Eduardo Carvalho Monteiro

>   Pioneirismo do Espiritismo no Estado de São Paulo

Artigos, teses e publicações

Eduardo Carvalho Monteiro
>   Pioneirismo do Espiritismo no Estado de São Paulo


O primeiro núcleo espírita surgido em São Paulo, Capital parece ter sido o Grupo Espírita “Luz e Verdade” em 20 de abril de 1885,tendo como primeiro Presidente o sr. De Lucca de Strazzari, segundo informa a Revista “Reformador”.

Já o primeiro registro de fundação oficial de uma Sociedade Espírita encontramos no “Almanach do Estado de São Paulo para 1890”, de Jorge Seckler, que registra a existência do “Centro Família Spírita“ fundado em 1 de janeiro de 1886. Ele funcionava na Rua Conselheiro Crispiniano, 11, e tinha como Presidente Dr.Antonio Luiz Ramos Nogueira e o professor Torteroli (residente no Rio de Janeiro) como Secretário. E uma observação curiosa termina o anúncio: “Nesta sociedade os sócios não pagam mensalidades, as despesas são feitas pela Diretoria”.

No Centro Familia Spirita, estudou e desenvolveu sua mediunidade Antonio Gonçalves da Silva (26.12.1838/22.01.1909), mais conhecido como Batuíra que, em 1890, viria a “reerguer” a Instituição Espírita “Verdade e Luz”, o que leva a pressupor que seja a Instituição presidida por Strazzari e que se encontrava adormecida.

Dr. Ramos Nogueira, falecido em 1903, conforme noticia o “Reformador” da FEB, mantinha estreito contato com aquela instituição e o movimento espírita do Rio de Janeiro.

Provavelmente outros grupos já praticassem o Espiritismo na Capital antes dos citados, se observarmos que era um modismo na época e em muitas cidades menores ele já havia chegado. Modismo para uns, mas missão para outros, que desde cedo se conscientizaram da importância da Doutrina Espírita.

A Revista da Sociedade Acadêmica “Deus, Cristo e Caridade”, publicada no Rio de Janeiro, nos fornece duas pistas para rastrearmos alguns pioneiros.

A primeira é em seu número de abril de 1882 que cita ter recebido carta do sr. Antonio de Carvalho Sandenberg, provavelmente um trabalhador de primeira hora do Espiritismo; e a segunda, quando publica em junho desse ano, uma interessante notícia de comunicação mediúnica do Espírito de Garibaldi: as linhas abaixo inseridas constituem uma comunicação espontânea do Espírito Garibaldi recebida em São Paulo pelo jovem, ardente republicano, e sócio da Ordem dos Associados Livres E. C. notável médium de incorporação, psicógrafo intuitivo psicôfano extático (sic).Os pensamentos nela contidos trazem o cunho da personalidade cujo nome os firma: respiram amor à liberdade. (segue a comunicação) Seria uma Entidade que se ocultasse sob essa denominação para a prática do Espiritismo?

No interior do Estado, no entanto, reencarnaram denodados espíritos que traziam a missão de implantar o Espiritismo em inúmeros recantos. Infelizmente, esses desbravadores têm seus nomes e lutas desconhecidas das gerações atuais. Neste artigo, iremos conhecer alguns desses heróis do movimento espírita quase anônimos




AREIAS (antiga Areas)


A Revista da Sociedade Acadêmica “Deus, Cristo e Caridade”, de novembro de 1881, publica a fundação de grupo naquela cidade:

Um cavalheiro distinto, o sr. Tenente-Coronel Joaquim Silvério Monteiro Leite, tendo assistido, em 1879, às sessões Sociedade de Estudos Espiríticos “Deus, Cristo e Caridade”, espírita convicto, cheio de fé, de volta à sua residência na cidade de Areias, da valorosa Província de São Paulo, cercando-se de alguns amigos como ele corajosos, e dotados de força de vontade, realizaram uma sessão espírita na casa da Câmara Municipal.

E no dia 23 de Janeiro de 1881, reunidos na morada daquele cavalheiro, os adeptos do Espiritismo e mais pessoas presentes fundaram o Grupo Espírita Areense, o qual, um mês depois de fundado, já contava entre os seus dedicados e zelosos membros, médiuns desenvolvidos, de psicografia e psicofonia, de cujo número era a sra. D. Amélia Monteiro Leite, digna consorte do sr. Joaquim Silvério. E para prova, temos à vista a ata da 4* sessão em que vêem os extratos de inúmeras comunicações e trabalhos espiríticos, entre os quais um espontâneo, atribuído ao Espírito de Augusto Comte, manifestações de sofredores e conselhos dos Guias.

