Vosso bom acolhimento e as boas
preces que fizestes em minha intenção obrigam-me
a vos agradecer vivamente e vos assegurar o meu eterno devotamento.
Desde a minha entrada na verdadeira vida, bem depressa me familiarizei
com todas as novidades, com as suaves exigências de minha
situação atual. Hoje me chamam de todos os lados,
não como antigamente, para cuidar de corpos doentes, mas
para trazer alívio às doenças da alma. A
tarefa a desempenhar é suave e, com mais rapidez do que
outrora chegava à cabeceira dos doentes, hoje atendo ao
apelo das almas sofredoras. Posso mesmo, e isto nada tem de estranho
para mim, transportar-me quase instantaneamente de um ponto a
outro, com a mesma facilidade com que meu pensamento vai de um
a outro assunto. O que é singular para mim é que
eu o possa fazer!...
Meus bons amigos, devo vos falar de um fato espiritual que me
acontece, e que venho submeter ao vosso julgamento, para que me
ajudeis a reconhecer o meu erro, caso me tenha enganado em minhas
apreciações a respeito. Médico em minha última
encarnação, como sabeis, me entreguei com ardor
aos estudos de minha profissão. Tudo quanto a ela se referia
era para mim um assunto de observação. Devo dizer,
sem orgulho, que tinha adquirido alguns conhecimentos, talvez
em razão de nem sempre ter seguido ao pé da letra
o caminho traçado pela rotina. Muitas vezes buscava no
moral o que pudesse trazer uma perturbação no físico;
talvez seja por isto que eu conhecesse um pouco melhor a minha
profissão do que certos colegas. Enfim, eis o fato: há
alguns dias senti uma espécie de torpor apoderar-se de
meu Espírito e, a despeito de conservar a consciência
do meu eu, senti-me transportado no espaço; chegado
a um lugar que para vós não tem nome, encontrei-me
numa reunião de Espíritos que, em vida, tinham conquistado
alguma celebridade pelas descobertas que haviam feito.
Lá, não fiquei pouco surpreendido ao reconhecer
nesses antigos de todas as idades, nesses nomes de todas as épocas,
uma semelhança perispiritual comigo. Perguntei-me o que
tudo aquilo significava; dirigi-lhes as perguntas que me sugeria
a minha posição, mas minha surpresa foi ainda maior,
ouvindo-me responder a mim mesmo. Voltei-me, então, para
eles e vi que estava só.
Eis as minhas deduções...
Dr.
Cailleux
Nota – Tendo parado
aí, o Espírito continuou na sessão seguinte.
A questão dos fluidos,
que constitui o fundo dos vossos estudos, representou um papel
muito grande no fato que eu vos assinalava na última sessão.
Hoje vos posso explicar melhor o que se passou e, em vez de vos
dizer quais eram as minhas conjecturas, posso dizer o que me revelaram
os bons amigos que me guiam no mundo dos Espíritos.
Quando meu Espírito sofreu uma espécie de entorpecimento,
eu estava, a bem dizer, magnetizado pelo fluido de meus amigos
espirituais; por uma permissão de Deus, daí devia
resultar uma satisfação moral que, dizem eles, é
a minha recompensa e, além disso, um encorajamento para
marchar num caminho que segue o meu Espírito desde um bom
número de existências.
Eu estava, pois, adormecido num sono magnéticoespiritual;
vi o passado formar-se num presente fictício; reconheci
individualidades que haviam desaparecido ao longo do tempo, ou,
melhor, que tinham sido apenas um indivíduo. Vi um ser
começar uma obra médica; um outro, mais tarde, continuar
a obra esboçada pelo primeiro, e assim por diante. Cheguei
a ver em menos tempo do que levo a vos dizer, de idade em idade,
formar-se, crescer e tornar-se ciência, o que, no princípio,
não passava dos primeiros ensaios de um cérebro
ocupado em estudos para o alívio da Humanidade sofredora.
Vi tudo isto e só me reconheci quando cheguei ao último
desses seres que, sucessivamente, haviam trazido um complemento
à obra. Aí tudo se desvanece e torno-me o Espírito
ainda atrasado do vosso pobre doutor. Ora, eis a explicação.
Não vo-la dou para me envaidecer; longe disso; mas, antes,
para vos fornecer um assunto de estudo, falando-vos do sono espiritual
que, sendo elucidado por vossos guias, só me pode ser útil,
pois assisto a todos os vossos trabalhos.
Nesse sono vi os diferentes corpos que meu Espírito animou
desde um certo número de encarnações, e todos
trabalharam a ciência médica sem jamais se afastarem
dos princípios que o primeiro havia elaborado. Esta última
encarnação não era para aumentar o saber,
mas simplesmente para praticar o que ensinava a minha teoria.
Com tudo isto fico sempre vosso devedor; mas, se o permitirdes,
virei pedir-vos lições e, algumas vezes, dar minha
opinião pessoal sobre certas questões.
Dr.
Cailleux
ESTUDO
Há aqui um duplo ensinamento:
primeiramente há o fato da magnetização de
um Espírito por outros Espíritos, e do sono daí
resultante; e, em segundo lugar, da visão retrospectiva
dos diferentes corpos que ele animou.
Há, pois, para os Espíritos uma espécie de
sono, o que é um ponto de contato a mais entre o estado
corporal e o estado espiritual. Trata-se aqui, é verdade,
de um sono magnético; mas existiria para eles um sono natural
semelhante ao nosso? Isto nada teria de surpreendente, quando
se vêem ainda Espíritos de tal modo identificados
com o estado corporal que tomam seu corpo fluídico por
um corpo material, que crêem trabalhar como o faziam na
Terra e que sofrem fadiga. Se sentem fadiga, devem experimentar
a necessidade de repouso, e podem crer que se deitam e que dormem,
como acreditam que trabalham e viajam em estrada de ferro. Dizemos
que eles crêem, para falar do nosso ponto de vista; porque
tudo é relativo e em relação à sua
natureza fluídica a coisa é tão real quanto
o são para nós as coisas materiais.
Apenas os Espíritos de ordem inferior têm semelhantes
ilusões; quando menos adiantados, mais o seu estado se
aproxima do estado corporal. Ora, este não pode ser o caso
do Dr. Cailleux, Espírito avançado, que se dá
conta perfeitamente de sua situação. Mas não
é menos verdade que teve consciência de um entorpecimento
análogo ao sono, durante o qual viu suas diversas individualidades.
Um membro da Sociedade explica o fenômeno desta maneira:
No sono humano, só o corpo repousa, mas o Espírito
não dorme. Deve dar-se o mesmo no estado espiritual; o
sono magnético, ou outro, não deve afetar senão
o corpo espiritual ou perispírito, e o Espírito
deve achar-se num estado relativamente análogo ao do Espírito
encarnado durante o sono do corpo, isto é, conservar a
consciência de seu ser. As diferentes encarnações
do Dr. Cailleux, que seus guias espirituais queriam fazê-lo
ver para sua instrução, puderam apresentar-se a
ele como lembrança, da mesma maneira que as imagens se
oferecem nos sonhos.
Esta explicação é perfeitamente lógica;
foi confirmada pelos Espíritos que, provocando o relato
do Dr. Cailleux, quiseram dar-nos a conhecer uma nova fase da
vida de além-túmulo.