David Garland
> A"Punição" na sociedade moderna
Um dos mais aclamados sociólogos
a tratar do tema punição comenta sobre seus
amplos sentidos e efeitos, e aborda a emergência da
cultura do controle.
Entrevista realizada em 10/05/2008 por
Cristina Caldas e Marta Kanashiro
- REVISTA ELETRÔNICA DE JORNALISMO CIENTÍFICO -
“Uma sociedade precisa refletir não somente a
respeito de como os indivíduos devem ser punidos, mas
sim sobre questões mais amplas, como a política
penal afeta comunidades, opiniões políticas,
economia e cultura da sociedade de maneira geral”, defende
David Garland da Universidade de Nova Iorque. Formado em direito
na Inglaterra, Garland achava a área entediante e ingrata
até assistir as aulas sobre criminologia, sociologia
da lei e penalogia. Cada vez mais atraído pelas ciências
sociais, mas também pelas justiças e injustiças
no sistema judiciário criminal, Garland foi abandonando
a idéia de ser advogado ou juiz, para perseguir os
estudos criminológicos. Conhecido por sua abordagem
sociológica nos estudos de controle do crime e punição,
assim como por seu trabalho sobre a história das idéias
criminológicas, publicou inúmeros artigos na
área e cerca de 10 livros, dentre eles os conhecidos
Punishment and Modern Society: A Study in Social Theory,
Punishment and Welfare: The History of Penal Strategies
e The Culture of Control. Segundo o sociólogo,
seu interesse atual em pesquisa é tentar explicar o
motivo pelo qual a pena de morte persiste nos Estados Unidos,
e de maneira tão peculiar. Nesta entrevista à
ComCiência, concedida pessoalmente em seu escritório
em Nova Iorque, Garland fala sobre os temas abordados em seus
livros.
ComCiência: Punishment
and modern society: a study in social theory
leva o leitor a compreender os múltiplos efeitos e sentidos
da punição. Qual a principal mudança de perspectiva
que a obra propõe?
Garland:
Geralmente entendemos punição como uma maneira de responder
a um indivíduo criminoso – como um castigo por sua agressão,
e esperamos que ela reduza o crime, faça justiça e anuncie
que esse tipo de comportamento é errado. O meu argumento é
que a punição tem efeitos sociais mais amplos que não
estão confinados à punição ou controle
de indivíduos. Há usos políticos óbvios
da punição, que operam na arena política. Por
exemplo, a promessa de punições severas é usada
para distinguir um candidato que defende políticas muito duras
de combate ao crime de um candidato com políticas mais amenas.
Assim, a decisão sobre como punir ou que tipo de lei penal
introduzir podem ser maneiras simbólicas de marcar um bloco
político inteiro de valores e opiniões. Hoje nos EUA,
um número maciço de indivíduos está preso
e a uma taxa muito mais alta do que em outras democracias liberais.
O fato é que o encarceramento de 2,3 milhões de pessoas
tem implicações econômicas importantes. Significa,
por exemplo, que a taxa de 4% de desempregados nos EUA, anunciada
pelo governo, pode chegar ao quadro real de 6% se forem incluídos
os que poderiam estar trabalhando - uma adição de 2%
de desempregados escondidos atrás das grades. Ou seja, a prisão
funciona para regular o mercado de trabalho e disfarçar desempregados.
A prisão nos EUA é orientada muito diretamente para
um grupo demográfico específico: homens jovens negros.
Detenção se tornou agora um padrão no curso da
vida de homens jovens negros que não completaram o ensino médio.
Ir para a prisão é, para esse grupo, um fato normal
da vida. Para eles é mais provável ir para a cadeia
do que casar, prestar serviço militar ou ir para a faculdade.
Além disso, ser preso significa, por um lado, a redução
das chances de conseguir emprego e de formar uma família e,
de outro, o aumento das possibilidades de ter filhos criminosos, caso
os tenha. Ou seja, a prisão torna-se a base para gerar desigualdades.
Assim, ela tem efeitos econômicos e sociais que vão além
do controle do crime e de criminosos individuais. Portanto, uma sociedade
precisa refletir não somente a respeito da questão menor
de como os indivíduos devem ser punidos, mas sobre questões
mais amplas, como a política penal afeta comunidades, opiniões
políticas, economia e cultura da sociedade de maneira geral.