Este grupo creou um Jornal denominado “ União e Crença”
.

Também colaborou na fundação desse núcleo de pioneiros, Affonso de Távora, introdutor do Espiritismo em São José do Barreiro, próximo a Areias, conforme veremos a seguir.



SÃO JOSÉ DO BARREIRO

Igualmente em novembro de 1881, a Revista da Sociedade Acadêmica registra a introdução do Espiritismo em São José do Barreiro:

Um jovem fluminense, D. Affonso de Távora, animado pelo fogo sagrado da fé, cheio de ardor, levado à feraz São Paulo pela força das cousas, espírita convicto, dedicado à idéia para cuja propagação trabalha com esforço, fundou na Vila São José do Barreiro, onde conquistara inúmeros prosélitos, um grupo espírita que denominou Fraternidade Barrreirense. Essa cerimônia, como consta do termo de instalação, foi imponente pelo grande número de famílias convencidas do Espiritismo que a ela assistiram.

Os trabalhos do grupo são variados, constam de uma primeira parte destinada aos trabalhos administrativos; segunda parte constando de orações e cânticos sagrados; terceira parte, comunicações doutrinárias dos Espíritos Guias ou Anjos da Guarda e Protetores; quarta parte, experiências medianímicas e estudos; quinta parte, trabalhos morais, manifestações de espíritos atrasados, sofredores e infelizes.

Muitas revelações e importantes trabalhos se tem efetuado nesse grupo, dos quais não damos os extratos, porque no Relatório e históricos que o grupo nos remeteu, figuram distintas famílias que não temos certeza se nos autorizariam publicar seus nomes.


JABOTICABAL


O primeiro Centro Espírita da cidade recebeu o nome de “Caridade e Fé” e foi fundado em 13 de maio de 1908, sendo sua primeira diretoria composta dos confrades: Manoel Portugal Freixo, João Camargo Neves, Joaquim Fernandes, João Manoel Magnusson e Agueda P.de Lemos Freixo, com a Avenida Pintos n 1.110, em prédio próprio, construído em terreno doado por César Augusto Guarita onde funciona até hoje. Sua fundação aconteceu devido aos numerosos fenômenos mediúnicos ocorridos naquela região, com grande número de pessoas obsediadas, necessitando de um local apropriado para tratamento.

Relacionamos, a seguir, alguns desses valorosos companheiros que implantaram o Espiritismo em Jaboticabal.

Fundadores do Centro: Agueda P. de Lemos Freixo (9.11.1894 - ?); João Camargo Neves; Joaquim Fernandes (1871-22.2.1947); Manoel Teixeira Portugal Freixo (28.12.1874-?).

Alguns pioneiros: Venâncio Tamanini (1867 - 6.6.1963); Francisca Tamanini Lessi (1868 --11.12.1933); João Fernandes Silva Bastos; Ana Carvalho Bastos; Francisco de Carvalho Bastos; Paschoal Volpe (12.6.1890 - 12.7.1974); Pedro Volpe (8.4.1888 - 9.11.1967); João Volpe (? - !980 ); Antonio Volpe (1887 -13.6.1974) Saturnino Barbosa (1888 - 23.9.1979); Domingos Valério (4.2.1893 -19-8-1974); Paulina Bragiola Valério (18.1.1894 - 29.8.1974); Maria do Carmo Bastos Volpe (18.12.1900 - 4.7.1987).


JACAREÍ

Francisco de Paula Ortiz, o pioneiro do Espiritismo em Jacareí, nasceu em São Paulo, Capital, em 1829 e mudou–se com a família, ainda criança, para a cidade de Paraibuna.

De família pobre, ele começou a trabalhar cedo como tropeiro, ferrador de animais e seleiro.
Mudou-se para a cidade de Santa Branca, onde com muito esforço tornou-se mestre-escola e depois se radicou definitivamente em Jacareí.

Nessa cidade, progrediu profissionalmente até tornar-se escrivão e coletor federal, residindo e trabalhando na Rua do Meio, hoje Rua Rui Barbosa.

