Permitam-me voltar mais uma vez ao
tema dos eventos que estão sendo noticiados diariamente pela
mídia. Muito possivelmente não há como um indivíduo
deixar de acompanhar - tal o desenvolvimento dos sistemas de comunicação
atuais - os conflitos que se estendem nas mais diversas escalas, desde
as tragédias pessoais, passando pelos problemas do panorama
político nacional até os grandes choques entre nações.
É um verdadeiro desenrolar de más notícias que
mais parecem saídas daqueles sermões apocalípiticos
do passado, quando se ameaçavam as ovelhas desgarradas com
toda sorte de punições divinas.
Mesmo considerando-se que todas as épocas da humanidade foram
sujeitas a tragédias, maus administradores ou povos belicosos
e dando-se o devido desconto ao fato das más notícias
receberem destaque maior que as boas notícias, ainda assim
parece que passamos por momentos diferenciados na experiência
humana. Os eventos encontram-se concentrados em um período
pequeno de tempo e com impacto em escala mundial.
Não há como negar, o mundo está em transformação,
as certezas de ontem se esvaem rapidamente e os alicerçes das
novas edificações do porvir começam a ser cavados.
Por um lado o egoísmo chegou ao auge, com a valorização
absoluta do imediatismo material em detrimento a posse dos valores
espirituais, e por outro há um sentimento generalizado de que
são necessárias mudanças urgentes nas estruturas
que formam nossas sociedades. Sentimento generalizado de que os caminhos
atuais são insustentáveis e que se algo não for
modificado a humanidade estagnará na situação
de conflito permanente, onde pessoas e mesmo sociedades inteiras buscam
sempre levar vantagem sobre as demais.
Mudanças urgentes que coloquem o foco das sociedades humanas
no progresso do bem estar integral do homem, no equilíbrio
entre a necessidade de subsistência e a necessidade de conquistar
níveis mais avançados de compreensão. Compreensão
do nosso papel como seres inteligentes da criação, auxiliares
de Deus na sua obra e, portanto, responsáveis pela nosso bem
e do nosso próximo. Compreensão que, deixando de lado
o egoísmo, promova uma fraternidade verdadeira.
Somente pela educação do ser, pelo desenvolvimento dessa
compreensão em cada indivíduo, será possível
transformar o sentimento generalizado da necessidade de mudança
em uma mudança real. Educação verdadeira que
coloque em sua dimensão correta a necessidade de se viver adequadamente
neste mundo, usando de forma honesta todas as capacidades físicas
e intelectuais para atingir-se o bem estar possível, frente
a realidade de que somos seres espirituais em estadia temporária
por aqui. Seres espirituais em processo de evolução,
solidários uns com os outros, sujeitos as mesmas leis de causa
e efeito e destinados a perfeição.
E neste ponto entra a responsabilidade de cada um de nós, que
já tivemos a oportunidade de nos aproximar do conhecimento
espírita, que é o de sermos agentes desta educação.
Agentes não somente no sentido de participarmos de instituições
espíritas - atividade sem dúvida importante - mas também
de buscarmos vivenciar na prática cotidiana aquilo que professamos.
Educação pela demonstração viva de uma
vida comprometida com valores sólidos, pela exemplificação
de que existe um caminho a ser seguido, de que o desequilíbrio
moral evidenciado pela mídia não é a única
alternativa existencial.
Não me entendam mal, não estou postulando espetáculos
de grandeza espiritual, dos quais penso que a maioria de nós
- de mim pelo menos tenho certeza - está muito longe. Estou
me referindo a coisas mais simples, como, por exemplo, nos portarmos
no nosso trabalho cotidiano com a mesma integridade com que nos portamos
na Casa Espírita. De ter como nossos colegas do dia-a-dia as
mesmas atitudes de solidariedade construtiva como a que temos no trabalho
assistencial. De lidar como nossos fornecedores e clientes com a mesma
honestidade de propósitos com a que lidamos com os companheiros
que nos buscam para eventos doutrinários conjuntos. De darmos
a nossa família a mesma atenção e paciência
que damos aos que nos buscam a orientação doutrinária.
De sermos honestos inclusive com nossos filhos dando-lhes não
somente uma cultura primorosa mas formando-lhes o caráter na
demonstração de que fazemos exatamente aquilo que ensinamos
aos outros.
De nunca negarmos, a quem quer que seja, a manifestação
de nossa confiança na providência divina, expressa através
de atitudes corretas, mesmo que - diante dos negócios do mundo
- elas nos desfavoreçam em relação a companheiros
ainda iludidos pelos ganhos materiais.
São os velhos "não servir a dois senhores"
e "brilhe a sua luz", que Jesus ensinou
a cerca de 2.000 anos, e que continuam carecendo de aplicação
mais firme de nós. Não podemos servir a Deus e ao mundo
ao mesmo tempo. Podemos sim servir a Deus no mundo, através
do nosso agir correto no mundo, e é essa a nossa responsabilidade,
conosco mesmo e com o próximo.