ComCiência: Em sua opinião, é
possível pensar em formas efetivas de punição?
Garland: Sim. Primeiro, é necessário
haver sanções penais para agressões criminais.
Se as pessoas aprendem a agredir com impunidade, isso é um
convite para o caos e maus comportamentos. Mas qualquer efeito intimidador
da punição usualmente acontece porque os criminosos
acreditam que serão pegos, e não porque receberão
uma sentença longa e terrível. Certeza é mais
importante que severidade, esse é o primeiro ponto. Além
disso, sabemos que de todos os inúmeros crimes que acontecem
em uma sociedade, apenas algo em torno de 1% resulta em condenação
pela corte e mandado de prisão. Há uma discrepância
marcante entre as agressões ocorridas, os crimes divulgados
para o público, os criminosos que são presos, condenados
e punidos. Há um imenso mecanismo de filtragem. Muitos crimes
não são notados, nem relatados. A maioria dos criminosos
não é pego, ao menos não na primeira vez. Mesmo
os que são presos, não necessariamente são condenados
e sentenciados. Isso significa que se a resposta principal ao crime
é a punição de criminosos descobertos e condenados,
então é perdido 99% dos comportamentos visados. Sendo
assim, ninguém deve esperar punição como bom
fundamento para o controle do crime. Não se pode descartar
punições, nem permitir que um agressor permaneça
impune, mas não se deve esperar que a punição
seja muito efetiva no esforço global de controlar o crime.
Ao invés disso, deve-se enfatizar dois mecanismos bem distintos,
ambos não punitivos. Um é a tendência atual de
padrões normais de socialização. Em geral, evitamos
cometer crimes não pelo medo de sermos descobertos, mas porque
achamos que tais atos são errados. Além disso, não
colocaríamos em risco nossos valores pessoais e senso de integridade,
ou o amor e respeito de nossa família e amigos (sem dizer de
nossos empregadores), caindo em tentações de fazer coisas
ofensivas e criminosas. Isso porque nossa socialização
foi efetiva. É também por conta da família a
qual pertencemos, da educação que tivemos, dos trabalhos
que fazemos, das possibilidades que temos, da reputação
que cultivamos. São esses nossos controles mais importantes,
não o medo da punição. É o medo de perder
status social e respeito próprio. Se uma sociedade quer prevenir
o crime, deve reforçar os mecanismos normais de socialização,
garantir que famílias, empregos e educação sejam
políticas fortalecidas. A outra abordagem não penal,
é a prevenção. Também podemos prevenir
crimes, nos concentrando nas situações em que ocorrem,
garantindo que as ruas sejam bem iluminadas durante a noite, que carros
sejam difíceis de roubar, ensinando vítimas como evitar
se tornarem vítimas. Prevenção por meio de socialização
é a melhor prevenção ao crime, e prevenção
por meio de controles situacionais também é importante.
Ambos são controles não punitivos que não produzem
os efeitos colaterais negativos da punição.
ComCiência: Nesse contexto, como se dá
a transição do Penal Welfarism e a emergência
da cultura do controle?
Garland: O argumento de The culture
of control é que em grande parte do século XX e
certamente até o começo dos anos 1970, a posição
ortodoxa na justiça criminal era a de que cortes judiciais,
prisões, condicionais e todo o sistema da justiça criminal
deveria visar à reabilitação ou correção
de indivíduos que chegaram a essas instituições.
A idéia era basicamente essa, para muitos criminosos, especialmente
os novos, o problema era que eles vinham de setores da sociedade com
pouca educação, menos socializados e com baixa taxa
de emprego. Ao invés de considerá-los inteiramente responsáveis,
o sistema de justiça criminal deveria tratá-los provendo
recursos de bem-estar social que solucionassem os problemas. A idéia
era que você deveria dar educação aos criminosos
que tinham saído da escola, provê-los de treinamento
e capacitação profissional, ajudar a reintegrá-los
às forças de trabalho. Em outras palavras, ao invés
de simplesmente punir, procurava-se resolver os problemas de base
que levaram ao crime. Isso não se aplicava a todos os criminosos,
nem tampouco aos crimes bárbaros ou aos reincidentes, mas especialmente
àqueles jovens, primários, pessoas com problemas mentais
ou usuários de drogas. Essa atitude foi amplamente desacreditada
a partir dos anos 1970 por diversos motivos. Um deles foi a percepção
de que o crime estava crescendo, o que realmente estava ocorrendo.
