Os precursores do Espiritismo
que evidenciaram a comunicação entre os dois mundos,
o dos vivos e o dos supostamente mortos, são inúmeros.
As visões do sueco Swedenborg, a mediunidade inconsciente de
Gottlieben Dittus, a clariaudiência do príncipe Luis
XVII, os fenômenos com o trabalhador escocês Edward Irving
e a extraordinária mediunidade clarividente e clariaudiente
do “profeta da nova revelação”, Andrew Jackson
Davis, revelaram um novo mundo de conhecimentos até então
quase ocultos aos homens.
A nova era espiritualista teve início em 31
de março de 1848 com os fenômenos de Hydesville, que
ficava perto da cidade de Rochester, em Nova Iorque, nos Estados Unidos
da América. Ali morava a família metodista Fox, composta
de três filhas (Leah Fox, Margaret Fox e Katerine Fox), duas
das quais viviam com os pais (Maggie e Kate), já Leah era professora
de música em Rochester. A família se estabeleceu na
humilde casa desde 1847, no entanto foi no ano seguinte que barulhos
estranhos começaram a acontecer. Esses ruídos misteriosos
despertaram a curiosidade da pequena Kate, então com 11 anos,
que decidiu manter um certo diálogo com os supostos ruídos.
Através dessa primitiva comunicação, ficou-se
sabendo que o autor das pancadas era o Espírito do vendedor
ambulante Charles B. Rosma, que fora assassinado há cinco anos
pelo antigo proprietário da casa e enterrado na adega. Utilizando-se
do alfabeto, David S. Fox, irmão do Sr. Fox, iniciou uma comunicação
sistemática com os Espíritos. Por este processo, a primeira
mensagem reveladora da Previdência Divina foi obtida: “Caros
amigos, deveis proclamar ao Mundo estas verdades. É a aurora
de uma nova era, e não deveis tentar oculta-lá por mais
tempo. Quando houverdes cumprido o vosso dever, Deus vos protegerá,
e os Bons Espíritos velarão por vós”. (Wantuil,
1945, p. 7)
Até a descoberta do corpo do
mascate, 56 anos depois dos ruídos (rappings, Moises e knockings),
as irmãs Fox foram alvo de muitas acusações e
várias experiências, a fim de desmascará-las ou
definitivamente descobrir-se o que eram aqueles sons. A descrição
completa da comprovação do assassinato se acha no número
do Boston Journal, de 23 de novembro de 1904. Essas descobertas, diz
Conan Doyle, fecharam a questão para sempre e provam, de forma
concludente, que foi cometido um crime naquela casa.
Com o fim das investigações
públicas em Nova Iorque e a afirmação da veracidade
dos fenômenos, entre eles o das mesas girantes (table-moving),
cresceu a curiosidade em torno deles. A imprensa dos Estado Unidos
ocupou-se em disseminar a notícia. Antes de terminar o ano
de 1850, alguns Estados da União já contavam com numerosos
Centros de estudos do Moderno Espiritualismo que, até então,
ainda não tinha recebido o nome de Espiritismo pelo seu codificador
Allan Kardec. No entanto, era necessário difundir a Terceira
Revelação na Europa, o centro do mundo naquela época.
“Prepararam então os
Espíritos Superiores a entrada dos novos ensinos naquelas velhas
paragens históricas, onde campeava o cepticismo e o materialismo.
Bem mais cedo do que se supunha, aqueles extraordinários fenômenos,
negados pela Ciência, explorados pelos charlatões, ridicularizados
pelos jornais, anatematizados por diferentes seitas, sofrendo desde
o inicio formidável oposição, acompanhadas, por
vezes, de cenas selvagens, em que houve a deplorar violências,
grosserias e absurdos de toda a espécie, – atravessaram
o Oceano Atlântico e invadiram a Europa”. (Wantuil, p.
17).