Recebeu a patente de Coronel da extinta Guarda Nacional e, aos 22 anos, contraiu núpcias com Claudiane Francisca da Piedade, 15 anos, e tiveram 8 filhos.Enviuvando, casou-se com Gertrudes Gaspar, também viúva, e não tiveram filhos.

Conhecedor da homeopatia usava de seus conhecimentos para aliviar os sofrimentos de quem o procurasse, chegando a ser chamado de “o pai dos pobres” na cidade.

Abraçou a Doutrina dos Espíritos graças à amizade que mantinha com o jacareiense Dr.Henrique Macedo.

O bom homem “Chico Ortiz”, apesar dos parcos recursos, nunca deixava de atender aos mais humildes, verdadeiro cultor da bandeira do Espiritismo “Fora da Caridade não há Salvação”.

Conta-se que, certa vez, Chico Ortiz caminhava por uma estrada quando encontrou um pobre escravo gravemente ferido, e, à semelhança do “Bom Samaritano”, o recolheu e, com inúmeros sacrifícios, conseguiu socorro e salvar-lhe a vida, fato este noticiado com vasta manchete por um jornal de Taubaté.

O convívio com o Dr. Henrique Macedo e outros espíritas da cidade, o motivou a fundar um Centro Espírita, pois até então os praticantes se reuniam nas próprias casas, sendo assim criado o Centro Espírita “Amor e Caridade”, que não é o mesmo local onde hoje existe uma Casa com este nome. O local exato perdeu-se no tempo. Paulo Ortiz foi presidente até seu desencarne.  

A Providência Divina quis testar um pouco mais o querido Chico Ortiz e sobreveio-lhe a cegueira nos últimos meses de vida terrena, mas em momento algum teve sua fé e confiança nos desígnios de Deus abalada e no dia 18 de março de 1914, com 84 anos, voltava a Pátria Espiritual Francisco de Paula Ortiz.

Sete anos após o seu desencarne, seus amigos, lhe deram uma justa homenagem fundando o Centro Espírita “Paulo Ortiz”.

Os poderes legislativo e executivo de Jacareí homenagearam–lhe dando seu nome a uma rua no Jardim Liberdade.


JAÚ

Em Areias, São Paulo, nasceu Paulino Oliveira Maciel, pioneiro do Espiritismo em Jaú, no dia 25 de dezembro de 1847, filho de José de Oliveira Maciel e Maria de Oliveira Maciel, gente da roça, de vida simples e honesta. Ali fez seu curso primário, mas continuou no trabalho da lavoura.

Aos 18 anos, com aval dos pais, despediu-se de todos e partiu para uma caminhada, ora em carros de bois ou carroças e, na maioria das vezes a pé, tendo por meta viver em Jaú, cidade que alcançaria em dois meses.

Em setembro de 1867, Paulino pisava em solo jauense, onde foi bem recebido, principalmente por ser capaz de entreter seus conhecidos e amigos com anedotas e músicas tiradas de seu violão. Por sua capacidade intelectual e carisma, logo foi convidado para participar da vida pública de Jaú, sendo nomeado Escrivão de Paz. Relutou em aceitar, mas acabou assumindo. Ganhando posição social passou a frequentar reuniões sociais, onde conheceu Fortunata, com quem se consorciou.

Como guarda-livros de várias firmas, Paulino juntou algumas economias e comprou um sitiozinho pouco distante da cidade. Ali atendia doentes gratuitamente utilizando-se da homeopatia, havendo relatos de curas admiráveis que promovia.

Sua fama crescia e ele era obrigado a desdobrar-se entre a vida na cidade e no campo. Tornou-se próspero comerciante e político, chegando ao cargo de intendente de Jaú, com seu pensamento sempre voltado para o bem estar do povo, principalmente aos mais pobres.

Mas, a sorte não lhe sorriu. Perdeu sua esposa e companheira espiritual. Abatido, mas não desanimado, prosseguiu na luta.Anos mais tarde conheceu Maria Maciel com a qual se casou. Convertido ao Espiritismo, dispendeu sua fortuna em remédios e assistência aos necessitados.

No seu Cartório duas vezes por semana reuniam-se os membros do Centro Espírita “União, Paz e Caridade”. Sob sua presidência realizavam sessões espíritas e atendiam pedidos da população necessitada e, particularmente, cedia livros de sua biblioteca particular para divulgar o Espiritismo. Do Centro faziam parte os confrades Manoel Paranhos, Damásio de Oliveira, José Condes, Antonio Bartelotti, João Penteado, Domingos Laprega, José Musitano, Bento de Siqueira e outros.

