé da árvore ? Na beira do rio ?
Assustado ? Como é que falo lixo ???
Sim, é lixo mesmo !
Este artigo vai ser assim mesmo, um tanto indigesto,
é para provocar náuseas e quem sabe ao final, no seu vômito,
você comece a evitar que os Orixás continuem tendo que
tolerar nosso lixo.
Vamos à parte prática. Reflita comigo,
ok ?
O conceito de oferenda é o ato religioso de interação
do fiel com seu guia, Orixá e forças da natureza. Energeticamente
o prana das oferendas é usado em beneficio de quem oferenda ou
pra quem se destina, ou seja, quando uma oferenda é feita para
terceiro. Magísticamente é a movimentação
de energias e elementais em beneficio próprio ou de outrem. Isso
é a síntese pratica de como funciona a oferenda. A Umbanda
é o culto à natureza e na oferenda colocamos tudo que
é natural.
Partindo deste pressuposto fica claro que o conjunto
geral da oferenda deve ser um ato salutar para todos os envolvidos,
ou seja, o fiel, a natureza e o Orixá. Pense, os pontos de força
naturais são as casas dos Orixás, como a mata está
para Oxossi, o mar está para Iemanjá, as cachoeiras estão
para Oxum, as pedreiras para Xangô, etc.
Oferendar também é uma forma de presentear.
Você gosta de receber presentes e eu também, porém
no final a embalagem jogo no lixo e fico com o que é usual no
presente.
Sejamos práticos e objetivos. O saquinho plástico
não é oferenda. A garrafa não é oferenda.
Os descartáveis não são oferendas. O que é
oferenda?
As flores, frutos e comidas.
Se a Umbanda vê a natureza como sagrado, logo
deve preservá-la. Todo cidadão precisa de uma consciência
ecológica para o exercício da cidadania, mas com o Umbandista
a coisa vai mais longe, ecologia é preceito religioso, e isso
significa muita coisa.
O respeito com a diversidade ritualística que
encontramos em nossa religião não pode ser confundido
com tolerância aos abusos. Porem antes de julgar precisamos orientar.
Sei que existem muitos conceitos sobre oferendas e postura
dentro dos campos sagrados. Certa vez me falaram que tudo que entra
na mata não pode sair, ou seja, aquelas dezenas de sacolinhas
plásticas que serviram apenas de condutores materiais, tinham
que ficar lá. Os copos plásticos, garrafas e bandejas
de isopor também. A justificativa: não tirar carrego da
mata !
Oras, ou aquele lugar é sagrado e como tal é
benéfico, ou é profano e prejudicial, temos que definir
isso na mente.
Pelo lado energético ou pergunto: o que vai me
atrair negatividades. São as sacolinhas que por sinal são
isolantes ou minha vibração mental e emocional ?
Se é a opção dois então
qualquer ambiente me fará mal, certo ?
Então vamos descartar esta obrigatoriedade de
poluir o espaço sagrado. Até porque esta pratica é
mais atual do que parece.
Os antigos zeladores do culto de nação
e vertentes afros, anterior á Umbanda ensinavam que as oferendas
deviam ser depositadas sobre folhas de bananeira, chapéu-de-couro
( erva ) ou folhagens do Orixá ofertado. Isso é sabedoria
natural, não existiam ainda campanhas ambientais. Mais que isso,
eles ensinavam que para natureza só vai o que ela ofertava. Os
elementos orgânicos se decompõem no solo e viram adubo,
muitas vezes as sementes brotam e uma nova vida nasce naquele ambiente.
Contudo, hoje não vemos isso, o que encontramos
são garrafas estilhaçadas ao redor de árvores,
panos nobres servindo de toalha para o “ banquete divino “
e muitos descartáveis que não oferecem nenhuma utilidade.
Além de cuidar do meio ambiente, precisamos zelar
pela boa imagem da religião. Pois, para aqueles que não
são adeptos, quando chegam em ambientes com estes “ restos
“, criam uma imagem bastante distorcida do real significado das
oferendas.
