“A inclusão
das crianças especiais não é uma utopia”
O conhecido estudioso e psicopedagogo espírita
fala sobre a questão da inclusão das crianças
especiais nas instituições espíritas
Marcos Paterra, na presente entrevista fala como
vê a questão da inclusão das crianças especiais
nas instituições espíritas.
Como psicopedagogo e espírita,
como o senhor vê a inclusão de crianças especiais
nas instituições espíritas?
Nas instituições espíritas
percebemos que poucos centros se adequam na estrutura física
e menos ainda têm pessoas com conhecimento para lidar com as
diversas e complexas formas de deficiências. A inclusão,
tanto nas instituições espíritas ou mesmo nas
escolas, é para alguns uma utopia, pois embora algumas instituições
se adequem para algumas deficiências instalando rampas, banheiros
apropriados, a falta de conhecimento dentre os que ali estão
torna a estadia de crianças ou mesmo adultos um tanto comprometida.
Vejo instituições que fundam associações
ou fundações paralelas para tratamento de crianças
especiais, ou de doenças crônicas ou mesmo para deficientes
físicos. Isso é muito bom, mas restringe a elas a inclusão,
além do que tem fins específicos para determinado tratamento.
E as outras instituições onde no bairro há uma
família com um filho autista, ou deficiente auditivo, ou Down?
Tem que excluir seu filho ou se deslocar para uma instituição
que o aceite ou possa integrá-lo?
O senhor então considera a inclusão
uma utopia?
Não. Mas... A inclusão se baseia em
vários conceitos, dentre eles posso frisar três, em que
é necessário que a criança:
1. Seja uma pessoa que se encontra dentro de um grupo,
no sentido dele fazer parte.
2. Que tenha amigos e relações sociais
significativas com iguais, ou sinta que participa na vida social,
contribuindo com alguma coisa.
3. Por fim que seja tratada com igualdade, carinho
e respeito como a pessoa única que é.
Resumindo, ela tem que ser inserida de modo a sentir
bem-estar pessoal e social. Fica evidente que a inclusão sem
esses conceitos não assegura inclusão social. Se as
instituições não pensarem e agirem baseadas nesses
conceitos, as mudanças estruturais para deficientes não
terão usuários com deficiência.
Qual sua opinião quanto à inclusão
nas escolas de evangelização espíritas?
Um dos grandes desafios das instituições
espíritas, atualmente, é saber lidar com a criança
que apresente alguma deficiência. Em seu despreparo o centro
espírita pode desencadear mais problemas ainda, e até
mesmo agravar os já existentes, reforçando nessa criança
o autoconceito negativo, a desmotivação, o desinteresse
e outros mecanismos de defesa, como a indisciplina, rebeldia ou agressividade,
que utiliza para justificar a sua incompetência diante da aprendizagem,
acreditando-se incapaz de internalizar novos conhecimentos. Acredito
que seja necessária a construção do Projeto Pedagógico
moldado às novas condições, e também identificar
e intervir junto às dificuldades que esses alunos incluídos
possuem ou tendem a possuir nessa nova perspectiva de ensino.
Que consequências você vislumbra
para o processo de evangelização infantil e juvenil
advindas da carência de uma visão inclusiva nessa atividade
no movimento espírita atual?
Enfrentamos um paradigma cultural que vem dos conceitos
eugenistas, em que o que é diferente ou deficiente deve ser
“excluído”. Assistimos no decorrer dos últimos
anos às tentativas maciças de liberar o aborto, a eutanásia
e, é claro, também minar as tentativas de inclusão.