Faleceu aos 78 anos de idade no dia 9 de dezembro de 1925 cercado de amigos e admiradores. Jaú reverenciou Paulino dando seu nome a de suas vias públicas.

Caetano Lourenço de Camargo

Em sete de agosto de 1863 nasceu o mestre–escola Caetano Lourenço de Camargo. Figura de relevo na história jauense, foi um verdadeiro homem de bem, injustiçado durante certo tempo por ter adotado a religião espírita.

Segundo o ex-presidente do C. E. “Verdade e Luz”, Júlio de Mattos (1887-1987), a conversão de Caetano Camargo deu-se devido ao episódio em que ele presenciou a materialização do espírito de sua esposa alguns dias após seu desencarne.

Sua conversão ao Espiritismo, no recuado início do século XX, numa cidade tradicionalmente conservadora e católica como Jaú, escandalizou a sociedade local e, conseqüentemente, provocou o esvaziamento de sua escola noturna, destinada à clientela particular. Os pais dos alunos, católicos de rígida formação, não queriam saber que seus filhos se educassem sob o patrocínio de um mestre-escola com “ligações diabólicas” ou enleado nas tramas de uma perigosa psicopatia. Este acontecimento desapontou-o sobremaneira, mas tanta era sua fé na nova doutrina, que ele permaneceu convicto em sua orientação religiosa e na sua missão no magistério. Passado o primeiro impacto, os alunos lhe voltaram em abundância, e o mestre-escola foi obrigado a aumentar as salas de aula na sua escola.

Se Paulino Maciel foi o introdutor do Espiritismo em Jaú, Caetano de Camargo foi o fortalecedor das bases doutrinárias espíritas na comunidade jauense. Inicialmente realizava suas sessões num barracão, nos fundos da antiga Academia de Comércio “Horácio Berlinck”. Mais tarde, com um grupo de espíritas convictos, alugou um prédio onde ainda hoje funciona o Centro Espírita “Verdade e Luz”, fundando também um albergue.

Foi assim que, Caetano, depois de ter participado do coro da Igreja matriz do Patrocínio, fundou o primeiro Centro espírita registrado de Jaú.

Dando seu nome a uma escola, o povo jauense homenageou-lhe a memória merecidamente.


PIRACICABA

A atual geração espírita de Piracicaba credita ao núcleo de fundadores do C.E. Fora da Caridade não há Salvação a implantação do Espiritismo na cidade. Isso não corresponde à realidade. Piracicaba teve um grande pioneiro, sob cuja batuta floresceu o grupo inicial, de grande estirpe, que iria fincar as bases sólidas da Doutrina na Noiva da Colina.

Este valoroso companheiro, desconhecido do movimento espírita atual, também não mereceu grandes necrológios ao seu desencarne, tão pouco sua biografia consta dos livros dos historiadores piracicabanos. Como espírita, porém, sabia reconhecer a sua condição de servidor humilde do Cristo e nunca pretendeu o reconhecimento dos homens. O Almanak de Piracicaba de 1900, no entanto, grafa em econômico texto, a mais meritória biografia que um cristão poderia almejar: 1900, 26 de maio - Fallece o prestante cidadão José Bicudo de Aguirre. O finado curava pela homeopathia e por esse modo prestou grandes serviços a nossa pobreza. Modesto, caridoso, verdadeiro pae dos pobres, conta immensas saudades entre nossa população.

Registra a história da introdução do Espiritismo no Brasil, que a ele se antecipou os homeopatas preparando-lhe o terreno, e que homeopatia e espiritismo sempre andaram juntos, conquanto sejam duas doutrinas com objetivos distintos e surgidos em locais e épocas diferentes.

Homeopatia, especialidade médica, e Espiritismo, doutrina de caráter científico-filosófico-religioso, possuem afinidades extraordinárias, notadamente quando o Espiritismo penetra nos estudos do perispírito e toca nos problemas biológicos, médicos e terapêuticos do homem.

Assim, vemos inúmeros espíritas no fim do século XIX praticando a Doutrina terapêutica das almas, ao mesmo tempo em que exercitavam a homeopatia para curar os corpos enfermos. Só para citar alguns, Filgueiras no Rio, Benedicto Junior em Santos, Batuíra em São Paulo e outros já citados nesse artigo.

