Espiritualidade e Sociedade



Pierre-Gaëtan Leymarie

>   Resposta a Alexander Aksakof

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Pierre-Gaëtan Leymarie
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Uma controvérsia com Leymarie
por Vital Cruvinel

No dia 8 de outubro de 1875 foi publicado no periódico britânico The Spiritualist um artigo escrito pelo editor da Revista Espírita Pierre-Gaëtan Leymarie em resposta ao artigo do pesquisador russo Alexander Aksakof publicado dois meses antes no mesmo periódico.

Nesta época Leymarie estava foragido na Bélgica para evitar sua prisão por conta do Processo dos Espíritas no qual ele foi condenado por cumplicidade na fraude de fotos de espíritos obtidas pelo fotógrafo Buguet e pelo médium Firman. Há indícios no próprio texto de que o artigo tenha sido escrito em conjunto com outras pessoas; em alguns trechos Leymarie é referido em terceira pessoa.

por Vital Cruvinel

 


O artigo do Aksakof apresenta duras críticas a obra e a pessoa de Kardec
-> link para o artigo de Aksakof - clique aqui -

Neste link - Uma controvérsia em detalhes - Vital detalha e contextualiza as fontes de sua pesquisa e da controvérsia.

 

O periódico
O artigo foi publicado no influente semanário britânico "The Spiritualist (ou The Spiritualist Newspaper)" que permaneceu em circulação de 1869 a 1881. Era editado por W. H. Harrison e fazia parte da British National Association of Spiritualists que mais tarde se tornou a
Society for Psychical Research.

A tradução do Livro
O Livro dos Espíritos tinha acabado de ser publicado na língua inglesa com tradução da Anna Blackwell, amiga do casal Rivail. Até então esta obra já tinha sido traduzida a mais de uma década para o alemão e para o espanhol. E o opúsculo O Espiritismo em sua Expressão mais Simples em alemão, polonês, português, grego, italiano, e espanhol, mas menos em inglês.

Anna Blackwell também respondeu a Aksakof:

veja neste link - clique aqui 

 

Editor da "Revista Espírita" sobre Allan Kardec

Excelentíssimo senhor, tendo folheado recentemente alguns dos principais periódicos espiritualistas de sua cidade, eu fiquei extremamente surpreso ao descobrir que, nesta crise, quando todos nós (Espíritas ou Espiritualistas) deveríamos estar unidos, a fim de resistir e repelir os ataques de nosso inimigo comum, o espírito do mal está disseminado; e isto quando se está perfeitamente consciente da influência irresistível e perniciosa exercida neste país por uma determinada parte do clero, quando você mesmo, tratando do tema do processo, falou do senhor Leymarie e senhor Firman como sendo as vítimas desta parte que, nesta crise, eu repito, você abre as colunas de seu influente jornal para todos aqueles que procuram depreciar a memória de Allan Kardec por calúnias mesquinhas e insinuações desprezíveis, sabendo, como você provavelmente sabe, de que fonte elas vêm. Para mim é muito doloroso ver tais alegações errôneas divulgadas pelos impressos públicos, e permita-me, senhor, assim espero, defender a honra da memória de um homem dos mais honrados e injuriados.

Um sentimento de respeito e veneração aos que partiram, e especialmente àqueles cujas vidas foram consagradas à realização de tudo que é bom e grandioso, sempre foi reconhecido como inerente à nação inglesa, e assim ela pode se orgulhar de tal nobre sentimento. Na França, é costume atacar a reputação de todo homem célebre, cujos serviços não forem oferecidos à Igreja como manda a lei vigente. Ridicularizá-lo, torná-lo desprezível, manchar o seu bom nome, nada é poupado para esse efeito, nem a utilização de linguagem vil, nem os repetidos e simultâneos ataques destes dois grandes órgãos de fanatismo e Jesuitismo, o Univers e o Figaro.