Questão de Postura
Há algum tempo foi notícia em Porto Alegre
– RS uma oferenda na beira do rio Guaíba contendo 77 cabeças
de bode, claro que sabemos que não tem nada de Umbanda nisso,
mas não foi isso que a mídia local divulgou. Também
em Curitiba – PR foi pribido a entrada de Umbandista para pratica
de oferendas numa reserva florestal, devido ao excesso de lixo não
orgânico deixado na natureza e nem preciso citar as milhares de
encruzilhadas diariamente forradas por elementos nada agradáveis.
Muitas vezes estes excessos provém da Umbanda,
no entanto já foi manchada a nossa imagem e precisamos de postura
real e firme, no dia – a – dia do fiel Umbandista, aliado
a divulgações e mídias como que realmente a Umbanda
se porta á natureza.
Em São Paulo capital, dois cemitérios
ganharam há seis anos um Santuário de Obaluaiê /
Omulú para os fiéis promoverem seus cultos e oferendas.
No enttanto tivemos notícia que estes espaços serão
desapropriados devido a depreciação do ambiente e a quantidade
diária de animais mortos despejados ali.
Precisamos erradicar o contra – senso da má
prática ofertatória. Para só depois conseguir mudar
a imagem social.
Fazendo a Diferença
Foi preocupado com a violência urbana, privacidade
e meio ambiente que o Sr. Pai Ronaldo Linares, presidente da Federação
Umbandista do Grande ABC fundou há 30 anos o Santuário
Nacional da Umbanda, um espaço que na origem era uma
imensa pedreira e terra seca, hoje todo reflorestado com árvores
tópicas, cachoeiras, rio e uma imensa área verde. O Umbandista
tem toda liberdade e privacidade para realização de seus
cultos e oferendas, inclusive em praças específicas para
cada Orixá ou linha de trabalho. Hoje, 263 terreiros estão
construídos nesta área e há 40 lotes disponíveis
para aluguel diário aos interessados em fazer trabalhos na natureza.
É aberto ao público geral sem restrições.
Lá sim, você pode fazer uma oferenda com
panos, pratos, descartáveis, vidros etc, pois o Santuário
conta com uma equipe de funcionários responsáveis pela
limpeza, a coleta é seletiva, o que é reciclado tem seu
destino certo, o que é orgânico vira alimento para o minhocário
que produz o adubo utilizado para o plantio de 300 mudas mensais e faz
parte do reflorestamento da Mata Atlântica que o Santuário
mantêm.
Pai Ronaldo informa que o Santuário tem um compromisso
muito sério com o meio ambiente, por isso são feitas três
coletas semanais de lixo, totalizando uma média de 8 a 10 toneladas
de puro lixo. Não está incluso nesta conta os recicláveis,
orgânicos e alguidares. Em épocas de festa chega coletar
quase o dobro disso. Todo esse lixo vem das 2 a 3 mil pessoas que freqüentam
semanalmente o Santuário.
O mais interessante é como se aproveita a maioria
dos materiais que seriam lixo. Os alguidares são limpos e triturados
para servirem de cascalho nas estradas internas do parque. Louças,
pratos, copos etc, também são limpos, desinfetados e defumados
pela Mão – de – Santo, Dona Luiza, que separa tudo
e encaminha para várias instituições de caridade.
Já os recicláveis são selecionados
pelos funcionários que dividem o lucro da venda destes produtos,
que não é pouco, sai um caminhão por mês
cheio de garrafas e até duas toneladas de plástico, papel
e latas, se juntássemos tudo isso, o peso seria em média
de 25 toneladas ao mês de “lixo", evitado de ser despejado
e destruir a natureza.
Próximo a cachoeira uma placa alerta os visitantes:
“O lixo traz o rato, o rato traz a cobra, a cobra
traz a morte”. A limpeza das oferendas é
feita sempre com o prazo mínimo de 24 hs após ser arriada.
“O Umbandista não precisa de uma catedral como só
o gênio humano é capaz de construir. So precisa de um pouco
de natureza, como Deus foi capaz de criar" - frisa
Pai Ronaldo.
Em Juquitiba, também interior de São Paulo,
a União de Tenda de Umbanda e Candomblé do Brasil,
presidida pelo Sr. Pai Jamil Rachid, construiu o Vale dos Orixás
com o mesmo fim, porém, restrito aos filiados da federação.
Pai Jamil afirma que, por mês, cerca que 2.000
filiados utilizam este espaço.
