Notícia – François
Pâris, famoso diácono de Paris, morto em 1727, aos 37
anos de idade, era o filho mais velho de um conselheiro do Parlamento,
a quem naturalmente devia suceder no cargo. Preferiu, no entanto,
abraçar a carreira eclesiástica. Após a morte
do pai deixou os bens para o irmão e, durante algum tempo,
ensinou catecismo na paróquia de São Cosme, encarregando-se
da direção dos clérigos e fazendo-lhes conferências.
O cardeal de Noailles, a cuja causa estava ligado, quis nomeá-lo
cura dessa paróquia, mas sobreveio um obstáculo imprevisto.
O abade Pâris consagrou-se inteiramente ao retiro. Depois de
ter experimentado diversos eremitérios, confinou-se numa casa
do subúrbio de São Marcelo. Lá se entregou sem
reserva à prece, às práticas mais rigorosas da
penitência e ao trabalho manual. Fazia meias para os pobres,
que considerava como seus irmãos; morreu nesse asilo.
O abade Pâris havia aderido ao apelo da bula Unigenitus, interposta
pelos quatro bispos; tinha renovado seu apelo em 1720. Assim, devia
ter sido descrito diversamente pelos partidos opostos. Antes de fazer
meias produziu livros muito medíocres. Dele possuímos
explicações sobre as epístolas de São
Paulo aos Romanos e aos Gálatas, e uma análise da epístola
aos Hebreus, que pouca gente lê.
Tendo seu irmão mandado erigir-lhe um túmulo no pequeno
cemitério de Saint-Médard, os pobres socorridos pelo
piedoso diácono, alguns ricos que ele havia edificado e algumas
mulheres que tinha instruído para lá se dirigiam, a
fim de fazer preces. Houve curas que pareceram maravilhosas e convulsões
que foram consideradas perigosas e ridículas. A autoridade
viu-se enfim obrigada a fazer cessar esse espetáculo, determinando
o fechamento do cemitério no dia 27 de janeiro de 1732. Então
os mesmos entusiastas foram provocar suas convulsões em casas
particulares. Na opinião de muita gente, o túmulo do
diácono Pâris foi o túmulo do jansenismo. Mas
algumas pessoas julgaram ver o dedo de Deus, tornando-se mais ligadas
a uma seita capaz de produzir tais maravilhas. Há diferentes
histórias desse diácono, do qual talvez jamais teriam
falado se não o houvessem querido transformar num taumaturgo.
Entre os fenômenos estranhos apresentados pelos convulsionários
de Saint-Médard citam-se: a faculdade de resistir a golpes
tão terríveis que os corpos deveriam ficar triturados;
a de falar línguas ignoradas ou esquecidas; um desdobramento
extraordinário da inteligência: os mais ignorantes entre
eles improvisavam discursos sobre a graça, os males da Igreja,
o fim do mundo, etc.; a faculdade de ler o pensamento; postos em contato
com os doentes, apresentavam dores no mesmo local daqueles que os
consultavam; nada mais freqüente do que ouvi-los predizer diversos
fenômenos anormais que deveriam sobrevir no curso de suas moléstias.
A insensibilidade física produzida pelo êxtase deu lugar
a cenas atrozes. A loucura chegou a ponto de realmente crucificarem
vítimas infelizes, a fazer-lhes sofrer todos os detalhes da
Paixão do Cristo. E estas vítimas, cujo fato é
atestado pelas mais autênticas testemunhas, solicitavam as terríveis
torturas, designadas entre os convulsionários pelo nome de
grande socorro.
A cura dos doentes se operava pelo simples toque da pedra tumular
ou pela poeira que encontravam à sua volta e que tomavam com
alguma bebida ou aplicavam sobre as úlceras. Bastante numerosas,
estas curas foram atestadas por milhares de testemunhas, muitas das
quais são homens de ciência, no fundo incrédulos,
que registraram os fatos sem saber a que os atribuir.
Paulyne Roland
1. Evocação do diácono
Pâris
Resp. – Estou às vossas ordens.
2. Qual é o vosso estado atual como Espírito?
Resp. – Errante e feliz.
3. Tivestes outras existências corporais depois dessa que conhecemos?
Resp. – Não; estou constantemente ocupado em
fazer o bem aos homens.
4. Qual foi a causa dos fenômenos estranhos que se passavam
com os visitantes do vosso túmulo?
Resp. – Intriga e magnetismo.
