A mediunidade há
muito se espalhou pelo Brasil. em todas as classes sociais e em suas
diversas modalidades: de cura, de efeitos físicos, psicografia,
psicofônica, psicopictográfica e outras.
Ao deter-se na coleta de informações
para tentar compor um estudo sobre a história da mediunidade,
o observador atento vai descobrir que os fenômenos mediúnicos
sempre estiveram presentes na vida religiosa de todos os povos e nações.
Ao longo do tempo, em cada região ou localidade onde essas manifestações
eclodiam, recebiam nomes diferentes. No antigo Egito a mediunidade era
reconhecida como ritos de iniciação. Entre os gregos era
chamada de mistérios de Elêusis. Na Pérsia chamava-se
magia, entre os babilônios, adivinhação. Para os
antigos hebreus seu nome era dons da profecia. Entre os cristãos
primitivos a mediunidade chamou-se carisma, e recebeu diversos nomes
conforme suas diferentes modalidades de manifestação:
dons do espírito, dons de cura, dons de línguas, profecia.
Os ofitas chamaram-na de delírios espirituais. Entre os druidas
seu nome era ritual de magia. Entre os cátaros o transe mediúnico
era chamado de consolamentum. Na Alemanha, na época de Lutero,
à eclosão de um “surto mediúnico”,
deram-lhe o nome de epidemia mística. Além destas, muitas
outras definições foram dadas aos fenômenos mediúnicos,
registradas pela história religiosa de cada povo. Finalmente,
com Allan Kardec, esses fenômenos consolidaram-se como mediunidade,
e hoje esse termo é aceito, com algumas exceções,
quase que universalmente. Os católicos, na atualidade, reabilitaram
a mediunidade de cura em seu meio com o nome de movimento de renovação
carismática, numa referência aos carismas, nome que a identificava
nos tempos apostólicos, e os evangélicos, na atualidade,
dão-lhe o nome de descida do espírito santo.
Mas não somente em movimentos coletivos manifestou-se a mediunidade.
Também com indivíduos, isoladamente, dentro ou fora de
ambientes místicos ou religiosos, os fenômenos mediúnicos
nunca deixaram de se manifestar, aqui e ali, com qualquer tipo de pessoas,
em lugares diferentes, em línguas diferentes, e em tempos diferentes.
Naturalmente, as forças espirituais superiores que assistem à
humanidade, através dos processos mediúnicos, sempre mantiveram
abertos os canais de intercâmbio entre seu plano e o nosso, como
uma necessidade de se manterem permanentes essas experiências,
visando aos tempos futuros, quando o conceito de religião tivesse
transcendido às velhas concepções de religião
organizada, com seus rituais, dogmas, e formalismos inúteis.
De entremeio a tantas manifestações do espírito,
ao longo de milênios, três grandes ciclos mediúnicos
se sobressaíram na história, coincidindo com três
importantes revelações religiosas que a humanidade assistiu,
e que os espíritas consagram como . Isso nos leva a refletir
sobre as informações de André Luiz segundo as quais
religião e mediunidade são intercorrentes, isto é,
embora coisas diferentes, ambas se complementam. Desta maneira, o Mediunismo
funciona como fator coadjuvante na consolidação da cultura
religiosa entre os homens, e, conseqüentemente, como necessário
e poderoso instrumento auxiliar para sua ascensão espiritual.
O primeiro grande ciclo mediúnico ocorreu na velha Canaã
dos hebreus, ao tempo de Moisés. O grande profeta (médium)
e legislador hebreu pretendeu fazer de seu povo uma grande nação
teocrática, e para preservá-la dentro de princípios
teocráticos, precisaria educar seus irmãos de raça
para que assimilassem perfeitamente as "ordens que seriam ditadas
por Jeová". Povo rude e insubmisso, cercado por todos os
lados por nações belicosas e pagãs, que faziam
de seus variados deuses mitológicos seus objetos de adoração,
para Moisés, a crença dos judeus em Jeová, Deus
único, precisaria estar fortemente arraigada num profundo sentimento
religioso. Assim como os deuses mitológicos estavam sempre presentes
em cada atividade e costumes dos povos vizinhos, também Jeová
deveria estar presente em cada peripécia da vida dos judeus.
