Definição e Anotações
sobre a Psicopatologia da Doença de Alzheimer
O “Mal de Alzheimer”,
ou Doença de ALZHEIMER, é um quadro demencial, irreversível,
com solapamento progressivo, principalmente, da MEMÓRIA do
paciente e de outras funções cognitivas (intelectuais).
Em geral, a doença começa a partir dos 65 anos, mas
há vários casos de início precoce, isto é,
a partir dos 45 anos.
Para entendermos bem as características e evolução
dessa Doença é preciso tentar explicar o que se denomina
LEI DA REGRESSÃO MNÊMICA DE RIBOT... Segundo esta,
quando uma pessoa apresenta uma alteração mnêmica
(da memória) “orgânica”, primeiramente
é comprometida a “memória de fixação”
e “memória de curto prazo”, ou seja, a pessoa
começa a se esquecer de acontecimentos ocorridos mais recentemente
e, com o progredir da Doença, a memória para fatos
mais antigos também será deteriorada. Outro aspecto
da “Lei de RIBOT” é que as funções
psíquicas mais complexas são afetadas, também,
mais precocemente do que as funções mais simples.
É por isso que, no início da Doença de ALZHEIMER
o paciente costuma se “perder” em via pública
ou mesmo esquecer-se de fatos os mais corriqueiros, pois a memória
recente estando comprometida, o paciente fica “desorientado”
no tempo e no espaço; além disso, o paciente costuma
apresentar alterações “ético-sociais”
-, o “pudor” (que é uma função
complexa) fica comprometido; conseqüentemente, não é
raro indivíduos bem educados apresentarem sintomas como despir-se
na frente de uma multidão de pessoas, não conseguindo
ajuizar eticamente a sua conduta.
A propósito, certa vez, tratamos um paciente com Doença
de ALZHEIMER cujo primeiro sintoma foi urinar em via pública,
exibindo a genitália para os transeuntes, no entanto, era
um Sr. com um passado de moral ilibada e muito responsável
e elegante...
Enfim, a Doença de ALZHEIMER vai afetando, progressivamente,
as funções corticais do paciente, pois o que acontece
é que há uma ATROFIA DO CÉREBRO do paciente
e, por isso mesmo, as funções cognitivas (intelectuais)
e até motoras (de movimento) são deterioradas pela
doença, irreversivelmente, porque as células cerebrais
não se regeneram, uma vez atrofiadas não são
substituídas por outras, íntegras; por isto, diz-se
que o tecido cerebral é “tecido nobre”, isto
é, as células lesionadas não são substituídas.
Exatamente como varias pessoas vivenciam: “na parte física
vemos que a pessoa vai definhando, perdendo o movimento e a noção
das coisas.”
Visão espírita do “Mal
de Alzheimer’
Na época do lançamento de O LIVRO DOS ESPÍRITOS
(OLE), de ALLAN KARDEC (1857), não se conhecia a fisiopatologia
da Doença de ALZHEIMER, por isso, a Codificação
não se refere à Doença especificamente, porém,
podemos extrair algum conhecimento sobre o que acontece com o Espírito
da pessoa com essa Doença se analisarmos bem a resposta à
questão 156 de OLE e, com tal análise, não
podemos nos furtar a um melhor entendimento da natureza e propriedades
do PERISPÍRITO e suas correlações com a MEMÓRIA
e o TEMPO.
Assim, leiamos a questão 156 de OLE e a primeira parte da
resposta:
“A separação definitiva entre a alma e o corpo
pode verificar-se antes da cessação completa da vida
orgânica?
“- NA AGONIA, ÀS VEZES, A ALMA JÁ DEIXOU O CORPO,
QUE NADA MAIS TEM DO QUE A VIDA ORGÂNICA (...)”.
...........................................................................................................................
MORTE CORPORAL E ESPÍRITO
O Espírito desliga-se definitivamente do corpo porque este
está morto, mas
não é o desligamento do Espírito que causa
a morte do corpo
...........................................................................................................................
Parece-nos, que nas doenças crônicas em geral, que
afetam o cérebro (como é o caso da Doença de
ALZHEIMER), estando este deteriorado, ele não mais reagiria
ao comando do Espírito - a vida na doença de ALZHEIMER
se resumiria, praticamente, à vida orgânica, VEGETATIVA,
“a alma já deixou o corpo”, embora não
definitivamente, pois isto só ocorre na desencarnação...
