Nesta parte
de O Livro dos Espíritos, que
trata das Leis Morais, a necessidade e o limite do trabalho tomam
vulto especial no capítulo III da Parte 3a da obra maior
da Terceira Revelação de Deus à Humanidade.
Se nada mais escrevêssemos além dessa análise
reflexiva, já teríamos dito o suficiente para que
a missão de Allan Kardec fosse encarada por quem quer que
a conhecesse como algo do mais sublimado teor.
Nosso propósito, no entanto, com estes
estudos é bem outro. É aprofundar reflexões
sobre mensagem tão luminosa quanto perfeita da Espiritualidade,
cuja origem não temos condição de compreender
senão como emanada das planuras celestiais.
Recordamos, através da História, que a ação
de trabalhar era considerada de cunho tão ínfimo
que os nobres não trabalhavam. Nada expressaria condição
tão desprezível para um nobre como a de trabalhador;
talvez por isso mesmo salientara Jesus – “Meu
Pai trabalha até agora, e eu trabalho também”
(João, 5:17) – ao ser
censurado pelos fariseus por realizar uma cura num dia de sábado.
Na verdade, quem observa a Natureza e o próprio Universo
vê que em tudo há trabalho. A própria vida,
em si mesma, é uma ação contínua de
trabalho. E a história das civilizações premia-nos
com exemplos magníficos de trabalho em todas as áreas
do progresso. Do homem de nossos dias ao homem primitivo, parece-nos
a distância de um salto apenas! Efetivamente, sem a bênção
do trabalho estarímos, ainda, na era da pedra lascada.
Vê-se, pois, que na ação de trabalhar se encontra
o principal fator que arrastou o homem primitivo à
condição do homo sapiens de nossos dias,
retardando-o apenas em moralidade.
Por trabalho,
aqui, não entenda ninguém apenas as ocupações
materiais. Por isso enganavam-se os nobres, quando malsinavam,
principalmente na Idade Média dos senhores feudais, o trabalho
como atividade inferior. Eles administravam seus bens e poderes,
desconhecendo, por força do egoísmo, que isso também
era ação de trabalhar.
É que o homem ainda ignorava sua condição
de Espírito eterno, que sempre trabalha quando pensa, quando
estuda, quando faz Arte, quando procura ser útil. O homem
de mente elevada sente que o trabalho se lhe impõe, como
conseqüência espiritual, no comando do corpo.
Mas, só nisso? Claro que não! Na Casa do Pai tudo
trabalha, mesmo os Espíritos ainda de condição
inferior trabalham (LE, questão 540).
Eis que sua alimentação, sua segurança e
bem-estar estarão sempre na dependência de certa
atividade, e que essa atividade é trabalho.
Assim, quando extremamente fraco o homem, Deus lhe desenvolve
a inteligência como compensação da fraqueza,
apontando-lhe recursos de ação criadora e produtiva,
do que encontramos exemplos em toda a parte.
Observemos uma vez mais a Natureza, no mundo dos seres simples
e irracionais. O que vemos é que não há inação
em parte alguma.
Tudo trabalha, a partir do átomo com seus elétrons
e prótons em ininterrupta movimentação no
seio das coisas, mesmo inorgânicas, estruturando, assim,
os seres do futuro.
Nas plantas, nos irracionais, nos seres mais pequeninos e simples,
na terra e nos mares, tudo se agita, buscando vida e conservação.
No homem, porém, o trabalho tem duplo fim: a conservação
ideal do corpo – saúde e bem-estar – e o desenvolvimento
da capacidade de pensar, de refletir, de aprender mais e mais.
Atentemos,
por exemplo, no que está expresso no item 11 do capítulo
XVII de O Evangelho segundo o Espiritismo,
para melhor reflexão.
Eis que na questão 678, o Codificador do Espiritismo, numa
indagação aos Espíritos Superiores, leva-nos
a pensar nos mundos mais aperfeiçoados do Universo, ensinando-nos
que lá também há necessidades que só
serão satisfeitas através do trabalho incessante.
O cientista de nossos dias assesta seus instrumentos de observação
na direção do espaço cósmico, e ao
captar a imagem do nascimento de um sistema galático, há
milhares de anos-luz, extasia-se e exclama: “Um big-bang,
é o nascimento do Universo!”
Porque não tem, ainda, alcance para entender que o Universo
é ação da plenitude infinita de Deus, e que
a Criação é permanente, nunca se interromperá!
Repitamos, mais uma vez, a afirmação de Jesus registrada
por João (5:17): “Meu Pai trabalha até
agora, e eu trabalho também.”
Recordemos aqueles que, por expiação ou prova, impossibilitados
se encontram de trabalhar. E Deus, na sublimidade de Seu Amor
e Justiça, manda-nos que, fraternalmente, lhes supramos
as necessidades, à luz do Evangelho. Acentua, ainda, na
questão 681, ser obrigação dos filhos assistirem
os pais, quando a estes faltarem forças para trabalhar;
e adverte toda a sociedade do dever de amparar os que se incapacitarem.
Quanto ao limite do trabalho e à necessidade do repouso,
na velhice, quatro questões ocuparam a atenção
dos Espíritos Reveladores, que confirmaram ser o repouso,
também, lei natural da vida, tendo em vista que, fisicamente,
o trabalho pode exercer desgaste na máquina física
do corpo.
Desse modo, o limite do trabalho é decorrente do limite
das forças.
Não obstante, quanto a isso, Deus deixa o homem entregue
ao seu próprio arbítrio, sem isentá-lo da
responsabilidade de prover o que lhe for necessário, na
ordem física, social e moral.
Na velhice, por exemplo, pode ocorrer total incapacidade, no homem,
para trabalhar, diante do que não lhe deve faltar assistência
da própria sociedade através do Estado.
Pois, que há de fazer o velho que já não
pode trabalhar e precisa sobreviver? Na verdade, infelizmente,
há países de sociedades ainda tão atrasadas
moral e espiritualmente que nem mesmo o poder público se
faz atento a esse tipo de compromisso fraternal...
Gostaríamos de estender-nos mais sobre um melhor aprofundamento
em torno do pensamento do inspirado Missionário da Doutrina
do Consolador. Em face, porém, de nossas deficiências,
deixamos a cargo do leitor refletir bem nas indagações
do mestre Allan Kardec a respeito do que compete à educação
moral, social e cívica, tão necessária ao
desenvolvimento espiritual do homem...