Dissertação de Mestrado
RESUMO
Tolerâncias e intolerâncias acontecem em
qualquer âmbito do convívio social, principalmente no religioso.
A presente dissertação aborda uma aproximação
ao tema, nos ambientes (centros espíritas) de prática
religiosa do espiritismo kardecista. Essa tarefa começa por volta
de 2013, quando ainda persistiam e já se avolumavam consideravelmente
as situações de intolerância religiosa neste tão
múltiplo religioso Brasil, e começa a se consolidar a
partir de 2015.
Busco explicitar o que é o espiritismo kardecista,
sua chegada ao Brasil, como se instala, o surgimento dos primeiros locais
de cultos, a sua disseminação, a sua criminalização
e a sua luta para se legitimar como religião na sociedade brasileira.
Isto feito, apresento a noção do que seja tolerância
ou intolerância em sentido lato, restringindo-se, entretanto,
ao entendimento no âmbito das Ciências Sociais. Noções
e conceitos estabelecidos, descrevo o ambiente de prática, ou
seja, a instituição espírita, sua filiação
ao órgão representativo, seus ritos, orientações
e recomendações. Realizando pesquisas prévias em
três centros espíritas para a verificação
da existência das intolerâncias e, em seguida, entrevistas
com colaboradores desses centros espíritas onde, de maneira mais
próxima, tento observar se o discurso da tolerância se
confirma na prática.
O que se verifica ao final, é a existência
de ambas: tolerância e intolerância coexistindo nos centros
espíritas, não como forças antagônicas, mas
como uma particularidade individual dos estados vivenciais, onde o esforço
próprio dos colaboradores voluntários parece ser um dos
caminhos que podem ser utilizados no sentido de reduzir, ou até
mesmo eliminar, as intolerâncias externas e internas. Ao espírita
kardecista cabe a responsabilidade e a disposição para
demonstrar se isso é possível ou não, neste seu
ambiente.
(trecho)
Há intolerâncias e há tolerâncias nos centros
espíritas que são os ambientes de práticas do espiritismo
kardecista. No entanto, essas situações não foram
encontradas ou relatadas como existentes nos momentos de acolhimento
aos assistidos. Como mencionou Aline ao dar um passe em um muçulmano,
orientou-o a pensar em Jesus e ele disse: “Posso pensar em Maomé?”
E ela respondeu “Sim, pode!” Os relatos são unânimes
neste sentido: os atendimentos se destinam a todos, sem qualquer distinção
de cor, ideologia política, nacionalidade, sexo (e gênero)
e religião. Assim, se as situações de intolerância
e de tolerância não aparecem na superfície do atendimento
social das ações espíritas, isso não quer
dizer que possam estar nos subterrâneos dos centros. Mas podemos
dizer que aparecem, em determinadas situações e em alguns
momentos, de maneira pontual, visto não ser geral nas situações
de práticas espíritas. Nestes casos, o desmerecedor não
é o centro espírita, mas a falta de entendimento e compreensão,
por parte do colaborador voluntário que ainda não se conscientizou
do que é ser espírita. Do que é ser um verdadeiro
espírita. E, para Kardec, “reconhece-se o verdadeiro espírita
pela sua transformação moral e pelos esforços que
faz para dominar suas más inclinações.”
“A história
da humanidade é, também, a história da sua
inabilidade para conviver com o outro, com o diferente. Os preconceitos
que geram a intolerância nutrem-se de alimentos abundantes
como o desconhecimento, o desrespeito e a indiferença. A
intolerância religiosa, por sua vez, está entre as
formas mais violentas, pois ferem o homem no seu aspecto moral mais
profundo ao rejeitar sua concepção ontológica,
gerando reações muitas vezes imprevisíveis.
Nestes casos, as religiões podem deixar de ser “caminhos
para os céus” para se tornarem verdadeiros “atalhos
para o inferno” ao se proporem o monopólio da “verdade”
ou da noção de deus.”
Rita Amaral – Antropóloga (1958-2011)
RIBEIRO FILHO, Sebastião Antunes. Tolerância
e intolerância religiosa: sua percepção e vivência
em espaços e práticas do espiritismo kardecista. 2018.
Dissertação (Mestrado em Humanidades, Direitos e Outras
Legitimidades)
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade
de São Paulo, São Paulo, 2018.
Orientadora: Prof.ª Dra. Margarida Maria Moura
doi:10.11606/D.8.2019.tde-20022019-140944
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Fonte: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8161/tde-20022019-140944/pt-br.php
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