A Sra. poderia, talvez, argumentar que um corpo não poderia
viver sem alma, o que não seria verdade... O que mantém
a vida corporal é o “FLUIDO” VITAL e não
o Espírito, a vida só se extingue pela exaustão
dos órgãos e não pela ausência do Espírito
(cf. resp. à questão 68 de OLE). É preciso
que se repita: o Espírito desliga-se definitivamente do corpo
porque este está morto, mas não é o desligamento
do Espírito que causa a morte do corpo...
Obviamente, ainda há uma ligação, muito tênue,
entre o Espírito e o corpo de uma pessoa com Doença
de ALZHEIMER, mas o rompimento de tal ligação só
não é definitivo porque a pessoa ainda não
desencarnou, pois o Espírito nada mais tem a fazer estando
o cérebro sem NENHUM controle seu... Sabemos que a alma desprende-se
do corpo, pouco a pouco, gradativamente, nas doenças orgânicas,
crônicas (cf. se depreende da resposta à questão
155-A de OLE) e, num grau avançado da Doença, acreditamos
que a alma está quase totalmente liberta do corpo.
Como um paciente com Doença de ALZHEIMER sente-se interiormente?
Parece-nos que isto irá depender não só da
evolução espiritual da pessoa, como também,
do estágio evolutivo da doença, da demência.
Quando as funções cognitivas (intelectuais) estão
seriamente comprometidas, a pessoa nada sente, isto é, não
há nenhuma repercussão ESPIRITUAL do que se passa
no corpo... Aliás, KARDEC afirmava mais ou menos isto, em
outras palavras, quando disse que de nada adianta ser um bom violinista
se o violino estiver danificado. Como tocar boa música, nessa
situação?
Prezados Srs. leitores e leitoras, o grande sofrimento na doença
de ALZHEIMER é dos familiares e da Sociedade, não
é do paciente. É muito duro, às vezes desesperador
mesmo, ver um ente querido, um ser humano, desconhecer seus próprios
parentes, não saber pronunciar seus nomes (na afasia motora)
e, às vezes, nem reconhecer as coisas do ambiente (agnosia)
e nem ter coordenação para os mais simples movimentos
úteis, como vestir uma roupa (apraxia), certamente, como
dizem alguns: “é um sofrimento ver uma pessoa tão
dinâmica ir definhando aos nossos olhos.”... Aí
está: a doença de ALZHEIMER é uma PROVA, extremamente
difícil para os familiares e exige muita resignação
e muito Amor e, antes de tudo, a certeza na IMORTALIDADE DA ALMA
e de sua INDIVIDUALIDADE após a morte e confiança
na Providência Divina e aí está a “vantagem”
de ser espírita, se é que assim podemos nos exprimir,
porque a Doutrina Espírita é Consoladora justamente
porque nos dá essa CERTEZA (através de FATOS positivos)
nas respostas a questões existenciais que todos já
fizeram algum dia: por que aqui estamos? Para onde vamos? Por que
sofremos?...
Enfim, cuidar muito bem dos pacientes, embora acreditemos que não
é fácil, mas as dificuldades são postas em
nossa vida para crescermos espiritualmente e, quem sabe, se este
gênero de prova não foi solicitado pelos familiares.
antes de reencarnar?!
A nosso ver os familiares devem ficar tranqüilos quanto ao
suposto sofrimento dos pacientes, pois, praticamente ele não
existe, e aí é que devemos agradecer à Providência
Divina, pois, na maioria das vezes o próprio paciente não
percebe o seu comprometimento cognitivo, nem se dá conta
que sua memória está gravemente comprometida. Se eles
forem um Espírito com certa elevação, devem
estar sentindo-se muito melhor que os familiares, disto temos absoluta
certeza, pois estando o Espírito dela com uma tal emancipação,
as coisas terrenas praticamente não a afetariam.
Onde ficarão “impressas”
as vivências presentes e passadas?
Como dissemos, o sintoma principal
na Doença de ALZHEIMER é a deterioração
da MEMÓRIA e tem havido muita distorção doutrinária,
a nosso ver, em relação à questão do
PERISPÍRITO, que, para alguns, seria o “arquivo”
das nossas experiências terrenas.
