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Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-graduação
em Linguística e Língua Portuguesa da Faculdade de
Ciências e Letras da Unesp/Araraquara, como requisito para
obtenção do título de Doutor em Linguística
e Língua Portuguesa.
Orientador: Prof. Dr. Jean Cristtus Portela
Araraquara, SP - 2016
RESUMO
Esta pesquisa teve por objetivo investigar a
prática da psicografia ou escrita mediúnica com base
em relatos de experiência de médiuns psicógrafos
da cidade de Uberaba (MG). Sob a perspectiva da semiótica greimasiana
e com base nas contribuições de Jacques Fontanille para
o estudo das práticas semióticas, foi possível
compreender: a sintagmática do ato mediúnico e da escrita
mediúnica; a constituição do actante e do ator-médium
nesses relatos de experiência; seus mecanismos enuncivos e enunciativos,
responsáveis pelos efeitos de sentido de “verdade”,
implicados no estabelecimento do contrato fiduciário; a existência,
no córpus, de uma figuratividade “mediúnica”
e do além-vida; e, finalmente, as relações entre
corpo e transmissão, que nos permitem descrever como a memória
de uma prática pode ser constituída e transmitida, enquanto
configuração semiótica e cultural. A análise
do córpus nos permitiu, assim, reconstruir o percurso da psicografia
como prática semiótica, em seus diversos níveis
de imanência. Considerando a influência sociocultural
e o impacto editorial da escrita psicográfica no contexto brasileiro,
bem como a inexistência de estudos linguísticos ou semióticos
a esse respeito, acreditamos que o presente estudo tenha auxiliado
a preencher uma importante lacuna para a compreensão dessa
prática tão polêmica quanto inexplorada, e que
atesta a diversidade linguística, linguageira e cultural de
uma expressiva parcela de brasileiros.
INTRODUÇÃO
Seja pelo lugar que passou a ocupar no imaginário coletivo
sobre a comunicação com o “além”,
seja pelo bem-sucedido mercado editorial que se organizou em seu entorno,
genericamente chamado de mercado da “literatura espírita”,
a psicografia ou escrita mediúnica – a “escrita
dos espíritos” – é marcada, desde o princípio,
tanto pelas controvérsias que provoca quanto pelo fascínio
que desperta. Não obstante a sua natureza metafísica
– à qual se pode atribuir, em grande parte, a razão
pela qual tem permanecido à margem da ciência oficial
–, julgamos possível abordá-la a partir de um
esforço de apreensão que se dá pelo que ela tem
de mais manifesto, material e tangível: pela escrita, em si
mesma, isto é, pelo seu texto-enunciado; pela prática
que o gera; pelos objetos que faz circular – do manuscrito ao
livro –; e pelas estratégias que estabelece para garantir
sua existência e permanência no universo sociocultural.
Assim, a partir desse posicionamento diante da psicografia –
objeto analisável, ainda que de contornos pouco definidos –
damos início, neste estudo, a uma dupla busca: compreendê-la
como prática semiótica, isto é, como “prática
que produz sentido” e, ao mesmo tempo, compreender a “maneira”
pela qual ela produz o seu próprio sentido (FONTANILLE, 2008b,
p. 3).