Espiritualidade e Sociedade





Alfonso Martinez Taboas


>    Uma revisão crítica dos livros do Padre Quevedo

Artigos, teses e publicações

Alfonso Martinez Taboas
>   Uma revisão crítica dos livros do Padre Quevedo

 

Os escritos e o trabalho realizados pelo Padre Oscar González Quevedo são muito conhecidos e divulgados tanto na Espanha quanto na América Latina. Além de ser autor de várias obras parapsicólogicas, é diretor do CLAP – Centro Latino Americano de Parapsicologia, em São Paulo.

Seus escritos, à primeira vista, impressionam por sua volumosa documentação e por oferecerem a seus leitores uma série de argumentos e observações que parecem esclarecer muito da confusão que impera nos fenômenos paranormais.

Dissemos "à primeira vista" porque, ainda sem negar que em suas obras se recompila uma abundante quantidade de trabalhos clássicos, se lhe fazemos uma revisão crítica e detida em seus argumentos e documentação, nos defrontaremos com algo que nos causa estranheza. O que pareciam ser citações fidedignas de documentos, em ocasiões não infreqüentes, são distorções dos originais; seus raciocínios se debilitam consideralvelmente ao nos depararmos com a sutileza com que usa diversas falácias; o que parecia ser uma conclusão irrefutável, ao tratar-se de verificá-las nos documentos citados, mostrou-se insustentável, devido ao manejo de documentos.

O fato de que nos livros de um autor que se tem em tão alta estima se encontrem freqüentes contradições, omissões, distorções, erros e falácias, não é fácil de se pensar. E mais, teria o leitor toda razão em exigir, sem ambigüidade nenhuma, a quem faz tal asserção, que apresente evidência clara e consistente de que isso é assim. É meu propósito, pois, apresentar ao leitor parte das inconsistências que tenho encontrado nos escritos de Quevedo.

Digo "parte", já que em meu fichário tenho listados, apenas do livro "AsForças Físicas da Mente", mais de 70 erros ou manejos indevidos de evidência. Os erros encontrados em "O que é Parpsicologia?" e " A Face Oculta da Mente", ainda que consideráveis, não alcançaram o número alarmante que encontramos em "As forças …".

Esclareço que meu interesse em revisar a documentação apresentada pelo Pe.Quevedo vem se realizando desde o ano de 1972. Em 1973, publiquei privadamente o ensaio que entitulei "Katie King", onde faço constar que González-Quevedo, em mais de duas dezenas de ocasiões, manipula a evidência a seu gosto, além de cometer erros crassos. Entre os anos 1973-1976, publiquei privadamente mais três ensaios sobre as obras do Pe. Quevedo, de onde continuava o trabalho de investigação de suas fontes. Finalmente, em 1977 publiquei meu ensaio "Uma revisão crítica dos escritos de Oscar González Quevedo, S.J.", onde enumero 50 erros ou distorções do material do Sr. Quevedo.

Sobre o material que me permitiu expor uma continuação, decidi dividi-lo em cinco partes. Estas são: contradições, omissões, distorções, erros e dogmatismo.

Às vezes, sua classificação é díficil porque em um só parágrafo pode haver dois dos ditos fatores. Desejo, em último lugar, enfatizar e advertir que a dita lista não pretende ser exaustiva. Só nos adverte sobre a necessidade de nos acercarmos de cautela e desconfiança, quando se trata do material que nos apresenta o Pe.Quevedo. ( nota : Enquanto não se indique o contrário, todas as referências são ao livro "As Forças Físicas da Mente" ).


Contradições :

1. Sobre o Médium Guzik, na página 159, tomo I, nos diz: "Otro gran médium que se presenta muchas veces como fraudulento, pero que tal vez deba entrar tambiém entre los que ‘al menos probablemente’ van en pro de la telecinesia real, es el polaco Jean Guzic." (página 162, tomo I, na edição em português : "Outro grande médium, que é muitas vezes apresentado como fraudulento, mas que se bem analisados os argumentos, ‘provavelmente’, ao menos, está de acordo com a telecinesia real ( Deslocamento ou movimentação de objetos à distância, sem interferência física - Destaque nosso ) , é o polaco Jean Guzik."). Na página 18, tomo II, esse "talvez" se converte em "creemos que sus qualidades parapsicológicas están fuera de duda". (página 325, tomo II, na edição em português: "cremos que suas qualidades parapsicológicas foram incontestáveis".) Evidência-se a divergência.

