Em 1991, a cantora norte-americana
Pam Reynolds morreu por alguns minutos. “Matar” clinicamente
a cantora foi o procedimento utilizado pela equipe cirúrgica
para remover um aneurisma de seu cérebro. Durante a operação,
ela deixou de respirar, seu coração parou de bater e
o sangue foi drenado da sua cabeça. Ao se recuperar da cirurgia,
ela foi capaz de contar em detalhes os procedimentos da equipe médica,
descrevendo diálogos e aparelhos utilizados.
Por tudo o que a neurociência
descobriu na última década, histórias como a
de Pam Reynolds, que sugerem a existência de uma mente que funcionaria
independentemente do cérebro, não poderiam ocorrer.
Afinal, a cada dia surgem novos estudos indicando que tudo o que existe
na mente humana, de pensamentos e emoções a ética
e personalidade, não passam de produtos da atividade cerebral.

Pam: experiência de quase morte
Desafinando esse coro, alguns cientistas têm
se voltado para a investigação de experiências
espirituais que, segundo eles, exigiriam uma nova maneira de pensar
a mente. Entre elas, as experiências de quase-morte (como as
do filme Além da Vida), e os fenômenos
mediúnicos. Uma das principais experiências do tipo é
The Human Consciousness, um projeto desenvolvido
em 25 hospitais europeus e norte-americanos que pretende acompanhar
1.500 sobreviventes de parada cardíaca, e, por meio do monitoramento
das atividades corporais e de entrevistas com os pacientes, tentar
determinar o que há de real e de imaginário nas experiências
de quase-morte. “Essas experiências desafiam a doutrina
materialista em relação ao problema mente-cérebro,
sugerindo que os processos mentais podem ser experimentados no momento
em que as funções do cérebro aparentemente não
estão ativas”, aponta Julio Peres.

Júlio Peres: mente pode funcionar sem
cérebro?
Outro neurocientista, Li Li Min, prefere acreditar
em causas neurobiológicas para as experiências de quase-morte,
como alterações na visão, provocada pela falta
de oxigenação no cérebro, que provocariam a ilusão
de entrada num túnel de luz (comum nas descrições
de quem acredita ter feito um bate-e-volta para o Outro Lado) e “elaborações
complexas do cérebro” semelhantes a sonhos. No caso de
Pam Reynolds, especula que “ela poderia ter imaginado a cirurgia
a partir de informações prévias, como documentários
de televisão”.
“Esse tipo de estudo é feito por crentes que falam para
outros crentes da mesma área de pesquisa dele”, rebate
o geneticista Renato Zamora Flores. “A ciência de boa
qualidade deve reunir dados empíricos tão bons que sejam
capazes de convencer os descrentes, como eu, e isso eles não
conseguiram fazer”, diz.
E não será nada fácil convencer
Zamora, que continuou ateu mesmo após passar por uma experiência
de quase-morte durante um acidente de carro, com direito ao pacote
completo de sensações deste tipo de evento. “Na
minha visão se formou um túnel, eu vi um monte de luzes
e, à medida que sangrava, eu sentia que as coisas iam ficando
mais tranquilas”, lembra. Um vislumbre do Além? Nada.
“A minha impressão é que tudo isso eram neurônios
disparando por causa da falta de oxigênio no cérebro.
Eu continuo certo de que não existe vida após a morte.
Mas achei engraçado porque vi como morrer pode ser bonito.”
Zamora critica os "estudos de crentes para
crentes"