O PERISPÍRITO, A MEMÓRIA E O TEMPO
Existem outras obras, além
das básicas , da DOUTRINA ESPÍRITA? Creio que não,
pois não me consta que a Espiritualidade Superior tenha se
manifestado doutrinariamente, depois de KARDEC, com a “concordância
universal dos seus ensinos”; eis, talvez, uma das causas dos
aspectos polémicos citados por alguns. Há um adágio,
cuja autoria eu desconheço, do qual gosto muito: quando os
“espíritas” igrejeiros insistirem, estereotipadamente,
em que FORA DA CARIDADE NÃO HÁ SALVAÇÃO,
que, aliás, é uma verdade; poderemos complementar
com o adágio: - E FORA DA CODIFICAÇÃO NÃO
HÁ DOUTRINA ESPÍRITA...
Perispírito - Matéria
e Espírito - Densidade e ponderabilidade da matéria
Como vários estudiosos dizem, o “perispírito”
possui características “especiais” de DENSIDADE,
PONDERABILIDADE e PLASTICIDADE. Está perfeito! Perguntaríamos,
então, ao leitor: conhecemos a densidade e a ponderabilidade
do “perispírito”?!...Embora seja “matéria”,
desconhecemos a natureza íntima do perispírito. Por
que? Porque só conhecemos, aliás não completamente,
a matéria “terrena”. As qualidades de EXTENSÃO,
IMPENETRABILIDADE e que IMPRESSIONA OS SENTIDOS cessam, quando desejamos
conceituar a matéria constitutiva do perispírito (cf.
resposta à questão 22 de O Livro dos Espíritos
de ALLAN KARDEC). Portanto, só podemos definir a “matéria”,
muito genericamente, como “o liame que escraviza o espírito;
é o instrumento que ele usa, e sobre o qual, ao mesmo tempo,
exerce a sua ação” (cf.
resposta à questão 22-A, op. cit.).
A matéria com que lidamos na Terra possui densidade, ponderabilidade,
contudo, a matéria considerada como derivada do “fluido
universal” é IMPONDERÁVEL para nós, encarnados
e imperfeitos. E isso é exposto claramente em resposta à
questão 29 (op. cit.), diz ela: “A ponderabilidade
é atributo essencial da matéria? E a resposta: “-
Da matéria como a entendeis, sim; mas não da matéria
considerada como fluido universal. A matéria etérea
e sutil que forma esse fluido é imponderável para
vós, mas nem por isso deixa de ser o princípio da
vossa matéria ponderável.”.
A seguir, KARDEC comenta:
“A ponderabilidade é uma propriedade RELATIVA (o destaque
é nosso). Fora das esferas de atração dos mundos,
não há peso, da mesma maneira que não há
alto nem baixo.”
É interessante ressaltar que a ponderabilidade dos corpos
depende, necessariamente, dos fatores cósmicos atuantes do
mundo em que se encontram; da lei de gravidade, por exemplo, em
nosso planeta.
Vários cientistas estudaram a questão da MATÉRIA,
tais como: CHARLES RICHET, MORSELLI, CESARE LOMBROSO, W. J. CRAWFORD,
WIILLIAM CROOKES, etc., inclusive estudaram os fenômenos de
“ectoplasmia”. Contudo, tais estudos foram realizados,
fundamentalmente, em MÉDIUNS, isto é, com “fluidos
animalizados” do médium em “conjunção”
com os da Espiritualidade desencarnada. Assim, W. CROOKES no seu
notável estudo da médium FLORENCE COOK na qual se
manifestava principalmente o espírito de KATIE KING, além
dos estudos com a médium EUSÁPIA PALADINO realizados
por RICHET, LOMBROSO, CRAWFORD e outros... Todas essas experiências,
realizadas em geral por cientistas, a princípio, céticos
em relação ao mundo espiritual, serviram para a comprovação
da realidade do mundo espiritual e pouco mais se conseguiu. A propósito,
na obra “O Psiquismo experimental”, ALFREDO ERNY relata
que escreveu ao Sr. CROOKES, em 1892, e perguntou-lhe se KATIE KING
ter-lhe-ia feito revelações sobre o outro mundo, recebendo
do ilustre químico a resposta: “Tive muitas conversações
com KATIE KING, e naturalmente lhe fiz várias perguntas a
respeito do outro mundo. As respostas não satisfizeram. Geralmente
ela dizia que estava proibida de dar essas informações.”