Poderiam afirmar que a reabilitação estava falhando,
que faltava o esforço necessário, inclusive para atingir
os criminosos cedo o suficiente, ou que recursos deveriam ser gastos
corretamente. Poderiam ter privilegiado a prevenção
e focalizado menos tratamentos posteriores. Mas ao invés disso
a resposta foi tipicamente “vamos abandonar a reabilitação
e mudar para mais punição e mais controle”. Uma
razão para essa importante mudança foi além dos
especialistas em justiça criminal e suas opiniões. Nos
EUA, por exemplo, houve um movimento contra as políticas de
bem-estar social e contra o sucesso do movimento dos direitos civis
– um movimento que reduziu o “privilégio branco”
da classe trabalhadora do sul. Além disso, a crise econômica
dos anos 1970 foi resolvida, em grande parte, exigindo que o pobre
carregasse o ônus do desemprego e da redução dos
bens sociais. Os EUA começaram a abandonar o projeto de inclusão
e passaram a confiar em mecanismos de exclusão. Isso levou
ao abandono do projeto de bem-estar social que foi substituído
pelo gerenciamento de risco, controle próximo e punição
retributiva severa.
ComCiência: Então não estava perfeitamente
claro se a reabilitação estava funcionando ou não...
Garland: Quando uma determinada política
pública não funciona há duas possibilidades.
Uma é que há um problema de implementação
e outra é que há um problema na teoria. Um problema
na implementação significa que o programa não
está funcionando muito bem porque há problemas na seleção
dos criminosos a serem tratados, na natureza de um tipo particular
de tratamento, os recursos utilizados, o treinamento dos profissionais
envolvidos, ou qualquer outro – algo na operacionalização
do programa está inadequado. E é evidente que havia
grandes problemas na implementação de programas de reabilitação.
A resposta política foi: “nossa teoria está errada,
nós não deveríamos nunca tentar reabilitar, fornecer
bem-estar social ou melhorar a reforma, nós devemos simplesmente
retornar para punição”. A mesma história
foi contada sobre o Estado de Bem-Estar Social nesse país.
O argumento foi que fornecer seguro desemprego, assistência
aos pais-solteiros, benefícios extensivos para desempregados,
faria com que todos parassem de trabalhar com dedicação
e se tornassem preguiçosos e dependentes do Estado. Mas se
observarmos países que têm políticas sociais robustas,
como Suécia, Alemanha e Holanda, não notamos esses problemas
maiores. Então a minha percepção é que
havia problemas reais com a reabilitação – e que
as nossas expectativas estavam sempre muito altas. Poderia ter sido
continuado o princípio geral e desenvolvida uma melhor implementação.
ComCiência: Como a modernidade tardia articula-se
com a questão da punição?
Garland: O principal fato social em todas
as nações ocidentais na segunda metade do século
XX, particularmente entre 1960 e 1980, é o crescimento acentuado
das taxas de crimes (violência, roubos de bens, desordem pública,
uso ilegal de drogas etc). Realmente, por um longo período,
criminologistas modernos, a polícia, os governos e o público
continuaram assumindo que os crimes sempre continuariam aumentando.
Alguns dos motivos pelos quais aumentaram estão relacionados
com desenvolvimentos progressivos que ocorreram nessas sociedades,
que nesse período, também se tornaram mais abastadas
e consumistas. As mercadorias produzidas pela produção
em massa significaram que repentinamente havia muito mais itens domésticos
pessoais na classe média, ou mesmo na classe trabalhadora,
que valiam a pena ser roubados. A maior categoria de crimes de propriedades
na segunda metade do século XX é de roubo de carros
e de roubos usando carros. Isso não ocorria na primeira metade
do século. Riquezas e mercadorias estão produzindo roubos.