Juca Aguirre, no então sertão de São Paulo, Piracicaba, era um deles. Registram-se poucos comentários sobre esse pioneiro espírita entre o grupo inicial do Fora da Caridade, primeira Instituição Espírita da cidade, mas ele sempre se manteve vivo na memória de D. Eugênia da Silva(1877-1971), que relatava as reuniões mediúnicas em sua casa e que com ele aprendera a manipular os complexos homeopáticos. D. Eugênia, também uma pioneira, durante mais de sessenta anos praticou a homeopatia gratuitamente, curando centenas de pessoas. Aguirre, segundo consta em relatos orais, foi o primeiro a possuir as obras da Codificação em Piracicaba.

O grupo espírita pioneiro de Piracicaba trabalhava na Rua do Porto em salão reservado especialmente para os trabalhos, em que cada um dos participantes tinha sua própria chave da porta. As reuniões eram realizadas numa semi-clandestinidade face ao preconceito da época. Possivelmente tenha sido sua denominação “Grupo Spirita Familiar de Piracicaba”, pois em outubro de 1881 a Revista da Sociedade Acadêmica, já citada, registra o recebimento de uma correspondência desse Grupo. Não cremos que um município tão pequeno àquela época pudesse abrigar dois núcleos espíritas.

É provável que este grupo tenha trabalhado por mais de vinte anos no século XIX. Deduzimos este fato pelo depoimento obtido junto a Maria Cândida de Toledo, (D. Doca), nascida em 2 de outubro de 1916, que relata as histórias ouvidas de sua mãe, Maria de Souza Moreira (24/10/1875 – 25/07/1967) a respeito de seu avô, Joaquim José Moreira (1812 – 09/07/1897), o Moreira do Porto e integrante do grupo de pioneiros.

Surgimento do Grupo Espírita “Fora da Caridade”

O pequeno grupo de espiritistas formado por Juca Aguirre não desanimou com seu desencarne em 1900. Prosseguiram com as reuniões nas casas de um e de outro, principalmente na de Luiz Arzolla (1871-1954), na Rua Moraes Barros, 211, que foi se fixando como ponto de encontro do núcleo de espíritas de Piracicaba. Registra João Eudóxio na memória, que por essa época também se realizavam reuniões mediúnicas e de preces no Hotel Bemmer, na Rua São José, de propriedade de um casal de alemães.

Eram idos, então, de 1905. Liderados por João Leão Pitta(1875-1958), os pioneiros espíritas de Piracicaba começaram a sentir o peso do preconceito religioso.Recolhidos à casa de Luiz Arzolla, onde sua esposa Sinhá Arzolla despontava como excelente médium, a Espiritualidade intuiu João Leão Pitta para a construção de um local apropriado que pudesse abrigar o contingente de espíritas e simpatizantes que, já era à essa época, de cerca de 70 cidadãos piracicabanos.

João Leão Pitta era um português nascido em 1875 na Ilha da Madeira e que aportou no Brasil com 16 anos, desembarcando no Rio de Janeiro e, pouco depois, se encaminhando para Piracicaba, terra de sua missão espiritual.

Como partir, no entanto, para uma empreitada de vulto já que todos eram pessoas simples, sem posses, que lutavam com dificuldades em seu dia a dia?

Conseguiu-se, através de uma cotização, adquirir-se um terreno à Rua da Palma, s/n., hoje Rua Tiradentes, 840. Desse grupo inicial de colaboradores faziam parte Casemiro Guimarães, Pedro de Camargo (Vinícius) (1878-1966), D. Eugênia da Silva, Francisco Leocádio de Castro Neves, Dr. Alfredo Cardoso (1876-1910), Luiz Arzolla, Jesuíno Damante, João Leão Pitta e outros que a memória de João Eudóxio da Silva não conseguiu registrar, depois de quase setenta anos, em entrevista ao Jornal da Mocidade Espírita de Piracicaba - JORMEP (novembro de 1971).