2. Nas páginas 80-87, do tomo I, ( páginas 88 a 92 na edição em português ), Quevedo diz que as irmãs Fox eram totalmente fraudulentas. Em outro capítulo ( pag.71 – Ed. Espanhol e pag. 75 – Ed. Português ) Ele referencia o Cientista Crooks, o qual é categórico ao dizer que os fenômenos relacionados às irmãs Fox são genuínos, e o Sr. Quevedo, concorda com Crooks ! O mesmo ocorre na página 240 e na 96 ( 242 e 84 na edição em português ) onde novamente cita Crooks, dizendo que suas experiências de tiptologia ( comunicação dos espíritos por meio de pancadas - Destaque nosso ) são genuínas. E tal citação é precisamente de Crooks referindo-se às irmãs FOX !

 

Omissões :

1. González Quevedo, ao esboçar sua teoria da ectoplasmia, alega que essa misteriosa e controversa substância chamada ectoplasma, o máximo que ela pode conseguir é formar membros ou figuras "rudimentares" e "imperfeitas".

Sobre o médium D. D. Home, diz o Pe. Quevedo que "jamais poderia imputar um truque". E é sintomático que as ectoplasmias do bem-dotado Home sempre tenham sido rudimentares". Quevedo passa a fudamentar sua asserção citando extensamente a Sir William Crooks ( p.281 ), onde parece demonstrar que as "mãos" que costumavam apresentar-se em suas sessões eram vagas e pouco precisas.

No entanto, é inquietante pensar por que o Pe.Quevedo não transcreveu o parágrafo seguinte do testemunho de Crooks, que é de sumo interesse e importância para fudamentar ou rejeitar sua teoria. Diz Crooks : " Ao toque, a mão às vezes parece fria como o gelo e como morta; em outras ocasiões, sensível e animada, e aperta minha mão com uma pressão firme, da mesma forma como faria um velho amigo."

Não cremos que o Pe. Quevedo tenha sido muito afortunado em omitir este parágrafo. Justamente onde o próprio Crooks desmente as características que González Quevedo arbritariamente atribui ao ectoplasma ! Mais estranho ainda é notar que nas biografias de Home, tais como a de Burton ("Heyday of a Wizard") e a da senhora Home ("D. D. Home: his life and His Mission"), detalham-se observações parecidas com as de Crooks, onde o suposto ectoplasma tomou formas precisas e definidas, inclusive sensíveis ao toque. É difícil pensar porque o Pe. Quevedo omite toda essa documentação, ainda mais quando o faz seletivamente, como no caso de Crooks.

2. Em "A Face Oculta da Mente", páginas 356-357, o Pe.Quevedo trata de desacreditar a hipótese espírita ao atribuir a senhora Piper, uma das mais renomadas médiuns mentais, a seguinte "confissão" : "Não creio que os espíritos dos mortos falem por intermédio de mim quando estou em estado de transe… A telepatia me parece mais plausível e a mais justa solução para o problema."

Essa citação é importante para a tese de Quevedo, e assim ele diz: "Ela mesma, como temos visto, auto-analisando-se, afirma que tudo quanto percebe está na memória inconsciente de alguém."

A "confissão" citada pelo Pe.Quevedo, para informação do leitor, apareceu originalmente no periódico "New York Herald" em 20 de outubro de 1901. É interessante notar que a própria senhora Piper desmentiu parcialmente a entrevista para o dito periódico. Isto o sabemos porque a senhora Piper declarou cinco dias depois ao "The Boston Adviser" : "Eu não fiz nenhuma declaração como a publicada pelo New York Herald ao fato de que os mortos não me controlam... Minha opinião é hoje a que tem sido nos últimos dezoito anos. Pode ser que os espíritos tivessem me controlado, ou pode ser que não tenham feito. Confesso que não sei." Mas isso, o Padre Quevedo não quis colocar em seu livro... Por que será ?

Ainda que haja indícios de que a senhora Piper não simpatizasse muito com a hipótese espírita, é um procedimento duvidoso ao máximo apresentar ao leitor a "confissão" de Piper do "New York Herald" sem advertir ao leitor da correção desta "confissão" em "The Boston Adviser". E ainda mais quando o Pe. Quevedo dá tanto peso a isto.

