Teoria de tudo ou de nada?
"Somente os otimistas conseguem alguma coisa neste mundo".
O físico teórico John Ellis, um dos criadores do Modelo
Padrão da Física de Partículas, conta ter lido
este ditado em uma embalagem de doce.
A mensagem ficou gravada, tanto que, em 1986, ele fez referência
a essa sabedoria de embalagem de bala em seu artigo "A Supercorda:
Teoria de tudo ou de nada?", publicado na revista Nature.
"Eu estava muito otimista," conta ele. "Eu estava
bastante positivo sobre isso."
De acordo com Ellis, "Teoria de Tudo" é um termo
bastante irônico para uma estrutura abrangente que une todos
os fenômenos físicos em um nível fundamental.
A ideia se tornou viral, tanto científica quanto culturalmente.
Inúmeros autores, filósofos e influenciadores científicos
aderiram ao movimento, incluindo os criadores de um filme biográfico
de 2014 sobre Stephen Hawking.
Então, por que tão poucas pessoas falam sobre uma
Teoria de Tudo hoje?
"Ela seria um único motor que impulsiona tudo. Isso
é claramente atraente, mas também uma visão
romântica do mundo ao nosso redor," defende o professor
Francesco Sannino, da Universidade do Sul da Dinamarca.
O bom demais Modelo Padrão
Hoje, Ellis diz que ainda é otimista, mas suas expectativas
são mais moderadas. "Eu ficaria feliz com uma teoria
de qualquer coisa," diz ele. "Qualquer coisa além
do que é descrito pelo Modelo Padrão."
O Modelo Padrão é a teoria que os físicos
têm para descrever o mundo subatômico. Mas o Modelo
Padrão não é uma Teoria de Tudo. Ele não
consegue explicar a origem da matéria no Universo ou sua
expansão acelerada, nem por que as galáxias giram
como se contivessem uma enorme quantidade de matéria invisível,
apelidada de matéria escura. O Modelo Padrão não
consegue explicar a gravidade, muito menos como a gravidade pode
ser unificada com as outras três forças fundamentais.

Mas, para ir além do Modelo Padrão, e em direção
a uma Teoria de Tudo, os cientistas precisam de um ponto de apoio
na forma de um desvio inesperado - um desvio que eles ainda precisam
encontrar.
"O Modelo Padrão é bom demais," diz o professor
Peter Woit, da Universidade de Colúmbia. "Apesar de
um grande esforço, não conseguimos chegar a algo melhor."

Decepção com
o LHC
Quando o LHC (Large Hadron Collider) começou a
operar, em 2008, os físicos esperavam que finalmente descobririam
a física além do esperado. "Vários colegas
pensaram que veríamos 100 novas partículas no primeiro
dia," conta Sannino. "Isso foi ingênuo e não
o que a natureza decidiu."
Ellis e muitos outros físicos esperavam que o LHC descobrisse
a supersimetria, uma extensão do Modelo Padrão que
resolve muitos problemas adicionando muitas novas partículas.
A descoberta experimental da supersimetria teria sido um passo concreto
em direção à Teoria das Supercordas, a versão
da "Teoria de Tudo" que Ellis divulgou em seu artigo de
1986.
"A Teoria das Cordas coloca tudo em uma sonhada Teoria de
Tudo - você só precisa comprar mais sete dimensões,"
ironiza Sannino.
Mas o LHC encontrou apenas uma nova partícula fundamental:
o bóson de Higgs, que era a peça final do Modelo Padrão.
Todos os outros resultados do LHC apenas reforçaram previsões
do Modelo Padrão.
A supersimetria parece cada vez menos provável de estar
certa, e a Teoria
das Supercordas nunca se materializou em algo com previsões
concretas e testáveis.
"O resto da comunidade está se perguntando: 'Onde está
o bife?'," comenta Ellis. "Ainda não houve nenhum
bife. Talvez os físicos de partículas tenham se tornado
um pouco vegetarianos e perdido o interesse pela fibrosa carne."
Continuamos procurando
Uma fração considerável da comunidade de físicos
já foi otimista de que poderiam cultivar a Teoria das Cordas
para obter uma ferramenta matemática capaz de previsões
concretas. "Isso ainda não aconteceu," diz Ellis.
"As pessoas agora estão muito mais cautelosas."
Mas nem tudo está perdido. A Teoria das Cordas forneceu
novas formas de pensar sobre as relações entre a gravidade
e as outras forças fundamentais, bem como insights sobre
a física da matéria condensada e o que acontece durante
as colisões nucleares dentro do LHC.
Quando íons pesados colidem dentro do LHC, seus quarks e
glúons internos se fundem em um fluido quase perfeito. Esse
fenômeno é difícil de explicar usando abordagens
tradicionais, mas as ideias da Teoria das Cordas mostram como elas
podem interagir umas com as outras de forma a produzir um fluido
com viscosidade e resistência extremamente baixas.
"A Teoria das Cordas se transformou não apenas em uma
candidata a Teoria de Tudo - embora isso ainda soe muito bem - mas
também em uma teoria de algumas coisas também,"
diz Ellis.
Ellis reconhece que o caminho para uma Teoria de Tudo acabou sendo
muito mais difícil do que ele e a comunidade científica
imaginaram na década de 1980. "O mundo é provavelmente
muito mais complicado do que jamais poderíamos imaginar,"
diz ele.
Mas ele continua sendo um otimista, e ainda acha que os físicos
devem mirar alto. "Newton unificou o movimento da maçã
e o movimento da Lua," diz ele. "Se colocarmos nossa visão
no alto, obteremos insights profundos."