Na mesma linha, a relativa emancipação das mulheres,
sua educação e entrada na força de trabalho significou
que havia inúmeras casas vazias durante o dia e mais vulneráveis
ao arrombamento. Os lares tornam-se menos supervisionados e abrigando
mais bens e mercadorias. Em terceiro lugar, durante o mesmo período,
surgiu uma nova demografia chamada adolescentes. O que eu quero dizer
é que as pessoas que antes começavam a trabalhar e formavam
famílias ainda jovens agora ficam na escola. Esses adolescentes
são relativamente maduros, mas ainda continuam na escola sem
responsabilidades, sem trabalho, sem ter que prover uma família.
Ademais, eles se tornaram cada vez mais móveis. Nos EUA eles
têm carros e habilidade para se locomover, mas são pouco
supervisionados. Mais oportunidade, mais indivíduos em risco,
menos supervisão, essa é a receita para o crime. O que
aconteceu nos anos 1980, e que surgiu nos anos 1970, é essa
percepção de uma sociedade com alto nível de
criminalidade, uma sociedade na qual era provável que não
apenas os pobres poderiam sofrer crimes, mas qualquer um começaria
a ser vítima de crimes. A casa de qualquer pessoa poderia ser
arrombada, o carro de qualquer um poderia ser roubado. Todos poderiam
ver pichações e vandalismos nas ruas. Isso fez com que
as pessoas se tornassem muito mais conscientes do crime do que antes.
Essa nova consciência coletiva teve dois efeitos. As pessoas
se tornaram mais punitivas e intolerantes com relação
à agressores, portanto um distanciamento do Estado de Bem-Estar.
Pessoas da classe média poderiam acreditar em reabilitação
de criminosos quando não eram atingidas pelo crime, mas uma
vez vitimadas, tornaram-se menos tolerantes. O segundo ponto é
que as pessoas começaram a se tornar mais expostas a rotinas
de prevenção e fuga do crime. Começaram a se
mudar para os subúrbios, a trancar seus carros, a estacionar
carros fora das ruas (em garagens), a instalar alarmes nas casas –
em resumo, começaram a fazer ajustes em suas vidas diárias
para minimizar sua vulnerabilidade. Também passaram a apoiar
o policiamento e tornaram-se parceiras da polícia. Nos anos
1980, os crimes em propriedades decrescem. Nos anos 1990, caem os
crimes violentos. Em grande parte isso aconteceu porque nossas sociedades
aprenderam que as liberdades, riquezas e mobilidade da modernidade
tardia vêm com um preço. O preço é o risco
do crime e da incivilidade. Começamos a reagir a isso de uma
maneira expressiva, excessivamente restritiva, punindo todos que se
envolvem em confusões e, algumas vezes, de uma maneira mais
racional, colocando em prática atitudes preventivas. Freqüentemente
somos super-protetores. Hoje em dia, os pais quase sempre transportam
suas crianças para a escola, enquanto antes elas caminhavam
ou pegavam o metrô sozinhas. Várias atitudes ajudaram
a reduzir altas taxas de crime nas sociedades modernas, mas ao mesmo
tempo, nos tornaram mais conscientes sobre o crime e mais orientadas
pelo controle. As liberdades dos anos 1960 têm sido obscurecidas
pela cultura do controle dos anos 1990.
ComCiência: É comum a imprensa no Brasil destacar
a impunidade de crimes, em especial, dos conhecidos como “crimes
de colarinho branco”. A impunidade nesses casos aumenta a criminalidade
de uma forma geral?
Garland: Isso é difícil saber.
No entanto, a impunidade tem uma conseqüência que é
a de reduzir o apoio público ao sistema. Essa prática
transmite uma mensagem de injustiças políticas e desigualdades
que são perpetuadas pela imposição da lei e pelo
sistema de justiça criminal. Em outras palavras, se o governo
concentra toda a sua atenção repressiva e punitiva nos
pobres, negros, ou minorias de diversos tipos, e ignora os crimes
corporativos, dos poderosos, entre outros, envia de fato uma mensagem
muito forte: a de que o Estado não é para o conjunto,
mas um Estado de classe, em que lei e ordem são na realidade
políticas de classe. O segundo ponto é que muitos dos
crimes de colarinho branco são muito mais danosos e caros do
que os crimes de propriedade.
ComCiência: Qual sua avaliação das pesquisas
sobre sociologia da punição nos últimos anos?
