A obra Paulo e Estêvão, do espírito
Emmanuel - psicografada por Francisco Cândido Xavier em
1941 e publicada no ano seguinte (1942) pela Federação
Espírita Brasileira - foi apontada pelo próprio
Chico Xavier em 1970, no programa televisivo de Silvio Santos,
como o principal livro decorrente de sua mediunidade. Lido em
primeira mão por Rômulo Joviano, chefe de Chico na
Fazenda Modelo, onde ocorreu a psicografia por oito meses, o texto
foi chamado por aquele homem de“manual do trabalhador cristão”.
Algumas descobertas arqueológicas e históricas -
sobretudo do professor e pesquisador bíblico estadunidense
Harold Hoehner (1935-2009), destacadas pelo estudioso espírita
do tema Haroldo Dias - denotam a veracidade dessa obra. Ela traz
a trajetória de Paulo de Tarso mediante o apoio de Estêvão,
que, de vítima se tornou seu mentor espiritual. Na introdução
do livro, Estêvão é apontado por Emmanuel
não como o primeiro, mas sim “o grande mártir
do cristianismo”. Isto porque no livro Há dois
mil anos (FEB, 1939), dos mesmos: autor e médium,
é relatado o martírio cronologicamente anterior
de Simeão, aquele que encaminhou Lívia, a esposa
do senador romano Públio Lêntulo (reencarnação
de Emmanuel), ao cristianismo.
Por seu turno, a economia solidária constitui um universo
composto de empreendimentos econômicos pautados por princípios
igualitários e democráticos, tendo como modelo a
cooperativa autogestionária, onde todos os trabalhadores
repartem os ganhos do modo mais equânime e equilibrado possível,
buscando a convivência fraterna. O maior pensador dessa
proposta é Paul Singer (1932-2018), que foi professor de
economia na Universidade de São Paulo e condutor, entre
2003 e 2016, da Secretaria Nacional de Economia Solidária
no âmbito do Ministério do Trabalho. Autor de fundamentais
livros sobre o tema, Singer costumava dizer que a economia solidária
havia renascido no Brasil dos anos 1990. Ele fazia menção
a experiências históricas, com destaque para a dos
pioneiros do cooperativismo autogestionário moderno em
1844 na cidade inglesa de Rochdale. E considerava também
algumas experiências comunitárias bem mais antigas.
Paulo e Estêvão apresenta a primeira comunidade
cristã, fixada em Jerusalém e chamada de Casa do
Caminho, afinal antes de ‘cristãos’, os seguidores
de Jesus Cristo eram chamados de “homens do caminho”
(para a capital do judaísmo), lugar de onde eram recolhidos
indivíduos necessitados: enfermos, deficientes, viúvas
e órfãos pobres. A comunidade era mantida sobremaneira
com doações de homens abastados da cidade que se
solidarizavam com a causa, embora não rompessem com o farisaísmo
para abraçar a nova tradição religiosa que
nascia. Aristocratas desse grupo impunham constrangimentos judaizantes
aos membros da Casa e isso angustiava muito seu líder Simão
Pedro, que relata a situação ao ainda novato no
apostolado cristão: Paulo de Tarso. Complementando a plantação
de subsistência que Pedro já havia estabelecido lá,
Paulo propõe algo maior:
Os órfãos,
os velhos e os homens aproveitáveis poderão encontrar
atividades além dos trabalhos agrícolas e produzir
alguma coisa para a renda indispensável. Cada qual trabalharia
de conformidade com as próprias forças, sob a
direção dos irmãos mais experimentados.
A produção do serviço garantiria a manutenção
geral. Como sabemos, onde há trabalho, há riqueza,
e onde há cooperação, há paz.
Tratava-se da formação
de um empreendimento de economia solidária para que as
pessoas acolhidas pela comunidade cristã, já curadas
e refeitas, pudessem trabalhar de modo a buscarem, tanto quanto
possível, a emancipação econômica de
todo aquele grupo que abrangia cerca de cem pessoas. Paulo então
decide fazer uso de suas duras viagens missionárias para
a coleta de recursos em prol da viabilização do
intento. Passados alguns anos, ele retorna à comunidade
portando a “pequena fortuna” que é comovidamente
recebida por Pedro. Bem mais tarde, quando Paulo, já idoso,
estava à caminho da prisão em Roma:
(...) mulheres humildes
agradeciam os benefícios recebidos de suas mãos.
Doentes curados comentavam a colônia de trabalho [empreendimento
de economia solidária] que ele sugerira e ajudara a fundar
na igreja [comunidade cristã] de Jerusalém e proclamavam
sua gratidão em altas vozes.
Tais trechos estão nos
capítulos 5 e 8 da segunda parte do livro.
Alguns anos atrás, enquanto
Paul Singer ainda atuava na SENAES, tive oportunidade de lhe explicar
em que consistia a obra Paulo e Estêvão
e também contar tais passagens, ao que ele reagiu com surpresa
e alegria. Judeu nascido na Áustria, que viveu no Brasil
desde menino, ele se dizia ateu, mas foi a pessoa mais espiritualizada
que conheci. Por seus ensinamentos e exemplo de vida, o professor
segue inspirando, sobremaneira os que o conheceram e os que compartilham
dos valores da economia solidária, algo que é, a
meu ver, uma expressão socioeconômica do cristianismo.
Por sua vez o profundo livro de Emmanuel e Chico Xavier vem sendo
gradativamente reconhecido como o manual do trabalhador cristão.
André Ricardo de Souza - Sociólogo,
46 anos, professor e pesquisador agradecido a Adriana Jaeger pelo
incentivo para a escrita deste pequeno texto.