Os senhores Dirckinck Holmfeld e Aksakof estão pelo menos familiarizados com Allan Kardec? Não, no mínimo. Eles simplesmente repetem as calúnias que nunca deveriam ter escutado. É fato bem aceito que um homem de talento, o senhor Piérart [1], e outros, cujos nomes seria inútil mencionar, se dão o trabalho de circular estas falsidades, que, naturalmente, impressionam os estrangeiros em Paris, que tomam muito pouco cuidado em descobrir a verdade, e se limitam a repetir o que foi comunicado a eles. Não temos a honra de conhecer pessoalmente o senhor Piérart, mas não sairíamos mundo afora dizendo qualquer inverdade, ainda que, estivéssemos em campanha contra ele, mas nem a centésima parte das calúnias inventadas por ele contra Allan Kardec, tanto durante sua vida como após ter sido remetido ao túmulo, que era incapaz de se ressentir de uma injúria, e cuja vingança consistia apenas em dizer todo o bem que ele poderia encontrar no seu mais implacável inimigo!

Ser contrário a certos estudos ou a certas doutrinas, é perfeitamente compreensível e natural. Diferentes homens terão, necessariamente, que buscar a solução de muitos problemas diferentes, e cada um deles buscando a verdade (ou o que ele considera como tal) vai inevitavelmente aumentar a importância desse assunto que é mais freqüentemente chamado a investigar: a harmonia é o resultado da variedade, tanto no mundo físico quanto no espiritual. Esse sistema filosófico do senhor Dirckinck Holmfeld deve ser incompreensível para aqueles cuja apreciação ele está a espera, como deve ser incompreensível para nós, o que isso significa? Será que prova alguma coisa contra uma reputação científica e literária altamente valorizada na Dinamarca? porque ele não pode explicar facilmente suas teorias na língua francesa, deveríamos condenar a priori? Seria absurdo, e ele certamente possui o direito de formular suas idéias e dar-lhes publicidade (ele deve encontrar leitores); ele também não deve reivindicar o direito de pegar pedaços estranhos e trechos de escândalo, e tê-los inseridos nos jornais ingleses?

Que o senhor Piérart possa escrever livros, e influenciar a mente de muitos por uma vigorosa argumentação, concisa e lógica, é seu dever e seu direito. Nós podemos examinar suas obras com satisfação infinita para nós mesmos, mas, certamente, sem cuidar de saber o que era ou o que ele fez dez ou vinte anos atrás. Temos de lidar apenas com as suas idéias, e nunca se enveredando em bisbilhotar a vida privada ou ações de qualquer homem.

Que o senhor Aksakof, um eminente membro da sociedade, como é dito, e um pioneiro da nossa causa, possa recolher os materiais necessários para a propagação da verdade; que ele possa acabar com os velhos hábitos e com os desgastantes preconceitos científicos, diremos: bravo, senhor Aksakof! Estaremos entre os primeiros a aplaudir e agradecer-lhe; nós te honramos pelo que você tem feito, pelo o que há de fazer, mas não podemos nos rebaixar investigando a sua vida passada.

Estes senhores têm se unido com o propósito de atacar não só o fundador do Espiritismo, mas também a doutrina da reencarnação, e sua antipatia a ela, certamente os levou longe demais. Permitam-me dar-lhes uma breve e resumida exposição da biografia de Allan Kardec.

Allan Kardec (Léon Hyppolite Denizard Rivail), de uma antiga família, com tradição na magistratura e na advocacia, foi um dos mais eminentes discípulos de Pestalozzi, em Yverdon, na Suíça. Pestalozzi, o grande pensador, o profundo filósofo, o homem da ciência e do progresso, que exerceu uma influência tão grande sobre a reforma da educação na França e na Alemanha; Allan Kardec se tornou um de seus alunos mais ilustres e, posteriormente, seu colaborador. Italiano, Inglês e Alemão, ele escrevia e falava perfeitamente; ele era um bom estudante de Latim, e traduziu várias obras para a língua alemã, e dentre elas, as de Fénelon; Membro da Academia de Arras em 1831 ele recebeu a medalha de honra pela sua dissertação "Qual sistema de estudos é mais adequado para o desenvolvimento social e intelectual de nossa época?"

Em um estabelecimento de ensino, fundado por ele na Rue de Sèvres, em Paris, ele ensinou, durante cinco anos (1835-1840), química, física, anatomia e astronomia. Ele também deu palestras gratuitas durante o mesmo período, ele foi o inventor de um método engenhoso de aprender a contar, e também de um quadro mnemônico para fixar na memória as datas de fatos históricos e descobertas notáveis, ele também era membro de diversas sociedades científicas.