 

Distorções :

1. O Pe.Quevedo trata de desacreditar o caso da senhora Piper, médium mental, não só omitindo-nos dados relevantes à sua avaliação, como também desacreditando seus investigadores. Assim por exemplo, nos diz de Lodge: "Lodge, que também fez experimentos com Piper, reconheceu ( antes que o rude golpe não superado da morte de seu filho lhe debilitasse o sentido crítico e lhe fizesse inclinar-se ao espiritismo )..." (Veja "A Face Oculta da Mente", pp.355-356.)

Vejamos quão certo é isso. Sir Oliver Lodge manteve sessões com Piper desde 1889, e chegou a participar inclusive das sessões mais bem controladas. O filho de Lodge, de nome Raymond, morreu em 14 de setembro de 1915. No entanto, já em um Proceedings da Society for Phychical Reserch ( parte 58, p.284 ) de 1909, ou seja, seis anos antes da morte de seu filho, Lodge declarou : "A antiga série de sessões com Piper me convenceram da sobrevivência após morte, por razões que me seriam difíceis de formular, mas este foi seu efeito em mim." E, mais adiante, diz: "A hipótese da sobrevivência da personalidade... é a mais simples e a mais certa, e a única que se encaixa com tudo o que ocorreu."

A distorção a que se dá ao luxo o Pe.Quevedo, de querer fazer ver a Lodge como limitado criticamente pela morte de seu filho é outra das muitas que se evidenciam, ao conhecer as fontes originais.

2. Outro exemplo claro onde pegamos o Pe.Quevedo em flagrante é em sua menção a uma sessão de Aksakoff com Florence Cook ( tomo 2, pp70-71 ), onde Luxmoore e Aksakoff amarram a médium de forma pouco usual. De fato, tão extenso é o relato das amarras, que ocupam 110 palavras do testemunho de Aksakoff. O Pe.Quevedo, no relato que cita, não só omite todo o concernente às complicadas amarras como também, além disso, em uma parte do relato em que se faz indispensável conhecer sobre estas, corta a oração sem nem sequer colocar as reticências. Comparemos os relatos :

QUEVEDO: "Encontrei-me na presença da médium sentada na poltrona, submersa em um profundo transe."

AKSAKOFF: "Encontrei-me então só e em presença da médium, que se encontrava sentada em uma poltrona em um profundo transe, com as mãos amarradas atrás de suas costas."

Omitindo parte desta oração, e todo o relato anterior das amarras, Quevedo distorce o propósito da sessão e fica fácil explicá-la a seu gosto.

 

Erros :

Erros de dados, datas, nomes, etc., são numerosos. Ilustraremos com três exemplos.

1. Na página 11, tomo 2, González Quevedo afirma que os componentes do Círculo Minerva, (Clube Minerva, em Genebra ) onde vários homens nobres da Ciência se reuniam e faziam experimentos com a médium italiana Eusapia Palladino, eram todos "espirítas declarados". Aqui há um grave erro, pois nem o cientista Morselli nem o Professor Porro eram "espíritas". De fato, Sir Lombroso em seu livro "After Death – What ?" ataca fortemente a Morselli por seu anti-espiritismo. O Professor Porro, da Universidade de Gênova, em sua famosa declaração, especificou claramente que não aceitava a hipótese espírita. Outros dos que formaram o Círculo Minerva, como Vassallo, se converteram ao espiritismo após as sessões, não antes.

2. Na página 90, tomo 2, Quevedo resume dizendo que Crooks abandonou a hipótese espírita rapidamente em seus estudos. Aqui há um erro, pois sabemos bem que Crooks morreu acreditando no Espiritismo e acreditando que havia se comunicado com sua esposa. Veja o estudo de Medhurst e Goldney, em que se demonstra isto através de cartas.