Em Bauru – SP, a Federação
Umbandista Reino de Oxalá, presidida por Sr. Pai Rubens
Amaro, há oito anos fundou o Vale dos Orixás.
Infelizmente pelo tamanho do nosso corpo religioso são
poucas as iniciativas para “ privatizar" santuários
naturais e trazer conforto, segurança e ecologia para nossa comunidade.
Mas se você reside distante destes espaços
se adapte e faça a diferença.
Dicas de Bom Senso
De forma geral os Umbandistas se utilizam da natureza
pública, poucos tem acesso aos recintos privados, como citamos.
Portanto, todos nós podemos adotar atitudes simples que resultam
em grande impacto.
Quando chegar no ponto de força da natureza e
definir onde irá arriar sua oferenda, priorize forrar o chão
com as folhagens do ambiente. Coloque os elementos e comidas sobre as
folhas. Dispense pratos ou coisas do tipo. Os líquidos coloquem
em copos descartáveis. Acenda as velas e prepare tudo.
Não há resultado em oferendas feitas às
pressas, lembre – se que este é um ato sagrado e com dedicação
deve ser ministrado. Então, faça as preces, cantos e pedidos
com tranqüilidade. Normalmente na natureza em 30 a 40 minutos as
velas já queimaram, ótimo. Recolha as borras e coloque
no lixo. Antes de sair, jogue o líquido dos copos ao redor da
oferenda, os descartáveis vão pro lixo. Faça o
mesmo com garrafas e demais elementos. Certifique – se que ficará
na natureza apenas material não poluente.
Seguindo esse preceito deixaremos de agredir a natureza
sem perder o ato sagrado e ainda alegrar o Orixá. Não
apóie velas no tronco das árvores, você pode matá
– lãs. E lembre – se: LIXO NO LIXO !
Conceitos de Oferendas e a Natureza
No livro Rituais Umbandistas de Rubens
Saraceni, pela Editora Madras, o autor cita na página
21 que “ o ato de fazer uma oferenda ritual a um guia espiritual
em um ponto de força abre – lhe a possibilidade de recorrer
à própria hierarquia e às forças da natureza,
tanto para auxiliarem seu médium como para socorrerem as pessoas
que atender. “ Ele ainda complementa que “ a oferenda ritual
atua como uma chave de abertura e de religação do médium
com o Orixá...”
O espírito Ramatís
no livro A Missão da Umbanda, editora do Conhecimento,
na página 94 elucida que “na cosmogonia das religioes africanistas,
especialmente a ioruba, o ato de “arriar “ uma oferenda
estabelece e perpetua uma troca de força sagrada entre dois mundos:
o divino oculto e o profano visível; tudo é energia e
tem mais afinidade com este ou aquele Orixá. Essa energia deve
estar sempre em movimento em ambos os sentidos: entre o plano concreto
– material e o invisível – astral. Assim como a água
em seu ciclo sucessivo de chuva, evaporação, resfriamento
e degelo, a dinâmica de transferência energética
é considerada essencial e parte da vida. “
Observamos dois autores que ao tratar das oferendas
convergem no mesmo ponto. A grandiosidade e sacralidade da oferenda
e dos pontos naturais.
Tempo de Indigestão da sua Oferenda
Material |
Tempo de Degradação |
Alguidar |
Indeterminado |
Louças ( Ibás ) |
Indeterminado |
Lata de Alumínio |
200 a 500 anos |
Vidro |
Indeterminado |
Isopor |
Indeterminado |
Metal |
100 anos |
Garrafa Pet |
400 anos |
Copo de Plástico |
50 anos |
Bituca de Cigarro |
5 anos |
Papel |
3 a 6 meses |
Pano |
6 meses a 1 ano |
Sacolas Plásticas |
100 anos |
Tampinha de Garrafa |
150 anos |
Palito de Fósforo |
6 meses |
Espero que a ajuda tenha sido de bom proveito
para todos os irmãos.
Abraços e um grande Axé
Rô de Aruanda
Leiam de Rodrigo Queiroz
Breve
ensaio sobre a crença pós morte e funeral na Umbanda
Função
das oferendas
Ética
Lixo Umbandista
Mediunidade
atrapalha?
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