Portanto, vários leitores leram algumas obras atuais estabelecendo
as “correlações do Espírito com a matéria”,
pontificando a natureza eletromagnética dessa matéria,
tenham muito cuidado; pois no Espiritismo, infelizmente, há
muitos espíritos pseudo - sábios, embora a Física
moderna têm lançado muita luz sobre tais obscuros problemas.
Creio que deverá demorar muito para que conheçamos,
aqui na Terra, a densidade e ponderabilidade do perispírito;
talvez isto ocorra com a regeneração da Terra... Talvez...
Talvez... Por enquanto, há boas hipóteses-de-trabalho,
nada mais, o que já é um avanço considerável...
Perispírito e participação
na elaboração do pensamento e no desenvolvimento da
inteligência
Não concordo com que o perispírito - embora seja matéria
quintessenciada - esteja “alheio à elaboração
da inteligência e do pensamento”. Na erraticidade, na
Terra e em outros mundos o Espírito terá sempre o
seu envoltório (perispírito), exceto os Espíritos
muito Superiores e os Puros, se não estiverem encarnados;
aliás, esta é uma eventualidade rara mas não
impossível, embora não estejam mais sujeitos à
encarnação, eles podem encarnar-se em “missão”,
nada impede!... Frisamos isto, aqui, como um obstáculo aos
sofismas dos roustainguistas.
Como disse a Espiritualidade Superior: “(...) o Espírito
muda de envoltório, como muda de roupa.” (cf.
resposta à questão 94 ‘in fine’ de O Livro
dos Espíritos). Só podemos conceber o Espírito
sem a matéria “pelo pensamento” (cf.
resposta à questão 26, op. cit.).
Embora a Inteligência e o Pensamento sejam atributos inalienáveis
do Espírito, haverá sempre co-participação
do perispírito em relação ao Pensamento e à
Inteligência. Por que o perispírito não está
“alheio à inteligência e ao pensamento”?
Justamente porque o perispírito é o liame entre o
mundo espiritual e o material. Onde houver matéria, aí
estará o perispírito, mais grosseiro como o nosso
ou menos grosseiro como na erraticidade e nos mundos mais evoluídos.
Sem a participação do perispírito não
há progresso material nem espiritual. Como citamos, anteriormente
(questão 26 de OLE), a separação
entre o perispírito e o espírito é uma abstração
do pensamento dos encarnados e inferiores, como nós.
Memória humana
(psíquica ou verdadeira) e Memória animal (Memória
orgânica ou Memória - hábito) - A questão
do tempo - A “durée” bergsoniana
As explicações da função do perispírito
como “arquivista temporário” ou como “biblioteca
do espírito”, são interessantes didaticamente,
todavia, não há rigor nessas explicações...
A memória humana não é um mero repositório
de engramas (imagens fixadas e conservadas) “arquivados”.
Coube ao filósofo HENRI LOUIS BERGSON (1859-1941) a distinção
entre MEMÓRIA ORGÂNICA (ou MEMÓRIA-HÁBITO)
e MEMÓRIA PSÍQUICA (ou MEMÓRIA VERDADEIRA).
Esta seria apanágio, “específico”, do
ser humano.
Com o prof. NOBRE DE MELO podemos definir MEMÓRIA, genericamente,
como “a propriedade ou capacidade psíquica de “fixar,
conservar” (em latência) e “reproduzir”,
“evocar” ou “representar” (voltar a apresentar
na consciência), sob a forma de “imagens representativas
ou mnêmicas” aquelas impressões sensoriais recebidas,
transmitidas e conscientizadas sob a forma de sensações.”
(A . L. NOBRE DE MELO. PSIQUIATRIA - Vol.
I. Civiliz. Bras. / MEC, Rio de Janeiro, 1979, p. 398). Prosseguindo,
diz o nosso mestre da Psiquiatria brasileira, já desencarnado:
“Mas, assim, genericamente concebida, a memória deixa
de ser, é óbvio, atributo específico do ser
humano”. E exemplifica: “Um cão, digamos, que,
alguma vez, tenha sido corrido a pedradas, fugirá espavorido
se alguém fizer menção de arremessar-lhe seja
o que for, e isso, por efeito, unicamente da dolorosa lembrança
anterior fixada”.(op. cit., p. 398 -
399).
