Numa reunião espírita,
um dos presentes queixou-se pelo fato de alguns expositores não
linkarem sempre as suas palestras ao Evangelho, com citações
de ensinamento de Jesus, como base para sua oratória. Disse
também que sendo Jesus o governador do nosso planeta é
a Ele que temos de nos reportar sempre.
Intimamente senti-me contra essa idéia
e comecei a refletir sobre ela, com a seguinte pergunta:
Será que tal diretriz não
estaria perpetuando uma situação de idolatria criada
e mantida pela Igreja católica e herdada e também
mantida pelas evangélicas?
Como funciona essa idolatria, na
prática? Ela estabelece uma relação de dependência
entre o fiel e o seu ídolo, e essa dependência é
prisão evolutiva, porque o fiel quer sempre ser levado pela
mão. Como o filhote de passarinho, está sempre com
a boca aberta para receber alimento, e esse alimento tem muitas
feições além da própria fé, tais
como questões de saúde, a solução para
problemas, o desejo de bens materiais ou mesmo afetivos, até
o gol tão esperado do time favorito.
Espiritismo, a meu ver, é
luz que nos ilumina o caminho, mas o esforço da caminhada
tem que ser nosso. Não devemos ver Jesus ou os espíritos
superiores como nossas babás, mas como sábios mestres
a nos orientarem os passos e a nos estenderem a mão quando
isto se fizer realmente necessário.
Observa-se também que inúmeros
centros espíritas ritualizaram a abertura e encerramento
dos trabalhos “em nome de Jesus”. Certamente não
há mal nisso, mas por que não em nome de Deus, do
criador, do Pai de todos nós? Por que não em nome
do amor, do bem, da luz? Assim se fugiria ao ritual e à idolatria.
Ou será que Jesus vai se fazer presente pelo fato de ser
anunciado como sendo o patrono do evento? Certamente Ele se faz
presente onde há amor, humildade, harmonia, e onde se trabalha
pelo bem, mesmo sem chamado.
Na codificação do
Espiritismo os espíritos nunca disseram ser Jesus o governador
do nosso planeta, mas sim que é Ele o maior modelo de perfeição
que podemos ter na Terra. Modelo, sim, porque nos inspira a tentar
imitá-lo, a seguir seus passos, ou seja, as suas orientações,
seus ensinamentos.
Diz a Bíblia ter Ele
afirmado: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém
vai ao Pai, senão por mim”. Mas a oração
que ensinou a seus seguidores diz: “Pai nosso que estás
no céu”, ou seja, ensinou a nos dirigirmos diretamente
a Deus. Ele sempre falou no Pai, não nele próprio.
É verdade que o ser humano sente profunda
necessidade de ser levado pela mão nas questões evolutivas.
Talvez isto reflita a nossa pouca idade espiritual, mas só
crescemos quando nos esforçamos para caminhar com nossos
próprios pés, sem precisar que seres superiores nos
carreguem no colo.
Mas estas reflexões, embora
possam parecer, não significam uma tentativa de diminuir
a importância do Evangelho ou da figura de Jesus. Longe disso!
A intenção é
apenas a de pôr as coisas nos seus devidos lugares, visando
os melhores caminhos para nosso crescimento.
Como devemos então nos relacionar
com o Evangelho e com Jesus?
Com o mesmo respeito e amor de sempre,
ou ainda mais, mas vendo na sua figura o Mestre, não o ídolo,
e nos seus ensinamentos o caminho, não a muleta. O Mestre
ensina e envia seus discípulos para o mundo, a fim de vivenciarem
o que ensinou. Não segue junto com eles, indicando e orientando
sobre tudo.
Jesus exortou a nos reportarmos
ao Pai nas nossas preces, afirmando que o Pai é maior do
que o Filho.
Essa mentalidade difundida nos meios
espíritas de buscarmos comunhão com Jesus, em vez
de buscá-la com Deus, nosso pai e de Jesus também,
deve-se certamente è influencia de espíritos como
Emmanuel, procedentes da Igreja católica, ou ainda, isto
pode ter sido apresentado assim como um degrau entre os modelos
das igrejas e os ensinos mais elevados do Espiritismo.
Essas tendências que
os espíritos guardam de suas vidas passadas estão
presentes até mesmo na codificação do Espiritismo,
na qual, em alguns enfoques, transparecem conceitos que, se podiam
ser adequados àquela época, estão carecendo
de revisão.
Podemos observar isto em algumas passagens,
como no capítulo em que falam sobre as penas e recompensas.
A linguagem é bastante semelhante à da Igreja. No
capítulo Bem-aventurados os aflitos, Lacordaire diz: “O
homem não recebe nenhuma recompensa para esse tipo de coragem,
mas Deus lhe reserva seus louros e um lugar glorioso”.
Essa idéia de recompensas, louros e um lugar glorioso é
adequada a espíritos que ainda não alcançaram
certo grau de entendimento e que necessitam desse tipo de muletas
para caminhar melhor. Mas hoje, em pleno trânsito para uma
nova época, essa velha mentalidade deve começar a
ceder lugar à do trabalho pela auto-superação,
a auto-ajuda (levanta-se e anda), o crescimento da criatura como
ser cósmico. Tal crescimento por si só, deve ser o
seu maior fator de felicidade atual e futura. Também se observa
aí um toque de vaidade na expectativa de glórias,
incompatível com os ensinamentos de Jesus e as idéias
transmitidas pelo Espiritismo. E mais adiante Santo Agostinho diz:
“O Senhor marcou com seu selo todos os que acreditam nEle”,
ou seja, passa a idéia da salvação pela fé.
Como vemos, aqueles espíritos, embora de elevada estirpe,
mantiveram, até certo ponto, um linguajar e idéias
compatíveis com suas últimas reencarnações
ou, quem sabe, preferiram usar aquela linguagem como um degrau para
entendimentos mais elevados.