Moisés deu-lhes esse Deus, único e superior. Porém,
igualmente aos deuses mitológicos, Moisés dotou-o de sentimentos
humanos, e pela boca do povo (via mediúnica), fê-lo falar
a língua do povo, e expressar os sentimentos desse próprio
povo. Ao contrário do que entenderam os intérpretes dos
textos bíblicos, o grande líder hebreu não proibiu
o profetismo (mediunismo), e sim o liberou, e estimulou a sua prática
junto à sua gente. ...quem dera que todo o povo de Israel fosse
profeta, e que o Senhor pusesse o seu espírito sobre ele! (Nm.
11,29). Como Moisés sentia- se impotente para conter a insubmissão
de seu povo, pediu socorro aos espíritos, que o mandou escolher
setenta anciãos entre os mais respeitáveis, e de uma só
vez torná-los médiuns ...e tirando do espírito
que estava sobre ele, o pôs sobre aqueles setenta anciãos;
e aconteceu que, quando o espírito repousou sobre eles, profetizaram.
E estes passaram a colaborar com Moisés na obra de doutrinação
de seu povo. Quanto mais perto de Jeová os judeus se sentissem,
mais conscientes estariam de sua missão de . Porém Moisés
enganou-se. De posse dos dons espirituais, cada judeu viu nessa prática
uma maneira de subtrair vantagens. A venda de favores espirituais tornou-se
atividade comum entre eles. E a mediunidade, entre aquele povo, breve
perverteu-se. As hostes de espíritos inferiores aproveitaram-se
do ambiente favorável que se estabeleceu a seu favor, para estimularem
aquela gente invigilante a reverenciar falsos deuses e estátuas
de animais como o bezerro de ouro, cujo simbolismo compreendia rituais
sensualistas que terminavam em festivais de sexo explícito coletivo.
Moisés compreendeu que errara. Seu povo estava ainda imaturo
para assumir responsavelmente as práticas de tão elevadas
revelações, e de conviver com elas, obtendo com esse privilégio
a acumulação de valores morais que o haveriam de tornar
uma nação realmente superior em relação
aos outros povos. O grande condutor hebreu voltou atrás em sua
decisão, e só então proibiu o intercâmbio
com os espíritos entre sua gente, e reprimiu com violência
o seu uso. Os que ousassem praticá-lo, pagariam com a morte.
Encerrava-se para a história o primeiro grande ciclo mediúnico.
O profetismo voltou assim a ser de uso restrito às escolas de
iniciação. Por muitos séculos seguidos, tornou-se
atividade exclusiva dos profetas.
O segundo grande ciclo mediúnico ocorreu cerca de mil e trezentos
anos após o primeiro, também na Palestina, novamente entre
o povo judeu, com o advento do Cristianismo. Na realidade, sua preparação
começara cerca de trezentos antes do nascimento de Cristo. Nessa
época surge na Palestina uma nova seita judaica, secreta, onde
as atividades mediúnicas eram amplamente exercitadas e reverenciadas.
Os membros dessa seita, ao tempo de Jesus, ficaram conhecidos como Essênios.
Os essênios viviam em comunidades isoladas, longe das multidões,
e levavam vida ascética. Diziam que precisavam estar santamente
preparados para receber o Senhor e para servi-lo, quando ele chegasse.
Após a morte de Jesus eles saem de cena, tão misteriosamente
como apareceram. Grande parte das correntes espiritualistas tentam ligar
os essênios à vida de Jesus. Evidências evangélicas
e históricas tornam verossímil essa hipótese. Acredita-se
que Jesus tenha convivido com esse povo durante o período obscuro
de sua vida que vai dos treze aos trinta anos, onde teria organizado
sua campanha evangélica e preparado os essênios, mediunicamente,
para darem suporte aos fenômenos psíquicos que ele iria
produzir. O Mestre Nazareno, ao iniciar sua vida pública, fez
da mediunidade uma prática constante. Suas curas, transfigurações,
"ressurreições" de mortos, multiplicação
de pães, locomoção sobre as águas, etc.,
são a mais clara evidência de sua especial capacidade de
provocar fenômenos mediúnicos de efeitos físicos,
nos quais, com certeza, precisaria do apoio de médiuns altamente
habilitados para a produção de fluídos abundantemente
suficientes para que aqueles extraordinários fenômenos
se produzissem. Emmanuel, nos dias de hoje, chama a Jesus de médium
sublime. Também seus apóstolos e discípulos, todos
foram médiuns que produziram fenômenos abundantes, e eram
preparados para exercitarem essas atividades. Paulo de Tarso, o apóstolo
dos gentios, foi um médium extraordinário, e fez do mediunato
um dos seus mais importantes instrumentos de trabalho. Como ocorre nos
centros espíritas de hoje, cada igreja cristã era uma
escola de educação mediúnica, onde se formavam
médiuns com as mais variadas modalidades de manifestação
espiritual. Importantes escolas de iniciação à
mediunidade floresceram nos tempos apostólicos, sendo que a mais
importante foi a de Antióquia. O serviço mediúnico
ocupava posição destacada entre os primeiros cristãos.