O senhor Rivail era um homem de mérito próprio; era muito íntimo de Alvarez Levi, e elaborou conjuntamente com ele as palestras que foram assistidas pelos jovens aristocratas e estudiosos de Paris. Do senhor Rivail nós devemos: 1 "Um Plano proposto para a Melhoria da Instrução Pública" (1828), 2 "Curso Teórico e Prático de Aritmética" (1839), 3 "Gramática Francesa Clássica" (1831), 4 "Manual dos exames para diplomas de capacidade, e soluções de questões e problemas de aritmética e geometria" (1846), 5 "Catecismo Gramatical da Língua Francesa" (1848), 6 "Programação dos cursos normais de Química, Física, Astronomia, Fisiologia" (da qual foi professor no Liceu Polymathic), 7 " Exercícios para os exames, no Hotel de Ville e da Sorbonne, com Ditados sobre Dificuldades Ortográficas" (1849). Estas várias obras, ainda muito prezadas, estiveram em alta conta no momento de sua primeira publicação. Em 1868, o senhor Rivail teve novas edições de sua publicação, e seu nome era bem conhecido e merecidamente, não entre os escritores sensacionalistas, ou participantes da literatura simples, mas para os homens de letras e homens de bom senso, que gostariam de ver o conhecimento útil difundido por toda a parte.

A senhora Amelia Boudet, de uma família rica e respeitável, trouxe um dote de 80.000 francos ao marido, senhor Rivail. Com a morte deste, o montante de 80.000 francos não paga o imposto sobre herança (droits de succession). É extremamente fácil de verificar o fato. Após seu casamento, senhor e senhora Rivail emprestaram grandes somas aos amigos, que, em conseqüência de falhas e outras circunstâncias imprevistas, nunca os reembolsaram. Um deles, o gerente de um teatro (Les Folies dramatiques), recebeu 50.000 francos, o resto de sua fortuna, e quando este montante estava em perigo, o senhor Rivail foi obrigado a superintender os assuntos pecuniários do teatro, a fim de se salvar do último naufrágio de sua fortuna. A partir desta circunstância muito natural seus inimigos querem nos fazer crer que ele tinha sido um vendedor de entradas de teatro. O nome do gerente, guardaremos em segredo, de acordo com os últimos desejos de Allan Kardec, que o perdoou no seu leito de morte. Após a perda total de sua fortuna, a senhora Rivail criou uma escola para jovens moças; o marido se tornou contador de diversos estabelecimentos de grande porte, e, entre outros, para o escritório do jornal Univers. Manteve, assim, honrado com o produto de seu suado salário em várias casas diferentes. Que infelicidade é esta de trabalhar para esta função? E foi ele um colaborador do Univers porque se debruçou sobre livros contábeis duas horas por dia? Pode um único artigo ser produzido como prova de que ele seja o contrário do que era, um amante da liberdade, do progresso e da justiça; um inimigo do fanatismo e da superstição em todas as suas formas? Como ele foi enterrado? "Mas, caluniam, caluniam", diz Basílio, "algo que sempre virá do mesmo". A senhora Allan Kardec, já possuidora de uma pequena propriedade, em que ela vive, e que veio a ela como herança de família, mas tem uma pequena renda de menos de duas centenas por ano, não obstante os incansáveis trabalhos ao longo da vida de seu falecido marido. Desde 1840 o senhor Rivail era sempre um membro do júri e era eleito presidente na maioria das vezes. Agora, é perfeitamente sabido que, para ser um jurado deve-se estar na posse de seus direitos civis e políticos, nunca ter sido objeto de qualquer sanção, condenação, etc. O leitor inglês tem muito bom senso para não concordar com que o Barão Dirckinck Holmfeld impôs sobre à credulidade do verdadeiramente estimável senhor William Howitt, quando ele lhe pediu para publicar afirmações tão equivocadas na Spiritual Magazine.

Ah, senhor Aksakof! você tem muitas responsabilidades. Como o senhor Dirckinck Holmfeld, você dá ouvidos aos caluniadores, e ainda assim nós temos uma causa em comum. Você deveria ter usado sua influência para promulgar a doutrina do amor fraterno, mas ao invés disto tenta nos desunir. O princípio da reencarnação não é do seu gosto; ora, refute-o calmamente, desapaixonadamente, filosoficamente, sem recorrer a meios tão mesquinhos como calúnias e sarcasmo. Homens de grande erudição e talento acreditam nela, e não vão mudar sua maneira de pensar a menos que você lhes dê razões plausíveis para tal. Nossos adversários parecem ter lido Allan Kardec de forma muito superficial, e sua opinião quanto à elaboração do Livro dos Espíritos é totalmente equivocada.

