Perceber e valorizar
aquilo que temos ou recebemos de bom ajuda a afastar sintomas
de depressão e ansiedade
Receber o reconhecimento alheio por
aquilo que fazemos costuma ser prazeroso, ninguém duvida. O problema
é que, por si só, essa sensação não
se sustenta – e, ainda que os elogios sejam muitos, chega uma
hora em que simplesmente não são mais suficientes para
aplacar nossas carências narcísicas. O que do ponto de
vista psíquico parece de fato fazer bem é cultivar gratidão
por aquilo que temos ou recebemos, seja especificamente de outra pessoa
ou da vida, de maneira geral. Nos últimos anos, vários
estudos têm buscado compreender e mensurar os efeitos desse sentimento
na vida psíquica.
Um deles, desenvolvido pela neurocientista Sonja Lyubomisky, da Universidade
da Califórnia, em Riverside, por exemplo, mostrou que quanto
mais alto é o nível de orientação para a
gratidão de uma pessoa, menos ela tende a apresentar sintomas
de depressão e ansiedade.
Em outra pesquisa, os psicólogos Robert Emmons e Michael McCollough,
os dois da Universidade da Califórnia, em Davis, dividiram voluntários
em três equipes. Os do primeiro grupo deveriam anotar uma vez
por semana cinco situações que haviam despertado sua vontade
de agradecer. Aos do segundo, os cientistas solicitaram que registrassem
cinco eventos que despertassem preocupação e aos integrantes
da terceira equipe, cinco acontecimentos do cotidiano escolhidos ao
acaso. Resultado: após duas semanas, os participantes do primeiro
grupo declaram se sentir mais satisfeitos e apresentaram menos queixas
físicas como cansaço, dores de cabeça e de estômago,
em comparação aos colegas.
Emmons e McCollough garantem, porém, que só nos darmos
conta do quanto somos gratos não é suficiente: comunicar
(de preferência à pessoa a quem dirigimos esse sentimento)
é fundamental. Segundo a doutora e psicologia Rebecca Shankland,
professora da Universidade Pierre Mendès France, em Grenoble,
o fato de a orientação para a gratidão ser um dos
traços pessoais mais ligados ao bem-estar psicológico
pode ser compreendido, por exemplo, em razão da forma como retemos
informações. Os mais gratos tendem a memorizar mais facilmente
as lembranças positivas, evocando com maior frequência
a recordação de quem lhe fez o gesto de generosidade e
o contexto em que a situação ocorreu. E o mecanismo que
produz esse efeito se autoalimenta: gentileza e generosidade aumentam
as chances de desenvolvermos relações satisfatórias
que nos tragam bem-estar.
Aí surge a pergunta inevitável: é fácil
manter esse estado positivo? Não, nem sempre. E, claro, alguns
têm mesmo maior facilidade que outros para fazê-lo. A boa
notícia é que, como acontece com quase tudo na vida, podemos
nos familiarizar com a orientação para a gratidão.
Sonja Lyubomisky, por exemplo, sugere manter um diário onde podem
ser anotadas situações que nos motivam a agradecer. Quanto
mais específicos forem os registros, melhor. Além disso,
segundo os pesquisadores, sempre que possível, vale realmente
dizer às pessoas (tanto próximas quanto estranhas) que
nos fizeram algum bem o quanto isso foi importante. Na impossibilidade
de agradecer concretamente – como no caso de alguém que
já morreu –, vale escrever uma carta ou um email. E mesmo
que não seja possível enviá-los, o que conta é
entrar em contato com o sentimento.
Robert Emmons e Michael McCollough enfatizam ainda que não é
preciso esperar que acontecimentos mirabolantes nos motivem a agradecer.
Eu, por exemplo, sou grata hoje pelo fato de que, por uma dessas artimanhas
de causas e condições volto ao Estadão, dez anos
depois de minha saída da redação. E, desta vez,
escrevo não só como jornalista, mas também como
psicóloga e psicanalista. É uma sensação
boa, parecida com a de retornar para casa. Obrigada!
Fonte:
http://blogs.estadao.com.br/pensar-psi/gratidao-para-curar-a-mente
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