Em uma entrevista concedida em
Uberaba, na data de 11/03/1979, a um grupo de jovens integrantes
da Juventude Espírita Abel Gomes, do Rio de Janeiro, em
fraternal clima de bate-papo, Chico Xavier respondeu a diversas
questões propostas.
Ao longo da entrevista, o médium
narrou fatos interessantes ocorridos durante uma visita que fez
à Penitenciária de São Paulo. Esclarecendo
sobre a importância do livro espírita e, com aquele
seu modo simples de falar, sua humildade para colocar os fatos
e situações, ele comentou:
— Sabe que na Penitenciária
de São Paulo, o livro está entrando muito? Já
fui lá duas vezes, antes de ficar doente. A Diretoria da
Casa pediu àqueles que quisessem ouvir a prece e a palestra,
se inscrevessem — 542 se inscreveram. Eu estive com esses
542 companheiros. Foi um encontro tão agradável
que tive vontade de passar férias na cadeia... Não
para ficar descansando, mas para conversar toda noite com os que
pudessem conversar, mesmo na cela — porque lá têm
espíritos brilhantes, maravilhosos...
P. — Na cela, há
espíritos maravilhosos?
R. — Ali dentro da Penitenciária.
P — Na condição
de preso, não é?
R — De presos. Desses 542,
um me disse:
— “Pois é,
Chico Xavier, nós somos tratados por números. Muitos
são os presos e os cárceres, então têm
que colocar número, n.° 3, n.° 14, isso dá
muito desgosto.” Então eu disse assim: — Meu
filho, quem é de nós hoje que não é
tratado por número? É número de telefone,
de carro, de casa, do CEP, não sei de que, do CIC, nós
ainda estamos com mais números que você. Só
que agora estamos na cela ambulante e vocês estão
na fixa. Eles riram muito.
Há muita gente boa presa,
nós temos que compreender a situação deles...
Carinho aos reeducandos
P. — Chico, os espíritos
brilhantes que estão lá dentro, têm a tarefa
de ajudar a recuperar os outros que estão nessa situação,
é por isso que estão lá dentro? Ou cometeram
erros e estragaram a reencarnação?
R. — Absolutamente, e a
gente tem que compreender a situação deles, porque
eles todos estão com o coração na flor dos
olhos, mas, pedindo entendimento.
Terminada a reunião, na
hora de sair da sala, eu disse ao Diretor: Preciso ir embora,
mas, antes eu quero beijar e abraçar a todos. Ele falou
para mim: — “Deus me livre. Não, senhor. Você
não vai abraçar, nem beijar ninguém.”
Então eu disse a ele: — Não senhor doutor,
eu não viria aqui fazer prece, para depois me distanciar
dos nossos irmãos. Não está certo. Haverá
tempo, o senhor disse que só precisará do salão
daqui a uma hora e tanto... sendo assim... eu lhe peço
licença para abraçar. — “Chico, nesse
salão, no outro dia, mataram um guarda de 23 anos. Afiaram
a colher até virar punhal. Mataram e não se soube
quem matou. Aqui tem criminosos com sentenças de 200 a
300 anos, eles podem te matar...”
— Pouco importa, vim aqui
para o encontro e o senhor não me permite abraçar?
— Então você
vai fazer o seguinte: você vai abraçar através
da mesa. — (Deus me livre). — Tem que recuar esse
povo que veio com você (umas 40 pessoas). Ficam só
duas senhoras tomando nota porque seus encontros serão
rápidos e nós vamos colocar 18 baionetas armadas
em cima. Se houver qualquer coisa você morre também.”
Eu fiquei na frente e comecei a abraçar os 542. Eu abraçava
e beijava; muitos que falavam comigo, um segredinho, podia falar
assim... meio minuto. Dos 542, só um, de uns 40 anos, chegou
perto de mim e ficou impassível como uma estátua.
O Diretor estava ali perto de mim e eu pedi às duas senhoras
que dessem a cada um, uma rosa. Quando aquele chegou e ficou parado
eu disse a ele: — O senhor permite que eu o abrace? —
“Perfeitamente”, respondeu-me. Então eu o abracei,
mas ele estava ereto.
— O Sr. deixa que eu o beije?
— “Pode beijar.” Eu beijei de um lado, de outro,
beijei quatro vezes, aí duas lágrimas rolaram dos
olhos dele. Então ele disse: — “Muito obrigado.”
E foi embora. Foi o único que ficou ereto, mas chorou...
Mas todos receberam o abraço.
Francisco Cândido Xavier
ladeado pelo repórter de O Globo, Clementino de Alencar
e seu irmão José Xavier. No ano de 1935 O Globo
publicou dezenas de reportagens tirando
Chico do anonimato. Foto contida no livro Notáveis Reportagens
com Chico Xavier, editada pelo IDE, Araras, SP