O senhor Rivail começou a estudar o magnetismo animal, em 1830, e continuou as suas investigações com esse espírito de imparcialidade e solidez de julgamento que seus contraditores parecem desejar. Em 1850 ele já havia analisado uma quantidade de documentos, e fez muitas observações interessantes sobre o assunto; durante vinte anos ele estudou os fenômenos do magnetismo de todas as formas; durante vinte anos, você entendeu!

A senhorita Japhet, as madames Roger, Bodin, muitas sonâmbulas e médiuns, como a senhorita Huet, senhorita Dufaux [2], senhora Robyno, e centenas de outros foram e ainda são, bem adaptados aos temas de estudo para um magnetizador inteligente; cada um deles tem suas qualidades especiais e suas imperfeições. Considerados separadamente e individualmente, o resultado das pesquisas de um magnetizador não seria, talvez, grande coisa; considerados coletivamente, e submetidos a entrevistas de um questionador lúcido, sensato, e capaz, que sabia como separar os bons grãos dos maus, que passou a trabalhar como somente um experimentador experiente poderia, o diamante precioso da verdade foi extraído da mina escura, e dado à luz do dia. Em 1855 [3], o Livro dos Espíritos foi publicado pela primeira vez, muitos acréscimos foram posteriormente feitos a ele até o ano de 1858 [4], quando ele apareceu em sua forma completa, como nós o temos no momento: 100.000 cópias dele foram publicados e traduzidos em todas as línguas. Allan Kardec quis afirmar alguma vez que o Livro dos Espíritos ou o Livro dos Médiuns saíram de sua pena? Nunca. Elas são o fruto de seres sobrenaturais que fizeram uso dos instrumentos considerados mais úteis para esse fim, para nos transmitir as suas instruções. Eles escolheram Allan Kardec, porque ele era um homem de bom senso e discernimento, para presidir as sessões espirituais, exatamente como seus colegas o escolheram em todas as ocasiões particulares, ou em todas as matérias de peso, para ser seu presidente ou o seu árbitro. Allan Kardec não inventou a reencarnação, o princípio sempre existiu, sempre teve inúmeros e eminentes adeptos, nos tempos antigos e modernos; não teria ele repetido isto várias vezes? e como poderia o senhor Aksakof empregar um argumento tão fútil e tão falso?

Por que deveria o senhor Kardec tomar um maior conhecimento da senhorita Japhet do que de outros médiuns e sonâmbulos que ele mesmerizou, e que todos reinvidicam a sua participação na compilação do Livro dos Espíritos? Todos eles são igualmente modestos e despretensiosos. O senhor Leymarie, que desde o ano de 1858 tem sido considerado um bom médium escrevente, acharia um absurdo que ele fosse reivindicar qualquer parte desse trabalho, porque, em verdade, as comunicações do espírito viriam através dele. Não! tais ensinamentos pertencem de direito àqueles de quem eles emanaram, aos nossos irmãos mais velhos na seara espiritual, e todos nós deveríamos nos considerar muito felizes por termos sido escolhidos como instrumentos para a melhoria dos nossos semelhantes.

Quem pensaria em jogar a senhorita Japhet, ou qualquer outro médium, ao esquecimento? Todos eles foram úteis em seu caminho em um determinado momento, mas o que acharia da idéia de colocar uma dúzia de seus nomes no topo de cada parágrafo? Não seria simplesmente absurda? Lamentamos que o senhor Aksakof tenha feito uso de argumentos tão pueris; se ele iria derrubar o colossal monumento cimentado pelo trabalho de um grande e nobre espírito, que ele escreva um trabalho próprio, aquele que irá iluminar nossas trevas, e "nos leve de fora da sombra da morte para os portões da vida", se puder.