 

CONCLUSÃO

O que diria sobre tudo isso, um Parapsicólogo sério e que estime a ciência ? Primeiro, tem que esclarecer que o Pe. Quevedo só está expressando sua opinião particular ao dizer que "a Parapsicologia teórica" tem rechaçado o Espiritismo. Como bem assinala Scott Rogo: "Atualmente não há opiniões, reconhecidas em geral na Parapsicologia, sobre a sobrevivência após a morte.", ou seja, os parapsicólogos em geral, não opinam quanto à possibilidade de sobrevivência, depois que uma pessoa morre. ( Destaque nosso )

Segundo, sua insistência de que "Deus", "a Virgem" e a "Ordem Sobrenatural", têm se manifestado abertamente, e que isto está "cientificamente" demonstrado, é mais uma asserção teológica e apressada, que científica. Em nenhum de seus livros encontramos nem sequer as razões mínimas para dar apoio a estas informações tão categóricas. No entanto, Ele diz que elas estão "provadas", e nada menos que pela ciência ! O Padre Quevedo só não diz qual ciência, quando, como, quais cientistas, etc. Talvez Ele ache isso um detalhe sem importância. ( Destaque nosso )

Da mesma forma, outras muitas conjecturas, as quais costumam passar como "princípios" e "leis" sobre como deve atuar o ectoplasma, os limites da percepção extra-sensorial, etc, não nos parecem estar fundadas na razão e em firme documentação.

A obra de Quevedo não é fácil de ser julgada. Por um lado, seus conhecimentos sobre a história da Parapsicologia parecem ser vastos e impressionantes. No entanto, há razões mais que suficientes para concluir que Quevedo utiliza tal conhecimento para justificar seus fortes preconceitos ideológicos e teóricos, os quais evidentemente guardam certo compromisso com determinadas doutrinas da Igreja Católica. Portanto há, justificativa suficiente para rotular o Pe.Quevedo não como parapsicólogo, mas sim como um autor proselitista que deseja impulsionar de maneira desmedida sua ideologia católica.

Tratadistas como Gillispie (1958), Russel (1930) e White (1896) enfatizaram que a história da ciência conta com inúmeros exemplos de como uma ideologia religiosa implacável e apaixonada ( como a do Sr. Quevedo ) costuma ser incompatível com o espírito cientifíco. Na ciência, as conclusões costumam expôr-se como tentativa e sempre tendo em conta a falibilidade que tanto Popper (1962) enfatizou. Para o Pe.Quevedo, no entanto, a ordem do dia são as declarações categóricas, a formulação de "leis" arbitrárias e a impaciência e o desdém ante autores e investigadores que defendem posturas diferentes. É óbvio que seu proceder o separa do campo da Parapsicologia científica.

Na verdade, o Padre Quevedo deveria ser intitulado como um "Parapsicólogo Católico", pois estranhamente, muitas das suas teorias parapsicológicas coincindem com os Dogmas da sua Igreja. ( Destaque nosso )

Isto que assinalamos também tem sido notado por outros autores. Por exemplo, Hess (1987) indicou recentemente que " Oscar Gonzalez Quevedo reinterpretou a Parapsicologia dos Estados Unidos e da Europa à luz da doutrina da Igreja Católica ... para obstaculizar as bases científicas do Espiritismo.

Além disso, Rueda (1991) em um artigo recente no Journal of Parapsychology, faz o importante assinalamento de que Quevedo "tem usado a Parapsicologia como uma arma ideológica em uma briga para marcar sua perspectiva conceitual particular... De fato, para atingir suas metas, o Pe.Quevedo tem distorcido a Parapsicologia em seus livros, querendo, a maior parte do tempo, acomodar dogmas católicos à sua conveniência" (p.183).

Demonstramos, precisamente, as conseqüências nefastas que os compromissos ideológicos têm sobre o intelecto humano. O Pe.Quevedo, em seu entusiasmo por defender suas idéias particulares, demonstra pouco cuidado no momento de citar os textos, acomoda as citações à sua conveniência e, sobretudo, seu estilo e a maneira de apresentar casos e evidências o distanciam consideralvelmente de qualquer pessoa que de algum modo estime a Parapsicologia como uma disciplina científica.

 

 

Fonte: http://www4.pucsp.br/cos/cepe/intercon/revista/polemica/pfequevedo.htm
- https://pt.scribd.com/document/110272155/Uma-revisao-critica-dos-livros-do-Padre-Quevedo

 



topo

 

Acessem os Artigos, teses e publicações: ordem pelo sobrenome dos autores :
- A - B - C - D - E - F - G - H - I - J - K - L - M - N - O - P - Q - R - S - T - U - V - W - X - Y - Z 
  - Allan Kardec
   -   Special Page - Translated Titles
* lembrete - obras psicografadas entram pelo nome do autor espiritual :