Em pouco tempo o fenômeno
das mesas girantes tornou-se moda na Europa. Em 1852, eram
comuns os convites para reuniões elegantes, em salões
na Inglaterra, onde, após o chá, as pessoas se divertiam
consultando tais objetos voadores. Além das formas rudimentares
de comunicação com o mundo invisível, como a
das pancadas, outras foram imaginadas e empregadas. A corbeille (ou
carrapeta) era uma cestinha de vime usada para servir vinho em garrafa,
na qual fixava-se um lápis na sua extremidade, em cuja ponta
pode apoiar-se e deslizar sobre uma ardósia (lousa). Os circunstantes
colocam o dedo indicador sobre a borda da cesta que, após certo
tempo, movimentava-se escrevendo palavras e frases inteiras. O Sr.
Kardec utilizou este método em muitas de suas experiências.
Enquanto no Velho Mundo o fenômeno
das mesas girantes crescia e, junto com ele, aumentavam as discussões
sobre sua legitimidade, seja com finalidade de estudo ou de recreação,
na América do Sul, “o grandioso movimento preparatório
do Espiritismo” (Wantuil, 1945, p. 124) também começava
a ter repercussão. A nobreza do Rio de Janeiro pode ter sido
o primeiro lugar aonde as notícias vindas da Europa aportaram.
O Jornal do Commercio, do Rio de Janeiro, foi o primeiro periódico
da Imprensa brasileira a divulgar as tabolas volleantes.
O Diário de Pernambuco,
o jornal mais antigo até hoje em circulação na
América Latina, cujo primeiro exemplar circulou em 1825, publicou
uma matéria, na parte destinada às noticias do Exterior,
sobre os fatos que atraiam a curiosidade geral do povo europeu. Na
edição de 2 de julho de 1853, o correspondente do Diário
de Pernambuco em Paris, noticiou a seguinte matéria:
Paris, 20 de maio de 1853
“Apesar das preocupações
políticas, um facto bizarro e que talvez não lhe eh
desconhecido, attrahe neste momento a attencao curiosa do publico,
quero falar do phenomeno das tabolas volleantes (tables tournantes).
Esta bizarra descoberta nos veio da América do Norte, porem
aclimatou-se logo em Franca, onde faz andar em roda todas as cabeças.
Na hora em que lhe escrevo, não se pode por pe em um salão,
sem ver toda a sociedade em torno de uma mesa redonda tendo cada
um o dedo mínimo apoiado no do visinho, e esperando todos
em silencio que a tabula queira voltar. Nesta posição
se esta quinze minutos, meia hora e ate uma hora, como se estivesse
occupado de um negócio importante. Algumas vezes a experiência
falha, mas quase sempre tem resultado, e a mesa arrasta em seu movimento
os experimentadores contentes e admirados. A mesma experiência
se faz com os chapéus, sapatos, e uma multidão de
objectos inertes, os quaes recebem igualmente o impulso do fluido
magnético. Tomei parte em algumas dessas experimentações,
ajudei a fazer voltar a tabola, e affirmo-lhe que o phenomeno se
produzio realmente.
Nossa academia das sciences esta embaraçada/
ella não quer admittir um resultado contrario as leis da physica,
mas, entretanto, lhe e um facto, e se prova alguma cousa he certamente
nossa ignorância de certas relações entre o ser
animado e a matéria bruta. Os magnetisadores estão maravilhados,
porque nos novos factos que se produzem, acham a demonstração
da verdade de seu systema. Eu os tinha como charlatões, que
exploravam a curiosidade pública, quando pretendem fazer descobrir
os objectos ronhados *ou predizer o futuro. Hoje quase que creio que
não he tudo mentira nas suas momices *, e que se poderia tirar
do magnetismo alguas meio de reconhecer as doenças e de cura-las.
Chamam o nosso mundo bem velho, ao ver o que se passa, parece que
elle esta ainda na infância e que nossos netos hão de
ver cousas estranhas. Em verdade desejar-se-hia viver por curiosidade”.
* Ronha – s.m. Malícia, manha, astúcia.
* Momices – s.f. Trejeitos, esgares, caretas.
* Isabelle Sarmento - Coordenadora de Infância
da Mocidade Tio Chico, do Lar Espírita Chico Xavier