Em que medida essa produção tem influenciado a consolidação
de políticas públicas na área?
Garland: Vou fazer
uma distinção entre criminologia e pesquisas sociológicas.
Durante muito tempo, sociólogos tiveram a tendência de
ignorar crime e punição e deixar essa pesquisa para
criminologistas que eram mais politicamente orientados, peritos da
justiça criminal. Assim, por muitos anos, os departamentos
de sociologia, mesmo nas melhores instituições de pesquisa,
não focalizaram questões de crime e punição.
Isso mudou nos últimos 10 anos, pelas seguintes razões:
prisão em massa, pena de morte, sentenciamentos severos e políticas
de lei-e-ordem têm se tornado parte proeminente da vida nos
EUA. Tanto organizações civis, como os sociólogos
tiveram que prestar atenção. Na década de 1960,
o governo norte-americano decidiu que seria uma boa idéia treinar
mais oficiais de polícia, gastando dessa forma uma grande quantidade
de dinheiro na formação na área de justiça
criminal. Isso se tornou uma obrigação educacional ampla,
mas com baixo status. Faculdades comunitárias ou universidades
com baixo status tornaram-se locais onde se estudava criminologia
e justiça criminal. Assim, os departamentos de sociologia começaram
a entender essa como sendo uma área que eles deixariam para
criminologistas empíricos. Mais recentemente, uma percepção
sociológica muito básica tem sido recuperada, que a
maneira pela qual uma sociedade pune é, em diferentes pontos
de vista, expressão das solidariedades básicas ou das
divisões básicas daquela sociedade. Aprende-se muito,
eu acredito, especialmente em um lugar como os EUA, estudando o sistema
penal, observando como e quem é punido, e como diferentes regiões
do país enxergam a punição.
O impacto da pesquisa criminológica
nas políticas governamentais diminuiu no final do século
XX. Após os anos 1970, crime e punição tornaram-se
politizados, especialmente nos anos 80 e 90. Quanto maior o grau de
politização, menor a influência de pesquisadores,
achados de pesquisa e opiniões profissionais. Os políticos
não se importaram em saber o que funciona bem ou quais são
os melhores usos dos recursos penais. Ao contrário, querem
saber o que o público quer e como ganhar benefícios
políticos atendendo às aspirações públicas.
Eu diria que a influência de pesquisa em políticas públicas
tem sido próxima a zero nos últimos 30 anos. O motor
da política penal e criminal tem sido uma batalha entre políticos,
cada um querendo ser mais punitivo que o outro. Competem prometendo
segurança pública e punição severa. A
idéia não é mais a de um sistema penal baseado
em evidências, custo-eficiente, racionalmente diferenciado;
mas garantir que o criminoso não tenha chance de agredir de
novo.
ComCiência: Nesse sentido, a percepção
pública da punição é uma ferramenta importante…
Garland: Sim, mas as questões colocadas
ao público nas pesquisas de opinião são geralmente
superficiais. Uma questão padrão perguntada todos os
anos nos EUA, desde de 1930, é se o público apóia
a pena de morte. 65% das pessoas freqüentemente dizem que sim,
“nós somos a favor da pena de morte”. Em meados
de 1990 a taxa era em torno de 85%. No entanto, se você pergunta
“você apóia a pena de morte em vez de prisão
perpétua sem liberdade condicional mais restituição
às famílias das vítimas”, o apoio à
pena de morte cai bruscamente. Portanto, é preciso ter em mente
que as enquetes de opinião pública que guiam as manchetes
(e política) são em sua maioria muito superficiais e
não informadas.
ComCiência: Qual é o seu interesse atual de pesquisa?
Garland: O trabalho que estou fazendo no
momento é o trabalho que qualquer sociólogo da punição
vindo para os EUA pela primeira vez teria que inevitavelmente responsabilizar-se
por fazer, que é explicar o motivo pelo qual a pena de morte
nesse país persiste, e porque persiste de maneira tão
peculiar. Ao invés de tratar a pena de morte como questão
legal ou moral, ou uma questão política, estou abordando
a pena de morte como um fato social estranho que um antropólogo
procura entender e explicar.
Fonte: http://www.comciencia.br/comciencia/handler.php?section=8&tipo=entrevista&edicao=35
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