Foi uma fase muito importante na vida de João Eudóxio, que alcançou a idade provecta de 95 anos praticando o Espiritismo em Piracicaba e que, devido a seu acendrado amor à Doutrina, lembra-se, inclusive, das doações iniciais: Ainda está viva em minha lembrança a doação de 100 carroças de areia por Da. Eugênia, o madeiramento do “seu” Emílio, o saibro ofertado pelo Vinícius e a economia que “seu” Pitta fez para comprar os tijolos para a construção. Eu tive a felicidade de poder dar a pintura do prédio. Assim, graças à colaboração do Alto e a ajuda de todos, em apenas um ano, 1906, o “Fora da Caridade” abria as suas portas para abrigar todos quantos desejassem conhecer os princípios iluminativos do Consolador, reunindo, outrossim, todos os espíritas dessa recuada época numa só família.

A fundação do Grupo Espírita “Fora da Caridade não há salvação” deu-se, assim, a 25 de março de 1906 e a construção do prédio terminou cerca de um ano após.


BARRETOS

Fontes orais asseguram que as primeiras reuniões mediúnicas em Barretos tiveram início na zona rural no ano de 1900, conforme esclarecem os barretenses Ary Lex e Wilson Ferreira de Mello.

A Revista “Verdade e Luz” (Editor Batuíra), de 15.1.1907, noticia a fundação do primeiro núcleo espírita na cidade:

ESPIRITISMO EM BARRETOS


Daquela próspera cidade se nos comunica que no dia 25 de dezembro último foi ali devidamente instalado um grupo espírita, cuja Diretoria ficou assim composta:
Presidente: Manoel Pedrosa e Silva
Vice Presidente: José Antonio Bernardes Ferreira
Secretario: Azarias F.de Mello
Tesoureiro: Osório Barros
1º procurador: Arnaldo de Mello
2ºdito – Francisco Honorato

Aos novos obreiros saudamos e desejamos toda a sorte de prosperidades.

A nova Casa recebeu o nome de Sociedade Espírita “25 de dezembro” e estava situada à Rua 16, nº26. Também faziam parte desse primeiro núcleo: Francisco Ferreira de Mello, Domiciano Alves Ferreira, Ozório Pedro da Silva, Aureliano Ferreira de melo, Teodolino Luiz `Pereira, Antonio José Moreira e César Tornelli.

Em 1911, a Instituição foi transformada em “Casa da Caridade“, nome este que passou a ostentar em sua fachada.Prestou relevantes serviços à comunidade no tratamento de enfermos até 1919, quando cedeu suas dependências à Santa Casa de Misericórdia, passando à direção do Dr. Raymundo Mariano Dias, ilustre espírita de Barretos.

Os integrantes do Clube Literário e Recreativo de Barretos, um grupo de intelectuais formado por Fausto e Alarico Lex, Dr. Mariano Dias, Dr. Leocádio Seixas e outros,começam a praticar como passatempo, em 1918, brincadeiras de salão com leitura de mãos, adivinhações e experiências com os copos, em moda na época.

Católicos por formação, nenhum pensava em comunicações mediúnicas sérias, no entanto, a mediunidade inconsciente de psicografia de um dos participantes eclodiu e as reuniões começaram a ser realizadas mais amiúde, despertando muita curiosidade.

Impressionados, os intelectuais do grupo compreenderam a seriedade e autenticidade dos fenômenos e revelações ali obtidas e se converteram ao Espiritismo. Foram buscar abrigo e conhecimentos da prática mediúnica na qual engatinhavam com os humildes integrantes do núcleo do “25 de dezembro” e lá se iniciaram de fato na Doutrina. Juntaram-se a eles nos estudos Victor Miguel Romano, Domingos Tedesco e Pereira Novo.

Em 1926, Mariano Dias funda a União Evangélica “Fé e Esperança” destinada a doentes mentais.Antes de ver realizado o seu sonho, tomba assassinado pelo espanhol Santiago Morales, indivíduo de maus antecedentes, mas seus companheiros espiritistas levam adiante seu ideal e assim foi inaugurada a nova “Casa de Caridade”, que recebeu o nome de Asilo “Dr. Mariano Dias”, hoje Sanatório “Mariano Dias”.

Dr. Mariano Dias


Raymundo Mariano Dias, nasceu em São Vicente do Ferres, Maranhão, aos 30 de julho de 1881, e desencarnou em Barretos, São Paulo, aos 26 de março de 1926.

Fez o Curso de Humanidades em São Luiz do Maranhão, formou-se em Farmácia em Salvador, Bahia, e doutorou-se em medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade do Brasil, no Estado da Guanabara, outrora Rio de Janeiro, no ano de 1907.

Iniciou a sua clínica médica primeiramente em Monte Azul Paulista, tendo daí se transferido para Barretos, onde montou o seu consultório.

