O movimento espírita lançou-se na construção
e manutenção de instituições pré-escolares
há mais de cinqüenta anos, em uma época na qual
a população de baixa renda necessitava e não
tinha acesso a este tipo de serviço.
A lei de diretrizes e bases, nos anos
90, atribuiu ao município a responsabilidade pela educação
infantil. Nesta época, as atenções do legislador
criaram uma série de exigências, muito justas, que transformou
o perfil destas instituições e, com estas mudanças,
o volume de recursos necessário para mantê-las.
A antiga monitora, que na verdade
trabalhava mais como cuidadora que como educadora, passou a ser substituída
por educadoras com formação em nível de ensino
médio, o que alterou substantivamente os custos da folha de
pagamento, principal despesa deste tipo de organização.
As instituições espíritas
passaram a aceitar o estabelecimento de convênios com as prefeituras,
para cobrirem as despesas adicionais que começaram a surgir.
Algumas prefeituras, por sua vez viram
nesta parceria uma forma de atender uma quantidade maior da população,
destinar recursos para a área de educação e de
reduzir despesas com pessoal, já que os empregados são
contratados das instituições espíritas, e não
são (s.m.j.) computados como servidores públicos (o
que facilita o problema do limite de gastos com pagamento de servidores).
Tudo isto, sem contar que em curto e médio prazos, as prefeituras
não necessitam investir em aluguel ou construção
de prédios.
Após a celebração
de convênios, a política da prefeitura de Belo Horizonte
tem sido exigir mudanças e adaptações aos espaços
existentes, o que caiu em um espaço de arbitrariedades imensas,
cometidas pelos fiscais, uma vez que o conjunto dos convenentes tem
instalações muito diferentes entre si.
Não bastassem as arbitrariedades,
a PBH (falo desta porque não tenho dados de outras), após
a assinatura dos convênios deixa de ser parceira e age como
se fosse dona da instituição: transforma problemas de
comunicação em negligências (nas quais as socidades
espíritas pagam a conta), baixa portarias e deliberações,
sem negociação clara com seus parceiros, envia fiscais
para verificar o cumprimento de suas decisões e não
dá o devido suporte em áreas de sua responsabilidade,
como é o caso da saúde.
A questão que originou esta
publicação surgiu quando começamos a observar
que a Prefeitura, ao celebrar convênios com instituições
espíritas, passou a exigir que estas abrissem mão de
práticas espíritas oferecidas à comunidade. Em
uma das instituições tentou-se proibir o passe aplicado
nas crianças, por entender que se trata de prática religiosa,
e alegando o princípio da laicidade do ensino.
O órgão público
tem razão, quando alerta que uma prática religiosa não
pode ser imposta a crianças ou famílias que não
a aceitem, em um espaço aberto à população
em geral, contudo, em meu entendimento, não tem poder para
proibir a prática de passes para quem o desejar receber em
uma instituição que por força de convênio
presta serviço de cunho social mas continua sendo espírita.
Os convênios, com o passar do
tempo, tornam-se um problema para a manutenção das creches.
As sociedades espíritas passam a depender dele, e evitam confrontação
com o município, por medo de não conseguir manter financeiramente
as despesas com as creches. Chegará um tempo em que o poder
público irá adotar uma política de desapropriação
das creches espíritas? Viveremos no Brasil situação
semelhante à que enfrentaram nossos irmãos portugueses
e espanhóis na triste época da ditadura em seus países?
Espero que não.
Este relacionamento precisa
ser revisto e cabe ao movimento promover uma discussão com
especialistas na área de direito público para orientar
as instituições como celebrar parcerias que não
exijam das sociedades espíritas abrirem mão de sua identidade
essencial, identidade esta que motivou os associados a se unirem para
tentar colaborar na solução de uma chaga social que
estava aberta em uma época na qual o poder público não
tinha olhos de ver a necessidade do ensino pré-escolar para
as populações de baixa renda.