P. - Já
me dissestes várias vezes que nos reuniríamos para
não mais nos separar. Como isto poderia se dar? É
que as reencarnações, mesmo as que sucedem às
da Terra, não separam sempre por um tempo mais ou menos longo?
R. - Digo-te: Deus permite àqueles que se
amam sinceramente, e souberam sofrer com resignação
para expiarem suas faltas, se reunirem primeiro no mundo dos Espíritos,
onde progridem juntos, para obter estarem encarnados nos mundos
superiores. Podem, pois, se o pedem com fervor, deixar os mundos
espíritas na mesma época, se reencarnar nos mesmos
lugares, e, por um encadeamento de circunstâncias previstas
anteriormente, se reunir pelos laços que melhor convierem
ao seu coração.
Uns pedirão para ser pai ou mãe de um Espírito
que lhes era simpático, e que ficarão felizes em dirigir
no bom caminho, cercando-o de ternos cuidados da família
e da amizade. Os outros pedirão a graça de estarem
unidos pelo matrimônio e de ver transcorrerem numerosos anos
de felicidade e de amor. Falo do casamento entendido no sentido
da reunião íntima de dois seres que não querem
mais se separar; mas o casamento, tal como é compreendido
sobre vossa Terra, não é conhecido nos mundos superiores.
Nestes lugares de felicidade, de liberdade e de alegria, os laços
são de flores e de amor; e não vás crer que
sejam menos duráveis por isso. Só os corações
falam e guiam nessas uniões tão doces. Uniões
livres e felizes, casamentos de alma à alma diante de Deus,
eis a lei de amor dos mundos superiores! e os seres privilegiados
dessas regiões benditas, crendo-se mais fortemente ligados
por semelhantes sentimentos do que não o são os homens
da Terra, que pisam tão frequentemente sob os pés
os mais sagrados compromissos, não oferecem o doloroso espetáculo
de uniões perturbadas, sem cessar, pela influência
dos vícios, das más paixões, da inconstância,
do ciúme, da injustiça, da aversão, de todos
esses horríveis pendores que conduzem ao mal, ao perjúrio
e à violação dos juramentos mais solenes. Pois
bem! esses casamentos benditos por Deus, essas uniões tão
doces, são a recompensa daqueles que, tendo se amado profundamente
no sofrimento, pedem ao Senhor justo e bom continuar nos mundos
superiores a se amarem ainda, mas sem temerem uma próxima
e terrível separação.
E o que há aí que não seja fácil de
compreender e de admitir? Deus, que ama todos os seus filhos, não
teve que criar, para os que disso se fizeram dignos, uma felicidade
tão perfeita quanto as provas haviam sido cruéis?
Que poderia conceder que fosse mais conforme ao desejo sincero de
todo coração amante? De todas as recompensas prometidas
aos homens, há alguma coisa de semelhante a este pensamento,
a esta esperança, eu poderia dizer a esta certeza: estar
reunido pela eternidade aos seres adorados?
Crê-me, filha querida, nossas secretas aspirações,
essa necessidade misteriosa, mas irresistível de amar, amar
por muito tempo, amar sempre, não foram colocadas por Deus
em nossos corações senão porque a promessa
do futuro nos permitia essas doces esperanças. Deus não
nos fará experimentar as dorés da decepção.
Nossos corações querem a felicidade, não batem
senão para as afeições puras; a recompensa
não poderia ser senão o cumprimento perfeito de nossos
sonhos de amor. Do mesmo modo que, pobres Espíritos sofredores
destinados à prova, nos foi necessário pedir e escolher
mesmo, algumas vezes, a expiação mais cruel, do mesmo
modo Espíritos felizes, regenerados, escolhemos ainda, com
a nova vida destinada a nos depurar mais, a soma destinada ao Espírito
avançado. Eis, filha bem-amada, um resumo bem sucinto das
felicidades futuras. Frequentemente, teremos ocasião de retornar
a este agradável assunto. Deves compreender quanto a perspectiva
desse futuro me torna feliz, e quanto me é doce te confiar
minhas esperanças!