Em 7 de setembro de 1909, contraiu matrimônio com Judith de Morais, de cujo casal nasceram dez filhos, dos quais sobreviveram apenas seis: Evandro, Izolda, Zilda, Zélia , Maria Tereza e Adolpho Magno.

Mariano Dias foi um dos pioneiros do movimento espírita em Barretos e cidades circunvizinhas,tendo criado várias Instituições espíritas na região.

Em Barretos, fundou a primeira Santa Casa de Misericórdia,conforme já nos referimos, que, a princípio, funcionou à rua 16, onde se encontra hoje a sede social da atual Sociedade Espírita “25 de Dezembro”.

Colaborou nos principais jornais e revistas espíritas de sua época : ”O Clarim”, “Aurora”, “Nova Era” e o “Reformador”.

Foi orador e jornalista, tendo sido ainda um dos fundadores do jornal “Correio de Barretos”.

Ocupou cargos de destaque na administração pública local e na Loja Maçônica “Fraternidade Paulista“ de Barretos,onde foi iniciado em 23 de março de 1909 e instalado Venerável Mestre de 1915 a 1917, continuando maçom ativo até seu falecimento.

Médico requisitado,foi grande batalhador em prol da construção do Sanatório para tratamento de obsidiados, conforme já nos referimos.


PRESIDENTE PRUDENTE

Nos anos de 1921 a 1922, mudou-se de Orlândia para Presidente Prudente, Antonio Campos do Amaral, trazendo toda a sua família, inclusive um filho já casado, José Campos do Amaral, que veio morar na zona rural, em local denominado “Boiadeira” , hoje bairro do Aeroporto.

Antonio,que já tinha noções de Espiritismo,conheceu um grupo de espíritas, entre eles Pedro Carvalho e Maria Mendes, esta uma excelente médium e parteira na zona rural.Sua casa estava sempre repleta de mulheres e crianças para receber tratamento de passes,na época,os famosos “benzimentos”.

Faziam parte deste grupo de pioneiros do Espiritismo em Presidente Prudente, Antonio Giraldi, Agostinho Alves, José Pinto, Manoel Spinhoza, Julio Espinhoza, Francisco Rosas, todos sitiantes e que se reuniram e construíram o primeiro Centro Espírita de Presidente Prudente na zona rural. Reuniam-se aos domingos às 12 horas para estudos e desenvolvimento mediúnico, visto ser difícil para todos eles saírem à noite por falta de energia elétrica e das condições precárias das estradas de terra na época.

O doador do terreno em que se erigiu o prédio do Centro foi Joaquim Nunes, também sitiante.Tempos depois, este mesmo grupo fundiu-se com o grupo dos confrades Tomas Ferreira, José Francisco Tavares, José Araújo (pedreiro) e sua esposa, Balbina Araújo, Antonio Almeida, Virgílio Reis, Olimpio Reis, Miguel Fernandes, Alexandre Fernandes e vários outros e resolveram fundar um outro Centro na cidade. Cassiano Martins doou um terreno na Av. Brasil e construiu-se o prédio do Centro Espírita “Poder da Fé”, erguido com grandes dificuldades pelos próprios integrantes da Instituição, tendo em vista a negativa de muitos profissionais em trabalharem na obra.O primeiro Presidente foi o Tomas Ferreira, o segundo Antonio Almeida, o terceiro Virgilio Reis, que ficou à frente da direção da Casa Espírita por mais de 50 anos.

O pequeno núcleo espírita da antiga Boiadeira continua em atividade, hoje no Bairro do Limoeiro, dirigido pelos familiares de Manoel Espinhoza.

 

 

Fontes e agradecimentos a nossos colaboradores:

Revista da Sociedade Acadêmica “Deus, Cristo e Caridade”, gentilmente cedida por Geraldo Campetti, Diretor da Biblioteca e Seção de Obras Raras da FEB; Aníbal Lopes (Jaboticabal); Conchetta Mônaco Carboni,Oswaldo Brandão Tóffano, Murillo de Almeida Prado, Júlio de Mattos (Jaú); José Pereira Novo Júnior, Sebastião de Souza Sant’Anna, Ary Lex, Wilson Ferreira de Mello (Barretos); Zildea Marques (Piracicaba); Ciomara Mancini, Rita Maria Macedo Alves (Presidente Prudente).

 



topo