Então, com aquela definição genérica,
poderíamos dizer que a simples capacidade de armazenar (“arquivar”)
e reproduzir impressões deixadas pelos estímulos e
excitações do meio externo pode ser encontrada até
nos organismos unicelulares, num disco CD, numa fita cassette e
nos robôs eletrônicos da moderna Cibernética.
Mas seria simplesmente isso a memória humana? Não,
a memória orgânica existe no Homem como em qualquer
animal, mas a memória humana tem algo de específico...Vejamos
a explicação do prof. NOBRE:
“Algo diversos, sem dúvida, são os fatos que
definem a chamada “memória psíquica” ou
“verdadeira”, esta sim, apanágio do ser humano.
Aqui, não somente se verifica a possibilidade de reprodução
mecânica ou automática (ecforia) de imagens perceptivas
fixadas e conservadas “(engramas)”, mas também
a revivescência “(evocação) voluntária”
ou “involuntária”, isto é, mercê
de associações fortuitas, de estados psicológicos
passados, dos pensamentos, sentimentos, emoções, desejos
e fantasias, que constituem o patrimônio de nossa experiência
vivida. Quer isso dizer que o homem recorda, não apenas os
acontecimentos do mundo externo ou circundante, que lhe é
dado aos sentidos, mas também os de sua realidade interna,
e suas significações respectivas, reconhecendo-os
e localizando-os em determinado momento da existência. A memória
psíquica ou verdadeira implica, em suma, um FATOR INTENCIONAL
SIGNIFICATIVO o destaque é nosso, que, a libera do FATALISMO
destaque nosso da memória orgânica.” (op.
cit., p. 399).
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MEMÓRIA HUMANA
A memória orgânica existe no Homem como em qualquer
animal, mas a memória humana tem algo de específico
....................................................................................................
Enfim, caríssimos leitores,
a “memória humana, verdadeira”, não é
um simples “arquivo”, estático, de nossas vivências
pretéritas. Nem a memória de um computador é
assim!... O élan vital caracterizado por BERGSON implica
numa continuidade do tempo e numa duração (“durée”).
Ou, como dizem os filósofos existencialistas, implica numa
“intencionalidade, significativa”... O movimento humano
é para o futuro, evolutivo; nunca retroagimos. Nossas vivências
passadas são sempre modificadas pelo nosso psiquismo presente
e pelas nossas perspectivas futuras... Quando me lembro de uma vivência
ocorrida na minha infância, estando com 61 anos, tal vivência
não é hoje, rigorosamente, igual àquela que
tive na infância. O que mudou? O meu passado? Não,
eu mudei e, portanto, mudou a minha vivência.
Além disso, a lembrança ATUAL de um acontecimento
será vivenciado diferentemente pelas pessoas, o que levou,
inclusive, o escritor italiano LUIGI PIRANDELLO a falar na “Verdade
de cada um”... Aliás, a vivência atual pode ser
modificada por uma série de “associações
fortuitas” como bem assinalava o prof. NOBRE. Através
dessas associações há “mudanças
qualitativas” na duração (“durée”)
e o passado é recuperado , de acordo com o “bergsonismo”
(cf. sua obra “Matéria e Memória. Ensaio sobre
a Relação entre o Corpo e o Espírito”).
Assim, pode ser traçado um paralelo entre o bergsonismo e
a música do compositor CLAUDE ACHILLE DEBUSSY e a obra do
escritor MARCEL PROUST.
Obviamente, não cabe neste artigo uma análise pormenorizada
da questão do TEMPO VIVIDO, do tempo como DURAÇÃO.
A propósito disse SANTO AGOSTINHO, encarnado, nas suas Confissões
em relação ao que seja o tempo: “Si nemo me
quaerat, scio; se quarenti explicare velim, nescio” (Se ninguém
mo pergunta, eu sei; se o quiser explicar a quem me fizer a pergunta,
já não sei.).cf. op. cit. Livro
XI – item 14.
Ou seja, a questão do tempo implica um caráter eminentemente
“intuitivo”. Ora, um filósofo, “encarnado”,
afirma não poder explicar o que é o tempo, imagine-se
definir o tempo vivido no mundo espiritual!...