P. - Reconhecemo-nos nessas novas e felizes existências?
R. - Se não nos reconhecêssemos,
a felicidade seria bem completa? Isso poderia ser a felicidade,
sem dúvida, porque nesses mundos privilegiados todos os seres
estão destinados a ser felizes; mas seria bem a perfeição
da felicidade para aqueles que, separados bruscamente na mais bela
época da vida, pedem a Deus para estarem reunidos em seu
seio? Seria a realização de nossos sonhos e de nossas
esperanças? Não, pensas como eu. Se um véu
fosse lançado sobre o passado, não estaria aí
a suprema felicidade, a inefável alegria de se rever depois
das tristezas da ausência e da separação; não
estaria aí, ou pelo menos se ignoraria, essa antiga afeição
que aperta mais os laços. Do mesmo modo que sobre a vossa
Terra dois amigos de infância gostam de se reencontrar no
mundo, na sociedade, e se procuram muito mais do que se suas relações
não datassem senão de alguns dias, assim também
os Espíritos que mereceram o favor inapreciável de
se juntarem nos mundos superiores são duplamente felizes,
e reconhecem a Deus este novo reencontro, que responde aos seus
desejos mais caros.
Os mundos colocados acima da Terra, nos graus da perfeição,
são cumulados de todos os favores que podem contribuir para
a felicidade perfeita dos seres que os habitam; o passado não
lhes é oculto, porque a lembrança de seus antigos
sofrimentos, de seus erros resgatados ao preço de muitos
males, e aquele mais vivo ainda de suas sinceras afeições,
lhe fazem encontrar mil vezes mais doçura nessa nova vida,
e os garante das faltas que poderiam, talvez, por um resto de fraqueza,
se deixarem ir algumas vezes. Esses mundos são para o homem
o paraíso terrestre destinado a conduzi-lo ao paraíso
divino.
Nota.
- Equivocar-se-á estranhamente sobre o sentido desta comunicação
vendo-se nela a crítica às leis que regem o casamento
e a sanção das uniões efêmeras extraoficiais.
Ante as leis, as únicas que são imutáveis são
as leis divinas; mas as leis humanas, devendo ser apropriadas aos
costumes, aos usos, aos climas, ao grau de civilização,
são essencialmente móveis, e seria muito triste que
fosse de outro modo, e que os povos do século dezenove fossem
acorrentados à mesma regra que regia nossos pais; portanto,
se as leis mudaram de nossos pais a nós, como não
chegamos à perfeição, elas deverão mudar
de nós aos nossos descendentes. Toda lei, no momento em que
é feita, tem sua razão de ser e sua utilidade, mas
pode que, boa hoje, não o seja mais amanhã. No estado
de nossos costumes, de nossas exigências sociais, o casamento
tem necessidade de ser regulado pela lei, e a prova de que essa
lei não é absoluta, é que ela não é
a mesma em todos os países civilizados. É, pois, permitido
pensar que, nos mundos superiores, onde não há mais
os mesmos interesses materiais a salvaguardar, onde o mal não
existe, quer dizer, de onde os maus Espíritos encarnados
estão excluídos, onde, consequentemente, as uniões
são o resultado da simpatia e não de um cálculo,
as condições devem ser diferentes; mas o que é
bom neles poderia ser mal em nós.
De outro lado, é preciso considerar que os Espíritos
se desmaterializam à medida que se elevam e se depuram; que
não é senão nas classes inferiores que a encarnação
é material; para os Espíritos superiores, não
há mais encarnação material, e, consequentemente,
mais procriação, porque a procriação
é para o corpo e não para o Espírito. Portanto,
uma afeição pura é o único objetivo
de sua união e, para isto, não mais que pela amizade
sobre a Terra, não tem necessidade da sanção
dos ofícios ministeriais.