Muito freqüentemente queixam-se os companheiros
que militam na Casa Espírita acerca dos distúrbios que
se operam nas engrenagens administrativas da Instituição,
impondo a deserção de vários tarefeiros e a abertura
de áreas de guerra intestina, em que a maledicência e
a revolta surda, o azedume e o melindre surgem por colheita infeliz,
fruto da sementeira invigilante dos trabalhadores envolvidos. Aqui,
aparece a discussão estéril, levando os trabalhadores
a ruidosos atritos pessoais, desencadeando o malogro de idéias
louváveis, e ao abortamento de projetos de crescimento da própria
Casa.
Mais adiante, observa-se a frieza de corações
no trato uns para com os outros, estabelecendo nevoento e propício
campo para as disputas de arena e os duelos espirituais nas faixas
dos sentimentos inferiores, prenunciando a ruína de tudo quanto
já foi construído pelos obreiros da primeira hora.
Mais acolá, a inveja ganha espaço entre
os servidores da colméia espírita, onde passa a haver
disputa pelo mel das vantagens imediatas e dos aplausos do mundo,
ante a ânsia de se estar nos postos de comando, abandonando-se
a simplicidade e a humildade que deveriam viger por bandeiras de vivência
cristã na seara que se escolheu para militar.
E assim vários focos infecciosos vão
minando a Instituição Espírita, sempre sob a
aparência de simples divergências de pensamentos, a ocultar
uma ameaça muito maior, qual seja a evidência perturbadora
da inferioridade humana, buscando espaço para as alucinações
do Ego e para a tirania do espírito.
Nesse meio termo, surgem os que alertam que a Casa
Espírita está sob assalto da obsessão coletiva,
necessitando de uma maior vigilância dos tarefeiros encarnados,
a fim de se minimizar o assédio das sombras sob açodamento
das paixões humanas. Recomenda-se a prece e a vigilância
por antídoto a semelhante flagelo de natureza espiritual.
Certamente que têm razão os que assim
se pronunciam, alertando aos demais para que não caiam mais
profundamente nas malhas sutis da influência fascinatória
exercida pelos Espíritos desencarnados sobre o psiquismo humano
em tresvario.O próprio Codificador do Espiritismo, Allan Kardec,
já nos tinha alertado que a influência obsessiva sempre
se dá quando o indivíduo se coloca predisponente para
que semelhante sintonia se estabeleça no campo pessoal, ameaçando
soçobrar a tranqüilidade e a paz vigente na seara espiritista.
Todas as vezes que a obsessão se insinua, imperioso
é reconhecer que os obsedados vulgares dão repasto a
semelhante enfermidade da alma. A invigilância aos próprios
sentimentos, a ausência de autocrítica, o despeito em
relação aos demais companheiros de militância,
a disputa por espaços de poder e de influência pessoal
abrem campo para que a obsessão, seja individual ou coletiva,
se instale na intimidade da Instituição qual erva daninha
em solo fértil, sendo esta praga rasteira disseminada pelos
próprios semeadores da Casa Espírita, ante o fascínio
de poder e comando que muitos trazem de existências transatas
fracassadas.
Necessário que, em vez de uma olhada simplista
para a janela do invisível, ante a investigação
mediúnica, que será simplesmente confirmar o que já
se sabe e se suspeita, fundamental se faz que os causadores do distúrbio
abram os portais da alma e se voltem para dentro de si mesmos, reavaliando
suas condutas ante a doutrina lida e estudada, mas ainda evidentemente
não vivida.
É o Espiritismo o mais sublime roteiro de reforma
íntima e renovação moral que se conhece nos caminhos
terrestres, nos convidando a abandonar os velhos mantos da vaidade
milenar e do egoísmo primitivista, sendo ele poderoso antibiótico
a agir nos tecidos infeccionados da alma, ensejando que façamos
ainda hoje a nossa autocura através da renúncia a propósitos
hegemônicos e autoritários, buscando uma postura madura
e responsável diante das tarefas abraçadas livremente
e dos demais irmãos de jornada, a fim de que não nos
façamos instrumentos da perturbação, a introduzir
no seio da Casa Espírita os pegajosos tentáculos do
escândalo e da viciação, a matar as florações
segadas por mãos abnegadas e dedicadas, escândalo este
pelo qual responderemos mais tarde.
Que cada trabalhador se conscientize de que é
importante sem ser imprescindível.
Que é útil, mas nunca indispensável.
Que mais vale ajudar do que desajudar.
Que toda crítica ao que já existe deve
vir acompanhada das possíveis alternativas ou soluções
de como deveria ser, e que nosso verbo, ao analisar fatos e pessoas,
deve estar marcado pelo selo da mansuetude e da tolerância,
ante a inequívoca constatação de que não
sendo perfeitos, não podemos exigir dos demais a perfeição
que eles igualmente estão a buscar.
Dessa forma, cada um vai percebendo sua real posição
na Casa Espírita que elegeu para trabalhar, evitando interferências
desastrosas nas lides alheias, e assim operando individualmente para
o êxito da atividade coletiva, que deve sempre refletir o espírito
do Cristo, que nos convida permanentemente ao combate sem tréguas
às nossas paixões, nos estimulando a evoluir com a ferramenta
da Doutrina Espírita e a conviver harmoniosamente no meio dos
desafios por que passa periodicamente a Casa Espírita, bem
como o Movimento Espírita, já que estamos cientes de
que não somos melhores nem piores do que os demais que comungam
conosco a seara a que nos entregamos voluntariamente: somos simplesmente
pessoas diferentes umas das outras, em graus de entendimento próprio,
em incessante marcha para dias melhores, depois de superadas, as refregas
da Terra, que nos impõe a convivência em grupo para que
nos exercitemos na arte de aceitar o companheiro que marcha conosco,
aprendendo igualmente a ser feliz.
Mário H. de Luna