Nenhuma decisão importante se tomava sem consulta prévia
aos espíritos. O Cristianismo primitivo foi um movimento mediúnico
por excelência. Foram quase trezentos anos ininterruptos de atividades
mediúnicas. A ninguém era negado o desenvolvimento de
suas faculdades. É claro que cada interessado deveria passar
por um noviciado (treinamento mediúnico), e só após,
era batizado pelo Espírito santo (considerado médium),
com a imposição das mãos sobre a cabeça
dos neófitos.
Ao assumir integralmente o controle do Cristianismo, o catolicismo romano
tratou de por fim aos serviços mediúnicos. Como nos tempos
de Moisés, a Igreja Cristã romana, menos cristã
e mais romana, usou da violência na repressão aos dons
do espírito, e cada médium pagava com a morte, agora na
fogueira, a sua ousadia em desafiar as proibições dos
bispos. O intercâmbio com os espíritos definha, e acaba
por desaparecer no seio do Cristianismo. O segundo grande ciclo mediúnico
termina.
O terceiro grande ciclo mediúnico, e o mais importante dos três,
ocorre em nossos dias, e teve início em meados do século
XIX, tendo sua eclosão começado nos Estados Unidos com
as irmãs Fox, e se espalhado rapidamente pelo mundo. Seu epicentro
fixou-se na França, onde, através de Allan Kardec, os
Espíritos Superiores legaram à humanidade a mais avançada
escola religiosa de todos os tempos, tendo como seu mais vigoroso apoio
o uso das práticas mediúnicas. Esse fator diferencia o
Espiritismo das demais escolas religiosas e reflete sua grandeza. Grandeza
que os antigos hebreus e cristãos primitivos também conheceram,
mas que a perderam quando viram-se despojados do intercâmbio com
os espíritos.
Os hebreus perderam o seu acesso aos dons da profecia quando passaram
a fazer mau uso deles. Os primeiros cristãos viram suprimidos
seus carismas pelos interesses mesquinhos e particularistas da igreja
poderosa que colocou as "- razões do estado" acima
das necessidades espirituais de seus seguidores. E os espíritas
modernos? O que estão fazendo da mediunidade? Para onde a estão
levando? Não chegou o momento de fazer-se uma autocrítica?
É claro que os Espíritos Superiores, responsáveis
pela condução e aprimoramento das faculdades mediúnicas
entre os homens estão vigilantes em seus postos. Mas o fator
mediúnico não depende só deles. É uma atividade
de duas vias e a única viável entre os dois planos da
vida, conhecida pelos humanos. Sem a participação do médium
o fenômeno não ocorre. Faz-se urgente pois, por parte destes,
profundas reflexões. Os espíritas não podem alhear-se
ao que se vê com bastante freqüência em casas espíritas,
algumas até renomadas, onde obras dita mediúnicas, tais
como livros, pinturas, músicas, sem qualquer valor artístico,
e sem nenhum conteúdo moral ou doutrinário sendo comercializadas,
fazendo supor-se, infelizmente, sejam obras de mistificação
dos próprios médiuns. Estamos frente a um descalabro mediúnico?
Reflitamos pois.
Publicado no Correio Fraterno do ABC Nº 362 de
Março de 2001
Fonte:
http://www.espirito.org.br/portal/artigos/correio-fraterno/ciclos-mediunicos.html
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