Observação – Entre as faculdades de que
eram dotados os convulsionários, reconhecemos algumas sem a
menor dificuldade, das quais o sonambulismo e o magnetismo oferecem
numerosos exemplos. Tais são, entre outras: a insensibilidade
física, a percepção do pensamento, a transmissão
solidária das dores, etc. Assim, não podemos duvidar
que essas criaturas em plena crise estivessem numa espécie
de estado de sonambulismo acordado, provocado pela influência
que exerciam uns sobre os outros, mau grado seu. Eram, ao mesmo tempo,
magnetizadores e magnetizados.
5. Por que motivo uma população inteira foi subitamente
dotada dessas estranhas faculdades?
Resp. – Elas se comunicam muito facilmente em certos
casos, e não sois tão estranhos às faculdades
dos Espíritos para não compreender que nisto eles tomaram
uma grande parte, por simpatia para com aqueles que as provocavam.
7. Participastes diretamente como Espírito?
Resp. – Nem de longe.*
- N. do T.:
Como no original francês, a numeração saltou
do 5 para o 7.
8. Outros Espíritos concorreram
para isso?
Resp. – Muitos.
9. Em geral de que natureza eram?
Resp. – Pouco elevada.
10. Por que essas curas e todos esses fenômenos cessaram quando
a autoridade se opôs, mandando fechar o cemitério? Teria,
então, a autoridade mais poder que os Espíritos?
Resp. – Deus quis fazer cessar o fenômeno porque
havia degenerado em abuso e escândalo. Foi preciso um meio e
ele
empregou a autoridade dos homens.
11. Desde que não participastes dessas curas, por que escolhiam
vosso túmulo, de preferência a outro?
Resp. – Acreditais que eu tenha sido consultado? Escolheram
meu túmulo calculadamente: minhas opiniões religiosas,
primeiro, e o pouco bem que eu tinha procurado fazer foram explorados.
Os Convulsionários
de Saint-Médard
(Continuação – DEZEMBRO
DE 1859)
1. [A São Vicente de Paulo].
Na última sessão evocamos o diácono Pâris,
que teve a bondade de vir. Gostaríamos de ter a vossa opinião
pessoal sobre ele, como Espírito.
Resp. – É um Espírito cheio de boas intenções,
porém mais elevado moralmente do que em outros sentidos.
2. De fato ele é estranho, como diz, ao que se fazia junto
ao seu túmulo?
Resp. – Completamente.
3. Poderíeis dizer-nos como considerais o que se passava entre
os convulsionários? Era um bem ou um mal?
Resp. – Era antes um mal que um bem. É fácil
de perceber pela impressão geral que esses fatos produziam
sobre os contemporâneos esclarecidos e sobre os seus sucessores.
4. A esta pergunta dirigida a Pâris, a saber: “Se a autoridade
tinha mais poder que os Espíritos, por que pôs fim aos
prodígios?”, sua resposta não nos pareceu satisfatória;
que pensais disso?
Resp. – Ele deu uma resposta mais ou menos conforme
à verdade. Esses fatos eram produzidos por Espíritos
pouco elevados; a autoridade pôs-lhe um termo, interditando
a seus promotores a continuação dessa espécie
de saturnais.
5. Entre os convulsionários alguns se submetiam a torturas
atrozes; qual era o resultado disso sobre seus Espíritos depois
da morte?
Resp. – Praticamente nulo. Não havia nenhum
mérito nesses atos sem resultado útil.
6. Os que sofriam essas torturas pareciam insensíveis à
dor; havia neles simples resignação ou insensibilidade
real?
Resp. – Insensibilidade completa.
7. Qual era a causa dessa insensibilidade?
Resp. – Efeito magnético.
8. A superexcitação moral, chegada a um certo grau,
não poderia aniquilar-lhes a sensibilidade física?
Resp. – Isso contribuía em alguns deles e os
predispunha a sofrer a comunicação de um estado que
em outros tinha sido provocado artificialmente, porquanto o charlatanismo
representa um grande papel nesses fatos estranhos.
9. Já que esses Espíritos operavam curas e prestavam
serviços, como, então, podiam ser de ordem inferior?
Resp. – Não vedes isto todos os dias? Não
recebeis algumas vezes excelentes conselhos e ensinos úteis
de certos Espíritos pouco elevados, levianos mesmo? Não
podem eles procurar fazer algo de bom como resultado definitivo, com
vistas a um aperfeiçoamento moral?
10. Nós vos agradecemos as explicações que pacientemente
nos destes.
Resp. – Sempre vosso.