Por isso e também porque
o bom senso indica, é importante estarmos sempre abertos
a reflexões, a reciclagens e revisões dos nossos conceitos
e práticas.
O fato de nos ligarmos sempre
a Jesus, nos momentos de comunhão espiritual com o mais alto,
pode nos levar, mesmo de forma imperceptível, a nos atrelarmos
a Ele, procurando nEle muletas ou mesmo uma “carona”
para Nosso Lar, quando não, a mão de uma babá
a nos conduzir vida afora. Tal atitude reflete estagnação
evolutiva.
“Levanta-te e anda”, “Ama
teu próximo”, “Sê perfeito”,
“Não julgues”, “Perdoa”,
são orientações de um MESTRE.
Nazareno Tourinho, um dos
maiores conhecedores de doutrina espírita, no livro Como
o Espírita deve pensar em Deus, faz longa exposição
sobre o que diz a codificação, concluindo: “(...)
nas demais obras do codificador do Espiritismo, absorvemos invariavelmente
a noção de que Jesus estava certo quando definiu DEUS
como nosso pai. Todo o esquema de racionalidade da filosofia kardequiana
se estrutura e desdobra nesse sentido. Os diversos ensinamentos
da doutrina, versando sobre os mais variados assuntos, de feição
científica ou ética-religiosa, articulam-se sempre
para nos induzir à crença num DEUS-PAI, dotado de
sabedoria e amor sem limites, que rege os destinos das coisas e
dos seres. Não aceitar isto significa, seguramente, não
ser espírita.”
Quando nos ligamos em tudo a Jesus,
estamos esquecendo, ou nos desligando do Pai, da inteligência
suprema, causa primária de todas as coisas, eterna, imutável,
imaterial, única, onipotente, soberanamente justa e boa,
de quem Jesus é filho, como nós outros também.
Digo isto sem qualquer diminuição à extraordinária
figura do Mestre, daquele que se sacrificou por nós, não
para nos salvar ou levar pela mão, mas para nos ensinar os
caminhos da evolução que devemos percorrer com nossos
próprios pés, sob as bênçãos do
Pai de todos nós.
Estas minhas reflexões refletem
a preocupação de que esse ritual instituído
em muitos centros espíritas, de se abrir e encerrar os trabalhos
em nome de Jesus, venha a manietar o pensamento dos freqüentadores
à Sua figura, impedindo que possa expandir-se em amplitudes
maiores, universais, cósmicas, a procura do Pai, do Criador,
de Deus.
Deixamos ainda à sua
reflexão outra observação digna de nota, feita
por Nazareno Tourinho no livro já citado:
“Uns poucos oradores
espíritas famosos, sobretudo, espalharam em nosso meio um
modelo de prece tão afetada, tão espasmódica,
tão piegas, tão prenhe de exagerada e ridícula
eloqüência, enfim, tão falsa e vazia de honestidade
sentimental que raramente assistimos os companheiros de crença,
em assembléias publicas, buscarem a comunhão com Deus,
ou mesmo com Jesus, em termos razoáveis."
* * *
FÉ
Por Elio Mollo
Caminhai, crescei e tornai-vos
um auxiliar, ao invés de permanecerdes sempre precisando
de auxílio.
Krishnamurti
O Universo necessita:
De pessoas que possuam discernimento.
Daqueles que são capazes de trabalhar com suas próprias
mãos.
De colaboradores que são capazes de distinguir o que tem
importância e o que não tem.
Da energia mental capaz de produzir eletricidade suficiente para
movimentá-lo.
Daqueles que sabem decidir por si mesmo.
Daqueles que sabem o que devem fazer.
Daqueles que querem aprender e desenvolver os conhecimentos.
Daqueles que tem boa vontade.
Daqueles que possuem fé.
* * *
É necessário possuir uma fé inabalável.
Fé difere muito de obediência cega.
Onde houver dúvida, existirá a vacilação,
e onde houver vacilação existirá o sofrimento.
Possuímos a intuição — dote Divino —,
para nos guiar. Porém, possuímos a inteligência
para desenvolver qualidades.
Fé é conhecimento — e devemos crescer em sabedoria
e compreensão.
Deus e todos os seus Emissários, estarão sempre conosco,
se seguirmos as Leis Divinas.
Deus estará conosco em todos os trabalhos altruísticos
destinados a ajudar os nossos semelhantes.
Quando O chamarmos, Ele vira, e derramará o Seu Amor e nos
fortalecerá. E poderemos prosseguir a nossa caminhada rumo
a perfeição sem nos desencorajarmos.
A fonte da força está em nossa fé, porque fé
é força.
Porém, para confiar em Deus, temos que confiar em nós
mesmos. É necessário aprender a confiar em nós
mesmos. Não podemos caminhar ao sabor das opiniões
e pensamentos alheios eternamente. Temos que caminhar com as nossas
próprias pernas.
Confiando em Deus e em si próprio, o homem é mais
alegre, possui mais ânimo, é mais positivo e transmite
aos seus semelhantes segurança.
É necessário conseguir desenvolver completamente a
nossa independência de pensar e de agir, para que possamos
com segurança discernir cuidadosamente, antes de falar, agir
ou pensar.
Quando procedemos com discernimento em todas as coisas, nunca haverá
excessos, ao contrário, a nossa vida fluirá naturalmente.
Meditemos sobre este assunto, pois Deus necessita de cada um de
nós para desenvolver o progresso geral, mas é preciso
que nos encontre com boa disposição para o trabalho.
* * *
Saara Nousiainen
Fonte: http://www.cooperativaespirita.org/artigos.em.nome.de.jesus.htm
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