Estão igualmente equivocados os que acusam os espíritas de estarem ligados a certos ritos, dogmas, etc. Não, eles são homens de mentes livres e independentes, em busca da verdade, os inimigos de todos os enganos e prestidigitações, cujo tempo é gasto estudando os fenômenos do Espiritualismo, e não sobrevoando o mundo, como o senhor Aksakof, para recolher uma porção de fofocas, e em seguida, recontar-lhes gravemente Urbi et orbi. Não, eles não fazem uso de práticas absurdas, eles não têm artigos de fé previstos para eles como uma lei; eles respeitam as opiniões alheias, mesmo as mais opostas, e eles honram e sobrelevam os missionários da verdade e da ciência, homens como Wallace, Varley, William Crookes, e Davis.

Allan Kardec nunca tentou desvalorizar as manifestações físicas, nem as pesquisas em ciências naturais; ao contrário, sempre reconheceu a sua utilidade. Suas obras não provam isso? Mas ele tem toda a razão em nos alertar contra aqueles que procuram enganar por meio dessas manifestações. Não temos experimentado ultimamente a necessidade de tal advertência? E nós vivemos num país onde até mesmo as pesquisas sobre os fenômenos seriam toleradas? Não temos sido condenados por apenas falar dos efeitos físicos produzidos por Firman, Williams, e Buguet? Falemos da América, da Rússia, onde uma comissão acaba de ser designada a investigar a ciência do Espiritualismo e, em seguida, vire os olhos para esta terra, do fanatismo e da intolerância, onde a prisão é certa para aqueles que acreditam firmemente na possibilidade de contato físico com outra esfera de seres. Ah, meus amigos, o momento foi bem escolhido para lançar seus golpes sobre nós; você tem agido terrivelmente na tentativa de esmagar aqueles que já estavam debilitados. Se você desejasse obter informações mais amplas você poderia ter consultado nossa jovem mídia dos dias de hoje, inteligente, enérgica e livre pensadora; valentes trabalhadores da nova safra; e, aos nossos olhos, pelo menos, infinitamente superior a muitos de quem você glorifica, porque não damos uma importância excessiva aos médiuns como a senhorita Japhet, senhorita Guldenstubbe, Sardou, Vaillandier, etc. E por que seu jornal em Leipzig sempre se recusou a inserir a refutação dos artigos publicados nele contra a reencarnação?

Você fala de Camille Brédif, mas você provavelmente não está ciente que foi precisamente o senhor Leymarie, que, em conjunto com o Dr. Houatz, o revelou como médium, e o introduziu na sociedade russa em Paris. Será que ele se lembra de uma certa sessão que aconteceu na Rue d'Isly na presença do senhor Golovine, senhor e senhora Allan Kardec, e senhor e senhora Leymarie? O senhor Aksakof gentilmente lhe perguntará se ele deseja que eu publique uma ata dessa reunião? O senhor Golovine tomou algumas notas na época, e elas ainda estão em seu poder. Devo mencionar porque o senhor Kardec não poderia escrever um artigo sobre o referido médium? por que ele não poderia dizer nada sobre o que ele tinha visto? Será que ele terá a bondade de responder? Às vezes é bom examinar os dois lados da questão.

O senhor Rivail de modo nenhum desprezou seu nome de família, que era muito respeitável, mas na França seria habitual que os escritores públicos assinassem com um nome falso? Foram seus amigos e guias espirituais que deram a ele o nome que hoje tem um prestígio em todo o mundo. Foi igualmente seus guias, que o orientaram a publicar o Livro dos Espíritos, e o fez apesar da escassez de seus recursos pecuniários. Ele continuou seu trabalho até a hora da sua morte, que foi causada por uma doença do coração (um aneurisma). Os que o conheceram intimamente podem testemunhar a sua bondade, mansidão e pureza de vida. Ele viveu muito discretamente, e nunca se recusou a quem pediu sua ajuda: generoso, simples de espírito, e sincero até o fim.

E agora, gentis leitores ingleses, vocês que me enviaram tão amigavelmente para a minha defesa perante o Tribunal de Paris, as testemunhas e atestados tão numerosos, vamos nos afastar, lhes imploro, de todos que tenham uma tendência a nos desunir. Vamos caminhar de mãos dadas, unidos por laços de afeto fraternal, não vamos dar ouvidos aos lobos em pele de cordeiro. Eu sou um reencarnacionista, e mesmo assim, eu considero todos vocês como meus irmãos. Se, na Inglaterra, os amigos espirituais lhes dão instruções diferentes das que recebemos diariamente na França, é que no seu mundo, como no nosso, as opiniões variam. Vamos respeitar as opiniões; vamos pesá-las na balança, mas sem lhes dar mais importância do que elas merecem.

