O estudo de uma faculdade de natureza biológica ou psíquica
tanto mais eficiente se revela quanto maiores oportunidades tem o investigador
de processá-lo ao natural, na vivência e movimentação
dos indivíduos que detêm a faculdade de estudar.
E tais oportunidades, com relação à mediunidade
Allan Kardec as teve ou as criou, aproveitando-as magistralmente para
compor O Livro dos Médiuns, de onde se extrai a admirável
síntese conceptual com que ele, o Codificador abre o capítulo
XIV da obra:
"Todo aquele que sente, num grau qualquer, a influência
dos Espíritos é, por esse fato, médium..."
Nesta colocação, o verbo sentir expressa a idéia
básica sobre a mediunidade: um sentido psíquico, de ordem
paranormal, capaz de ampliar o alcance perceptivo do ser, conferindo-lhe
uma aptidão para servir de instrumento para a comunicação
dos Espíritos com os homens, estabelecendo uma ponte entre realidades
vibratórias diferentes.
Avançando em seus apontamentos o mestre lionês elucida:
"...Essa faculdade é inerente ao homem; não
se constitui, portanto, privilégio exclusivo. Por isso
mesmo, raras são as pessoas que dela não possuem alguns
rudimentos. Pode, pois, dizer-se que todos são, mais
ou menos, médiuns. Todavia, usualmente, assim só
se classificam aqueles em quem a faculdade mediúnica se mostra
bem caracterizada e se traduz por efeitos patentes, de certa intensidade,
o que então depende de uma organização mais ou
menos sensitiva..."
Esta declaração não tira a clareza da conceituação
de Kardec pois, o que ele pretendeu, foi estabelecer, didaticamente,
uma linha demarcatória entre os indivíduos que agem mediunicamente
no campo objetivo, expressando nitidamente a intenção
e o pensamento dos Espíritos, e aqueloutros que agem mediunicamente
num campo preponderantemente subjetivo expressando a contribuição
espiritual de forma imprecisa, subjacente.
Há, portanto, dois níveis bem definidos de mediunidades:
um, ostensivo, explícito e bem caracterizado em que o pensamento
dos Espíritos comunicantes - apesar das influências do
médium - pode sobrepor-se ao deste, e outro, discreto, velado,
a manifestar-se no campo da inspiração em que o pensamento
incidente se mescla ao do médium sem sobrelevar-se ao mesmo.
A mediunidade ostensiva - podemos chamá-la, também, de
dinâmica pelos poderosos circuitos de força que dá
origem - é uma outorga, uma prova que o médium pode elevar
à categoria de missão pela forma dedicada e responsável
como exerce o seu mediunato.Trata-se de um compromisso assumido com
a própria consciência para resgate de faltas ou abertura
de novos roteiros evolutivos. O Perispírito do reencarnante candidato
à mediunidade é trabalhado pelos Benfeitores Espirituais,
na fase preparatória que antecede à reencarnação
no sentido de ajustar-se-lhes as estruturas para que, no momento próprio,
abram-se ou ampliem-se as percepções extrafísicas.
O ser como que é adestrado para a tarefa que o espera; ele se
apropria de um ferramental de que necessita para se reajustar com a
Vida. Algumas vezes, o tipo de vida que levou antes da encarnação
como médium - abalos emocionais intensos, pressões espirituais
decorrentes de processos obsessivos, além de outros fatores -
promove as aberturas psíquicas responsáveis pelos registros
mediúnicos de então: é como se a Lei Divina colocasse
na dor decorrentes de aflições e quedas o princípio
qualitativo, automático, regularizador da evolução
do ser que se movimenta nas marchas e contramarchas da evolução.
Se tomarmos, à guisa de exemplo, a psicografia e a psicofonia,
que são as formas mais comuns de mediunidade de efeitos intelectuais,
veremos que, médiuns ostensivos, dadas as características
de maior expansibilidade e magnetização especial de seus
perispíritos, operarão por contato perispiritual direto
com os Espíritos comunicantes, expressando objetivamente as idéias
desses comunicantes. Veremos ainda que, conforme a maior ou menor intensidade
da imantação ou independência em relação
aos implementos físicos, farão transes automáticos
- mecânicos em psicografia e inconscientes em psicofonia - semimecãnicos
em psicografia e conscientes em psicofonia.
