“Numa sociedade organizada
segundo a lei do Cristo ninguém deve morrer de fome.”
Resposta dos Espíritos a Questão 930 de o Livro
dos Espíritos.
Observando o mundo atual constatamos facilmente a existência
de grandes contradições, onde o homem, a cada instante,
embora demonstre ter alcançado elevado padrão de desenvolvimento
tecnológico, ignora em sua grande maioria os valores essenciais
de sua natureza espiritual, gerando grandes divergências de
opinião, dificultando a sua caminhada evolutiva.
Pois, como nos mostrou a socióloga Cleusa Colombo também
no movimento espírita brasileiro, existem as divergências
de opiniões, que dificultam a união dos espiritistas
e a unificação do movimento espírita na aplicação
do método kardequiano. (1)
Na área da Assistência e Promoção Social
Espírita não é diferente. Há divergências
de opiniões e interpretações a cerca de como
deve ser a atuação do movimento espírita em relação
a questão social.
Há, por exemplo, os que apoiam basicamente uma caridade assistencialista
- filantrópica; Há, os que se dedicam ao estudo dos
fenômenos e suas implicações, entendendo que não
cabe ao Espiritismo o atendimento social e assistencial às
massas menos favorecidas socialmente. E há ainda, outros que
acreditam na transformação da humanidade, através
de um entendimento tríplice da Doutrina Espírita, em
que para estes Ciência, Filosofia e Religião se entrelaçam
indissoluvelmente, entendendo que a caridade deve transcender o assistencialismo,
e que o movimento espírita deve ter uma atuação
mais efetiva, influindo nas estruturas sociais, e contribuindo para
a promoção do homem, usando a educação
como instrumento de progresso moral e espiritual.
No que se refere ao social, Kardec nos afirmava que:
“A questão social
depende inteiramente do melhoramento moral do indivíduo e
das massas,...”.(2)
Esclareceu ele ainda, que;
“A educação
é o conjunto de hábitos adquiridos e que é
através da educação que as massas menos favorecidas
melhorarão economicamente”.(3)
Neste sentido o Espiritismo assume
a posição de que a questão social está
intimamente ligada às questões moral e espiritual, sem
divisão entre a realidade social e a realidade espiritual,
e a evolução do homem integral, entendido como ser moral
que se manifesta na sociedade, determina a evolução
das relações sociais.
Para Kardec:
“o progresso é
uma sucessão de fatos morais e sociais determinados pelas
relações entre o elemento espiritual e o elemento
material”.(4)
Na visão do reformismo social
cristão, enfatiza que a questão social moderna transcenderá
o âmbito econômico-social, apontando cada vez mais para
a esfera espiritual e cultural.
Já o Espiritismo visando promover a transformação
da humanidade, utiliza-se do mecanismo da reforma moral dos indivíduos.
Herculano Pires, no entanto, acentua; “esta reforma deve
ser profunda, não superficial”.(5)
Parte ele do princípio de que, “o mundo e, por conseguinte
a humanidade, é o reflexo do homem e que para obtermos um mundo
transformado, ou um verdadeiro mundo de luz é necessário
acendermos a luz das almas”. (5)
Diz ainda que; “Isso, por si só, não basta,
é preciso, ao mesmo tempo em que, acendemos a luz das almas,
devemos fazê-la brilhar no meio social em que vive, pois as
almas iluminadas iluminam a sociedade”. Considera ainda,
Herculano; que “essa iluminação se dará
através da Educação, cuja Pedagogia consiste
em ensinar e dar o exemplo, (5) seguindo
o modelo do Cristo”.
Também o Espiritismo partindo do conceito de que os sistemas
sociais se criam de acordo com a evolução dos homens,
não concorda que esta reforma, ou mudança seja feita
de forma abrupta e impositiva, mas sim de modo gradual e permanente.
É preciso que haja tempo para a assimilação das
novas idéias. Kardec acentua:
“Não se transforma
o coração dos homens por decreto. (6)”.