"Não há efeito sem causa", e quantidade infinita de almas desencarnadas podem pensar de maneira diferente em relação a certas questões que para todos os Espiritualistas não são de fundamental importância, e ainda atuar juntos em harmonia, pois os pontos principais das suas crenças são idênticos.

Allan Kardec diz:

"O Espiritismo é inteiramente baseado na existência em nós de um princípio imaterial, na existência da alma. Aquele que não admitir que existe um princípio inteligente dentro de si, não pode necessariamente admitir que há um fora; e, consequentemente, não se admitindo a causa, ele não pode admitir o efeito."

Como vocês, queridos amigos, nós acreditamos em Deus, o Criador de todas as coisas, onipotente, soberanamente justo, bom e de perfeição infinita; acreditamos na Sua providência, na existência da alma após a sua separação do corpo; nós também acreditamos na sua individualidade, não considerando-a como uma hipótese, mas como a consequência necessária dos atributos divinos. Admitindo a existência da alma, sua sobrevivência ao invólucro terreno, pensamos que não seria, nem segundo a justiça, nem segundo a bondade do Todo-Poderoso, que a virtude e o vício, o bem e o mal, devam ser tratados de semelhante forma após a morte, quando sabemos que durante a vida, a recompensa e o castigo raramente são distribuídos com equidade. Então, se as almas dos ímpios e dos justos não são tratados de forma igual, alguns devem ser felizes e outros infelizes, ou seja, eles devem ser punidos ou recompensados de acordo com suas obras.

O que desejo (Espíritas e Espiritualistas) é estimular a investigação, para excitar a curiosidade por meio de críticas adversas, e para despertar a atenção dos indiferentes, rejeitando, como indigno de nós, o uso de linguagem grosseira e abusiva nos argumentos do superficial e não refinado. Pedimos aos nossos contraditores que nos provem, não por qualquer subterfúgio, mas por uma demonstração clara e palpável - seja matemática, física, química, mecânica ou fisiológica - que um ser inteligente, capaz do ato de pensar durante a sua vida, torna-se incapaz de realizar esse mesmo ato depois de ter deixado sua estrutura corpórea; que a faculdade do pensamento sendo permitida, ele não pode se comunicar com os amados que deixou na terra; que, tendo o poder de locomoção, ele não pode transportar-se em nossa vizinhança; que, estando ao nosso lado, ele não pode comungar com a gente; que, por meio do seu envoltório fluídico, ele não pode agir sobre a matéria inerte; que, dotado de poderes para agir sobre a matéria inerte, ele não pode influenciar uma mão para escrever; que, fazendo uma mão escrever, ele não pode responder às nossas perguntas ou nos transmitir suas idéias.

Allan Kardec diz (obras póstumas, Revista Espírita, setembro de 1869, página 257[5] a 261).

"O direito de investigação e de crítica é o que não pode ser proibido: o Espiritismo não pode pretender ignorá-lo, não mais do que podemos esperar para dar uma satisfação universal. Cada um é livre para rejeitar ou aprovar, mas devemos, pelo menos, ter consciência do que nós rejeitamos, e do que nós aprovamos. Agora, nossos adversários têm muito freqüentemente dado provas da sua total ignorância dos princípios mais elementares da nossa doutrina, se referindo a sentimentos e a linguagem em oposição direta à verdade".

Este artigo deveria ser lido por todos os Espiritualistas, mas somos obrigados a ser breve, e acrescentaremos apenas algumas linhas da mesma Revista (página 260):

"Na guerra que o Espiritismo foi forçado a entrar, sempre recebeu o apoio das mentes imparciais pela sua moderação; nunca foi empregada retaliação contra seus adversários, nem nunca devolveu uma injúria com outra.