Sob esse prisma é necessário criar processos de ensino
onde a visão inclusivista seja acrescida, ou teremos espíritas
elitizados e moldados a formas arcaicas do conhecimento. Entendo que
a própria palavra “Evangelizar” é espalhar
a “boa nova” e, portanto, vamos fazer isso aprofundando-nos
em uma visão inclusivista, no grande amor de Jesus por todos,
sem distinção de sexo ou deficiências. E vou mais
além, na evangelização juvenil que abre precedentes
para o ESE e o ESDE, deve-se já instigar os jovens à
leitura de obras de J. Herculano Pires, Ernesto Bozzano, Bezerra de
Menezes, Adenauer de Novaes, e tantos outros que fazem também
parte da história do Espiritismo e abordam assuntos pertinentes
sobre diversos tópicos, dentre eles as deficiências.
E dentro do ESDE seria imprescindível também ter esse
incentivo. A doutrina espírita, maravilhosa que é, abre
precedentes para a crítica e a autocrítica, e para responder
às dúvidas inerentes a essas críticas é
necessário ampliar as fontes do saber.
Se nós, que pregamos a caridade e tencionamos
o entendimento do ser, não abrirmos precedentes para a inclusão
dentro de nossas instituições, e é claro na evangelização,
estaremos caindo na hipocrisia da falsa moralidade e criando seres
eugênicos.
Você diria que crianças com alguma
síndrome, como o autista por exemplo, sofrem algum tipo de
obsessão ?
Conforme Bezerra de Menezes na obra Loucura e
Obsessão, psicografada por Divaldo Franco, o Autismo,
como também todos os processos de limitações
e doenças psíquicas ou mentais, é um resgate
para Espíritos que em suas encarnações passadas
tiveram "poder" de influência, decisão, liderança,
ideológico ou coisas assim e que não utilizaram aquele
"dom" em um objetivo útil ao próximo, abusando
de sua influência e muitas vezes se aproveitando de tudo o que
podia fazer para ganho próprio. O psicólogo espírita
Adenáuer de Novais na obra “Reencarnação:
processo educativo” nos diz: “Há crianças
que rejeitam tão fortemente a encarnação atual,
aos membros de sua família, ao ambiente em que retornaram,
que se alheiam da realidade. Experimentam uma rejeição
muito grande à atual encarnação. O Espírito
prefere permanecer vinculado ao passado, a algo distante e remoto
que, de alguma forma, lhe recompensa. Esses casos podem levar ao autismo.
[...]”.
Em resumo, além da auto-obsessão, essas
“crianças que apresentam síndromes” também
atraem inimigos do passado que as obsidiam.
Gostaríamos de agradecer sua disposição
em nos conceder esta entrevista e pedir suas considerações
finais.
Eu que agradeço, e gostaria
de aproveitar e enfatizar que a “inclusão” não
se restringe aos portadores de deficiência, mas também
envolve as diversidades étnicas, a opção sexual
e as diferenças sociais ou religiosas. Devemos lembrar que,
segundo aprendemos no Espiritismo, o corpo nada mais é que
uma carcaça para que o Espírito possa habitar e evoluir.
Sob essa ótica somos todos Espíritos... Portanto, todos
IRMÃOS!
Devo também lembrar que os
Centros Espíritas ajudam e orientam nas questões espirituais,
todavia se o frequentador/evangelizando necessita de cuidados médicos
ou fazer uso de remédios, não podemos nem devemos interferir.
Nosso tratamento é baseado na fluidoterapia e na orientação,
mas não descartamos o auxílio carnal dos médicos.
Para finalizar cito a frase de Kardec
em “A Gênese” (pág. 31): “na reencarnação
desaparecem os preconceitos de raças e de castas, pois o mesmo
Espírito pode tornar a nascer rico ou pobre, capitalista ou
proletário, chefe ou subordinado, livre ou escravo, homem ou
mulher. Se, pois, a reencarnação funda numa lei da Natureza
o princípio da fraternidade universal, também funda
na mesma lei o da igualdade dos direitos sociais e, por conseguinte,
o da liberdade”. Muito obrigado.
Marcos
Paterra, radicado em João Pessoa, capital do Estado da
Paraíba, é psicopedagogo, palestrante e articulista
espírita, membro da AME/PB.