Epes Sargent
> Cautela diante das sugestões de fraude
Epes Sargent (1813-1880),
nascido na cidade de Gloucester, Massachusetts, EUA. Escreveu
uma quantidade apreciável de obras destinadas a estudantes
e professores, tendo mesmo sido catalogado como educador emérito,
tornando-se famoso em toda a América do Norte, na segunda
metade do século passado. A sua obra "The Standard
Speaker", publicada em Filadélfia no ano de 1852,
alcançou mais de sessenta edições. Se interessou
pelo Espiritismo, estudando-o profundamente após ter sido
um dos que combateram e repudiaram os fenômenos insólitos
ocorridos em Hydesville e Rochester, através da mediunidade
das famosas irmãs Fox. Manteve correspondência epistolar
com numerosos dirigentes espíritas dos Estados Unidos e
da Europa. Escreveu numerosos artigos para os órgãos
que então se ocupavam da matéria. Epes Sargent foi
um homem de talento fora do comum. Sua operosidade foi das mais
intensas, tendo mesmo merecido de Edgar Allen Poe, que havia tomado
conhecimento dos seus escritos anteriormente a 1849, as seguintes
palavras: É um dos mais preeminentes membros da extensíssima
família Americana a dos homens de engenho, talento e tato.
O jornal "Boston Evening Transcript", comentando o seu
decesso, escreveu: "Qualquer assunto, quando descrito pela
sua pena, adquiria uma forma admiravelmente original, como se
fora uma nova criação".
Os fenômenos provados, indicadores
da obra de uma força inteligente estranha a todo o organismo
visível, têm sido desacreditados, sob vários pretextos,
por muitos que não têm tempo, vagar ou inclinação
para fazer uma justa investigação. O caráter
realmente maravilhoso de alguns desses fenômenos, provocou a
incredulidade; as fraudes aparentes, pelas quais médiuns, que
se supunham genuínos, têm sido freqüentemente acusados,
despertaram uma desconfiança natural; as extraordinárias
façanhas dos indivíduos que se intitulavam expositores
do Espiritismo e a audácia de suas asserções
confundiram não poucos daqueles cujos conhecimentos sobre este
assunto eram limitados. A idéia de que uma ocorrência
viola as leis da Natureza por ser maravilhosa, é, quando analisada,
uma simples superstição. Um médium é suspenso
até o teto, sem que nisso seja a lei da gravitação
mais violada do que quando saltamos um fosso. Admitindo-se a teoria
de uma força espiritual não sujeita à lei, o
fato se tornará acreditável. A acusação
de fraude feita a médiuns provados, como Florence Cook, Sra.
Wood, Sr. Williams e outros, levanta questões a que naturalmente
desdenham responder os que não conhecem intimamente a história
dos fenômenos. Falarei somente daquilo que investigadores inteligentes
aceitam como a solução pelo menos de alguns dos casos
em que médiuns, prévia e subsequentemente reconhecidos
como honestos, foram apanhados no que à «prima facie»
parecia fraude.
As influências que afetam os fenômenos são extremamente
sutis e imperfeitamente conhecidas. Tenho, porém, repetidamente,
nos estudos práticos e experiências, observado o seguinte:
os pensamentos ocultos, a vontade, o ânimo das pessoas promiscuamente
presentes em uma sessão de fenômenos, influem sobre o
caráter e a facilidade da sua produção, influência
esta que tem mais força por ser oculta e inacreditável
para as almas não preparadas. Conheci uma médium, cuja
honestidade nunca foi posta em dúvida e em cuja presença
os mais indubitáveis fenômenos ocorriam prontamente nas
mais rigorosas condições de exame, que ficou meio paralisada
pela presença de duas ou três pessoas, trazendo, cada
uma delas, talvez um ambiente espiritual adverso, todas veementemente
opostas ao êxito da experiência, e não só
com o intento de descobrirem uma fraude, mas ainda com a esperança
de a conseguirem. Segundo a teoria espírita, será desarrazoado
supor-se que tais pessoas possam exercer influências, e que,
se o médium intuitivamente não resistir a elas, consigam
afetá-lo de tal modo, que as provas venham confirmar sua descrença
e suas suspeitas de embuste? Que isso muitas vezes se haja dado, onde
o corpo transfigurado do médium se tem apresentado como uma
forma espiritual, é mais que provável. A crermos no
testemunho de cuidadosos investigadores tanto da Europa como da América,
o embuste não é coisa rara. O melhor caminho, contudo,
que deve seguir um noviço, quando se querem provas absolutas,
é não depositar a sua confiança nem no Espírito
nem no médium, mas nas condições exatas, se ele
puder obtê-las, as quais serão uma garantia contra os
defeitos e as decepções, seja do suposto mundo espiritual
seja deste.