Na visão espírita,
conforme nos demonstra Denis,
“A educação
da alma é a finalidade última, o fim supremo da evolução
humana”. (7)
Portanto, a solução
dos problemas sociais, segundo o Espiritismo, está baseada
na Pedagogia, constituindo-se a educação no instrumento
desta transformação. Entende ainda, que é através
da educação que se conseguirá libertar o homem,
induzindo-o a prática da caridade, da solidariedade, do amor
ao próximo, do combate ao orgulho e ao egoísmo. Pois
como Kardec, afirmava:
“Nada se opõe mais
à liberdade e a fraternidade, do que o orgulho e o egoísmo”.(8)
Por isso, para o Espiritismo o caminho
para a solução dos problemas sociais está na
Pedagogia da transformação moral do homem e da sociedade.
Isto significa que os problemas sociais, na sua essência, são
problemas morais.
Ainda, partindo do raciocínio de que o exercício da
solidariedade é lei universal que liga todos os seres humanos,
a prática da caridade deve transcender o assistencialismo,
atuando nas estruturas sociais e culturais, transformando a mentalidade
dos homens. Sendo por isso importante investir na Educação,
proporcionando à criança, jovens e adultos, uma formação
cultural apoiada na mais positiva e completa base espiritual, que
mostre a insensatez das concepções materialistas.
Outro aspecto a ser observado em relação à questão
social é a falta de cuidado com o ser humano, estigma de nosso
tempo. Esta falta ocorre em todos os sentidos. Portanto, cabe a nós
espíritas, neste terceiro milênio, construir um novo
paradigma de convivência, inaugurando um novo modelo de assistência
e promoção social, estabelecendo um pacto social, de
respeito e preservação a tudo que existe e vive, buscando
alternativas que representem uma nova esperança. Leonardo Boff
nos alerta, “O grande mal desta civilização
é o descuido, o descaso, o abandono, numa palavra, a falta
de cuidado. Há um descuido manifesto pelo destino dos pobres
e marginalizados da sociedade.” (9)
Assim, acima de qualquer combate à classes sociais e estruturas
econômicas, o Espiritismo deve atuar no campo social, transformando
o homem, por dentro, tornando-o capaz de moralmente realizar a construção
de uma sociedade mais justa, contribuindo na formação
de um homem consciente de suas responsabilidades com a vida, com o
mundo, com o meio ambiente, com a sociedade, com o próximo,
com Deus e consigo mesmo.
Mostra ainda, o Espiritismo, através da leitura de suas obras
básicas, que a ação mais agradável a Deus,
é a da caridade.
“Mas não dessa
caridade fria e egoísta que consiste em espalhar em torno
de si a sobra de uma existência nababesca, mas da caridade
cheia de amor, que vai ao encontro do infeliz e o levanta sem humilhar...”
Segue dizendo;
“Não repudies as
lamentações receando ser enganado, mas vai à
fonte do mal. Alivia primeiro, depois informa-te e verifica se o
trabalho, os conselhos, mesmo a afeição, não
serão mais eficazes que a esmola”. (10)
Esclarece ainda, o Espiritismo as
relações que há entre o corpo e a alma, e afirma;
“Que por serem necessários um ao outro, é
preciso cuidar de ambos”. (11)
Contempla assim, o homem na sua totalidade: Espírito e Corpo.
Portanto, a assistência e promoção social espírita
constituem-se, hoje num instrumento de interação com
a sociedade, de que dispõe o Movimento Espírita, veicula
a mensagem espírita, exercendo o seu papel transformador, levando
o consolo, esclarecimento, iluminação, assistindo àqueles
que passam pela difícil prova da privação material,
espiritual e moral. Deve assim, o Movimento Espírita levar
o atendimento emergencial, mas, acima de tudo, deve contribuir para
a promoção e elevação moral e, por conseguinte,
social do indivíduo e da família, através da
educação.
* o autor é Administrador e Diretor do Departamento
de Assistência e Promoção Social Espírita
da FERGS