"O Espiritismo é uma doutrina filosófica, cujas tendências são essencialmente religiosas, como em qualquer sistema de filosofia espiritualista; e portanto tem necessariamente muitos pontos de contato com as bases fundamentais de todas as religiões: a divindade, a alma humana, a vida futura, etc. Mas, no entanto, não se pode chamá-la de uma religião, pois não há nenhum culto, nenhum ritual, nenhum templo, nenhum dogma, nem há entre os seus adeptos quem se apresente como padres ou sacerdotes, aqueles pomposos termos que existem apenas na imaginação dos nossos críticos. É Espírita aquele que se torna adepto pelos princípios da doutrina, e que se conduz por ela. Todo homem tem um direito inalienável para seguir certas opiniões, ou para defender certos modos de crença, seja optando por ser um discípulo de Voltaire ou Descartes, ou que suas simpatias religiosas o inclinemigião, pois não há nenhum culto, nenhum ritual, nenhum templo, nenhum dogma, nem há entre os seus adeptos quem se apresente como padres ou sacerdotes, aqueles pomposos termos que existem apenas na imaginação dos nossos críticos. É Espírita aquele que se torna adepto pelos princípios da doutrina, e que se conduz por ela. Todo homem tem um direito inalienável para seguir certas opiniões, ou para defender certos modos de crença, seja optando por ser um discípulo de Voltaire ou Descartes, ou que suas simpatias religiosas o inclinem a ser um judeu, um católico, um protestante, um fourierista, um Saint Simonista, um deísta, ou mesmo um materialista. Os Espíritas entendem a liberdade de consciência como um direito natural, que permitem aos outros na medida em que reivindicam para si próprios; eles respeitem as opiniões dos outros, então exigem que a sua seja respeitada em troca.

"O resultado natural da liberdade de consciência será o livre direito de investigação em matéria de fé. O Espiritismo se opõe ao princípio da fé cega, porque esta impõe a necessidade de abdicar de um juízo próprio e, conseqüentemente, não pode ter raízes profundas na mente. Assim, entre as suas máximas, encontramos a seguinte: - 'Nenhum sistema de crença é construída sobre bases sólidas, se não se pode encarar as investigações da razão em todas as épocas da humanidade.'

"Em conformidade com seus princípios, que não impõe nenhuma restrição, não usa a coerção, deseja nenhum outro seguidor, a não ser aqueles que vêm a ele voluntariamente e de um sentimento de pura convicção; dá a exposição de seus princípios e deixa os outros livres para adotá-los conforme queiram".

Na página 307 na Revista de 1869, Allan Kardec diz:

"Para todos os sentimentos de inveja e ciúme por parte de outras pessoas, nós possuímos um meio infalível para torná-los inócuos. Vamos nos esforçar para desenvolver a nossa inteligência, para melhorar os nossos corações e mentes. Vamos competir com os outros na prática das boas obras, no exercício da caridade e do auto-sacrifício. Deixe o lema do "amor fraterno" ser inscrito em nossa bandeira, e deixe que a busca da verdade seja o objetivo da nossa existência. Imbuídos destes sentimentos, podemos desafiar a zombaria dos nossos contraditores e da má vontade de nossos inimigos. Se nos enganarmos, vamos reconhecer o nosso erro, e superá-lo: observando estritamente as leis da caridade e auto-sacrifício, evitando todo sentimento de inveja e ciúme, temos a certeza de que estamos no caminho certo. Estes devem ser os nossos princípios, são eles os laços de unidade, que deverão reunir todos os 'homens de boa vontade sobre a terra', enquanto o egoísmo e a falsidade definitivamente os separariam."

Espiritualistas e Espíritas de todos os países, vamos refletir sobre essas palavras memoráveis.


P. G. LEYMARIE

Rue de Lille, em Paris.

 

Notas do tradutor:
[1] Na transcrição do original está grafado Pierrard.
[2] Na transcrição está Duffaulz, mas este provavelmente é um problema de digitalização do documento original.
[3] É possível que tenha havido algum problema na edição desta data, 1855; como sabemos a primeira edição do Livro dos Espíritos apareceu apenas em 1857.
[4] Sabe-se que a revisão (e segunda edição) do Livro dos Espíritos apareceu apenas em 1860; mas, esta questão é bem controversa.
[5] A numeração desta página e de outras mais a frente estavam erradas na transcrição do original; aparentemente, deve ter ocorrido algum problema de digitalização.


Fonte: http://decodificando-livro-espiritos.blogspot.com/2010/05/uma-controversia-com-leymarie.html

 


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