É muito provável que os médiuns verdadeiros recorram
algumas vezes propositadamente à fraude, quando o poder supra-sensível
que produz os fenômenos não seja bastante eficaz. Para
isso concorrem: primeiro, a tentação de atrair um apreço
exagerado à sua presente mediunidade; e, depois, a tentação
do lucro pecuniário, que falhará se o fenômeno
não se der. Alguns médiuns fazem da exibição
de suas faculdades um meio de vida; e se, às vezes, suprem
os fenômenos reais por artimanhas, não devemos inferir
que, por ser falso em uma coisa, ele o seja em todas (*).
(*) Um espirita inglês, muito
familiarizado com esses fenômenos, escreveu (Novembro de 1878):
"Posso até admitir que o médium sensitivo pode,
em seu estado normal, ser levado a trapacear, por uma influência
do meio. Ele merece antes lástima que condenação.
Assisti às sessões escuras, públicas, de Williams,
Herne, Eglington, Bastian e Taylor, e vi o que considero manifestações
reais. Centenas de pessoas têm visto a mesma coisa em suas
próprias residências, com os mesmos médiuns
e em circunstâncias em que o embuste era impossível.
Por isso, não creio que uma pessoa, que seja realmente suscetível,
arrisque de propósito a sua reputação, empregando
uma fraude palpável e fácil de ser descoberta. Quanto
mais apurada for a suscetibilidade, mais fácil se tornará
a fraude. Frequentemente, se a sessão é muito longa
e o médium fica exausto, as baixas influências se manifestam."
Já muitas vezes se tem provado
que a acusação de fraude é, freqüentemente,
o resultado da completa ignorância do acusador, pois este se
aventura a tirar conclusões, aparentemente sinceras, mas que,
se ele possuísse mais algum conhecimento, se lhe apresentariam
como duvidosas ou falsas. Quanto aos intitulados expositores do Espiritismo,
ocasionalmente tem sucedido que pessoas dotadas de alguma faculdade
mediúnica, não podendo tirar das suas manifestações
um meio de vida, e tornando-se desafetas aos espíritas, por
estes repelirem suas pretensões, têm procurado o patrocínio
dos que combatem os fenômenos. Se tiverem facilidade de falar,
se possuírem muita presença de espírito e alguma
perícia na arte de prestidigitação, persuadirão
facilmente os inexperientes de que algumas das suas fraudes são
idênticas aos verdadeiros fenômenos mediúnicos.
Quanto aos fenômenos que não podem ser imitados fraudulentamente,
elas os produzem com o auxílio do gabinete e das cortinas,
pela cooperação de Espíritos de ínfima
classe. Em tais casos, têm sempre uma excusa para não
exibir ao público o seu «modus operandi». Dirão
que depois explicarão porque não podem divulgar o seu
segredo, enquanto ele for seu ganha-pão. Muitos desses impostores
têm conseguido atrair numerosos assistentes e colher da parte
dos inimigos do Espiritismo o auxílio que os adeptos não
lhes dariam.
Qualquer expositor que afirmar ser a clarividência e a pneumatografia
fraudes demonstráveis, pode com certeza ser considerado como
mistificado por si mesmo ou um petulante mistificador. Sua pretensão
ao título de emérito prestidigitador não passa
de uma suposição e, no geral, conhece que ela é
falsa. Seguidamente, durante os últimos trinta e três
anos, recebi cartas de amigos que, confiando muito em sua própria
sagacidade, me informavam de que certos fenômenos, que eu havia
proclamado como genuínos, estavam provados pelo expositor ambulante
como simples embustes. Em todo o caso o «expositor» acaba
sempre por ser conhecido como impostor ou pretensioso pantomineiro;
e então nenhum dos fenômenos geralmente aceitos pelos
investigadores cuidadosos e experimentados no mundo todo será
apeado de sua verdadeira base.