Já com o nível de mediunidade discreto ou velado - podemos
ainda chamá-lo de estático - o que ocorre é uma
inspiração. O médium age captando, tão somente,
as correntes do pensamento do espírito comunicante, absorvendo-as
e entrelaçando-as com as suas próprias idéias.
Que a inspiração corresponde a esse nível de mediunidade,
pode depreender-se do pensamento de Kardec no seu estudo sobre os médiuns
inspirados, quando assim se expressou: "...A inspiração
nos vem dos Espíritos que nos influenciam... Ela se aplica em
todas as circunstâncias da vida, às resoluções
que devamos tomar. Sob esse aspecto, pode-se dizer que todos são
médiuns..."
Podemos afirmar ainda que essa mediunidade estática se expressa
de forma particular e especial na sintonia com o anjo guardião
e, por intermédio dele, com os espíritos familiares e
protetores. Pelo menos, parece ser este o plano divino para que as forças
mediúnicas do homem sejam acionadas naturalmente, clareando as
suas rotas evolutivas; e isto dizemos com os Espíritos que ditaram
a Codificação, haja vista as lúcidas palavras de
Santo Agostinho e São Luiz, na questão 495 de O Livro
dos Espíritos: Não receeis afadigar-nos com as vossas
perguntas: ao contrário, procurai sempre estar em relação
conosco.Sereis mais fortes e mais felizes. São essas comunicações
de cada um com o seu Espírito familiar que fazem sejam médiuns
todos os homens. A tais palavras mais tarde, o Espírito Channing,
nas Dissertações do cap.XXXI de O Livro dos Médiuns,
aditaria: "Escutai essa voz interior, esse bom gênio que
incessantemente vos fala e chegareis a ouvir o vosso anjo guardião...Repito:
a voz interior que vos fala ao coração é a dos
Bons Espíritos e é desse ponto de vista que todos são
médiuns".
Kardec conclui a sua belíssima definição sobre
os médiuns, afirmando: ...È de notar-se, além disso,
que essa faculdade não se revela da mesma maneira em todos. Geralmente,
os médiuns têm uma aptidão especial para os fenômenos
desta ou daquela ordem, donde resulta que formam tantas variedades,
quantas são as espécies de manifestações.
Se a mediunidade mostra-se variada no tocante à intensidade,
ainda mais diversificada se revela sob o aspecto das formas, modalidades
e tipos de fenômenos que propicia. Paulo dizia: "Há
diversidade de dons, mas um mesmo é o Espírito. Ora, investido
o médium de determinadas características e apto para certas
mediunidades jamais conseguirá reduzir outras se a sua natureza
não o permitir.assim sendo, a especificidade de cada médium
faz com que não existam médiuns nem mediunidades iguais.
Um outro dado que se pode inferir da definição de Kardec
é a natureza orgânica da mediunidade. Quando isto se afirma
não se pretende alijar o espírito ou colocá-lo
à margem do processo mediúnico. Porventura não
dependem as estruturas psicobiofísicas do homem da sua realidade
espiritual? Com a mediunidade se dá o mesmo; ela é uma
faculdade do espírito que se define e se delineia nas estruturas
do Perispírito para emergir na organização física
onde está plantada. Imprescindível, portanto, organizações
perispiritual e celular compatíveis a fim de que a mesma se manifeste
como fenômeno. Semelhantes organizações, o próprio
trabalho mediúnico as desenvolve e aprimora, podendo-se afirmar
que a mediunidade é, além do mais, evolutiva.
Imaginemos, didaticamente, que a uma pessoa, num dado momento de sua
evolução, seja outorgada uma organização
adequada ao exercício mediúnico ostensivo: O aproveitamento
desta oportunidade, através do uso responsável e equilibrado
da concessão, acabará por aperfeiçoar os seus equipamentos
de registro, adequando-os, ainda mais, para o trabalho em novas expressões
com vistas ao futuro.
Revista "Presença Espírita", set./out. de 1992
Fonte:
http://www.espirito.org.br/portal/artigos
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