A DURAÇÃO (“durée”) do ponto de
vista “espiritual” é bem diferente da nossa e
isso foi explicitado na resposta à questão 240 de
O Livro dos Espíritos e KARDEC comentou a seguir:
“Os Espíritos vivem fora do tempo, tal como o compreendemos;
a DURAÇÃO o destaque é nosso, para eles, praticamente
não existe, e os séculos, tão longos para nós,
são aos seus olhos apenas instantes que desaparecem na eternidade,
da mesma maneira que as desigualdades do solo se apagam e desaparecem
para aquele que se eleva no espaço”.
O “TEMPO VIVIDO” pode alterar-se em algumas doenças
mentais (Esquizofrenias, depressão, etc.) e até em
pessoas normais. Por exemplo, o cantor popular brasileiro ROBERTO
CARLOS diz nos seus versos na canção “Amor sem
limites”: “(...) Aprendi que pouco tempo é muito,
se estou longe de seus braços.” . E nos pacientes com
a denominada Síndrome de COTARD observa-se um “delírio
de negação dos órgãos” (delírio
niilista) e um “delírio de eternidade”, em conseqüência,
o paciente sofre muito por julgar que nada existe e que aquela situação
durará “eternamente”...
É exatamente pelo fato da “DURAÇÃO”
ser diferente no mundo “espiritual”, que muitos espíritos
desencarnados, ainda apegados à vida carnal, julgam-se no
inferno, acreditando assim na “eternidade das penas”.
Assim, KARDEC dá inúmeros exemplos dessa situação
na 2ª. parte do seu livro “O Céu e o Inferno –
A Justiça divina segundo o Espiritismo”. Ilustrando-se
isto, sugiro ao leitor que leia o caso BENOIST (op.
cit., 2ª parte, cap. VI, “Criminosos arrependidos”,
especialmente as questões 3, 9 e 11); e que leia também
o caso “Duplo suicídio, por amor e por dever”
(op. cit., 2ª parte, Cap. V, “Suicidas”,
especialmente a resposta à questão 4, atentando-se
para o clamor da que foi a jovem PALMYRE: “sempre assim!”).
EPÍLOGO
Acreditamos que nossas vivências
sejam “impressas” em nosso cérebro e aquelas
mais importantes espiritualmente (intelectuais e morais) são
levadas ao Espírito, através do perispírito.
Mas, tais vivências não ficam ali “arquivadas”,
o Espírito as modifica de acordo com o seu “livre –
arbítrio”.
Admitir-se o perispírito como “arquivista temporário”
ou como “biblioteca do espírito” é admitir-se
a “memória orgânica”, pura e simplesmente,
e, portanto, cair num “fatalismo materialista mecanicista”,
ao qual muitos expositores que se dizem “espíritas”
e defensores do “Evangelho de JESUS” são conduzidos,
alguns até bem-intencionados...
Caro leitor, estou terminando este artigo... Precisarei utilizar
o comando “Salvar como” do meu computador para que ele
fique arquivado. Toda vez que clicarmos no título “O
PERISPÍRITO, A MEMÓRIA E O TEMPO”, aparecerá
na tela todo o meu artigo, porque ele ficará na “memória”
do meu computador...
Embora as minhas vivências significativas também fiquem
“arquivadas” no meu Espírito, o comando “Salvar
como” é sempre “Salvar automaticamente”
e eu terei acesso a elas clicando não o título, mas
sim a “tecla” VONTADE, aqui ou na erraticidade; contudo,
nem todo o “texto” estará disponível para
ser revivenciado na minha consciência, como numa “ecmnesia”
(revivescência do passado individual), pois a “Providência
Divina” interdita pensamentos, emoções, sentimentos,
etc. que sejam inúteis para o nosso progresso espiritual.
Gostaríamos de dizer que as vivências do Espírito
desses pacientes são “qualitativamente” diferentes
das dos seus familiares, pois o Espírito deles estão
parcialmente EMANCIPADOS do corpo, ao passo que os familiares e
nós, encarnados, vivemos as nossas experiências na
“prisão” da carne... O “Mal de ALZHEIMER”
aniquila a vivência do tempo para o corpo, porque este não
“obedece” ao comando do Espírito.
Iso Jorge
Teixeira:
- Psiquiatra (Uerj Hospital Univ Pedro Ernesto) e escritor espírita