O fato de muitas pessoas que se dizem espíritas terem prejudicado
a sua causa, recorrendo à luz mediúnica para resolverem
seus negócios e assuntos domésticos, sob a inspiração
de sua própria razão e sentimento de direito, tem feito
nascer um amontoado de prejuízos, entre os que não investigaram
por si mesmos os fenômenos. Se o investigador deseja realmente
a verdade, depressa se libertará das objeções
que podem ter-se originado da credulidade dos neófitos ou das
fraudes dos médiuns mercenários. Ficará sabendo
que há fenômenos genuínos justificando a crença
em uma força sobrehumana e espiritual. Se o grande assunto
tem sido vituperado, a culpa é toda daqueles que daí
fogem cautelosamente.
Um eminente jurisconsulto, ocupando uma das mais altas posições
judiciárias por escolha do povo de seu Estado, em data de 10
de Julho de 1880, escreveu o seguinte:
"Minhas primeiras tentativas
em experiência deram-me a convicção de que eu
havia caído nos laços da fraude, e os princípios
perigosos e imorais, professados pelos que pareciam ser chefes da
Causa, impediram que por alguns anos me ocupasse com isso. Nos últimos
seis anos, porém, tendo a Causa sido expurgada de muitas
dessas fraudes, a luz me veio casualmente. Trabalhando nesse assunto
durante trinta anos e tendo observado a sua evidência nos
últimos doze anos, dei-lhe o melhor das minhas faculdades,
sempre dirigido por um gênio naturalmente céptico,
e consegui convencer-me de duas grandes verdades elementares, a
saber: a continuação da existência depois da
morte e a comunicação dos que foram com os que estão
encarnados. Levado a essa conclusão, admiti somente aquilo
que, sob o ponto de vista da evidência, resistisse ao mais
severo e céptico escrutínio da razão, libertada
da credulidade e das superstições."
A teoria espírita ensina que
a vida continua; que a palavra imortal deve ser tomada no sentido
etimológico, exprimindo — o que não morre. A continuidade
do ser não é então mais que um efeito natural
de causas presentes. Desse modo, o inquérito em busca de uma
crença na existência de órgãos espirituais
e faculdades da compleição humana, manifestando sempre
o seu trabalho na vida terrena e formando a base da vida comum a este
e ao seguinte estado do ser, torna-se um processo estritamente científico
e experimental, jogando com as mais delicadas e recônditas partes
da ciência fisiológica, ou com os desenvolvimentos psico-fisiológicos
da nossa natureza mista. É por terem confundido o fato de uma
vida futura com as questões especulativas teológicas
e religiosas, que chegaram à conclusão de ser esse fato
colocado fora das raias da verificação científica.
Há pessoas piedosas que declaram que, a não ser pela
autoridade da Bíblia, não têm motivos para crer
em Deus e na vida futura. Sobre isso, John Page Hopps observa eloquentemente:
"O que poderá dizer
ao povo, que só concebe a vida futura como a restauração
de um corpo dissolvido, aquele que, sem refletir e dirigido por
inculto instinto animal, despreza com zombaria a asserção
de ser o Espírito uma realidade maior que o corpo, ou que
nos diz que só crê na imortalidade porque ela se acha
consignada nos textos da Bíblia, livro que não é
infalível? Pouco importa que o povo seja bom, fervoroso ou
cultivado em outros sentidos; suas ideias relativamente ao Espírito
e à vida espiritual mostram que, nesse tremendo assunto,
eles não são mais que meninos. . . A primeira coisa
a fazer-se, é colocar toda a questão fora da região
do mistério, da falsidade, da fantasia e do temor, e chamá-la
para a do frio raciocínio e, se for possível, para
a experimentação científica."
É isso precisamente o que a
Inteligência, que se manifesta pelos chamados fenômenos
espirituais, parece incitar-nos a fazer.
"O Espiritismo, disse o falecido
Dr. Hallock, não é um problema novo que deva surpreender
os discípulos da Ciência; através de todas as
idades, ele bateu à porta de todos os pensadores, pedindo uma
solução. Em falta desta, o pensamento popular, mal dirigido
por uma teologia completamente cega e caduca, envolveu numa mortalha
a imortalidade de sua própria crença e converteu-a em
um espantalho, transformando a mais bela e sublime operação,
pela qual a Humanidade é glorificada, em um horrível
esqueleto a que deram o nome de morte, fazendo dela o objeto do mais
profundo horror. Competia à Ciência despojar desses andrajos
o Espírito imortal. Porque não o fez?"
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Bases Científicas do Espiritismo, pp. 33-38.
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